O Ministério Público Federal em Sergipe (MPF/SE) acaba de conseguir uma importante vitória em favor da cidadania. A TV Atalaia (Record) assinou um acordo na 3ª Vara da Justiça Federal comprometendo-se, entre outras ações, a veicular – nos intervalos do programa policial Tolerância Zero, no final da manhã, e do Jornal do Estado, telejornal noturno da emissora – inserções de 30 segundos com vinhetas temáticas sobre direitos humanos.
O acordo é fruto de uma ação civil pública movida contra a TV Atalaia – canal 8 – por veicular cenas e divulgar expressões agressivas à dignidade das pessoas no programa Tolerância Zero, apresentado pelo radialista e policial civil Otoniel Rodrigues Amado, mais conhecido como ‘Bareta’. A ação também foi movida contra o próprio apresentador, o estado de Sergipe e a União Federal. Na tarde de ontem, em audiência, foi fechado um acordo proposto pela emissora e acatados pelas partes.
A TV se comprometeu a veicular, diariamente, as vinhetas de 30 segundos por um período de seis meses durante os intervalos dos dois programas. Os temas das inserções serão definidos pelo Ministério Público Federal, mas vão abordar os direitos humanos, tortura, combate à corrupção, lisura eleitoral e o papel do Ministério Público, entre outros. O descumprimento do acordo, por parte da emissora, importa em multa de R$ 25 mil que será revertida para o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos.
Palavrões e gestos ofensivos
O procurador da República Paulo Gustavo Guedes Fontes, que atua na questão, disse que o acordo ficou bastante razoável. ‘Foi um trabalho árduo do MPF/SE, especialmente dos nossos servidores, em defesa da cidadania. É importante registrar o compromisso público do juiz federal Edmilson da Silva Pimenta, do representante da União e do estado de Sergipe, além do interesse da emissora em resolver a questão’, avaliou o procurador.
Ainda pelo acordo, a emissora fica proibida de exibir imagens de presos, notadamente se houver recusa, e nem suas fotos, buscando sempre o respeito à dignidade das pessoas. A TV também deve se restringir aos fatos ocorridos, abstendo-se de realizar conjecturas e suposições sobre os fatos e as pessoas envolvidas, muito menos externar juízo de valor sobre presos. Ficou a emissora proibida ainda de usar trucagem e animações, e o emprego de tom jocoso ou de ridicularização contra os entrevistados.
Diretamente ao apresentador, ficou acordado que ele não pode proferir qualquer tipo de injúria direta contra os presos; não incentivar ou fazer alusão que possa fomentar a prática de infrações penais, tais como tortura, abuso de autoridade, mesmo que de forma implícita; não incitar a desobediência às leis ou decisões judiciais. A própria emissora garante no acordo a proibição em seu programa do uso de palavras de baixo calão, palavrões, gestos ofensivos ou ainda insinuativos de violência policial ou contra presos.
Imagens chocantes
A emissora ainda se comprometeu em abster-se de veicular propaganda de bebida alcoólica e fumo, além de não utilizar na propaganda de bebidas recursos gráficos e audiovisuais pertencentes ao universo infantil. O juiz Edmilson Pimenta, na audiência, disse que louvava o acordo firmado num tema de relevante interesse público, sem desprezar o dever de informar da imprensa e o direito da coletividade em ser devidamente informada, tudo isso sem prejuízo da vigilância e do dever do Ministério Público, como fiscal da lei, em fazer cumprir a Constituição Federal e as leis vigentes no país.
O procurador da República Paulo Fontes disse que, desde 2003, o MPF/SE vem acompanhando o programa televisivo de jornalismo policial, que é veiculado diariamente entre as 12 e 14 horas. ‘Pelo horário, é assistido por crianças e adolescentes. O seu conteúdo é inadequado a esse público. Exibe, muitas vezes, cenas chocantes de cadáveres e lesões corporais, além de propagandas de bebidas alcoólicas’, disse o procurador.
‘O programa tem forte apelo sensacionalista e se vislumbram graves violações à ordem jurídica, como ofensas aos direitos dos presos, veiculação indevida de sua imagem, o princípio da presunção de inocência, incentivo à prática da violência policial e da tortura, veiculação de palavras de baixo calão e imagens chocantes, nocivas à formação de crianças e adolescentes, entre outras’, completa Paulo Fontes.
Desde a notícia do ingresso da ação civil pública contra a emissora e o programa Tolerância Zero, os dirigentes da TV Atalaia informaram que tinham sido realizadas alterações na produção do programa para ajudar o que determina a legislação. O Ministério Público Federal vai continuar acompanhando.
******
Da Assessoria de Comunicação da Procuradoria da República em Sergipe (ascom@prse.mpf.gov.br)