Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Nelson Gobbi

‘A guerra das cervejas teve ontem mais dois rounds espetaculares. Enquanto o sambista Zeca Pagodinho reunia a imprensa para dar sua versão sobre a polêmica campanha publicitária da Brahma estrelada por ele, a 27ª Vara do Fórum Central de São Paulo concedia liminar ao Grupo Schincariol proibindo a veiculação do comercial da marca rival, sob pena de multa de R$ 500 mil por dia. A liminar é valida até setembro, quando termina o contrato de Zeca com a cervejaria de Itu.

Imediatamente, a Ambev retirou do ar a peça em que o sambista tratava a Schin como ‘um amor de verão’. Em seu lugar, passou a veicular depoimentos de consumidores favoráveis à atitude do cantor, mantendo, no entanto, o tema da campanha, um samba assinado pelo publicitário Nizan Guanaes, da agência Africa, responsável pela marca.

Durante a entrevista, no Hotel Intercontinetal, em São Conrado, Zeca não revelou quanto recebeu para trocar a Schin pela Brahma.

– O que me foi proposto verbalmente foi experimentar uma cerveja. O anúncio é bem claro, o comercial é óbvio, não tem como questionar nada, em momento algum eu digo ‘eu bebo Schincariol’. Todo mundo que me conhece sabe que eu só bebo Brahma – alegou o cantor, referindo-se à campanha da Nova Schin intitulada Experimenta, veiculada no segundo semestre do ano passado.

Zeca afirmou que não havia lido o contrato que assinou com a agência de publicidade Fischer América, dona da conta da Schincariol, até um show realizado em fevereiro, quando teve de recomendar a cerveja de Itu em público, após brincar no palco que iria tomar uma Brahma.

– Eu venho de um lugar onde a palavra de um homem vale mais que qualquer contrato. No início era só para experimentar, logo após começaram a vir as cobranças. Não podia nem ir onde tivesse uma barraca da Brahma. Esse Fischer (Eduardo Fischer, da agência Fischer América) disse para mim: ‘Pode ir lá tomar sua Brahma. Só evita, pra não pegar mal’.

O sambista rebateu as críticas de Fischer na campanha iniciada pela Schin esta semana, em que um cartaz na parede do bar traz a inscrição ‘Prato do dia: traíra’.

– Quem eu traí? Eu experimentei, em momento algum eu digo que a minha cerveja agora é essa. Isso era um papo nosso, que eu acreditava estar valendo. Quando li o contrato, vi que estava amarrado. O verdadeiro traíra nessa história é o Fischer, ele já tem mesmo aquela cara de peixe – ironizou.

Quanto ao cachê, o sambista limitou-se a dizer que a Brahma se comprometeu com um patrocínio mensal de R$ 10 mil à Escolinha de Música Mata Virgem, que Zeca mantém em Xerém, Baixada Fluminense, e atende a cerca de 290 crianças. O patrocínio é válido pelo tempo que durar o contrato dele com a marca, cuja vigência não foi divulgada. Zeca assegurou ainda só ter experimentado a Schin durante as gravações do comercial e lembrou que, nos ensaios, bebia a cerveja rival. A cervejaria de Itu rebateu a informação, enquanto Fischer não quis comentar as declarações do cantor.’



Gilberto Scofield Jr.

‘Polêmica sobre campanha racha publicitários’, copyright O Globo, 21/03/04

‘Na quarta-feira da semana passada, cerca de 40 publicitários pesos-pesados se reuniram na sede da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap), em São Paulo, para discutir assuntos rotineiros, como elevação de impostos e previsões de aumento do bolo publicitário no ano. Não conseguiram. O que deu o tom dos debates foi a estratégia usada por Nizan Guanaes, sócio da agência Africa, para tirar o cantor Zeca Pagodinho da campanha da Nova Schin, criada por Eduardo Fischer, da FischerAmérica, através de um rompimento de contrato.

Desde o dia 12, quando Zeca entrou no ar cantando o abandono da Nova Schin (um amor de verão) pela Brahma (seu verdadeiro amor), a polêmica se instalou no setor.

Publicitários vêem danos às técnicas do mercado

O assunto mobilizou não só publicitários, mas consumidores, dividindo opiniões. Houve quem visse na estratégia uma forma antiética de agir, maculando a imagem da publicidade e associando-a a uma espécie de vale-tudo, desde que paguem mais. Houve quem achasse todo o barulho resultado de uma estratégia eficiente do ponto de vista publicitário – o fazer-se notar. Para se ter uma idéia da polêmica, a pesquisa de opinião do site Globo Online na internet rendeu, até sexta-feira, 8.200 acessos, quando a média para pesquisas semelhantes costuma ser de 3.000.

– Já há quem chame o tema de o 11 de setembro do setor – diz o publicitário Armando Strozemberg, da Contemporânea. – Como publicitário, acho que a estratégia traz uma imagem negativa à publicidade, reforçando estereótipos que se julgavam enterrados, como o vale-tudo por dinheiro no setor.

