[O CPJ e a HRW enviaram, na quinta-feira (5/2), a seguinte carta ao presidente colombiano Álvaro Uribe Vélez, expressando objeções às acusações contra o jornalista colombiano Hollman Morris]
5 de fevereiro de 2009
S.E. Alvaro Uribe Vélez
Presidente da República da Colômbia
Casa de Nariño
Bogotá D.C., Colômbia
Por fax: 011-571-337-5890
Excelentíssimo Senhor Presidente,
Escrevemos com o propósito de expressar nossas objeções às acusações que V.Ex.ª e outros altos funcionários de seu governo formularam esta semana, vinculando o jornalista colombiano Hollman Morris ao grupo guerrilheiro de esquerda Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Estas sérias imputações colocam em risco a vida do jornalista e põem em perigo a liberdade de imprensa em seu país.
Depois que as Farc libertaram, no domingo, quatro reféns e os entregaram a uma missão humanitária liderada pela Cruz Vermelha Internacional, informes da imprensa colombiana e internacional assinalaram que Morris, produtor do programa investigativo semanal Contravía, no Canal Uno, e um correspondente da Rádio França Internacional (RFI) haviam sido detidos pelo exército colombiano logo após realizarem a cobertura sobre a operação de resgate.
Região insegura
Morris disse ao Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) e à Human Rights Watch (HRW) que não havia planejado estar presente durante a operação de resgate. Entretanto, informou, ele havia viajado ao sudeste da Colômbia dez dias antes da operação para entrevistar líderes das Farc como parte de um documentário sobre o seqüestro na Colômbia. Morris ressaltou que a reunião com os comandantes guerrilheiros havia sido programada várias semanas antes da viagem. No domingo (01/02), enquanto estava no Departamento [estado] de Caquetá, onde ocorreu a libertação, Morris, seu cinegrafista Leonardo Acevedo e Camilo Raigozo, repórter do semanário La Voz, de Bogotá, foram contatados por combatentes das Farc que ofereceram a eles uma entrevista com os seqüestrados.
Morris afirmou que se reuniu com os três policiais e com o soldado antes que estes fossem libertados. No entanto, segundo Morris, quando ele percebeu que as respostas estavam sendo dadas sob coação, decidiu que apenas perguntaria seus nomes e quanto tempo haviam passado em cativeiro. Morris afirmou que não transmitiu as seqüências feitas e que não publicará testemunhos manipulados pelas Farc.
Na terça-feira (03/02), os quatro reféns libertados enviaram cartas à Comissão Interamericana de Direitos Humanos e à RFI informando que as declarações que deram a Morris haviam sido feitas sob ameaças de assassinato ou de permanecerem em cativeiro, segundo informações da imprensa colombiana.
Logo após a entrega dos seqüestrados à missão humanitária, Morris e os outros dois jornalistas foram detidos em um bloqueio militar próximo do povoado de Unión Peneya, em Caquetá. Morris afirmou que um soldado pediu o material, mas que ele se negou a entregá-lo. Ediberto Ramón Endo, porta-voz do governo de Caquetá, informou ao jornal El Tiempo que o exército só havia retido Morris por não ser uma região segura para jornalistas. Temendo por sua segurança, Morris entrou em contato com organizações de direitos humanos em Bogotá e foi escoltado para fora do povoado pela polícia local e o defensor público regional.
‘Permissivo, cúmplice do terrorismo’
O vice-presidente Francisco Santos Calderón emitiu um comunicado alegando que os seqüestrados haviam sido obrigados a dar entrevista a Morris. Santos declarou que as ações do jornalista careceram de’objetividade e imparcialidade’, e sugeriu que haviam constituído uma’apologia à violência’. A declaração enfatizou que o governo colombiano garantiu a proteção de Morris a pedido da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Morris abandonou a Colômbia em várias ocasiões, após receber reiteradas ameaças. Santos afirmou que o jornalista se submeteu’a um risco extraordinário para a sua vida, sem informar o Estado ao qual demanda proteção’.
