Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

O fim do mundo

O que acontece em Rondônia ? Governador e deputados chantageiam-se mutuamente, usam a imprensa para enlamear-se uns aos outros, e o Judiciário para enxovalhar a Constituição nos nossos direitos fundamentais.

Lembro-me de quando um governador de Mato Grosso do Sul, citado por peculato na coluna de Janio de Freitas – então reproduzida no extinto Diário da Serra –, teria mandado recolher a edição do jornal local. Tão ou mais lidos – e certamente mais respeitados – do que o Diário e seus concorrentes, os jornais de São Paulo, contudo, circularam normalmente na capital sul-mato-grossense.

Fiz na televisão a única reportagem que registrou e ilustrou como pôde o episódio patético, no qual carros de distribuição do Diário percorriam bancas e até repartições públicas assinantes do jornal para tirar os últimos exemplares da vista do freguês. (Não teria como provar a relação entre a matéria na TV e algumas ameaças veladas que recebi naquela noite e nas seguintes. Felizmente, o tempo passa, e passou.)

Com todos os brasileiros

Na mesma época, abandonado pela rede afiliada da Globo na região – por conta de interesses políticos de ocasião –, o tal governante costumava enviar seu secretário de Comunicação à emissora para tentar barrar tal ou qual matéria negativa para sua imagem. Eram longas e constrangedoras negociações na sala do diretor de Jornalismo, que se estendiam com o telejornal já no ar, até que já não havia nada a fazer.

Pior: a matéria iria para a rede nacional, e aí não haveria mais nada a negociar.

O que acontece em Rondônia, a noroeste do fim do mundo, é muito mais grave, mas é o mesmo que acontece em tantos rincões brasileiros, de sul a norte – e a sudeste – sob as mais diversas formas sob o sol da nossa democracia tropical.

Pode ser um jornal de bairro na metrópole, uma rádio comunitária na Amazônia, um blog na internet. (Ou um livro do Fernando Morais.) Podem estar em jogo um mandato, uma reputação, um loteamento, um resultado de futebol – e, claro, o dinheiro que compra e vende tudo isso, à revelia de uns poucos que falam em nome da multidão silenciosa.

Poderes constituídos, seus representantes pagos com dinheiro de impostos, e os interesses políticos e econômicos a que secundam, de repente têm pela frente o direito do público à informação. E o atropelam descaradamente.

Dados os precedentes autoritários da história do país, sem novidade até agora. Por isso, a expectativa: o que acontecer em Rondônia, Brasil, acontecerá com todos os brasileiros.

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Jornalista, Rio de Janeiro