Roberto Duailibi, da DPZ, diz que a campanha é de gosto duvidoso e observa que pelo menos uma prática saiu arranhada do episódio: a campanha testemunhal, ou seja, quando uma celebridade dá seu testemunho de aprovação de um produto ou de uma marca:

– Acredito que os anunciantes vão pensar duas vezes antes de associar seus produtos a uma personalidade, já que ficou fácil quebrar um contrato.

O presidente da VS Rio, Valdir Siqueira, concorda:

– É claro que os consumidores sabem que aquela pessoa que está no comercial está recebendo um cachê, mas eles esperam que haja um mínimo de verdade no depoimento. Se as pessoas percebem que a opinião do garoto-propaganda muda de acordo com o valor do cachê, isso é prejudicial – disse.

‘É o caso Lurian da publicidade brasileira’

Luis Lara, da agência Lew Lara, vai além:

– O que houve foi o roubo de uma estratégia alheia para desconstruir a imagem do concorrente. A atitude compromete a publicidade como importante instrumento de construção de uma marca.

Luis Grottera, da agência TBWA/BR, faz coro e associa a prática às táticas da propaganda política, com prejuízo para a publicidade comercial.

– O episódio é um momento triste para a propaganda e rompe definitivamente a ética que norteia a publicidade dos golpes baixos que se pode ver na propaganda política – diz Grottera. – Esse é o caso Lurian da publicidade brasileira – diz Luis Lara.

Eduardo Fischer, sócio da FischerAmérica, não contém a indignação:

– Foi um roubo de idéia, um rompimento de contrato, um ato antiético, tudo que mancha a publicidade.

Dalton Pastore, presidente da Abap, adota um tom mais moderado. Ele lamenta que a peça da Africa tenha posto em dúvida valores da publicidade e disse que, internamente, a Abap está tomando as providências necessárias para evitar que o episódio se repita.

Nizan Guanaes, da Africa, diz que há muito barulho sobre o tema, mas poucos sabem o que há por trás da decisão de Zeca Pagodinho de abrir mão da Nova Schin pela Brahma.

– Ninguém perguntou ao Zeca por que ele fez isso – diz o publicitário.

‘Em pouco tempo as pessoas terão esquecido o assunto’

Bia Aydar, sócia de Guanaes na MPM, diz que o comercial é um sucesso, criativo e cumpre seu objetivo de vender:

– A campanha é sucesso e isso incomoda – diz ela.

Paulo André Bione, diretor do grupo Talent e coordenador do Miami Ad School e da Escola Superior de Propaganda e Marketing, também não vê maiores problemas no episódio:

– A campanha não tem o poder de destruir a imagem da publicidade. Em pouco tempo, terão todos esquecido o assunto. E, numa guerra como a do setor de cerveja, a estratégia é válida – diz Bione.

O cantor Zeca Pagodinho, pivô da discussão, diz que não feriu a ética da publicidade.

– Sempre fiz propaganda da Brahma de graça e todo mundo sabe disso. A diferença é que agora sou pago para fazer isso. E não me sinto também um garoto-propaganda da Brahma, assim como não fui garoto-propaganda da Schin. Apenas fui pago pelas empresas para falar das cervejas. No caso da Schin, meu trabalho era apenas experimentar. Foi o que fiz – disse o cantor.

Num setor como o mercado publicitário, onde a mudança de uma conta de uma agência para outra traz tantas mágoas e rancores, pode-se imaginar que a polêmica está apenas começando. (*) Colaboraram Erica Ribeiro e Martha Beck’

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‘‘Há um exagero em torno do assunto’’, copyright O Globo, 21/03/04

‘Nizan Guanaes, sócio da Africa, nega que sua estratégia de levar Zeca Pagodinho para a Brahma seja antiética e diz que as pessoas falam sobre o assunto sem conhecer o que há por trás do episódio. Ele diz que não tem a pretensão de achar que atingiu a imagem da publicidade no país.

O episódio envolvendo o cantor Zeca Pagodinho e as cervejas Nova Schin e Brahma afeta, de alguma forma, a imagem da publicidade no Brasil?

NIZAN GUANAES: Seria pretensão minha achar que um episódio como esse tem a força para atingir a imagem da publicidade no Brasil. Há um exagero enorme em torno desse assunto.

Mas há quem diga que o episódio foi antiético e fere a imagem do setor.

GUANAES: Antiético é as pessoas fazerem um julgamento de valor desse episódio sem saber o que está por trás de todo o fato. Ninguém falou com o Zeca Pagodinho antes de qualificar a campanha como antiética. As pessoas não vão acreditar mais ou menos na publicidade por causa de um fato como esse. Alguns publicitários dizem que a estratégia da Africa compromete a técnica do testemunhal, ou seja, os anunciantes vão passar a ter medo de contratar uma celebridade e ligá-la a uma marca por causa do episódio da Nova Schin e da Brahma.

