Thursday, 14 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1314

O direito à informação pública

Em sua primeira sessão, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) adotou a resolução de que a liberdade de informação constitui o fundamento de todas as liberdades a que se dedica a ONU. De 1946 até hoje, o regime internacional de direitos humanos vem aperfeiçoando essa interpretação, a ponto de considerar a defesa e a promoção do direito à informação uma obrigação de todos os Estados. O Brasil garante o direito de acesso a informações públicas na Constituição Federal, mas não regulamentou, conforme padrões internacionais, de que modo esse direito deve ser exercido, na prática. O resultado é que órgãos governamentais não levam em conta o direito humano à informação no momento de divulgar ou classificar como sigilosa alguma documentação oficial.

No mundo, a compreensão da importância da regulamentação desse direito fez com que, nas últimas duas décadas, mais de 80 países aprovassem leis ou regulamentos nacionais de acesso a informações e dados públicos. Essas legislações se baseiam no princípio de que o Estado democrático funciona em nome de seus cidadãos. Portanto, informações e dados produzidos para a promoção do interesse público devem circular livremente.

Como oxigênio

Tais leis não passaram sem resistência nesses países, onde a mobilização foi importante para a aprovação de legislações progressistas. No Brasil, a resistência vem na forma da defesa do sigilo eterno, sob o qual documentos poderiam ter acesso restrito, por tempo indeterminado. O projeto delei de acesso à informação pública em discussão no Senado Federal, PLC 41/2010, extingue o sigilo eterno, estabelecendo o teto de 50 anos para qualquer restrição de acesso. Esse projeto foi intensivamente debatido, de forma ampla e participativa, na Câmara dos Deputados, e teve pareceres favoráveis de três comissões no Senado.

Na última comissão a apreciá-lo, os senadores Fernando Collor de Mello (PTB-AL) e José Sarney (PMDB-AP) voltaram à questão do sigilo, afirmando que a liberação de documentos diplomáticos poderia ser uma ameaça ao Brasil. O Ministério das Relações Exteriores, no entanto, contrariou essa interpretação ao anunciar que não tem documentos que possam comprometer as relações internacionais do país e, inclusive, já se prepara para se adaptar às exigências da futura lei.

Não existe fundamento para defender o sigilo eterno. Boas leis de acesso à informação oficial consideram o acesso como regra e o sigilo como exceção temporária. O PLC 41/2010 segue essa premissa e traz uma lista exaustiva de casos legítimos em que a informação pode ser classificada como sigilosa. Qualquer informação mantida pelo Estado que esteja fora dos casos listados não poderá estar sujeita a restrição de acesso.

A sociedade brasileira não deve se curvar ao desconforto de autoridades que ainda não compreendem o funcionamento do Estado democrático. Faz-se urgente a aprovação de um marco regulatório que dê melhores condições ao combate à corrupção e ao acompanhamento das políticas públicas, permitindo que a informação oficial se torne efetivamente pública.

A informação é o oxigênio da democracia. Precisamos nos erguer para impedir que nossa democracia comece a sufocar.

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[Paula Martins é coordenadora do escritório e do núcleo de acesso à informação do Artigo 19 no Brasil; Arthur Massuda é oficial de Comunicação do Artigo 19 no Brasil]