No início de maio, o Instituto Teotônio Vilela, do PSDB, publicou artigo em defesa da imprensa independente. Começava assim:
“A parcela governista da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga as relações de Carlinhos Cachoeira com o submundo da política elegeu seu primeiro e favorito alvo: a imprensa. A estratégia equivale a culpar o mensageiro pelo conteúdo indigesto da notícia. É a velha obsessão do PT por calar seus críticos.”
Na segunda-feira (4/6), o governador peessedebista de Goiás, Marconi Perillo, protocolou interpelação judicial na 3ª Vara Cível do estado contra a jornalista Fabiana Pulcinelli, do jornal O Popular, por artigos publicados na coluna de opinião “A Cena Política” em 14 e 21 de maio. Entre outros pontos, questiona informações sobre a venda de uma casa sua ao bicheiro Cachoeira.
O governador se iguala, assim, ao que fazem os presidentes da Venezuela, Hugo Chávez, do Equador, Rafael Correa, e da Argentina, Cristina Kirchner: tenta usar instrumentos jurídicos para calar jornalistas. É o que o PSDB acusa o PT de fazer. Como diz o provérbio ugandense: “O macaco que vai atrás ri do rabo do macaco que vai na frente”.
Calar opinião
A repórter Fabiana Pulcinelli disse ao Observatório da Imprensa que se trata de uma tentativa de intimidação. “Ele está questionando uma análise, uma coluna de opinião. E ele não interpelou nenhum jornalista de fora [de Goiás], de algum grande jornal. Coincidentemente, um dia depois da publicação da minha coluna saiu uma coluna falando da casa de uma forma muito mais direta, muito mais forte do que os meus artigos, que não fazem acusações”, afirmou.
Sob o título “O Clube do Nextel”, Merval Pereira escreveu no Globo (15/5):
“Até aqui, o governo de Goiás, do tucano Marconi Perillo, foi aquele sobre o qual a organização criminosa mais ampliou seus tentáculos, podendo-se falar mesmo, segundo a Polícia Federal, de um ‘esquema paralelo’: até o corregedor da Secretaria de Segurança Pública era do esquema.
“A organização tinha ‘cota’ de indicações políticas no governo. O governador Marconi Perillo, citado 237 vezes em conversas, teve encontros diretos com Cachoeira, tratava-o amistosamente e vendeu sua casa para o próprio, recebendo cheques assinados por Leonardo Ramos, sobrinho do capo”.
Segundo Pulcinelli, têm sido frequentes em Goiás, devido à cobertura do caso Cachoeira, as tentativas de intimidação. “Eles estão inclusive ameaçando convocar jornalistas para depor em CPI na Assembleia”, contou a repórter.
Os atritos, inexistentes num passado em que toda a mídia goiana era mais ou menos governista, cresceram durante a cobertura da “operação Monte Carlo” da Polícia Federal. Marconi Perillo publicou notas criticando a cobertura feita pela TV Anhanguera e pelo O Popular, ambos pertencentes à Organização Jaime Câmara. A TV Anhanguera é afiliada da Rede Globo.
A editora-chefe de O Popular, Cileide Alves, ouvida pelo Observatório da Imprensa, também insistiu na tecla de que a investida do governador se dá em função de uma opinião. Fez uma analogia: “Eu digo que acho sua camisa horrorosa e você responde que vai me processar porque eu acho sua camisa horrorosa. Você quer mudar minha opinião? Quer que eu ache que sua camisa é bonita? O mais grave é isso. Trata-se de uma opinião, não de uma informação”.
O Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de Goiás lançou nota em que “alerta a sociedade goiana para uma ameaça real à democracia: a intimidação a jornalistas”. A íntegra da nota pode ser lida aqui.
Afinidades domiciliares
No episódio da venda da casa de Marconi Perillo a Carlos Augusto Ramos, muito se fala da modalidade da venda, da suposta (i)licitude do negócio, tudo muito confuso e de molde a excitar a suspicácia.
Mas até agora não se tratou de algo relevante: por que o bicheiro quis morar numa casa que foi do governador, entre tantas mansões para escolher em Goiânia? E por que o governador nem imaginou que essa transação poderia causar prejuízos a sua imagem?
Cartas para a redação.