GUANAES: O testemunhal é uma das formas mais antigas de comunicação e de recomendação, que se iniciou há muito tempo nas figuras do pai e do padre. E eu não posso achar que uma campanha como a nossa vá mudar essa tradição. A Regina Duarte vai fazer uma campanha de um banco e a Gisele Bündchen continua fazendo campanha de uma loja de roupas e não há qualquer dúvida sobre o que elas dizem.

Não há problemas na campanha?

GUANAES: A campanha gerou controvérsia porque é polêmica, mas a estratégia é legítima e só quem desconhece o que há por trás do episódio pode recriminá-la.’

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‘‘E do roubo de idéia, ninguém fala?’’, copyright O Globo, 21/03/04

‘O publicitário Eduardo Fischer, sócio da Fischer Américas, diz que a estratégia usada pela Africa no caso da guerra das cervejas atinge os fundamentos do setor de publicidade e prejudica a imagem do setor. Ele condena a conduta do concorrente, que qualifica de ilegal e antiética.

O episódio envolvendo o cantor Zeca Pagodinho e as cervejas Nova Schin e Brahma afeta, de alguma forma, a imagem da publicidade no Brasil?

EDUARDO FISCHER: O Zeca Pagodinho ter rompido um contrato fechado com uma agência de publicidade é grave, mas o pior é o que está por trás disso.

Como assim?

FISCHER: A idéia de usar um cantor de pagode num comercial de cerveja foi roubada. E do roubo da idéia, ninguém fala? Se a Africa sempre soube que o Zeca bebia Brahma, por que não o convidou antes para fazer um comercial para a AmBev? Quer dizer que uma agência rouba uma idéia de comercial – o que diminui seus riscos – denigre a imagem do concorrente, rompe um contrato e isso nada significa? É claro que tudo é muito grave.

E o senhor acha que o episódio pode comprometer a imagem da publicidade no país junto ao consumidor?

FISCHER: O episódio é pontual. Não acho que esse tipo de prática ilegal e antiética vá se repetir, pois seria o fim do setor publicitário como o conhecemos. Mas acho que o setor inteiro deve tentar evitar transformar essa prática num padrão porque senão tudo vira uma bagunça.

E como se evitaria isso?

FISCHER: Pois é isso que a Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap) está discutindo, e é preciso lembrar que o Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar) ainda não julgou o mérito de nossa ação. As instituições que representam o setor precisam garantir que isso não se repita.’



José Alan Dias

‘Liminar suspende comercial da Brahma’, copyright Folha de S. Paulo, 20/03/04

‘A Schincariol obteve ontem liminar na 27ª Vara Cível de São Paulo, contra a AmBev e Zeca Pagodinho, que suspende a veiculação do comercial da Brahma protagonizado pelo cantor. Pelo despacho, fica impedido o uso da imagem do cantor associado direta ou indiretamente à marca Brahma, em qualquer meio de comunicação, enquanto vigorar o seu contrato com a Nova Schin.

De acordo com a Schincariol, o cantor mantém contrato de exclusividade até setembro. O juiz fixou em R$ 500 mil a multa diária pelo não-cumprimento, informou a empresa. A decisão é em primeira instância e cabe recurso.

Por meio de sua assessoria, a AmBev alegou que não foi notificada pela Justiça e que não faria pronunciamentos. Em tese, a liminar suspende as duas versões do comercial Brahma: a primeira, que estava no ar desde a semana passada, e a segunda, idêntica, na qual se agregam depoimentos de pessoas em apoio ao cantor.

A disputa entre a Schincariol e a AmBev começou no último dia 12, quando foi ao ar o comercial da Brahma, protagonizado por Zeca Pagodinho, então garoto-propaganda da Nova Schin.

No refrão da música cantada no filme da Brahma, Zeca ironiza sua passagem pela Nova Schin: ‘Fui provar outro sabor, eu sei. Mas não largo meu amor, voltei’.

Depois de ter indeferido o pedido de suspensão da veiculação no Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária), a Schincariol partiu para o ataque: apresentou nova campanha, com um sósia do cantor, na qual insinua que Zeca teria recebido US$ 3 milhões para trocar de opinião sobre a cerveja preferida. Além disso, anunciou que moverá ações na Justiça por perdas e danos contra a AmBev e o artista.

Conar

A Brahma e a agência de publicidade África feriram o código de conduta ética do Conar ao tirar o cantor Zeca Pagodinho da concorrente Nova Schin, segundo um membro da direção do conselho, que não quis se identificar.

Diz o artigo 6.2 do Anexo Q (sobre testemunhais, atestados e endossos) do código: ‘Anunciantes concorrentes deverão abster-se da utilização do testemunhal de uma mesma pessoa ou entidade, sempre que dela possa redundar confusão para o consumidor’. Com base no código, o Conar já pode tipificar como conduta antiética a veiculação da imagem do cantor pela Brahma.

O Conar havia indeferido, na terça, pedido da agência Fischer América, responsável pela campanha da Nova Schin, de sustação liminar do filme da Brahma. O órgão decidiu que o comercial só poderia ser suspenso após julgamento do mérito. O relator não aceitou os argumentos da Schincariol e da Fischer América de que o comercial da Brahma ultrapassou os limites estabelecidos para propaganda comparativa.

