Da forma como da mídia tem tratado os mais variados assuntos, muitas vezes levada apenas pela necessidade de agradar anunciantes, é difícil descobrir qual o verdadeiro interesse na divulgação de alguns assuntos que dizem respeito à mulher.
A indústria de cosméticos descobriu um filão de marketing diferente para firmar marcas junto às mulheres. Primeiro foi a Dove, que resolveu valorizar a ‘mulher de verdade’ – ou seja, mulheres mais gordinhas, mulheres mais velhas, mulheres comuns, enfim. A campanha, lançada nos Estados Unidos no programa de Ophra Winfrey, foi um sucesso, que gerou matérias em jornais, revistas e TV.
Agora chegou a vez da Avon, que, em parceria com o Ibope, fez uma pesquisa sobre violência doméstica. Em vez de falar de beleza, a Avon preferiu discutir o medo de suas clientes. Clientes que a empresa cultiva através de vendedoras que são suas amigas, vizinhas, suas iguais, enfim. Talvez a escolha do tema se deva ao fato de saber que as donas de casa sem renda própria, mulheres que não têm acesso aos exclusivos cosméticos produzidos para a classe A, são as grandes vítimas da violência doméstica.
Problema existe e é fundamental
Os resultados da pesquisa ‘Percepções sobre a Violência Doméstica no Brasil’, parceira do Ibope com a Fundação Avon, foram divulgados pelo jornal O Estado de S.Paulo (15/04/2009):
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Pelo menos 55% dos entrevistados conhece pelo menos um caso de violência doméstica contra a mulher e 39% dos que conhecem uma vítima de agressão tentaram ajudar.**
Por que os homens agridem? 38% dos entrevistados acreditam que o motivo é alcoolismo; 36% atribuem à natureza violenta do homem brasileiro.**
Por que as mulheres não abandonam o agressor? O principal motivo, segundo os entrevistados, é a falta de condições econômicas para se sustentar (24%); em segundo lugar vem a preocupação com os filhos (23%) e em terceiro (17%) o medo de ser morta pelo agressor em caso de separação.Da mesma forma que a campanha da Dove, a Avon também começou seu trabalho nos Estados Unidos. Ambas têm uma celebridade como âncora – no caso, a atriz Reese Witherspoon, presidente da Fundação Avon. É ela que aparece nas fotos com a gargantilha que a Avon vende para arrecadar fundos para ajudar – em todo o mundo – as organizações de defesa de mulheres agredidas.
Se as campanhas atingem os resultados desejados – melhorar a auto-estima das mulheres e ajudá-las a se defender dos agressores – só o tempo dirá. Talvez a gente nunca saiba se essas empresas realmente se preocupam com suas consumidoras ou apenas descobriram um filão de marketing especial. Também é difícil saber se a mídia divulga essas campanhas porque acredita nos seus motivos sociais ou porque quer agradar anunciantes fortes.
Mas, para as mulheres, o que interessa mesmo é que assuntos sérios – como a aceitação dos padrões de beleza verdadeiros (não os fabricados pelos fashionistas e celebrados pela mídia) e o medo da violência doméstica – acabam virando notícia. E, neste caso, mostrar que o problema existe e é fundamental. Não importa os motivos que levam à divulgação. Se for apenas marketing, tomara que outras empresas sigam pelo mesmo caminho e que a mídia divulgue.
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Jornalista