Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Fórum de Mídia Livre se reúne em Belém

Coletivos, blogueiros, movimentos sociais, acadêmicos, ONGs e ativistas de várias partes do mundo se reúnem nos dias 26 e 27 no Fórum Mundial de Mídia Livre, que acontece junto ao Fórum Social Mundial (FSM), em Belém do Pará. Sob a identidade do ‘midialivrismo’ e evocando a militância contra-hegemônica, o evento pretende debater e, ao mesmo tempo, praticar formas de comunicação alternativa.


O primeiro Fórum de Mídia Livre ocorreu no Rio de Janeiro em junho de 2008 e contou com a participação de cerca de 500 ativistas, exaltando a pluralidade de experiências e de propostas. Desta vez, a integração ao FSM fomenta a expectativa de que participantes do Brasil e de outros países reflitam sobre a garantia do direito à comunicação através da colaboração entre os diversos veículos alternativos e à luz das novas tecnologias.


‘Vamos tentar dar um caráter mundial para o evento, pois contaremos com mais de uma centena de países’, conta Renato Rovai, editor da revista Fórum e um dos impulsionadores do Fórum de Mídia Livre. Diante da necessidade de enfrentar uma das maiores concentrações de propriedade de mídia do mundo, diz Rovai, torna-se imperativo construir novas redes de produção e troca de conteúdos. ‘O evento é promovido por veículos de comunicação que não se reconhecem na mídia tradicional.’


Entre eles há várias definições, como descreve Rita Freire, editora da Ciranda Internacional de Comunicação Compartilhada e integrante do GT de comunicação do FSM. ‘São as mídias alternativa, comunitária, popular, independente, enfim, que estão fora do mercado. Elas vão discutir como defender o direito à comunicação, discutir políticas públicas, marcos regulatórios.’


De fato, é a heterogeneidade a principal característica tanto do FSM quanto do Fórum de Mídia Livre. É a idéia de construir novos canais de disputa da hegemonia da informação, no entanto, que reúne uma diversidade rara de militantes e organizações. ‘Muitas pessoas estão se reconhecendo como fazedores de mídia’, conta Ivana Bentes, professora da Escola de Comunicação Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).


Desafios da mídia livre


Como resultado desse esforço, o Fórum de Mídia Livre promoverá duas mesas de debate e um seminário, tentando abranger os desafios da mídia livre, como a ampliação da comunicação compartilhada e de formas de aumentar a capacidade e abrangência destas redes de informação. Rovai acredita que o movimento atual já é um ‘ponto crítico da mídia tradicional’. Significa, para ele, que a grande mídia não consegue mais ignorar a profusão de informações por diferentes atores.


Ivana concorda e acredita que é necessário fortalecer a mídia livre apontando para um novo contexto nas comunicações. ‘Temos muitas iniciativas, mas que ainda não se comunicam entre si.’ Nesse caso, impõe-se como desafio ‘articular-se mantendo a singularidade de cada um’.


Para o Fórum de Mídia Livre, é o momento para reconhecer outras redes para além do Brasil e da América Latina. A crise econômica é o pano de fundo para estas e outras discussões que se darão em Belém. Em um dos debates, é a própria atuação da mídia corporativa diante do caos sócio-econômico, do qual também é cúmplice, que estará no foco das atenções.


Colaborativo


Durante o Fórum Social Mundial, será através de uma rede aberta de cobertura conjunta entre as mídias não-comerciais que o evento se comunicará com o mundo. Esta experiência de comunicação colaborativa vem se aperfeiçoando com a seqüência de FSMs e será tema de um seminário no Fórum de Mídia Livre.


‘Estamos discutindo a construção de modelos alternativos num contexto de destruição dos recursos do planeta e, por outro lado, buscando valorizar as diferentes culturas’, conta Rita. Exercício que sugere a superação do modelo mercadológico e que pretende ‘eliminar o recorte da competição entre os meios de comunicação’. Para a militante da Ciranda, a colaboração é o caminho para o embate com a mídia comercial. ‘Sem competição e lucro, o mercado não vive.’


Perpectivas


Após o I Fórum de Mídia Livre, em 2008, e desta sua edição mundial, é inevitável imaginar quais serão os resultados e as perspectivas em relação à afirmação da mídia livre resultantes da ação de um conjunto tão amplo de atores e diante da urgência pela democratização da comunicação no país. Alguns sites e blogs brasileiros têm sido bem sucedidos na iniciativa de expor algumas pautas e publicizar opiniões sobre temas polêmicos de maneira mais democrática do que o olhar enviesado da mídia comercial.


Com efeito, Renato Rovai sugere que esta seria uma ‘conquista subjetiva’ da mídia livre. ‘Economia solidária e software livre, por exemplo, não se discutia na mídia tradicional’, lembra. Mas esta sensibilização é, naturalmente, difícil de ser medida e não é, necessariamente, resultado de uma articulação coletiva, de modo que é possível destacar outros resultados concretos.


Por exemplo, em Belém será apresentado aos participantes do Fórum Social Mundial o edital para os Pontos de Mídia Livre, nos mesmos moldes dos Pontos de Cultura criados pelo Ministério da Cultura, idéia que foi delineada pelos participantes do FML no Rio. Com o edital, o MinC premiará 60 iniciativas de comunicação compartilhada, incluindo sites, rádios, fanzines, blogs, TVs, estúdios de produção de áudio e vídeo e outras mídias.


‘É o reconhecimento de quem está fazendo mídia fora do campo corporativo’, opina Ivana Bentes sobre o edital. A professora, porém, acredita que deve haver mais políticas públicas permanentes que dêem sustentabilidade a esta mídia não-comercial.


Este passo, para Ivana, seria dado com a realização da Conferência Nacional de Comunicação, reivindicação permanente das organizações da sociedade civil. ‘O Fórum de Mídia Livre é um bom momento para pressionar para sua realização’, concorda Rita Freire. A conferência seria, no caso, a condição para uma transformação estrutural da realidade das comunicações no Brasil através de novos marcos regulatórios.


Verbas para todos


Outra questão que envolve diretamente o governo federal e que incidiria sobre os veículos de comunicação não-comerciais é a destinação de verbas para publicidade estatal. É consenso entre os participantes do evento que o dinheiro público não pode ser monopolizado pelas grandes empresas em detrimento de veículos ‘que não aceitam dinheiro de corporações’, como destaca Rita em relação à mídia livre. Rovai acredita que os grandes veículos ‘não informam mais sozinhos’ e que é hora de os midialivristas terem seu valor finalmente reconhecido.

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Do Observatório do Direito à Comunicação