O início das transmissões, neste domingo (2/12),da TV Brasil, nova emissora pública de televisão que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva criou por Medida Provisória neste ano, e, concomitantemente, do padrão Digital de televisão – cujo padrão provocou uma intensa disputa comercial internacional e grande polêmica política interna, com grupos poderosos defendendo o modelo europeu e outros ainda mais influentes fechando com o japonês, que acabo usaindo vitorioso após intensa negociação – foi o destaque das edições de sábado dos principais jornais brasileiros. Confira abaixo o que foi publicados sobre esses dois temas – TV pública e TV digital – na Folha de S. Paulo e n’O Estado de S. Paulo.
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Copyright Folha de S. Paulo, 1°/12/07
TV PÚBLICA
Elvira Lobato
Presidente da TVE se afasta após criação da TV pública
‘Descontente com os rumos tomados na criação da TV Brasil, a jornalista Beth Carmona deixou a presidência da Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (Acerp), que administra a TVE. A diretora-geral, Rosa Crescente, também deixou a emissora.
O conselho de administração da Acerp aceitou o pedido de afastamento de Carmona e nomeou o jornalista Arnaldo Cesar Jacob, que integra a equipe da implantação da nova TV, para sucedê-la. Jacob foi editor-executivo do jornal ‘‘O Dia’.
À Folha Carmona criticou a fusão da Radiobras com a TVE na formação da nova TV pública. ‘‘Como a Radiobrás e a Acerp têm, cada uma, cerca de 1.200 funcionários, acharam que juntar as duas estruturas resultará em uma instituição com o dobro de força. Mas não é assim. A Radiobrás não tem tradição de televisão.’
Ela disse que um dos motivos que a levaram a se afastar é a incerteza em relação aos funcionários. O contrato entre a Acerp e a União, para gestão da TVE e da Rádio MEC, termina neste mês. A medida provisória que criou a TV Brasil prevê que a empresa absorverá as funções (contratos e obrigações) da Acerp, que desapareceria em três anos. Carmona diz que lhe foi assegurado que não haverá demissão em massa.’
Kennedy Alencar e Leandro Beguoci
TV pública de Lula estréia amanhã com improvisos
‘A TV Brasil, nova emissora pública do governo federal e um dos principais projetos do segundo governo Lula, estréia amanhã com orçamento de R$ 350 milhões garantidos pelo Palácio do Planalto para 2008 e cerca de 2.000 funcionários. Por enquanto, de improviso.
A rede nasce da fusão entre a TVE do Rio e a Radiobrás, estatal federal. Ela vai mesclar em um único canal o conteúdo que já é exibido separadamente por cada uma dessas empresas. Da TVE, permanecem atrações como ‘Observatório da Imprensa’, ‘Sem Censura’, ‘Conexão Roberto Dávila’ e ‘Um Menino Muito Maluquinho’. A Radiobrás contribuirá com ‘Ver TV’ e ‘Diálogo Brasil’.
Só em março deve ir ao ar a primeira leva de programação própria e o logotipo ‘TV Brasil’. Por enquanto, telespectadores de Rio, Brasília e Maranhão, únicos locais onde será possível assisti-la por algum tempo, verão os símbolos da Radiobrás e da TVE na tela.
Ainda não há data para chegar aos outros Estados. As emissoras locais ainda não definiram se e como vão transmitir o conteúdo federal. O sinal será analógico, à exceção de São Paulo, o único lugar que terá TV digital a partir de amanhã. Mas ainda não há data para a TV Brasil chegar aos paulistas.
Nem tudo será velho. Amanhã vai ao ar uma programação especial, a partir das 14h, com foco na área cultural e em entrevistas. Falará sobre TV. Às 20h, transmite o evento de lançamento da TV digital, em SP. Na segunda-feira e durante essa fase inicial do projeto, a TV pública terá um telejornal diário, o ‘Repórter Brasil’. Começará às 21h e terá três âncoras. Luiz Lobo, ex-SBT, ficará baseado em Brasília, onde o telejornal será editado. Apresentadora da TVE, Luciana Barreto será a âncora do Rio. Em São Paulo, ficará Florestan Fernandes Jr., atualmente na Radiobrás. Nenhum deles será o âncora principal.
Críticas
O governo, porém, não quer trabalhar com o termo ‘estréia’. Teme receber críticas ao não apresentar uma programação original desde o início. De acordo com a presidente da TV Brasil, Teresa Cruvinel, ‘estréia significa ter identidade visual, com logomarca definida e uma programação nova. Domingo é apenas o ponto inicial de uma estréia que deve acontecer em março’, disse.
Até lá, enquanto fica no ar essa grade provisória, serão entrevistados telespectadores comuns das cinco regiões do país para que digam o que gostariam de assistir na rede pública. Haverá ênfase na interatividade. A Folha apurou que a vinheta-slogan da TV Brasil será: ‘TV Brasil, você escolhe, você programa, você assiste’.
Lula não será entrevistado no primeiro dia da TV Brasil. A intenção é entrevistar futuramente tanto o petista como o tucano Fernando Henrique Cardoso, para sugerir equilíbrio editorial. Até o final deste ano, serão conhecidos os temas dos editais de licitação para produção de programas independentes.
Empresas privadas e estatais poderão patrocinar ainda programas da TV Brasil. A preocupação com índices de audiência não será a prioridade nessa fase inicial, mas sim em médio e longo prazos.
