Parece que esta manhã de terça-feira (15/7) está com uma estranha calmaria nos blogs que tratam de jornalismo e de política, diferentemente do que acontece nos dias de semana. Poucos dos diversos blogs que tenho inscritos no Google Reader apareceram com novidades ou opiniões, e mesmo assim muito mornas. Não sei se estou fazendo uma associação indevida de fatos, mas imagino que muitos colegas jornalistas devem estar mergulhados na leitura do Relatório sobre a Operação Satiagraha, da Polícia Federal, que está desde ontem à noite (segunda-feira, 14/07) disponibilizado na reportagem ‘Operação Grampo‘, do jornalista Cláudio Júlio Tognolli, no site da revista Consultor Jurídico.
O documento, que possui 210 páginas, todas elas com o timbre ‘Sigiloso’, contém um capítulo intitulado ‘Manipulação de mídia’ (págs. 148 a 160). Ele mostra conteúdos de e-mails e de escutas telefônicas de terceiros que se referem a jornalistas que supostamente teriam produzido matérias para atender a interesses do Grupo Opportunity ou se oferecido para produzi-las. Não há transcrições de e-mails enviados ou recebidos por tais jornalistas nem de escutas de conversas telefônicas com a participação deles.
Outro site, o Comunique-se, já na tarde de ontem havia levantado o assunto que imagino estar prendendo a atenção de muitos jornalistas, com a publicação da reportagem ‘Relatório da Polícia Federal indica que Dantas manipula mídia’, do jornalista Sérgio Matsuura.
(Tenho dúvidas sobre se é adequado o uso do verbo ‘indica’ no título da reportagem do Comunique-se. Já no primeiro parágrafo, de forma que me parece correta, o texto afirma que o relatório ‘diz que os supostos grupos criminosos do banqueiro Daniel Valente Dantas e do investidor Naji Robert Nahas manipulam a mídia’. No final das contas, trata-se de uma acusação a determinados jornalistas.)
‘Remuneração direta ou indireta’
O texto do relatório afirma, em suas páginas 148 e 149:
No curso da presente investigação nos deparamos com diálogos e emails que apontam para uma manipulação da mídia pela organização criminosa investigada. Pudemos notar que tudo o que se publica com relação aos interesses do grupo é acompanhado de perto e cuidadosamente.
Não obstante não haver tipificação penal para tanto, a situação verificada ultrapassa os limites estabelecidos no artigo 220 e inciso IV do artigo 221 da Constituição da República. Em alguns momentos, o comportamento de alguns jornalistas poderia até ser enquadrado como de membros da organização criminosa, especialmente daqueles com indícios de recebimento de remuneração direta ou indireta de recursos advindos do grupo.
Em certas oportunidades, é travada uma verdadeira batalha psicológica por meio dos órgãos de imprensa, os quais deveriam apresentar uma opinião isenta, mas, na verdade, encontram-se totalmente corrompidos, utilizados como instrumentos servindo aos interesses de criminosos.
O volume de dados obtidos sobre o tema foi grande e de sua análise concluímos que a utilização da mídia serve a dois propósitos, no mínimo, antiéticos, o benefício próprio e o prejuízo de terceiros, com intenções de chantagem, inclusive, plantando em meios de mídia informações falsas, até com cunho difamatório, como podemos ver no exemplo abaixo:
(…)
[segue transcrição de e-mail em que se faz menção a um jornalista]
‘Nosso prazo para entrar com a campanha difamatória é no começo de março, e se não formos fazer com ele, temos que achar outra pessoa.
Nos preferiríamos que você redigisse, achamos que esse caso tem muitos fatos e seria melhor redigido por um civilista do que por um criminalista.’
O nome do jornalista não está aqui citado porque este blog é opinativo e não faz reportagem, o que exigiria ouvir os envolvidos e apresentar sua versão.
Indícios de faltas graves
Já dá para imaginar as reações na imprensa a esse documento, que certamente foi redigido com a intenção de se referir a determinados jornalistas e veículos, mas abusa de considerações generalizantes nesse trecho.
O que importa é que os indícios são de faltas altamente graves. Mas não se pode ignorar que se trata de uma peça preliminar para a acusação dos envolvidos no caso. Em outras condições, eu consideraria inadequada a divulgação desse documento pela imprensa, uma vez que ele contém acusações não comprovadas. Mas agora, com os nomes dos acusados já divulgados anteriormente pela imprensa, não tenho certeza disso.
Um argumento em favor dessa divulgação seria o de fornecer subsídios para esclarecer o confronto entre o ministro Gilmar Mendes, presidente do STF, e o juiz Fausto de Sanctis, da 6ª Vara Criminal Federal de São Paulo, que expediu mandados de prisão que foram tornados sem efeitos por meio de habeas corpus do outro.
No que se refere aos demais implicados pelo relatório, os da esfera político-financeira, o conteúdo agora liberado é combustível para agitar ainda mais o caso. Seja como for, os próximos dias prometem muita agitação.
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Jornalista especializado em meio ambiente e editor do blog Laudas Críticas