Ainda segundo o Conar, a alegação da agência e da Schincariol de que houve aliciamento do apresentador do produto (Zeca) não está prevista no código de conduta da entidade.

Pelo rito processual do Conar, uma vez formulada uma denúncia, a diretoria do órgão sorteia um relator entre seu membros do conselho de ética -o anunciante pode apresentar por escrito sua defesa. O Conar convoca, então, uma reunião, na qual as partes envolvidas podem apresentar seus argumentos. Encerrados os debates, o relator anuncia seu parecer, que é levado à votação.

A assessoria de imprensa da Africa, que pertence ao publicitário Nizan Guanaes, informou que a agência não se pronunciaria sobre o assunto. A AmBev também não fez comentários. Colaborou Fernando Mello, do Painel FC’

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‘Zeca Pagodinho afirma ter sido o traído’, copyright Folha de S. Paulo, 20/03/04

‘O músico Zeca Pagodinho afirmou ontem que não leu o contrato com a Schincariol, que teria sido, segundo ele, negociado ‘de boca’. Por isso, ele disse que ‘o traído’ na história é ele e acusou o publicitário da cervejaria, Eduardo Fischer, ‘de ser o verdadeiro traíra’, em referência ao anúncio da Schincariol em resposta ao da Brahma em que, num quadro-negro na parede de um bar, há a palavra traíra.

‘Esse Fischer disse para mim: pode ir lá tomar a sua Brahma. Não traí, experimentei. Em momento nenhum disse: essa é a minha cerveja.’

Em entrevista, Pagodinho afirmou que foi contratado pela Schincariol para experimentar a cerveja, e não para dizer que é a bebida que ele consome. Segundo Zeca, todo mundo sabe que sua cerveja é a Brahma e ele teria alertado a Schincariol que a propaganda ‘não funcionaria’.

De acordo com Pagodinho, mesmo nas filmagens do comercial da Schincariol ele bebeu Brahma. Ele apenas ‘provou’ a Schincariol na hora em que as tomadas foram para valer.

Pagodinho disse ter sido traído, pois nessa conversa com Fischer não foi estabelecido que ele não poderia aparecer tomando Brahma. ‘Eu venho de um lugar onde a palavra de um homem vale mais do que qualquer contrato. O papo era: é só para experimentar, mas logo depois começaram as cobranças. O cara [Pagodinho] não pode ir ali, não pode parar onde tem uma barraca da Brahma.’

Ainda durante a entrevista, Pagodinho compara Fischer ao peixe que o publicitário utiliza no comercial da Schincariol para insinuar a traição do músico: ‘O verdadeiro traíra nessa história é esse rapaz. Ele já tem mesmo essa cara de peixe. O retrato dele é que deveria estar no comercial.’

Por meio de sua assessoria, a Fischer América informou que o contrato em seu poder, assinado por Zeca, com firma reconhecida em cartório, há uma cláusula que o impede de falar em público sobre outra cerveja.’

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‘Schincariol vai acionar AmBev e Zeca Pagodinho judicialmente’, copyright Folha de S. Paulo, 18/03/04

‘A Schincariol anunciou ontem que moverá ações na Justiça contra a AmBev e o cantor Zeca Pagodinho. A primeira ação, contra a AmBev, seria por perdas e danos, baseada no suposto aliciamento do cantor, então garoto-propaganda da Schincariol, pela concorrente. Zeca Pagodinho teria que responder, além de perdas e danos, por quebra de contrato.

Desde a última semana, o cantor protagoniza um comercial da cerveja Brahma, uma das marcas da AmBev. Zeca fora a estrela do lançamento da Nova Schin, da Schincariol, em agosto do ano passado, que sustenta manter contrato de exclusividade com o artista até setembro próximo.

O diretor-superintendente da Schincariol, Adriano Schincariol, disse que a AmBev promoveu a veiculação da campanha com o cantor para ‘encobrir’ os problemas que estaria enfrentando desde o acordo com a Interbrew.

‘É uma cortina de fumaça para desviar a atenção do que realmente interessa. O que queríamos que aparecesse, que são as questões da CVM [Comissão de Valores Mobiliários] e do Cade [Conselho Administrativo de Defesa Econômica], acaba deixado de lado pela polêmica em torno do Zeca.’

O empresário fazia alusão à queda das ações preferenciais da AmBev, depois do anúncio do acordo, e à admissão do co-presidente do conselho de administração da AmBev, Victório de Marchi, de que houve vazamento de informações sobre a negociação.

O advogado da Schincariol, Vinícius Camargo Silva, disse que nas ações pedirá indenização baseada nas perdas que a Schincariol teve com a quebra de contrato e que o juiz estabeleça outra indenização a título de ‘correção’.

A empresa e o advogado se negaram a divulgar os valores do contrato com Zeca Pagodinho.

