Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Mero marketing

A polêmica artificialmente construída em torno do filme A Paixão de Cristo, com inegável cumplicidade da imprensa, é mera estratégia de marketing, criada especificamente para alavancar o desempenho comercial da obra nas bilheterias do mundo. Na realidade o filme, a partir de uma análise histórica, não diz nada que já não tenha sido dito sobre o assunto. É inegável que a comunidade judaica de Jerusalém teve participação efetiva na condenação e morte de Cristo, mas daí a condenar o povo judeu por toda a eternidade é algo absolutamente inconcebível. É tão impertinente quanto seria, contemporaneamente, condenar o povo alemão pelo Holocausto, o povo espanhol pela extinção das civilizações pré-colombianas, o povo português pelas barbaridades da inquisição etc.

Júlio Ferreira, Recife

Resta uma dúvida

Só nos resta saber se Mel Gibson vai realmente fazer o que ordena Deus-Filho Jesus Cristo: vender tudo o que tem (e o que faturar) e dar aos pobres. Isso nenhum católico conservador faz, os tempos são outros… PS: Sou católico!

Warner Burchauser, consultor, Campinas, SP

Só uma revisãozinha

Caro Sr. Mauro Malin, não quero transformar isso num ‘bate aqui-toma lá’ infindável, uma vez que, me parece, nossas opiniões são antagônicas e eu não tentarei convencê-lo de nada e tampouco o senhor a mim. Mas preciso solicitar uma réplica a sua resposta, até em função de ter esperado algo mais consistente em relação à existência de Jesus Cristo em sua análise de meu comentário. A minha colocação é anterior a isso que está sendo discutido na mídia, sobre o tal filme de Mel Gibson. A minha discussão é sobre a existência desse mito e se é relevante gastarmos tanta energia com uma mentira. Se é preciso padres, rabinos, pastores e ativistas de direita (como a TFP) terem espaço na mídia para discutir aquilo que já sabemos que pensam.

Na minha opinião o ‘Cristo de Mel’, como está sendo chamado, é uma obra do cinema e deve ser analisada sob a ótica cinematográfica, se o filme é bom ou ruim, desse ponto de vista. Abordando dessa forma, alguém colocaria objeções se o Cavalo de Tróia fosse pintado de amarelo em algum filme, se Homero tivesse escrito que era azul? Abrir-se-ia algum debate mundial, se Buda tivesse 100 ou 200 kg e alguém dissesse que não, que ele era adepto de uma dieta de baixas calorias? Hórus, o deus dos egípcios, teria cara de cachorro ou de chacal? Os duendes dos celtas são realmente verdes? E se fosse feito um filme mostrando que teriam o aspecto dos hobbits de Tolkien? Mudaria alguma coisa no cenário mundial de mitos, contos, lendas e assombrações?

Não importa, e isso deve ser deixado claro, se foram os judeus, os romanos ou alguma bruxa encantada que matou o tal Cristo naquela lenda. Alguém disse que teria sido ‘encomendado’ em Bangu 1. Para quem acredita, isso não faz a menor diferença. O que importa é, me parece, que a igreja e seus subordinados precisam dessas polêmicas para manter-se vivos e perpetuarem suas mentiras. Mesmo nas contradições.

Preciso também dizer que não estou tentando fazer uma evangelização contra os evangelhos e contra as crenças em mitos, de uma maneira geral. Como me referi anteriormente, cada um acredita naquilo que quiser e que se assuma isso como sua missão de vida, se isso cabe. O que queria chamar a atenção é para um relevante fato histórico que, penso, se fosse mais bem-elucidado por pessoas qualificadas (eu não me incluo nisso, sou apenas um curioso), poderíamos entrar em outra era, a era do conhecimento pleno.

Perdoe-me, mas não estou falando de eventos que ocorreram ao longo da história, que motivaram guerras, revoluções, golpes e acontecimentos políticos desde que o homem passou a registrá-los à posteridade. Até porque, usando uma velha máxima, a história é contada pela ótica dos vencedores. Estou falando de uma construção de sociedade, de interesses, de linhas de pensamento e, se fossem postas às dúvidas, algumas situações ‘poderiam’ ser revertidas. Estou falando em quebrar essa cadeia de situações construídas há dois mil anos (se for esse realmente o tempo) e que levaram a um monopólio de pensamentos, atos e atitudes, engendrando uma filosofia elaborada por religiosos decadentes e que precisavam de um novo mito para continuar conservando o homem no mundo das trevas e, com isso, mantendo seu controle.

Enquanto se puderam fabricar falsificações para atestar as rentáveis mentiras, foi possível esconder o engodo durante séculos. Em nossa época, em plena era da informação, do conhecimento, isso não é mais possível. Só peço uma revisãozinha. Umazinha. Um ou dois arqueólogos, algum cientista do ramo, metidos nos arquivos do Vaticano e nos monumentos de Jerusalém. Quero uma nova era sem mentiras. Será que é pedir muito? O resto é lenda.

Alexandre Carlos Aguiar, biólogo, Florianópolis