O meio ambiente, a paz, a segurança e o lixo tornaram-se os temas mais caros da sociedade brasileira da segunda metade do século passado para cá e a agudização deles tem refletido o tratamento secundário que lhes tem sido dado pela imprensa brasileira. Basta refletir sobre o tratamento que o Congresso vem dispensando ao Código Florestal para perceber as formas e a dimensão que serão aplicadas quando vier à tona a discussão sobre a paz e a segurança pública. É perceptível verificar que serão necessárias várias tragédias de Realengo para o Congresso acordar para essas premências.
Não se pode deixar de admitir que os anos 1970 foram marcados por uma percepção profissional divisora entre o romantismo vigente no jornalismo brasileiro, quando a atividade detinha laços com o passado e as exigências de um mercado profissional que se abria e até se caracterizava pela necessidade de uma formação profissional.
Esse comportamento mercadológico abriu lugar para uma postura profissional em que a conquista de novos leitores ou consumidores de informação exigia uma especialização crescente. Foi essa necessidade que fez aparecer o jornalismo de economia, no qual se firmaram tão bons profissionais como temos hoje, emprestando-se consistência a uma cobertura super-amadorística e limitada anterior a 1945.
Desorientação ideológica
Mas essa vertente, infelizmente, não se ampliou para acompanhar o próprio desenvolvimento científico e tecnológico brasileiro. Veja: em menos de 10 % dos municípios brasileiros há aterro sanitário. Na porta da maioria das cidades, o lixo a céu aberto toma conta de tudo. No mundo desenvolvido, percebeu-se, há mais de 20 anos, que a solução para o destino do lixo é a incineração. Porque com o crescimento das cidades não há mais espaço físico urbano para aterro sanitário. Isso até agora não impediu que o governo brasileiro continue financiando os aterros sanitários como se fosse a última atitude a tomar. Por que a imprensa brasileira não se mete nisso? Nem o Congresso? Essa questão não lhes diz respeito?
Hoje, a sociedade clama pelo preservacionismo e não temos espaço suficiente nas páginas dos jornais – nem no rádio, nem na TV – para noticiar as questões ambientais, com as raríssimas exceções. A violência e a marginalidade pontificam em todas as áreas sociais e a cobertura da imprensa brasileira, em todos os níveis, só vê o ponto de vista dos bandidos e quase sempre oculta o da sociedade. A cobertura jornalística é absolutamente obstruída do ponto de vista da pacificação da sociedade.
Quando a paz obtém espaço na mídia brasileira, a tragédia sócio-política já se tem banalizado. O jornalismo espasmódico – aquele que só se faz em função das manchetes do dia – virou tão costumeiro que a busca de novidades para arredondar as letras garrafais é a pedra de toque das pautas dominantes. Basta ver na forma como se denuncia atualmente a presença de uma nova droga no mercado do narcotráfico brasileiro, a oxi. O impacto desse noticiário é tão forte que, ao invés de servir de combate, estimula o seu uso. Tal é a desorientação ideológica – ou a falta de – do noticiário da imprensa nacional.
Fim do analfabetismo
Certamente pelo amadurecimento dos seus dirigentes e experiência dos seus profissionais, desde o pós-guerra tanto a imprensa europeia quanto a dos EUA buscaram na especialização e no aprofundamento temático o caminho para manter-se o equilíbrio. Nunca foi gratuito nem sem fundamento a presença de grandes nomes da ciência, da literatura e da pesquisa nos jornais de grande tiragem, com seus artigos, suas reportagens e suas avaliações. Até hoje é possível encontrar um deles, Noam Chomsky, um exímio estruturalista norte-americano, elaborando conceitos, formulando ideias e propondo soluções como se fosse um estudante. Quando vivo, Albert Einstein nunca se recusou a participar de debates pioneiros.
A presença de alguns nomes consagrados na ciência e na literatura na mídia é um atributo confiável a um descortino genial. A mídia brasileira deve a Alberto Dines, por exemplo, a presença entre nós de um Carlos Drummond de Andrade e da esvoaçante Clarice Lispector. Qual não foi o espanto de alguns brasileiros quando leram pela primeira vez, nas páginas do velho Jornal do Brasil, poemas do sempre arredio Drummond e os primeiros textos lispectorianos do vibrante Perto do coração selvagem.
Nunca será demais repetir: a imprensa brasileira não parece esforçar-se pela ampliação dos seus leitores. Caso contrário, se envergonharia de nunca se ter engajado numa campanha pelo fim do analfabetismo e pela tão baixa compreensão dos direitos da cidadania.
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Jornalista e escritor, Maceió, AL; editor do site da AALONG