MP no Congresso
Tereza Cruvinel tem se dedicado a negociar com os deputados federais as emendas da MP (medida provisória) que criou a EBC (Empresa Brasil de Comunicação). No Planalto, avalia-se que a MP será aprovada por acordo na Câmara e terá mais dificuldade no Senado. A TV Brasil começará sua transmissão sem que a MP esteja aprovada. No caso de rejeição, hipótese que o Palácio do Planalto avalia como remota, seria encontrado outro formato jurídico para manter a rede no ar. Um dos motivos para a emissora não entrar com uma grade inteiramente nova é o temor de melindrar o Congresso.
Neste ano, a TV Brasil executará o que restou do orçamento de R$ 220 milhões dos extintos canais estatais. Há expectativa que, além dos R$ 350 milhões já garantidos, um fundo do Ministério da Cultura para produção audiovisual possa dar mais R$ 80 milhões.
Existe ainda a meta da direção da rede de obter R$ 60 milhões por ano com dois instrumentos: publicidade institucional de estatais e empresas privadas e patrocínio a projetos que possam se beneficiar das leis de incentivo à cultura. A data do dia 2 de dezembro foi escolhida pelos gestores da TV pública numa tentativa de vincular a estréia da nova rede com o início das transmissões da TV digital em São Paulo.
Mas o transmissor digital que servirá para gerar, de forma digital, a programação da TV pública no Estado foi importado dos Estados Unidos e não conseguirá chegar a tempo ao Brasil, por problemas na alfândega. (Colaboraram LETÍCIA SANDER e FELIPE SELIGMAN, da Sucursal de Brasília)’
Leandro Beguoci
Proposta inicial desagrada a TV Cultura
‘A relação entre a TV Brasil, criada pelo governo federal, e a TV Cultura, financiada pelo governo de São Paulo, do PSDB, precisa ser muito discutida para não acabar em confusão.
O principal problema é saber quantas horas de programação da TV Brasil passarão na TV Cultura, que não é obrigada, assim como nenhuma outra emissora estadual, a virar uma retransmissora da rede federal.
Nesta semana, representantes das 19 emissoras estaduais filiadas à Abepec (Associação Brasileira das Emissoras Públicas, Educativas e Culturais) se reuniram em Maceió (AL) com Mario Borgneth, diretor de rede da TV Brasil, para discutir como participarão da emissora lançada pelo governo Lula.
Segundo Jorge da Cunha Lima, presidente do conselho curador da Cultura, a proposta de que todas as TVs veiculem uma programação comum de oito horas não agradou aos paulistas. ‘Eles pretendem criar um pólo com todo mundo, inclusive a gente’, afirma Cunha Lima. ‘Mas, por enquanto, não dá. Ainda estamos consolidando a grade nova da Cultura, que está nascendo agora com o presidente Paulo Markun.’
Hoje, a TV Cultura é a principal fornecedora de conteúdo às emissoras mantidas pelos governos estaduais. Ela disponibiliza seus programas gratuitamente (como previsto em lei). A própria TVE do Rio, que se uniu à Radiobrás para formar a TV Brasil, usa sete produções da sua equivalente paulista, como o jornalístico ‘Roda Viva’ e o musical ‘Viola Minha Viola’. A Cultura usa quatro da TVE, como o infantil ‘Um Menino Muito Maluquinho’.
Esse quadro tem grandes chances de mudar. A TV Brasil nasce com um orçamento federal de R$ 350 milhões, fora patrocínios que podem somar mais R$ 60 milhões à nova emissora. A TV Cultura teve, neste ano, R$ 169 milhões: R$ 93,1 milhões do governo do Estado de São Paulo e R$ 75,9 milhões captados no mercado.
‘Se eles atraírem as TVs com programação de alta qualidade, ótimo para o Brasil. Para conquistar São Paulo, precisa ver como vai ser. Se reproduzirem apenas o padrão da TVE do Rio, não vamos nos interessar. A Radiobrás e a TVE, juntas, não vão dar uma TV melhor do que a nossa. A Cultura poderia fazer maravilhas se tivesse R$ 350 milhões’, diz Cunha Lima.
A presidente da TV Brasil, Tereza Cruvinel, adota um discurso mais diplomático. ‘A TV Cultura será uma parceira importante. Ela tem produtos muito bons, alguns serão mantidos na grade e esperamos, no futuro, que adote um programa da TV Brasil, quando tivermos uma produção mais intensa.’
Em tese, a TV Brasil não precisa da TV Cultura. Ela terá um canal digital na cidade, ainda sem data para estrear. Na prática, como poucas pessoas têm TV digital, a emissora só entrará na maior cidade do país se chegar a um acordo com sua equivalente paulista, que tem mais um trunfo: os retransmissores analógicos e digitais da TV Brasil, em SP, ficam na antena da Cultura. No passado, a Cultura e a Radiobrás assinaram um acordo de cooperação.’
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TV de Lula tem Estado demais, diz professor
‘Celso Schröder, 54, é professor do curso de jornalismo da PUC-RS e coordenador-geral do FNDC (Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação), movimento nascido em 1991 para reivindicar o controle social da mídia e mudar a legislação sobre os meios de comunicação no país. O fórum foi fundado por sindicatos, pela UNE e por siglas como o PT. Schröder afirma que a TV Brasil, tal como está hoje, é ‘uma TV estatal com algum caráter público’ e está sujeita a muitas interferências da Presidência da República. Primo de Carlos Henrique Schroder, diretor da Central Globo de Jornalismo, o professor critica ainda a opção do governo por nomear personalidades, como o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, para o conselho da TV. ‘Eu prefiro que fique na mão das corporações, pelo menos elas representam muito mais pessoas do que simplesmente a consciência dos indivíduos.’ Confira abaixo os principais trechos da entrevista.