O ministro da Defesa, Juan Manuel Santos, também indicou, em entrevista a uma emissora de rádio nacional, que Morris era’próximo às Farc’.
Na terça-feira (03/02), o procurador-geral Mario Iguarán anunciou que, a pedido de seu governo e da Polícia Nacional, a Procuradoria abriria uma investigação criminal contra Morris por supostos vínculos com o terrorismo, segundo os informes da imprensa local. Desconhecemos qualquer evidência que vincule Morris às Farc e exortamos seu governo a explicar, publicamente, em que indícios sua investigação se fundamenta ou que a extinga por completo.
Em uma coletiva de imprensa realizada no mesmo dia, V.Ex.ª acusou Morris de'[esconder-se] em sua condição de jornalista (…) para ser permissivo (….) cúmplice (…) do terrorismo’. Morris indicou que sua tarefa informativa era completamente independente das Farc e de seu governo.
Acusações sem fundamento
V.Ex.ª declarou publicamente que, embora seu governo não goste que os meios de comunicação entrevistem guerrilheiros ou paramilitares, respeita o direito que têm de fazê-lo. Durante reunião com uma delegação do CPJ, em maio de 2006, V.Ex.ª enfatizou que qualquer funcionário que interferisse com o trabalho da imprensa’estaria cometendo um crime contra a democracia, e que isso seria gravíssimo’. Os jornalistas colombianos têm o direito de informar livremente sobre o conflito armado interno que há várias décadas ocorre em seu país.
A recente carga de acusações que V. Ex.ª e altos funcionários de seu governo lançaram contra Morris abala seu compromisso com a liberdade de expressão. Comentários oficiais vinculando jornalistas com qualquer das partes envolvidas no conflito armado interno colombiano têm resultado em sérias ameaças e têm levado repórteres a deixarem o país ou praticarem autocensura. Nós o instamos a, como Presidente de República, retratar-se publicamente pelos recentes comentários, respeitar o dissenso e abster-se de acusar membros da imprensa de ter vínculos com atores armados sem possuir nenhuma evidência. Exortamos V.Ex.ª e demais altos funcionários de seu governo, incluindo o vice-presidente Santos e o ministro da Defesa Santos, a se absterem de fazer acusações sem fundamento e perigosas contra a imprensa colombiana e internacional.
Agradecemos sua especial atenção a este urgente assunto e aguardamos sua resposta.
Atenciosamente,
Joel Simon, diretor-executivo, CPJ; José Miguel Vivanco, diretor-executivo para as Américas, Human Rights Watch.
Com cópia para: Francisco Santos Calderón, vice-presidente da República da Colômbia; Juan Manuel Santos, Ministro da Defesa; Thomas A. Shannon, Jr., Subsecretario para Assuntos Hemisféricos, Departamento de Estado dos Estados Unidos; José Miguel Insulza, Secretário Geral da Organização dos Estados Americanos; Carolina Barco, Embaixadora da Colômbia ante os Estados Unidos; William R. Brownfield, Embaixador dos Estados Unidos ante a Colômbia; Mario Iguarán, Procurador Geral da Nação; Comissão Interamericana de Direitos Humanos; Fundação para a Liberdade de Imprensa; American Society of Newspaper Editors; Amnesty International; Article 19 (Reino Unido); Artikel 19 (Países Baixos); Canadian Journalists for Free Expression; Freedom of Expression and Democracy Unit, UNESCO; Freedom Forum; Freedom House; Human Rights Watch; Index on Censorship; International Center for Journalists; International Federation of Journalists; International PEN; International Press Institute; David J. Kramer, U.S. Assistant Secretary for Democracy, Human Rights, and Labor; The Newspaper Guild; The North American Broadcasters Association; Overseas Press Club
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