Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

O crime como business, por que não?

Inflação, G-8, crise financeira americana e as aventuras de Daniel Dantas com a Polícia Federal e a Justiça foram os grandes temas econômicos de julho, até agora. Os três primeiros foram alojados, sem grande surpresa, nos cadernos de economia. O último, não. Só um grande jornal, o Globo, abrigou na seção econômica as matérias sobre o banqueiro Dantas, o especulador Naji Nahas e o ex-prefeito paulistano Celso Pitta.

O Estado de S. Paulo e a Folha de S. Paulo apresentaram a cobertura no primeiro caderno, na área conhecida como ‘Nacional’ou ‘Brasil’, em geral dominada por assuntos políticos e institucionais. A Gazeta Mercantil noticiou a Operação Satiagraha e seus desdobramentos sob o chapéu ‘Direito Corporativo’, um tanto engraçado quando o título principal da página é ‘PF desmantela máfia de crimes financeiros’.

Há bons argumentos a favor da publicação no caderno de economia, embora as ações investigadas pela Polícia Federal podem ter ligações com a política. Daniel Dantas, segundo o noticiário, poderá contar histórias embaraçosas para figuras importantes do governo atual e do passado. Mas a política, para os empresários envolvidos na história, é apenas instrumental. Não importa o partido: qualquer governo pode ser bom, se ajudar a ganhar dinheiro. A política, nesse caso, é mera extensão do mercado.

Não se trata, no entanto, apenas de histórias de negócios com envolvimento de interesses políticos. Os empresários sujeitos a investigação policial são suspeitos de crimes, como fraudes financeiras e lavagem de dinheiro. Também isso é business? Se pode ser política, pode ser business, por que não? Afinal, os quase lendários barões ladrões são personagens importantes da história do capitalismo industrial americano – para não falar no banditismo e nas pilhagens como episódios da acumulação primitiva.

A minicrise no Judiciário, com os embates entre o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, e o juiz Fausto de Sanctis, o responsável pelas duas prisões de Daniel Dantas, foi tratada tecnicamente. Os jornais publicaram as declarações do ministro Tarso Genro sobre como o governo enfrenta as elites etc. e tal, mas sem descuidar dos aspectos legais do caso.

A reunião do Grupo dos 8 (G-8), no Japão, com participação, como convidados, do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e outros chefes de governo de países emergentes, foi coberta com saudável distanciamento. O noticiário de segunda-feira (7/7) já deixou clara a inutilidade do encontro e a pouca disposição dos líderes do mundo rico de assumir compromissos importantes sobre questões econômicas e ambientais.

A velha senhora

A inflação volta a assustar e a ser um grande assunto para os meios de comunicação. Uns poucos editores tiraram do armário de velharias aquelas pautas sobre como se defender da alta de preços. Ninguém foi irresponsável a ponto de aconselhar a formação de estoques de comida. Mesmo nos anos 80 e 90 conselhos desse tipo foram raros, mas ocorreram em número suficiente para envergonhar a profissão.

Matérias sobre como se proteger da inflação têm dois defeitos graves. Em primeiro lugar, são dirigidas a uma pequena parcela da população, beneficiada com mais um privilégio. A maioria das pessoas simplesmente não tem como se defender e fica sujeita a maiores perdas num ambiente especulativo. Em segundo lugar, a inflação é um desajuste macroeconômico e o salve-se quem puder só pode agravá-lo.

De modo geral, a cobertura é hoje muito melhor do que nos tempos da velha inflação, derrubada a partir de 1994. A análise dos números oferecida pelos jornais é mais cuidadosa e detalhes significativos, como o grau de difusão dos aumentos, têm sido publicados. O debate sobre o risco da indexação e do retorno da espiral inflacionária foi aberto pela imprensa e algumas pautas têm posto em foco um tema delicado, o das correções e aumentos salariais.

Um bom exemplo recente foi a matéria da Folha de S. Paulo no dia 13, domingo, sobre o risco de aumentos salariais acima dos ganhos de produtividade e, de modo geral, sobre o possíveis efeitos das próximas negociações salariais. Essa matéria não foi a primeira sobre o assunto. O tema vem sendo enfrentado sem preconceito e com discussões técnicas em matérias de vários jornais e essa é uma novidade importante.

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Jornalista