A Schincariol afirmou que recorrerá ao Cade contra o acordo da AmBev-Interbrew. A empresa alega que o acordo agravará a situação de virtual monopólio no mercado interno. Para a Schincariol, a AmBev poderia usar seu maior poder econômico para pressionar fornecedores, o que prejudicaria a concorrência.

Procurada pela Folha, a AmBev, por meio de sua assessoria, informou que somente comentaria questões judiciais se de fato houvesse o ingresso de uma ação.

Acerca do acordo com a Interbrew, a empresa informou que procedeu de forma ‘transparente’ e o processo tem cumprido as normas estabelecidas pela CVM.

Pelos dados da consultoria Nielsen referentes a fevereiro divulgados ontem, a Nova Schin passou de uma participação de 12,6% do mercado, em janeiro, para 13%. A Brahma recuou de 18,2% para 17,8%. A Skol (da AmBev), marca líder, tem 30,4%.’

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‘Conar nega pedido para tirar peça da Brahma do ar’, copyright Folha de S. Paulo, 17/03/04

‘Em um mesmo dia, a guerra das cervejas protagonizada pela Nova Schin e a Brahma registrou dois capítulos. O Conar (Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária) indeferiu, à tarde, o pedido da Schincariol para que fosse suspensa a veiculação de comercial da Brahma com o cantor Zeca Pagodinho, que fora a estrela do lançamento da Nova Schin.

À noite, a Schincariol apresentou nova campanha, com um sósia de Zeca Pagodinho, na qual insinua que o cantor teria recebido US$ 3 milhões para trocar de opinião sobre a cerveja preferida.

Em seu despacho, no qual manteve no ar o filme da Brahma, o Conar afirma que a letra do samba cantado por Zeca e a composição geral do comercial não feriram o código de ética do conselho e estão dentro dos limites da propaganda comparativa.

Segundo o Conar, a alegação da Fischer América e da Schincariol de que houve aliciamento do apresentador do produto (Zeca) não estaria prevista no código de conduta da entidade.

A disputa começou na sexta, quando foi ao ar o comercial da Brahma, protagonizado pelo cantor, então garoto-propaganda da Nova Schin -e cujo contrato se estenderia até setembro.

No refrão da música cantada no filme da Brahma, Zeca ironiza sua passagem pela Nova Schin: ‘Fui provar outro sabor, eu sei. Mas não largo meu amor, voltei’. Para a Schincariol, o comercial maculava a imagem da Nova Schin.

Contra-ataque

O filme da ofensiva da Schincariol veiculado ontem em horário nobre tem como cenário um bar.

Enquanto bebem cerveja, dois amigos discutem sobre a troca de cerveja. Ao fundo do cenário, um placa: ‘Prato do dia: traíra’.

Um deles pergunta ao personagem, apresentado como ‘Zequinha’, se este não trocaria de cerveja por ‘R$ 600 mil’. A oferta é recusada. O amigo indaga, então, se não o faria por ‘R$ 1 milhão’. ‘De jeito nenhum’, responde Zequinha. Nesse momento, o sósia de Zeca Pagodinho, que apenas observa a conversa, levanta-se e diz: ‘O cara é ‘firmeza’, enquanto cumprimenta o personagem.

O amigo sobe a oferta para US$ 3 milhões: ‘Por US$ 3 milhões, falo que amo e ainda dou beijo na boca’, responde Zequinha. No mercado publicitário, estima-se que o contrato do cantor com a AmBev teria sido de R$ 3 milhões.’



Sérgio Martins


"O pagodão do Pagodinho", copyright Veja, 24/03/04


"O cantor Zeca Pagodinho tornou-se protagonista de uma das brigas mais pitorescas que o mercado publicitário brasileiro já viu. Contratado em setembro de 2003 para ser garoto-propaganda da cerveja Nova Schin, da Schincariol, ele rompeu o contrato antes de seu vencimento, para estrelar o anúncio de uma marca concorrente, a Brahma – cerveja que ele afirma ser a sua preferida de verdade. Para aumentar a confusão, a Nova Schin, no comercial da Brahma, é citada indiretamente como ‘um amor de verão’ passageiro. Furiosa com a atitude de Zeca, a Schincariol revidou. Criou um novo comercial em que o cantor é chamado de ‘traíra’ (traidor) e prometeu dar entrada numa ação judicial de perdas e danos com pedido de indenização milionária. Aos 44 anos, Zeca Pagodinho é o mais bem-sucedido sambista do país, com vendagens que superam os 12 milhões de cópias de discos. O CD Acústico MTV, lançado no fim do ano passado, vendeu 400 000 unidades, o que o torna um dos grandes sucessos do mercado fonográfico nacional na atualidade. Zeca Pagodinho tem raízes em Xerém, na Baixada Fluminense, onde mantém um sítio e projetos sociais. Mas hoje ele mora numa cobertura localizada na Barra da Tijuca, que comprou toda decorada, acrescentando-lhe apenas certos toques pessoais – como uma grande estátua de São Jorge, o seu santo protetor. Nesta entrevista a VEJA, Zeca Pagodinho afirma que assinou sem ler o contrato com a Schincariol – contrato que conteria obrigações que ele nunca quis assumir.


