Nem a entrada do banqueiro Edouard de Rothschild no capital do Libération, em abril do ano passado, ajudou o diário francês de esquerda a sair de sua crise financeira. Por isso, Rothschild, acionista majoritário (com 38% das ações) que investiu US$ 26 milhões na publicação, apresentou nesta quarta-feira (27/9) aos representantes dos funcionários e aos membros do conselho administrativo uma proposta vista como a ‘última tentativa’ de tirar o jornal do buraco.
O conselho administrativo do diário afirmou ter chegado a um ‘consenso sobre os caminhos a explorar a fim de garantir a perenidade’ da publicação. No entanto, nenhum detalhe da proposta foi divulgado. O conselho também concordou em pedir um adiamento não determinado do período de ‘cogerência’ do diário, que deveria terminar no dia 1/10. A ‘administração mútua’ – dividida entre um jornalista escolhido pela Sociedade Civil dos Empregados do Libération (SCPL) e um publisher apontado por Rothschild – havia sido instituída depois da saída forçada, em junho deste ano, do então chefe de redação e co-fundador Serge July. Um comitê da empresa foi convocado para uma outra reunião nesta quinta-feira (28/9).
Tensão no ar
A equipe do Libé teme que haja novas demissões, reduções nos salários e uma possível separação do sítio do jornal – o terceiro mais visitado na França – para formar uma empresa subsidiária. Especula-se que Rothschild demita de 70 a 100 dos 285 funcionários. Em dezembro do ano passado, 56 empregados foram demitidos. A saída de July, em junho deste ano, também gerou uma série de saídas de jornalistas de peso do jornal – incluindo a correspondente Florence Aubenas, que ficou em cativeiro por 157 dias no Iraque no ano passado.
Muriel Gremillet, porta-voz da Sociedade Civil dos Empregados do Libération (SCPL), segundo acionista do diário com 18% das ações, afirmou que os representantes dos funcionários estão trabalhando em conjunto com os acionistas para o relançamento do jornal e ficou surpresa com o fato de Rothschild apresentar uma nova proposta para o Libé. ‘A impressão que tivemos foi a de que eles estavam trabalhando escondidos de nós, sem nos consultar’, disse.
Nada de dinheiro
Executivos da empresa tentaram recrutar novos investidores, conforme afirmou Isabelle Bascou, porta-voz de Rothschild. Na semana passada, o jornal lançou um esquema de venda de ações para seus leitores e 100 inscrições foram recebidas nos primeiros três dias. ‘É claramente uma última chance, porque o Libération está em uma situação financeira muito grave. O plano incluirá reformas editoriais e estruturais para que o jornal se torne viável’, disse Isabelle. De acordo com ela, Rothschild estaria procurando alguém para ocupar o cargo de editor-chefe. Edwy Plenel, ex-editor do Le Monde, seria um dos interessados. O favorito de Rothschild, entretanto, é Laurent Joffrin, do Nouvel Observateur.
O Libé publicou uma página dupla no começo do mês, onde lançava um apelo a Rothschild para ‘cumprir com suas responsabilidades’ e investir mais dinheiro no jornal. Isabelle descarta qualquer possibilidade de novos investimentos sem que antes sejam realizadas mudanças administrativas. ‘É enganador deixar as pessoas acreditarem que mais dinheiro vai resolver tudo. Se o jornal continuar no atual estado, o dinheiro não resolverá nada – só adiará o problema’, afirma.
Crise geral
O Libération está em seu sexto ano de perdas, e já amarga prejuízo de US$ 8 milhões no primeiro semestre deste ano – mesmo com as demissões. A tiragem média do jornal é de 135 mil cópias – a do Le Figaro é de 322 mil e a do Le Monde, de 314 mil.
Fundado em 1973 pelo filósofo Jean-Paul Sartre e pelo jornalista Serge July, o jornal não é o único no mundo a passar por séria crise diante da perda de anunciantes e leitores para a internet e jornais gratuitos. Na França, para piorar o cenário, os valores de serviços de impressão e distribuição são altos e sindicalizados. ‘Se todas as soluções para o relançamento do jornal não forem exploradas, o Libération corre o risco de desaparecer, ou poderá cair nas mãos de predadores capitalistas. Não podemos deixar de excluir o pior’, escreveu o jornal na edição de quinta-feira (28/9). Com informações da Associated Press [26/9/06], do Libération [27/9/06] e de Emma Charlton [AFP, 26/9/06].