A líder na luta pelas liberdades civis, políticas e democráticas da Birmânia, Aung San Suu Kyi (lê-se Chi) declarou ao Burma Digest, no domingo (18/9), que não tem tempo para o Twitter ou Facebook. A notícia dada pela simples e simpática publicação virtual da Birmânia percorreu jornais de toda a Ásia, e acabou na BBC World, como uma pequena chamada escrita, inserida entre blocos de notícias na TV. A imprensa ocidental presta pouca atenção na luta do povo birmanês pela liberdade. E muitos veículos ainda usam o nome imposto pela ditadura: Myanmar. A oposição e a valente senhora Suu Kyi chamam sua terra natal de Birmânia. A mídia mundial deveria seguir seus passos.
O “ícone da democracia”, como anotou o periódico especializado em direitos humanos na Birmânia, quer manter-se na mesma posição que seus compatriotas: censurada, bloqueada e sem acesso livre a internet. O país tem uma das mais repressivas legislações sobre internet no mundo, segundo os Repórteres sem Fronteiras, publicou o Taipei Times, outra publicação alocada em provedor estrangeiro graças a uma ditadura inimiga da livre imprensa e dos diretos democráticos. O periódico é publicado por exilados chineses.
A senhora Suu Kyi vem conduzindo lentamente um processo de mudanças graduais, extenuante e sofrido para esta pequena mulher que luta como se nada mais houvesse no mundo além da libertação de seu povo. Ela depende de publicações hospedadas na web em provedores estrangeiros para publicar suas ideias. Sonhos de uma Birmânia pacífica e finalmente livre, depois do fracassado e sangrento levante dos monges em 2007. É assim a relação da senhora Suu Kyi com a web.
Lido e entendido como um gigante da mídia
Os sites que contam sua história e levam suas ideias são simples e despretensiosos como ela. Como o Burma Digest. Que só existe para defender a libertação da Birmânia sem derramamento de sangue. Ela passou um total de vinte anos em prisão domiciliar. Só foi libertada em novembro de 2010. Aung San Suu Kyi vem defendendo um processo de negociação com seus adversários que ela considera não ter paralelo com os movimentos árabes de libertação. Ela é uma amante irredutível da paz.
Depois de impedida de formar governo apesar de eleita, em 1990, Suu Kyi tornou-se uma figura ubíqua na mídia internacional. Principalmente em forma fotográfica: tornou-se um ícone em seu próprio tempo. Suas palavras, entretanto, talvez soem pouco combativas, para que raciocina nos termos das sangrentas revoluções dos três últimos séculos. Mas ela mesma deve ser (e é) a guardiã das liberdades de seu país. Que no momento está impedido de manter uma imprensa livre.
Por isso Aung San Suu Kyi não pode frequentar Twitter nem o Facebook. Ela não pode fazê-lo (embora goste da ideia) porque deve manter uma oposição firme a seu adversários no cotidiano. Ela não pode dar-se ao luxo, nem por um segundo, de deixar de vigiar seus adversários. Ela sabe o perigo que eles representam, para ela e para seu povo. Se o regime opressor hoje parece mais tolerante com seus dissidentes, por outro lado não dá sinais evidentes de mudanças no curto prazo. Mas todos já conhecemos a enorme paciência de Aung San Suu Kyi.
O pequeno Burma Digest deve ser lido e entendido como um gigante da mídia mundial, sempre a lembrar o quanto ainda falta para que a Birmânia um dia seja livre.
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[Sergio da Motta e Albuquerque é mestre em Planejamento urbano, consultor e tradutor]