Veja – Por que, depois de assinar um contrato publicitário com a Schincariol, o senhor mudou para a Brahma?


Zeca Pagodinho – Você fuma? Bem, eu fumo um tipo de cigarro. Se acabar o maço de cigarros e só tiver outra marca para comprar, eu não compro. É a mesma coisa com cerveja. O que aconteceu é que me pediram para experimentar uma nova marca. E eu experimentei, às custas de um trem de gente me convencendo e um garçom me dando bronca na gravação do comercial. Mas foi só isso. Eu não mudei. Em nenhum momento eu disse que passaria a beber Schin ou que era a minha cerveja favorita. E quer saber? Até naquele comercial eu bebi Brahma.


Veja – O senhor não considera errado romper um contrato dessa maneira?


Zeca Pagodinho – Olha, também me prometeram bocalmente um monte de coisas que não cumpriram. Desde o início da negociação as pessoas sabiam que eu não bebo outra cerveja que não seja Brahma. Esse menino, o (Eduardo) Fischer, o publicitário da Schin, foi na minha casa e viu que eu só bebo Brahma. Então disse, na frente da minha mulher, dos meus filhos e dos meus amigos: ‘É só você experimentar’. Palavras dele. É claro que isso não está no contrato. Mas, de onde eu venho, a palavra de um homem vale muito mais do que um papel assinado, morô? É por causa disso que eu não saio do subúrbio e do Xerém. Porque, de onde eu venho, se você disser ‘amanhã eu vou’, então amanhã você vai mesmo. Só depois vi que estava completamente amarrado com a Schin. Não era esse o combinado. Aquele menino, o Fischer, me garantiu que eu iria levar a minha vida normal depois de filmar o comercial da Schin. Mas quando eu fui ler o contrato estava escrito que eu não poderia participar de festas da Brahma ou de outra concorrente.


Veja – O senhor quer dizer que assinou o contrato sem ler?


Zeca Pagodinho – Assinei. Assinei como se você chegasse agora para mim e dissesse: ‘Zeca, vamos fazer uma parada amanhã? Só que você terá de assinar um contrato assim e assado’. Eu faria sem titubear. Porque eu venho de um lugar de homem, lugar de gente que tem palavra.


Veja – Quando o senhor começou a reparar nas restrições impostas pelo contrato?


Zeca Pagodinho – Em fevereiro eu me apresentei no Credicard Hall, em São Paulo. Eu estava rouco e doido para tomar uma Brahma. Me controlei e tomei apenas um copo de vinho. Quando vi que o show estava fluindo legal, eu disse: ‘Daqui a pouco eu vou tomar uma Brahma’. Eu queria dizer que ia tomar uma cerveja. Porque, em Xerém, Brahma é sinônimo de cerveja. Poxa, eu tinha até um tio que mandava comprar umas Brahmas da Skol, morô? Foi então que uma pessoa ligada à Schin foi ao camarim e disse que havia uma cláusula no contrato me proibindo de mencionar outras marcas de cerveja. No Carnaval eu também fui muito pressionado para ir ao camarote da Schin. Diziam que eu tinha de ir, porque estava no contrato. Aí tem a seguinte história: no documento lá, estava escrito que em qualquer aparição pública que eu fosse fazer teria um cara ao meu lado para me servir Schin. Esse cara nunca apareceu. Durante o Carnaval, eu procurei esse rapaz da meia-noite às 3 da manhã. Fiquei rodando pelo Porcão, pelos camarotes do Sambódromo atrás do cara e atravessei até o desfile de uma escola de samba – e olha que eu acho o maior desrespeito passar no meio da escola. O cara me deu a maior canseira. Eles tinham uma ratoeira armada para mim. Eu estava algemado. Não podia nem urinar outra coisa. Me senti traído.


Veja – O senhor está ciente de que quebrar um contrato acarreta conseqüências legais?


Zeca Pagodinho – Posso perder na Justiça, mas não perco na palavra.


Veja – E se o senhor tiver de pagar uma multa pesada pelo seu ato?


Zeca Pagodinho – Se tiver de pagar, a gente paga. O pessoal da Brahma garantiu que irá arcar com todas as despesas que eu tiver nesse processo.


Veja – Essa promessa da Brahma está no contrato ou foi feita apenas verbalmente?


Zeca Pagodinho – Está no contrato. E esse eu fiz questão de ler direitinho.


Veja – O senhor afirma que entrou nessa confusão toda ingenuamente?


Zeca Pagodinho – O complicado foi ter sido honesto e decente. Por isso eu me dei mal. Os caras me infernizaram dia e noite. Ligavam para a minha casa, pediam para os meus amigos para eu topar fazer o anúncio. Diziam que bastava experimentar. Os caras me encheram tanto que eu topei. Nem verifiquei preço de mercado, cobrei pouco.


Veja – A Nova Schin pagou 1 milhão de reais ao senhor. Isso é pouco?