FOLHA – O Brasil precisa de uma TV pública?
CELSO SCHRÖDER – Precisa. Todos os países, de alguma maneira, possuem alguma coisa nesse sentido. A TV pública não é um capricho. Informação precisa ser tratada como bem universal, como luz e educação. O Brasil precisa mais da TV pública do que outros países porque temos uma hipertrofia do sistema comercial televisivo no país.
FOLHA – Por quê?
SCHRÖDER – Entramos em um curto-circuito de forma e conteúdo. Isso causa um problema para o próprio sistema, para as redes hegemônicas, que acabam se pautando por elas mesmas. Isso cria, obviamente, um esgotamento de modelo.
FOLHA – Como falar em esgotamento do modelo se ele mantém as TVs lucrativas?
SCHRÖDER – O grande problema que exige uma televisão pública é o esgotamento das linguagens. O modelo comercial, pelas próprias características de consumo que o público exige e que as empresas precisam disponibilizar para garantir e maximizar os lucros, não permite a elas grandes investimentos, grandes ousadias de criatividade, de linguagem, as fórmulas prontas são as que acabam sendo reforçadas. As audiências das televisões vêm caindo, até da Globo.
FOLHA – O sr. fala de inovação de conteúdo. As pessoas que o governo trouxe para fazer a TV pública são provenientes da grande mídia que o sr. critica, como Tereza Cruvinel e Franklin Martins, ambos da Globo. Isso não é contraditório?
SCHRÖDER – É uma TV pública que sai pautada pelos seus paradoxos. Não temos ninguém de Marte para trazer. Nós todos faríamos isso e todos estamos pautados por essa televisão. Sou um crítico do modelo da Globo, mas não saberia fazer outra televisão a não ser que começássemos a experimentar.
FOLHA – O governo elegeu a BBC como seu modelo. A TV inglesa tem orçamento de 2,8 bilhões de libras. O orçamento da TV pública para o próximo ano é de R$ 350 milhões. Como cumprir esse objetivo com esse orçamento?
SCHRÖDER – Esse é um dos elementos criticáveis do projeto. Nesse momento, os recursos são escassos. Por isso me parece que em vez de ser uma televisão pública, uma rede pública, como chegou a ser anunciado, o que foi feito até agora foi simplesmente a fusão de duas empresas, criou-se uma TV estatal com algum caráter público.
FOLHA – Por quê?
SCHRÖDER – O conselho da TV não retira o Estado, ao contrário, o Estado está fortemente presente na estrutura de gestão. Por enquanto, o modelo brasileiro é absolutamente igual ao das TVs comerciais brasileiras. Nesse desenho que o governo faz, há um conselho técnico e abaixo há a direção técnica. Acima dele está a Presidência da República.
O argumento do ministro Franklin tem sido um tanto ingênuo, que não coincide com a capacidade e a inteligência dele. Ele diz que isso se justifica porque o presidente Lula tem 60 milhões de votos e que isso daria a ele autoridade democrática para escolher a direção técnica.
Bem, óbvio, 60 milhões de votos, com esse argumento, podemos fechar Congresso, fazer o que quiser, não há mediação democrática.
FOLHA – Mas há o Conselho Curador, que terá economistas, esportistas, professores…
SCHRÖDER – Nós achamos mais democrático conselhos em que a sociedade civil fosse representada não pelos seus expoentes individuais, mas pelas suas instituições. Levamos esse argumento ao ministro, mas ele tem refutado dizendo que prefere a representação difusa, de personalidades, porque isso evitaria que o conselho ficasse na mão das corporações. Eu prefiro que fique na mão das corporações, pelo menos as corporações representam muito mais pessoas do que simplesmente a consciência dos indivíduos.
FOLHA – Muitas das corporações são ligadas ao PT.
SCHRÖDER – Não pode ser o conselho do PT, ou de um setor. Se fizer isso, leva a TV ao fracasso. Se o Estado fez um lugar para mandar, começou do lugar errado.’
José Alberto Bombig
FHC ataca a idéia e diz que nunca pensou em TV quando presidente
‘Antecessor do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Palácio do Planalto, Fernando Henrique Cardoso (PSDB) disse não apoiar a iniciativa da nova televisão pública.
Para ele, a estrutura de comunicação já existente sob controle do governo federal, e que o tucano conheceu bem, já é suficiente para a tentativa de assegurar os objetivos que Lula e os petistas dizem querer alcançar com a iniciativa.
‘O governo já possui a TVE, São Paulo tem uma TV educacional, outros lugares também. Eu não vejo razão, não vejo necessidade de uma nova rede’, afirmou à Folha. O ex-presidente disse ainda que em seus oito anos de Planalto nem sequer chegou a cogitar a possibilidade. ‘Não passou pela minha cabeça criar algo assim enquanto fui presidente.’
Controle e propaganda
Geraldo Alckmin, também tucano e governador de São Paulo por cinco anos, é mais direto: ‘É um objetivo claramente de controle dos meios de comunicação’, disse.
Segundo ele, derrotado por Lula na disputa presidencial em 2006, a criação da TV pública será um desperdício de dinheiro. ‘Não há nenhuma razão em criar outra televisão. Aliás, esse governo é o campeão em gastar com publicidade, é uma coisa totalmente desnecessária’, disse.
Para o vice-governador de São Paulo, Alberto Goldman (PSDB), um dos homens de confiança de José Serra, o Planalto poderia ter articulado uma rede que unisse com mais eficiência todos os canais públicos e educativos já existentes. ‘Para nós, isso pressupõe a tentativa de organizar um instrumento de propaganda. Não há a menor necessidade.’
