Com a veiculação de uma mensagem enumerando as formas possíveis de contágio pelo vírus HIV, a TV Globo respondeu na segunda-feira (29/3) à decisão da Justiça Federal que obrigou a empresa a assumir a responsabilidade por exibir declarações equivocadas sobre a Aids feitas por um dos participantes do seu reality show. Realizada em formato de comunicado oficial e lembrando, pelas cores e fonte escolhidas, as mensagens obrigatórias do Ministério da Saúde, a nota contrasta com a edição das declarações do lutador Marcelo Dourado, que afirmou durante o programa Big Brother Brasil que ‘homem hetero não pega Aids’.
O procurador da República Jefferson Dias, responsável pela denúncia contra a Globo, diz que ainda irá avaliar se a resposta da emissora foi satisfatória. Segundo ele, é necessário que o vídeo com a mensagem exibida na segunda-feira seja anexado aos autos do processo. Para isso, se a emissora não enviar a gravação espontaneamente, o Ministério Público Federal fará esta solicitação. ‘Originalmente, eu tinha pedido que a resposta tivesse o dobro do prazo de exposição [da declaração de Dourado] e o juiz concedeu o mesmo tempo, vou esperar [a Globo] juntar para fazer a comparação temporal, e a partir daí fazer a análise’, informou. ‘Por enquanto, não dá nem para falar que foi satisfatório. Na próxima semana [darei um parecer].’
Errata insuficiente
A partir de denúncia feita por um cidadão, o MPF abriu inquérito para averiguar a responsabilidade da emissora por veicular o comentário feito por Dourado sobre o HIV (saiba mais). O lutador disse, em 2 de fevereiro, que ‘hetero não pega Aids, isso eu digo porque eu conversei com médicos e eles disseram isso. Um homem transmite para outro homem, mas uma mulher não passa para o homem’. A declaração, exibida ao vivo nos serviços de pay per view na internet e na TV paga, foi incluída na edição dos melhores momentos do programa na TV Globo que foi ao ar em 9 de fevereiro.
Na denúncia, o procurador Dias pedia que a Globo fosse responsabilizada por atentar contra as políticas públicas de prevenção à Aids e promovesse uma retratação. Na decisão liminar em favor do pedido do procurador, proferida na segunda-feira (29),o juiz federal substituto Paulo Cezar Neves Junior, da 3ª Vara Federal Cível de São Paulo, reconheceu a responsabilidade da emissora por ‘lesão ou ameaça de lesão ao direito constitucional à saúde e também ao direito também de cunho constitucional ao serviço público de rádio e televisão de qualidade’.
O juiz justificou a decisão em caráter liminar considerando que o programa se encerra na terça, dia 30. A pena prevista pelo não cumprimento era de R$ 1 milhão.
Na tarde de segunda-feira, a Globo já sinalizava que cumpriria a decisão judicial. Antes, porém, havia se manifestado publicamente sobre o caso afirmando que não é responsável pela opinião dos participantes do reality show. A emissora alegou ainda que, no mesmo dia da veiculação do comentário, o apresentador Pedro Bial teria feito uma errata, indicando que os telespectadores procurassem informações corretas sobre a transmissão do HIV no site www.aids.gov.br
Direito à saúde
Para o juiz, a conduta assumida pela emissora de ‘liberalidade’ não é suficiente para cumprir seu dever de não afrontar o direito fundamental de informação e prevenção de doenças. Na sentença, Neves Junior ressalta o desequilíbrio entre a exibição de uma declaração na TV e a solução apontada pelo apresentador de que os telespectadores buscassem informações pela internet.
Na decisão, o juiz ainda ressalta que a ‘análise sistemática da Constituição Federal impõe que a liberdade de comunicação seja limitada pelo exercício de outros direitos fundamentais nela previstos, dentre eles o direito à saúde’