Zeca Pagodinho – Um milhão? Então eu tenho de buscar mais uns 700 contos. Me deram uma graninha e ainda tive de pagar comissão do empresário, imposto de renda… Fiquei só com 300 000 reais.


Veja – Circula a notícia de que o senhor vai embolsar um total de 9 milhões de reais pela campanha da Brahma? É isso mesmo?


Zeca Pagodinho – Essa quantia não tem nada a ver, morô? Vou receber menos do que estão falando. Olha, dinheiro é uma praga. Eu era mais feliz quando era pobre. Acho bom pelos meus filhos, que têm oportunidade de aproveitar melhor a vida graças ao que eu ganho. Eles têm o Danoninho deles, uma escola melhor. Mas não faço as coisas por dinheiro. Quer um exemplo? Anos atrás eu fiz show para uma marca de refrigerante que também vende cerveja. Eles me pediram para eu aparecer na foto com uma cerveja deles na mão. Neguei na hora. Disse que o meu cachê era para fazer show, não propaganda de cerveja. Eles nunca mais me chamaram.


Veja – Se o senhor gosta tanto da Brahma, por que nunca havia feito comercial para essa marca?


Zeca Pagodinho – Esse rapaz, o (Eduardo) Fischer, era da Brahma. A minha gravadora vivia sugerindo que ele fizesse um comercial comigo e ele dizia que a Brahma tinha de ter uma certa postura. Como se eu fosse um vagabundo e um bebum. Aí ele foi para a Schin e está fazendo essas coisas para me atormentar.


Veja – Pediram que o senhor experimentasse a Nova Schin. O senhor experimentou e fez o sinal de positivo num comercial. Isso indica que a cerveja foi aprovada, certo? Ou isso também foi fingimento?


Zeca Pagodinho – A cerveja é até boazinha.


Veja – É verdade que a Schincariol lhe perguntou se o senhor estava negociando um contrato com a Brahma e o senhor negou?


Zeca Pagodinho – Fechei com a Brahma apenas quando eu me senti traído. Ao traidor, a traição. Por mim, eu não teria feito comercial para nenhuma das duas. Estava cheio de parar no sinal e ouvir das pessoas: ‘E aí, Zeca, mudou mesmo para a Schin?’ Dava vontade de dizer: ‘Mudei. Por quê, vai me dar o que eu ganhei para eu voltar atrás?’ Quando estou duro ninguém vem me perguntar se o IPTU está atrasado.


Veja – O que é ética para o senhor?


Zeca Pagodinho – Para mim, o que existe é a ética de Xerém. Em Xerém, eu deixo o cheque em branco com o dono do boteco e ele nunca me rouba. Em Xerém, o que eu falo vale mais do que qualquer papel escrito. Agora, a lógica do pessoal da Schin é a seguinte: eles vêm na minha casa, falam na minha cara que eu tenho apenas de experimentar a cerveja deles e depois me aparecem com um monte de coisas escritas no contrato. E, para responder ao comercial que fiz para a Brahma, eles fazem um comercial me chamando de traíra. Se for optar por essa ética e a de Xerém, eu fico com a de Xerém, que nunca me deu problema, morô?


Veja – O senhor concorda com a letra do samba da Brahma, que diz que sua experiência com a Schincariol foi um ‘amor de verão’?


Zeca Pagodinho – Sim. A letra do Nizan Guanaes era muito mais agressiva do que a que eu cantei. Pedi para mudar umas partes da letra porque não queria ofender o pessoal da Nova Schin. Quer saber? Se eu soubesse que eles iriam me chamar de traíra, como fizeram depois que a propaganda foi ao ar, deixava todos os xingamentos e ainda colocava outros da minha parte. Botava para quebrar.


Veja – O senhor nunca traiu ninguém?


Zeca Pagodinho – Fui traíra apenas comigo mesmo. Toda vez que digo que não vou mais beber cerveja ou quando prometo que não irei sair – e saio – estou traindo e prejudicando a minha pessoa.


Veja – Desde quando o senhor bebe cerveja?


Zeca Pagodinho – Desde os 16 anos. Quando eu era pequeno, meu tio pedia para comprar cerveja no boteco e deixava eu beber a espuma.


Veja – Seus filhos bebem como o senhor?


Zeca Pagodinho – Não bebem e muito menos fumam. Às vezes eu brinco como o meu menor, falo para ele dar um tapa na cerveja. Sem chance. O mais velho é a mesma coisa. Quando eu vou para Campos do Jordão, tenho de implorar para ele tomar um cálice de vinho comigo. Eles são muito estudiosos. Tiram de 8,5 para cima. E eu estou sempre cobrando um bom desempenho deles.


Veja – O senhor pretende estrelar outra campanha publicitária?


Zeca Pagodinho – Por mim, não faria. Mas eu carrego uma legião de pessoas que dependem de mim. Se ganho um, dez ou vinte, uma parte vai para as entidades que eu mantenho. Tenho uma escola de música, ajudo as pessoas, sustento a minha família. Por mim, se eu tivesse a minha cerveja gelada não ligaria para mais nada. Não sei andar de lancha nem de carrão. Para que eu correria atrás de mais dinheiro?