Os tucanos estudam a criação de uma comissão suprapartidária que acompanhe a programação da nova TV.
Nos bastidores, o temor é que ela se transforme na ‘TV Lula’ e sirva como um instrumento de campanha dos petistas e de seus aliados na eleição de 2010, especialmente nos grotões do país.’
Pedro Dias Leite
Referência no mundo, BBC mudou para manter sua independência
‘Depois de 85 anos, a BBC (British Broadcasting Corporation) -TV pública britânica que é referência em todo o mundo pela alta qualidade da programação- sofreu uma grande reestruturação há alguns meses na busca por manter sua independência em relação governo.
As alterações surgiram na esteira de uma das maiores crises da história da BBC, em 2004, quando um enfrentamento com o governo Tony Blair em torno de uma matéria levou à saída da cúpula da emissora, assim como do repórter que levou a história ao ar.
Um inquérito judicial contestado por boa parte da mídia britânica concluiu que a emissora falhou ao levar ao ar uma reportagem em que acusava o governo de ‘apimentar’ um dossiê sobre armas de destruição em massa no Iraque. O cientista que passou anonimamente a história para o repórter suicidou-se depois que sua identidade foi revelada.
Dois anos depois da crise, a emissora criou um novo órgão para supervisionar suas atividades, o BBC Trust. ‘O Trust foi criado para assegurar uma maior independência, mais transparência e também uma seleção mais criteriosa dos temas da BBC’, disse à Folha uma porta-voz do órgão, que começou a operar em janeiro.
Formado por 12 integrantes, o Trust decide as linhas gerais para o trabalho da emissora e presta grande atenção às opiniões dos telespectadores/ouvintes/leitores da BBC, mas não tem nenhuma conexão com o dia-a-dia das redações.
Os membros do Trust são escolhidos por um sistema público e independente de seleção, mas a última palavra cabe ao governo, que pode acolher ou vetar a indicação. ‘Se uma indicação é negada, o governo tem de explicar os motivos, então é muito raro que isso aconteça’, argumentou a porta-voz.
Quem toca as operações da BBC é uma entidade totalmente separada, o conselho executivo, formado por 15 integrantes, escolhidos por um processo misto, com influências de dentro e de fora do governo.
A cada dez anos, a licença da BBC é renovada pela rainha -a última ocorreu em 2006, e a criação do Trust faz parte das mudanças arquitetadas para a próxima década.
A corporação é formada por quatro canais de TV aberta, alguns na TV a cabo, rádio e internet. O orçamento, em torno de 4 bilhões de libras (cerca de R$ 15 bilhões), é quase todo financiado por uma taxa de 135,5 libras que tem de ser paga por todos que tiverem TV em casa.
Imparcialidade
Com esse Orçamento independente e uma longa história de independência, a rede é sinônimo de imparcialidade e uma paixão dos britânicos, mas mesmo assim está sujeita a pressões.
O ex-diretor-geral que perdeu o cargo na crise de 2004, Greg Dyke, escreveu um livro acusando o governo de tentar interferir na cobertura que a emissora fez da Guerra do Iraque. ‘Todos os governos tentarão fazer isso. Os governantes são políticos. O trabalho das redes de televisão é ignorá-los nessas circunstâncias, como nós ignoramos Blair’, disse Greg Dyke à Folha, em 2005.
A Guerra do Iraque, que ruiu com a credibilidade de quase a totalidade da mídia norte-americana, foi um dos maiores testes da BBC nos últimos anos. A rede foi acusada tanto pela direita quanto pela esquerda, o que é sinal de imparcialidade. Um membro do Parlamento chegou a defini-la como ‘Bush and Blair Corporation’, mas a rede manteve uma linha crítica em relação ao governo.’
Leandro Beguoci, Fernando Barros De Mello, Luiz Fernando Vianna E Italo Nogueira
‘Não entendo nada de TV’, diz indicado ao conselho
‘Os conselheiros da TV Brasil terão duas missões. Zelar pela independência da nova emissora diante do governo federal e fiscalizar a qualidade da programação oferecida. Sabem que nenhuma delas será fácil, pelos mais variados motivos.
‘Não entendo nada de TV’, admite José Antonio Fernandes Martins, vice-presidente do Conselho de Administração da Marcopolo e uma das 20 pessoas nomeadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para compor, durante quatro anos, o conselho curador da nova emissora pública -e talvez até por mais tempo, já que ainda não foi definido como estes nomes serão substituídos.
Ele disse ter aceitado o convite, feito pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, porque ‘o Brasil é muito fraco de programas culturais, educativos, como aqueles ‘faça você mesmo’ da TV americana. Temos que mostrar para o povão que televisão não é só filme com tiroteio e novela em que a mulher trai o marido’.
Cada conselheiro receberá R$ 2 mil por mês, mais despesas de viagem e estadia.
O advogado José Paulo Cavalcanti Filho, presidente do Conselho de Comunicação Social do Congresso e ministro (interino) da Justiça no governo José Sarney, afirma que há cinco anos quase não lê jornal ou vê televisão porque está escrevendo uma biografia de Fernando Pessoa. Ele destaca que a nova TV não pode ser um ‘instrumento de proselitismo’ e que, se for assim, é melhor usar o dinheiro em escolas.
O cientista político Wanderley Guilherme dos Santos diz que só o tempo mostrará qual o caráter da emissora, se apoiará ou não o presidente Lula. ‘Uma iniciativa governamental pode ser vista por ângulos não muito favoráveis. Acho que a execução esclarecerá.’ Em 2005, ele acusou a oposição de usar o mensalão para aplicar um ‘golpe branco’ contra o governo.
