Sunday, 24 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Outros pesos, outras medidas

Várias vozes da imprensa internacional estão caladas no caso da prisão do correspondente da rede Telesur na Colômbia, Fredy Muñoz, que completou uma semana no domingo (26/11). Entidades como a Associação Mundial de Jornais, o World Press Freedom Committee e a Freedom House, que costumam intervir no caso de prisões políticas contra jornalistas, desta vez se omitiram.


Muñoz foi preso em 19/11 pelo Departamento Administrativo de Segurança (DAS), polícia federal colombiana, em cumprimento a uma ordem expedida pela 5ª procuradoria regional (Barranquilla, norte do país). O jornalista, que é colombiano, é acusado de participar de dois atentados a bomba contra a rede de energia elétrica em Barranquilla e Cartagena, em 2003. De acordo com o Ministério Público da Colômbia, Muñoz foi denunciado por guerrilheiros das FARC que cumprem pena por crimes semelhantes. A Telesur rebate que estes presos são estimulados a fazer delações falsas para se beneficiarem do programa de delações premiadas.


Na quinta-feira (23/11), o jornalista foi levado para depor no tribunal de Barranquilla e, durante poucos momentos, deu declarações à imprensa. ‘Eu não tenho tempo de ser chefe de milícias. Eu só tenho tempo de ser jornalista. Não me sobraria um minuto para outra coisa na vida, muito menos para ser chefe de milícias terroristas. Gosto muito do meu país para iniciar uma ação dessas’, disse. A TeleSur também divulgou uma carta escrita pelo próprio Muñoz dentro da prisão.


A Federação Internacional de Jornalistas emitiu um comunicado expressando ‘preocupação’ com a prisão do jornalista e ressaltando a urgência de ‘deixar claro se realmente a prisão de Muñoz não responde à necessidade de calar suas denúncias sobre supostas irregularidades cometidas pelo DAS e outras instituições policiais e militares da Colômbia’. Já a ONG Repórteres Sem Fronteiras exigiu a libertação do repórter e afirmou que ‘a prisão de Fredy Muñoz é pura e simplesmente um abuso de poder e uma arbitrariedade’. A Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP, em espanhol) declarou que ‘se manterá atenta‘ ao caso de Muñoz e afirmou ter pedido às autoridades colombianas que assegurem todas as garantias legais ao jornalista. Outras cartas de apoio partiram da colombiana Fundación para Libertad de Prensa (FLIP), da Coordenação de Mídia Alternativa da Colômbia e da Associação Brasileira de Canais Comunitários (ABCCOM), reunida em congresso no último fim de semana.


‘Situação difícil’


A Associação Mundial de Jornais (WAN, em inglês) divulgou o fato mas não se manifestou oficialmente, ao contrário do que faz em casos semelhantes. O Instituto Internacional de Segurança Jornalística (International News Safety Institute), que divulga relatórios semanais sobre jornalistas presos no mundo, nada mencionou no último, datado de 20/11. Sete dias depois da prisão, nada se encontra sobre o caso de Fredy Muñoz no website da Freedom House, entidade americana conhecida por patrulhar atentados a liberdades e direitos civis (e privados) no mundo. A mesma situação se repete com as páginas da International Press Institute, World Press Freedom Committee, Reporters Committee for Freedom of the Press, Canadian Journalists for Free Expression, todas entidades acostumadas à denúncia de arbitrariedades contra a liberdade de imprensa.


Os sites também não não explicam a omissão das mesmas entidades que foram rápidas para condenar os assassinatos de Anna Politkóvskaia, na Rússia, e de Gueórgui Gongadze, na Ucrânia, e que são tão rígidas no monitoramento à liberdade de imprensa na China, Venezuela, Bielorrússia, Moldávia, Bolívia e outros países sob governos anticapitalistas. Mesmo a RSF, que se apresenta tão combativa, desta vez foi condicional: ‘Se for confirmado que [a prisão de Fredy Muñoz] está relacionada com a transmissão pela Telesur, um ano atrás, de entrevistas com guerrilheiros, então o governo colombiano será culpado de atentar contra a liberdade de imprensa’, disse o comunicado da ONG.


Segundo o relatório anual da própria RSF, a liberdade de imprensa na Colômbia é classificada em ‘situação difícil’ e o país ocupa o 131º lugar no ranking, entre 168 países analisados pela entidade. Outro levantamento, feito pela FIJ, aponta o país como campeão em morte de jornalistas nas Américas em 2005.


‘Não há garantias’


‘Não consigo imaginar as atividades informativas de um jornalista alternadas com a detonação de bombas’, ironizou o diretor da IFJ local, Eduardo Márquez. De acordo com ele, na Colômbia tem acontecido ‘todo tipo de abusos cometidos contra colegas em nome da guerra ao terrorismo’.


A ordem para a prisão do correspondente da TeleSur foi expedida pela justiça colombiana em 10/11, enquanto Muñoz estava em Caracas, Venezuela, participando de um workshop de telejornalismo. Ele teria sido apontado em depoimentos de três guerrilheiros presos como colaborador das FARC sob o pseudônimo de ‘Jorge Eliécer’. Assim que pisou em território colombiano, o jornalista foi preso. A polícia também afirmou ter encontrado armas durante uma revista na casa dele. O DAS alega que a ordem da Procuradoria é resultado de três anos de investigação contra Muñoz por ‘crimes de rebelião e terrorismo’, mas não apresentou à imprensa as ‘provas sólidas’ que diz ter.


Fredy Muñoz nasceu em Bogotá, tem 36 anos e iniciou a carreira nos jornais El Universal e El Periódico. Trabalhou também para a ONU, elaborando relatórios sobre desigualdades sociais e direitos humanos, e para o canal regional TeleCaribe. Começou a trabalhar para a Telesur logo que a rede foi lançada, em julho de 2005.


Para o presidente da emissora, Andrés Izarra, a prisão tem motivação exclusivamente política e foi orquestrada pelo governo de Álvaro Uribe, principal adversário regional do presidente vizinho Hugo Chávez. ‘Há um interesse político em atacar a imagem e a credibilidade da TeleSur’, disse. ‘Todos que exercem o jornalismo na Colômbia sabem que estão sujeitos a uma atividade que acarreta um risco considerável. No caso da TeleSur, temos um risco adicional, já que foi da Colômbia que vieram os ataques mais graves à nossa rede. Desde antes de irmos ao ar, diziam que promoveríamos o terrorismo, que levaríamos a voz das FARC ou que éramos uma rede de campanha de Chávez’, acrescentou Izarra, que antes de assumir a direção da TeleSur foi repórter e editor nas emissoras americanas NBC e CNN.


No depoimento à justiça colombiana, Fredy Muñoz disse desconhecer totalmente os fatos dos quais é acusado. O advogado do jornalista, Tito Augusto Gaitán, pediu ao comitê local da FIJ que entidades de defesa da liberdade de imprensa façam pressão para que o caso não seja mantido na justiça regional de Barranquilla. ‘Não há garantias de uma investigação transparente’, disse Gaitán.

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Jornalista (Rio de Janeiro, RJ)