Veja – O senhor não acha que perdeu a credibilidade com esse episódio?


Zeca Pagodinho – Claro que não. Aquele que só lê jornal e não me conhece pode até achar que eu sou traíra. Mas eu ando no mundo. Eu não vivo de notinha de jornal e de revista. Eu sou um homem de palavra.


Veja – O senhor se encontrou recentemente com o presidente Lula. Sobre o que conversaram?


Zeca Pagodinho – Lula me convidou para ir a Brasília para vermos juntos o meu último DVD, Acústico MTV. Eu não entrei em papo de política porque não entendo nada disso. Bebemos cerveja e conversamos sobre samba e cachaça.


Veja – O senhor se encontra regularmente com o presidente?


Zeca Pagodinho – A gente não tem tempo para isso. No máximo, trocamos algumas idéias pelo telefone. Eu tenho minha vida, meus shows e meus projetos sociais para tocar. O Lula tem de governar. Ele não costuma ir aos meus shows, e acho bom para ele. Porque se virem o presidente no show vão dizer que ele deixou de governar o país para se esbaldar no pagode.


Veja – O seu voto em Lula foi convicto ou foi na base do ‘experimenta’?


Zeca Pagodinho – Sempre votei no Lula. Na minha opinião, estava mais do que na hora de o povo tomar conta do país."




Luís Nassif


"A Lei de Nizan e Fischer", copyright Folha de S. Paulo, 23/03/04


"Zeca pagodinho foi transformado no Gerson dos anos 2000. Ambos são ídolos, com toda carga de simbologia que carregam. Gerson, o grande comandante do tricampeonato, o guerreiro que venceu o estigma de amarelar; Pagodinho, a ressurreição do samba, o bom malandro que escorrega, mas sempre volta ‘para a minha patroa’.


O primeiro virou símbolo de oportunismo, o inspirador da ‘Lei de Gerson’; o segundo ameaça virar símbolo de traição. Ambos foram sacrificados no altar de uma propaganda inescrupulosa, e o que se vê agora é uma rodada de hipocrisia sem paralelo, a ponto de a própria Abap (Associação Brasileira de Agências de Propaganda) fazer um veemente protesto contra Pagodinho, acusando-o de denegrir a propaganda brasileira -como se o publicitário fosse ele, e não Nizan Guanaes (que o tirou do concorrente) nem Eduardo Fischer (que o acusou de ‘traíra’ em uma campanha nacional).


Zeca Pagodinho é uma vítima da cerveja, uma pessoa simples, com problemas de alcoolismo, que corre sérios riscos de saúde se não parar de beber. É contratado por um cachê milionário para vender uma cerveja -a Nova Schin. No mesmo período, os controladores da AmBev vendem a empresa e se tornam sócios da compradora -a Interbrew. Seu horizonte, agora, é o mundo, e seus concorrentes, a Miller e a Molsen, não uma pequena cervejaria brasileira, a Schincariol, que cresceu sob suspeita de praticar sonegação pesada. A operação levanta ruídos no mundo inteiro.


Trinta dias antes do anúncio de venda, a AmBev decide pela campanha inusitada de tirar o garoto-propaganda do concorrente. A operação é de alto risco, por expor cruamente o poder de um monopólio e por colocar em xeque, sem nenhum prurido, a imagem de um ídolo popular. E ainda atropela todo o seu planejamento de marketing -que era não permitir a comparação da Schincariol com a Brahma, mas com a Antarctica.


Deflagrada a operação, toda a celeuma relevante -da venda da AmBev- é substituída pela crucificação de Zeca Pagodinho. A agência concorrente, Fischer América, em uma campanha para o Brasil inteiro, acusa-o de ‘traíra’. Não há nenhum gesto da AmBev e de Nizan de impetrar ao menos uma liminar para proteger seu contratado. Porque o que interessava era mesmo deixar esse país de botocudos discutir a ‘traição’ do Zeca, e não o episódio da venda da AmBev, o fim do sonho da multinacional brasileira.


Não existe ‘Lei de Gerson’, assim como não existe ‘Pagodinho traíra’. Existe a ‘Lei de Nizan’, para quem não vê limites para a esperteza; e a ‘Lei de Fischer’, para quem bate no mensageiro, para não ter que enfrentar seu chefe.


Até os ídolos populares estão sendo subtraídos desse país. Aonde se irá parar nessa escalada?


Pauta fiscal


Escreve-me um distribuidor de cervejas para explicar que, nesse mercado, a sonegação pesada acontece via ‘NFs Plásticas’ -que vão e voltam com o caminhão. Na venda sem nota fiscal, o fabricante embolsa o IPI, o ICMS substituto, o PIS/ Cofins e o IR; e o distribuidor embolsa o PIS/Cofins e o IR. Com a ‘pauta fiscal’ (tributar pelo volume, não pelo valor) e com o medidor de vazão, ele considera que o quadro poderá ser eliminado."