Já Cláudio Lembo, ex-governador de São Paulo e autor da expressão ‘elite branca’, vê riscos de a TV pública se transformar em um órgão chapa-branca, de apoio ao Palácio do Planalto. ‘Não sou ingênuo, esse é um risco grande’, afirma o membro do DEM. ‘Vou ser muito presente para que se preserve identidade e coerência.’
Os conselheiros podem afastar membros da diretoria executiva da TV, até mesmo a presidente da emissora, Tereza Cruvinel, caso identifiquem problemas graves na programação. Se isso acontecer, a maioria dos conselheiros deve emitir dois votos de desconfiança, em um prazo de 12 meses, com intervalo de 30 dias. Problema: quatro membros do conselho são representantes de ministérios, mais sujeitos a pressões do governo federal.
‘Ninguém no conselho vai tolerar qualquer interferência’, assegura o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, que está cotado para presidir o conselho -eleitor de Lula em 2002, ele disse que votaria em José Serra se o tucano fosse candidato à Presidência da República em 2006. ‘Se alguém tentar fazer alguma coisa em contrário, peço demissão. Acho a manipulação uma das coisas mais ridículas, mais grotescas dos meios de comunicação.’
Lembo, que diz se informar principalmente pela internet e pelos programas da TV Câmara e TV Senado, defende uma programação voltada à história do país, para divulgar as tradições brasileiras. Belluzzo gostaria de ver um programa de entrevistas como o ‘Hard Talk’, da BBC inglesa, emissora que aprecia muito -’ o entrevistador é implacável com todo mundo’ .
Audiência
José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni, que já foi o homem mais poderoso da TV Globo e hoje é dono da TV Vanguarda, diz que não será sua função se envolver com a programação do canal público. Mas, por e-mail, ele mostra que tem idéias claras sobre o papel educativo da emissora:
‘Considero um bom projeto se não houver interferência do Estado. Vejo como coisa de longo prazo e uma boa oportunidade para fazer algumas múmias da rede educativa começarem a se modernizar.’
A cenógrafa e carnavalesca Rosa Magalhães imagina uma emissora pública com programação variada e ‘de preferência, com audiência’.
‘Se põe títulos como ‘programa educativo’, já fica cacete. E não tem esse negócio de que criança não pode ver TV. Pode ver sim, faz muito bem. Sempre fiz dever do colégio com TV ligada e nunca me atrapalhou.’’
Leandro Beguoci
‘Se enveredar pelo partidarismo, rede será desastre moral’
‘‘Se ela [TV Brasil] enveredar pelo partidarismo e pelo governismo, ainda que veladamente, viveremos um desastre moral.’ A avaliação é de Eugênio Bucci, 49, presidente da Radiobrás no primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele ajudou a formatar a emissora que o governo leva ao ar.
Professor visitante do Instituto de Estudos Avançados da USP, Bucci defendeu, em entrevistas por e-mail à Folha, o modelo da TV Cultura, da qual é conselheiro. Segundo ele, ser fundação e não uma estatal aumenta a independência.
FOLHA – Por que o Brasil precisa de uma TV pública?
EUGÊNIO BUCCI – O Brasil não precisa apenas de TV pública. Precisa de um sistema público não governamental de comunicação, um sistema não comercial que articule rádio, TV e internet. A TV deve ser vista como parte, mas ela não é o todo. A comunicação comercial sozinha, com suas regras próprias, não consegue suprir as demandas estruturais do espaço público democrático.
FOLHA – Quais as principais diferenças e semelhanças entre a TV Cultura e a TV Brasil?
BUCCI – A TV Cultura é uma fundação, não é uma empresa. O seu conselho não é todo nomeado pelo governo. Há membros eleitos pelo próprio conselho. Sou conselheiro e fui escolhido por votação. Tendo em vista o papel que deve caber a uma emissora pública, o formato de fundação parece, para mim, bem mais adequado do que o formato de empresa pública, que acabou prevalecendo no caso da TV Brasil. A fundação, nos moldes da TV Cultura, está mais vocacionada para a independência. É justamente a margem maior de independência que explica a tradição positiva da TV Cultura.
Entre todas as emissoras públicas do Brasil, são dela os melhores programas. Se há ilhas de qualidade na TV pública do nosso país, quase todas estão na TV Cultura. Aí, a qualidade não vem meramente do dinheiro investido. Vem das garantias formais e institucionais de independência frente aos governos. Nesse ponto, embora ainda seja vulnerável às pressões do governo, a TV Cultura é a melhor instituição do Brasil.
FOLHA – A presidência da República tem forte presença na estrutura da nova emissora. Como garantir que não sofrerá ingerência nem será instrumento de propaganda?
BUCCI – A ingerência do governo não é um risco novo, mas um mal antigo, uma deformação tradicional. O debate que agora vem se alastrando é muito bom e pode ajudar o país a superar o mal antigo. Existe risco de a TV Brasil virar mais uma ferramenta de marketing político na mão dos sucessivos governos? É claro que existe. Mas, agora, a sociedade despertou para o problema. A fiscalização será intensa. E isso é o que fará com que o caráter público prevaleça sobre o caráter governamental.
FOLHA – Não teria sido melhor para o país que a TV pública e o novo marco regulatório viessem no mesmo pacote, por lei votada e aprovada no Congresso em vez de uma MP?
