Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O fim do Diário da Tarde, 77 anos depois

Os Diários e Emissoras Associados passam por mais uma derrota e quem perde são os leitores e os jornalistas. Circula na segunda-feira (30/7) a última edição do jornal Diário da Tarde, de Belo Horizonte, após existência de 77 anos.


A decisão pelo fechamento do Diário da Tarde foi tomada após uma série de medidas e ações equivocadas da atual diretoria da SA Estado de Minas, empresa que controla os negócios dos Associados em Minas Gerais, entre eles os jornais Estado de Minas e Aqui, além do Diário da Tarde.


Idealizado e criado como um diário vespertino, o Diário da Tarde era um jornal de textos de leitura fácil, diagramação que privilegiava fotos e ilustrações – e foi, desde o seu lançamento, leitura diária obrigatória dos taxistas de Belo Horizonte e dos amantes do futebol.


Após a fase inicial em que era impresso e circulava no início da tarde, o DT, como era chamado por seus leitores, passou a rodar e circular pela manhã, atendendo à exigência da velocidade cada vez maior das informações. Elaborado por uma redação enxuta, coesa e harmônica, o DT ficou conhecido por seus textos leves e facilidade de leitura. O Diário da Tarde estava para o Estado de Minas assim como o Jornal da Tarde está para o Estado de S.Paulo, isto é, voltado para quem tem preferência por textos mais lights.


Queda nas vendas


Enquanto manteve essa ‘personalidade’, o DT foi o primeiro em vendas em bancas na Grande Belo Horizonte. Seu melhor dia era segunda-feira, quando trazia uma edição mais completa, com destaque para a cobertura do futebol do fim de semana, além das notícias policiais e suplementos semanais.


Seu sucesso era tamanho que começou a incomodar o próprio Estado de Minas, a ponto de os gestores da empresa passarem a tratá-lo como concorrente ao ‘grande jornal dos mineiros’. Essa postura equivocada representou o início do fim. Ao imaginar que travando o DT iria fazer crescer as vendas do Estado de Minas, a empresa tomou várias providência, entre elas a impossibilidade de se assinar o jornal. Isso só era permitido a pessoas jurídicas e, mesmo assim, se assinassem também o Estado de Minas.


Ainda assim a posição de líder de vendas em bancas foi mantida pelo DT até que, há pouco menos de dois anos, os ‘cérebros’ dos Associados em Minas Gerais decidiram lançar o tablóide popular Aqui. No pacote de medidas, mudaram também a cara e o conteúdo do DT, enfatizando com mais radicalismo as notícias populares.


O lançamento do Aqui aconteceu, na verdade, para combater um jornal de mesmo estilo – o Super Notícias – lançado algumas semanas antes pela Sempre Editora, do ex-deputado Vittorio Medioli, e hoje o principal concorrente dos Associados de Minas Gerais no mercado da mídia impressa.


Ocorre que, enquanto o Super é um sucesso editorial inquestionável – chega a vender 200 mil exemplares por dia –, o Aqui está marcado pelo fracasso. Nem mesmo funcionou a atitude pouco elegante, para não dizer inescrupulosa, de ‘comprar’ do dia para a noite toda equipe de redação do Super Notícias para produzir o Aqui.


Nessa guerra editorial, o Diário da Tarde mais uma vez levou, injustamente, a culpa. Foi reformulado à força e contra a vontade da equipe de Redação que o projetou, o produzia e editava. O resultado foi uma dupla derrota. O Aqui não decolou e o DT, afundou. Suas vendas caíram de forma estrondosa e agora encerra atividades com a demissão dos poucos e bravos jornalistas que faziam o jornal.


Limpando as gavetas


A esperança dos dirigentes da S.A. Estado de Minas é a de que, com o fim do Diário da Tarde, seus tradicionais leitores passem a comprar o Aqui, que agora será rebatizado de Aqui DT. Mas, pelos vários tiros no pé que as últimas decisões dos Associados em Minas têm representado, o mais provável é que os leitores optem pelo jornal concorrente, o Super Notícia.


Nas entrelinhas dessas atitudes, o que pesa é a difícil situação financeira por que passa a S.A. Estado de Minas. A relação custo/faturamento piora a cada dia. Os anunciantes são muitos, o apoio do governo estadual por meio de páginas e mais páginas de publicidade oficial é o que hoje sustenta a empresa, mas as despesas são absurdas. Seus principais executivos recebem salários de fazer inveja aos melhores do mercado e as despesas com a segurança, gastos com festas, jantares e dividendos para os condôminos dos Associados tendem a comprometer a saúde financeira da empresa editora.


Até mesmo os classificados, que por muito tempo foram o principal sustentáculo do grupo, andam mal das pernas. O jornal Balcão, especializado em pequenos anúncios gratuitos, tirou boa parte do faturamento do Estado de Minas nesse campo e, recentemente, o incansável Vittorio Medioli lançou em Belo Horizonte a versão mineira do jornal Primeira Mão, que faz concorrência ao Balcão, mas tem como alvo principal o jornal Estado de Minas.


O fim do DT, antes de ser uma derrota para o grupo criado por Assis Chateaubriand, é uma vitória para a Sempre Editora, sob a batuta do principal desafeto dos Associados hoje, o ex-deputado Medioli. Enquanto, triste, a redação do DT limpa 77 anos de gavetas, a equipe da Sempre Editora deve estar comemorando a vitória de mais uma batalha na guerra para desbancar os Associados em Minas Gerais.

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Jornalista, Belo Horizonte, MG