BUCCI – Não tenho dúvidas: a adoção de novos marcos regulatórios tende a redefinir os espaços tanto das emissoras públicas quanto das emissoras comerciais. Mas não vejo um golpe de esperteza na iniciativa do governo. Não sei se já deixei isso claro, mas insisto no ponto: o simples fato de a Radiobrás e a TVE se dissolverem numa nova instituição, que seja mais moderna, mais transparente e portanto mais controlável pela sociedade já constitui um avanço.
Agora, a sociedade precisa estar atenta para que a gestão e a proposta editorial da nova empresa sejam subordinadas a critérios profissionais e públicos. Se ela enveredar pelo partidarismo e pelo governismo, ainda que veladamente, viveremos um desastre moral.
FOLHA – No Brasil, as TVs públicas também sofrem com a crise de audiência. Como superá-la?
BUCCI – É evidente que gerar boa audiência é dever de qualquer emissora, inclusive as públicas. Mas, por não ser comercial, a TV pública pode se permitir correr riscos estéticos.
É o preço que paga pela inovação, e às vezes esse risco pode acarretar perda de audiência.
Isso não tem nada a ver com fazer TV de segunda linha, para conquistar um traço como pico de audiência e depois pôr a culpa no telespectador, que é o que acontece com freqüência no Brasil. A programação das televisões públicas brasileiras, infelizmente, ainda é, na média, de péssima qualidade, o que nos leva a uma triste inversão, pela qual as pessoas acreditam que a emissora pública deve ter aversão a altos índices de audiência. Não.
Ter boa audiência pode ser a regra, mas não segundo a cartilha das emissoras comerciais. Para estas, quanto mais público melhor, porque o público é a mercadoria que elas vendem para o anunciante. Do ponto de vista da emissora pública, o telespectador pode ser tratado como algo distinto, inteiramente distinto. É daí que ela deve tirar seu diferencial.’
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‘TV não terá audiência e é dispensável’
‘Para Afonso Antunes da Motta, 56, o Brasil não precisa de uma nova TV pública. Ele afirma que a boa intenção do governo federal, de produzir conteúdo de qualidade, diferente das redes comerciais, vai esbarrar em dois problemas: falta de dinheiro e de audiência. ‘A audiência está com a televisão comercial. Vai poder mostrar para meia dúzia de pessoas, com todo o respeito.’ Motta é vice-presidente da RBS TV, do Canal Rural e da Agert (Associação Gaúcha de Emissoras de Rádio e Televisão). Ele aponta ainda o risco de a TV Brasil virar um instrumento do governo. Leia abaixo os principais trechos da entrevista.
FOLHA – O sr. é contra a TV pública?
MOTTA – A TV Pública é dispensável. Até porque todas as experiências que temos ai são experiências comprovadas, malfadadas. Claro que não se chega ao radicalismo de dizer ‘fecha tudo’. É um instrumento, tudo bem, mas não tem significado dentro do contexto da comunicação.
O ativismo da TV pública tem colocado que a preocupação das redes é perder verba pública. Ora, os grandes veículos de comunicação tem apenas de 3% a 5% dessa verba de governo, não tem esse significado todo que o ativismo deseja colocar. Não é por aí.
FOLHA – Um dos principais argumentos dos defensores da TV pública é que ela vai dar espaço ao que a TV comercial não mostra e tem importância cultural. Eles têm razão?
MOTTA – Não adianta, pode ter a boa intenção de mostrar, mas não vai ter audiência. Quem é que vai assistir? A audiência está com a televisão comercial. Vai poder mostrar para meia dúzia de pessoas, com todo o respeito, sem desmerecer.
FOLHA – O sr. acha que ela vai virar instrumento do governo?
MOTTA – Será que essa televisão pública, mesmo com essas limitações, vai ser pública efetivamente, não vai estar vinculada ao governo, não vai servir de instrumento? Há que se duvidar. Essa televisão pode ser utilizada para fins de valorizar ações de governo.
FOLHA – Setores do PT dizem que o orçamento é insuficiente para os desafios que a TV se coloca.
MOTTA – Tem um orçamento de R$ 350 milhões iniciais. A gente sabe que para produzir conteúdo para atingir minimamente os objetivos que estão se propondo é muito pouco. Apesar de ser bastante dinheiro, olhando em números absolutos, é insuficiente para o investimento necessário de equipamento, de tecnologia, da própria produção de conteúdo, que a gente sabe que isso é uma coisa muito cara.
FOLHA – O sr. não espera nada positivo da TV pública?
MOTTA – Acho que a TV pública poderia contribuir para a transparência dos atos públicos. Hoje há consenso em uma parte da sociedade de que uma das razões pelas quais a corrupção continua grassando é o fato de que não há transparência nesse país. E acho que a TV pública poderia ser utilizada, ao menos parte de seu conteúdo, para dar transparência à atividade pública. Essa é uma excelente idéia para conteúdo. Apesar de tudo isso, é pouco provável que a audiência saia do traço. Esse é o grande desafio.’
Denyse Godoy
Aos 40 anos, rede americana PBS tem audiência em queda e orçamento menor
‘DE NOVA YORK – A rede americana PBS (Public Broadcasting System), fundada em 1969 por uma agência ligada ao governo federal dos Estados Unidos, se aproxima dos 40 anos com a audiência em queda, o orçamento menor a cada ano e a sua programação questionada. Ela não é conhecida por defender o interesse público, por exemplo.
Muitos dos problemas estão ligados à sua estrutura. Criada com o objetivo de exibir conteúdo educativo e promover a cidadania, a PBS é uma empresa privada sem fins lucrativos, cujo controle está nas mãos das 355 emissoras que formam a rede -os diretores são eleitos entre os executivos delas. Controladas por ONGs, órgãos dos governos municipal e estadual ou entidades educacionais como escolas públicas e universidades, cada uma das emissoras tem autonomia sobre a sua programação, ou seja, não existe obrigatoriedade de transmissão simultânea de conteúdo.
Também não há uma central de produção conjunta. Com isso, apesar do maior espaço para a veiculação de quadros regionais, prejudica a criação de uma identidade e deixa a rede vulnerável às pressões políticas, o que é uma crítica constante tanto de liberais quanto de conservadores à sua programação.
Para sanar os problemas de financiamento, a PBS aumentou o tempo das inserções de propaganda e passou a aceitar merchandisings. Consultores do setor sugerem a criação de um fundo independente para financiá-la.’
TV DIGITAL
Tatiana Resende
TV por assinatura vai ter conversor digital por R$ 800
‘Os assinantes de TV paga terão que desembolsar R$ 799 para ter acesso à TV digital aberta, que começa a ser transmitida amanhã apenas na Grande São Paulo. Esse é o valor do único decodificador híbrido (ou seja, com o conversor para TV digital aberta já embutido) anunciado até agora, da Net Serviços.
A TVA vai anunciar seu novo decodificador até março, que será cedido sem custo para os assinantes que compraram por R$ 899 o aparelho lançado em junho do ano passado -já apto a receber o sinal digital e em alta definição da TV paga (disponível em apenas um canal), mas não da TV aberta. Para os outros assinantes, o gasto vai variar com o pacote e o tempo em que é cliente da empresa, mas o preço não foi informado. A Sky afirmou que vai lançar o novo equipamento ao longo de 2008.
Com 46% do mercado de TV por assinatura, a Net aposta na fidelização do cliente com o lançamento do novo decodificador. O preço se refere ao valor de adesão, pois o aparelho será cedido em comodato -logo, terá que ser devolvido se o assinante cancelar a TV paga.
Segundo Márcio Carvalho, diretor de produtos e serviços da empresa, o aparelho já tem um software que dispensa a troca quando a interatividade plena (envio de dados do telespectador para a emissora) estiver disponível.
O programa foi desenvolvido fora do Brasil e é equivalente ao nacional Ginga, que vai permitir essa interatividade na TV aberta, mas que ainda não está sendo produzido comercialmente. Por isso, os conversores que estão chegando ao varejo terão que ser trocados porque não será possível adaptá-los.
O conversor mais barato, para a TV digital aberta, disponível no mercado para TVs de LCD e plasma de alta definição (1.080 linhas) custa R$ 700, ou seja, R$ 100 a menos do que o novo decodificador da Net.
Questionado sobre o subsídio da empresa ao aparelho, Carvalho disse apenas que ‘a Net também está fazendo um investimento’, assim como o cliente, mas não revelou o valor, que deve ser bem alto para tornar o assinante fiel.
O produto foi fabricado pela Cisco Systems no México e entregue nos Estados Unidos, cabendo à TV por assinatura a importação, de acordo com Carvalho, o que livraria os decodificadores das suspeitas de importação irregular na investigação da Polícia Federal .
Atualmente, a Net, assim como outras TVs por assinatura, já têm transmissão digital, mas não em alta definição, o que só será possível com o novo decodificador. Vale lembrar, no entanto, que há pouco conteúdo sendo produzido em alta definição nas emissoras de TV aberta e por assinatura no Brasil, logo não haverá diferença na maior parte do tempo.
A aquisição do aparelho não é recomendada para quem TVs de tubo (480 linhas) porque a imagem exibida já é a melhor possível com essa televisão. Para quem possui TVs de plasma ou LCD, é preciso ter pacotes a partir de R$ 119,90, nos quais o assinante já tem a chamada Net Digital e, agora, vai poder ter também a alta definição.
O cronograma da troca seguirá o da transmissão da TV digital aberta, com previsão de chegada ao Rio de Janeiro em abril ou maio e, em todas as cidades brasileiras, até 2013.
O aparelho pode ser solicitado a partir de hoje na Grande São Paulo, mas a instalação só começa em duas semanas, assim como a transmissão do canal da Globosat com toda a programação em alta definição, que será uma miscelânea de programas de outros canais transmitidos ainda em definição padrão.’
Humberto Medina
Ministro pede ‘boa vontade’ com início das transmissões
‘As transmissões de TV digital começam amanhã em São Paulo, e o ministro das Comunicações, Hélio Costa, pede ‘boa vontade’ com o novo sistema, ainda sem interatividade e inacessível à grande parte da população por conta do alto preço dos aparelhos conversores. ‘Tem que ter um pouquinho de boa vontade com o processo. O importante é começar’, disse o ministro. Só receberá os sinais digitais quem tiver antena UHF e adquirir um conversor.
Na avaliação de Costa, o preço do conversor deve começar a diminuir a partir de março do ano que vem, quando Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília também começam a receber as transmissões digitais. ‘Aí o mercado potencial sai de aproximadamente 10 milhões de consumidores para algo como 30 milhões e a indústria passa a ter escala’, disse Costa.
Além do aumento da escala de produção, outros fatores podem influenciar no preço do conversor e, conseqüentemente, no sucesso da implantação da TV digital no Brasil. O governo deverá lançar um programa de incentivos fiscais para a indústria, para tentar reduzir o preço (que hoje está entre R$ 499 e R$ 1.099) para valores médios próximos a R$ 250.
A idéia do governo é replicar para o conversor da TV digital os incentivos dados à produção de computadores pessoais populares (programa ‘Computador para Todos’, do governo federal). Para produzir computadores populares (que custam até R$ 1.800), a indústria tem isenção de PIS/Cofins e as redes varejistas contam com crédito do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para fazer financiamentos ao consumidor.
‘Alguma coisa tem que ser feita para reduzir o preço do conversor. Há boa vontade do governo’, disse Costa. Segundo o ministro, a decisão de lançar um programa de incentivos fiscais para a indústria e financiamento para o varejo depende de decisão do presidente.
O ministro rebateu as críticas sobre a falta de interatividade. ‘O conversor mais barato, de R$ 499, já sai com o Ginga [software que permite interatividade]’, disse. De acordo com Costa, caberá agora ao mercado prover as ferramentas para tornar a interatividade possível. ‘Não é função do governo. O governo deu os caminhos’, afirmou ele.
Transmissões
Amanhã, a maior parte dos programas será exibida em SD (‘standard definition’, que significa definição padrão, melhor que a atual, mas inferior à alta definição (HD, ‘high definition’ ou ‘full HD’). O formato HD é melhor que o de DVD, e é possível perceber bastante diferença em relação ao formato analógico até em TVs de tubo. O full HD só poderá ser assistido em TVs de alta resolução, que custam mais de R$ 3.000.’
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Copyright O Estado de S. Paulo, 1°/12/07
TV PÚBLICA
Wilson Tosta
Governo intervém na TV Educativa e demite diretores
‘A dois dias da estréia da TV Brasil, nova emissora pública de televisão, o governo federal interveio ontem na Associação de Comunicação Educativa Roquette Pinto (Acerp), gestora da TV Educativa, demitindo diretores e mudando rumos da instituição. Em reunião de mais de seis horas, o conselho de administração da empresa, controlado pelo Palácio do Planalto, decidiu substituir Beth Carmona pelo jornalista Arnaldo César na presidência da Acerp. Segundo informou ontem o Estado, Beth encaminhara ao órgão carta dizendo-se sem condições de ficar, devido à ‘dualidade de comando’ na TVE, com diretores da nova estatal dando ordens à sua revelia. A presidente da TV Brasil, Tereza Cruvinel, porém, contestou a afirmação.
‘Fizemos sucessivas tentativas de harmonização da Empresa Brasil de Comunicação (EBC, a estatal que controla a TV Brasil) com a diretoria da Acerp’, disse ela ao Estado. ‘Todas foram infrutíferas, porque a Acerp continuou detendo o controle da TVE. A Acerp estava exercendo um comando que é de outra instituição, a EBC. Falou-se em duplo comando, porque o comando não foi entregue pela Acerp. Gostaria que tivesse havido harmonização.’ Tereza lembrou que a Medida Provisória 398, que criou a EBC, estabeleceu que os canais de televisão da União passam a ser explorados pela nova empresa. ‘Na medida em que a exploração do canal é da EBC por força da MP, o comando da Acerp deveria ter sido transmitido à EBC’, argumentou.
A presidente da EBC afirmou respeitar profissionalmente Beth e Rosa Crescente, também demitida ontem, do cargo de diretora-geral de televisão, e lamentou não ter conseguido ‘uma composição’. ‘Gostaria que fossem integradas ao projeto da TV Brasil, sob direção da EBC. Não houve entendimento.’ Teresa ressaltou que a EBC ‘precisa ter o controle dos quatro canais’, referindo-se às emissoras do Rio, de São Paulo, de Brasília e do Maranhão e declarou que a resistência da antiga direção da Acerp gerou ‘uma situação de ambigüidade que dificultava o trabalho e criava desconforto interno’ na TVE. O Estado também procurou o ministro da Comunicação Social, Franklin Martins, para comentar a crise na Acerp. Sua assessoria informou que o ministro não daria entrevista, por considerar que o assunto deve ser tratado pela EBC.
MUDANÇAS
Na reunião, o conselho de administração também nomeou Antonio Crescenti Júnior para a Diretoria de Tecnologia, que estava vaga. O jornalista Walter Clemente ocupará uma vaga no conselho. Os conselheiros discutiram como harmonizar a Acerp com as novas funções estabelecidas pela medida provisória, a qual determina que a EBC assuma a produção a ser exibida nos canais da União. A Acerp ficará com a função de formar mão-de-obra para as TVs públicas, focada na nova tecnologia da TV digital, que começa oficialmente no Brasil amanhã. Foram formados dois grupos de trabalho – um para preparar um novo estatuto e outro para fazer um novo contrato de gestão com a União, pois o atual expira no próximo dia 10.’
TV DIGITAL
Keila Jimenez
‘Fomos boicotados’
‘Horas antes do lançamento da TV digital, a Gazeta resolveu armar o maior barraco. A emissora enviou um manifesto ao presidente Lula e a outras autoridades ligadas ao setor alegando ter sido boicotada pelas emissoras no pool que marcará o início das transmissões digitais em São Paulo, amanhã.
No manifesto, a Gazeta diz não ter sido convidada para integrar o pool e fala que, mesmo procurando por conta própria os responsáveis pelo evento, foi completamente ignorada.
A emissora acredita que o boicote tenha ligação com o fato de ser o único canal a ter optado por equipamentos de transmissão de um fabricante nacional.
O Fórum de TV digital, que reúne as maiores emissoras do País, desmente a emissora. Garante que a Gazeta foi convidada a participar do pool, e acabou pulando fora depois que calculou o gasto que isso implicaria, uma vez que além da cerimônia de lançamento, as emissoras bancaram em parceria toda a campanha publicitária da chegada da TV digital.
Outra alegação é que a Gazeta não tinha equipamento para a transmissão até dias atrás e agora resolveu criar caso.’