Monday, 04 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

Pacto nacional contra corrupção e violência

O Brasil está diante de desafios históricos nunca antes colocados nos termos em que se apresentam hoje: o avanço do crime organizado em moldes semelhantes ao da máfia tradicional, pela violência e ousadia na ação contra a sociedade e o Estado; e a corrupção generalizada envolvendo o governo, partidos políticos, empresas estatais e privadas, compondo um cenário de desprestígio do Congresso Nacional. Desgaste que se reflete na apatia com que a população participa das eleições deste ano.

São problemas da mais alta gravidade que colocam em risco os fundamentos do Estado brasileiro e sua sobrevivência.

No enfrentamento dessas questões sobressai a impotência das autoridades, incapazes de uma ação conjunta e vigorosa como ocorreu, por exemplo, na Itália, com a Operação Mãos Limpas que desbaratou a máfia e suas ramificações nos poderes do estado e na iniciativa privada. Os métodos e as inovações na legislação implementadas com sucesso naquele país – que levou à cadeia centenas de parlamentares, empresários, juízes e funcionários, alguns bem posicionados como um ex-primeiro-ministro e poderosos industriais – foram apresentadas, no Brasil, a meu convite, pelos procuradores encarregados dos processos. Nos anais do Senado constam a íntegra das audiências públicas então realizadas em Brasília.

Já é tempo de o Estado brasileiro acordar da letargia e superar idiossincrasias partidárias e de cunho eleitoral. Os acontecimentos de São Paulo, onde o crime organizado escolhe data, hora e lugar para começar e terminar suas ações, espalhando pânico coletivo, não constituem problema localizado. É assunto nacional e exige tratamento diferenciado por parte dos poderes públicos. Uma Operação Mãos Limpas pode ser o começo de uma solução permanente.

O conceituado jornalista Alberto Dines, em entrevista recente ao site Via Política, aborda com propriedade esse tema. Diz ele que a reação pífia das autoridades brasileiras, e mesmo do empresariado de comunicações, diante do seqüestro de um jornalista em São Paulo, foi o sinal mais efetivo de que, ainda agora, não há indignação entre as mais altas autoridades do país com a situação caótica que vivemos hoje. Ele chega a sugerir uma reunião do atual com os ex-presidentes da República. Vou mais longe, proponho que a reunião inclua os presidentes dos tribunais superiores, do Congresso Nacional e da Procuradoria-Geral da República. Desse encontro, sairiam as diretrizes de uma ação organizada contra o crescimento do crime organizado no país.

Percepção popular

Ao lado desse problema grave que ameaça a segurança pública e suscita dúvidas quanto à capacidade (ou vontade?) do Estado de responder à altura, temos a questão da corrupção que tomou conta do governo, do parlamento e de órgãos e empresas públicas de uma forma geral. Não passa dia sem uma notícia de um novo escândalo.

Agora, os ‘sanguessugas’ ocupam as manchetes da imprensa. Mais uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) está funcionando no Congresso, investigando junto com o Ministério Público e apontando parlamentares na Câmara dos Deputados e no Senado envolvidos com troca de emendas por propinas na compra de ambulâncias. Mas, já se percebem sinais claros de manobras protelatórias para desviar o foco da atenção e adiar indefinidamente a conclusão dos processos.

Sempre defendi as CPIs, elas são necessárias e cumprem um papel importante na democracia brasileira. O país sempre saiu delas melhor do que quando entrou. Foi assim com o afastamento do ex-presidente da República, Fernando Collor, e com a cassação de dez parlamentares que se apropriaram de dinheiro público na Comissão do Orçamento. Quando estourou o primeiro escândalo do governo atual, o flagrante do sub-chefe da Casa Civil, Valdomiro Diniz, extorquindo um empresário do jogo, encaminhei mandado de segurança ao Supremo Tribunal Federal para instalar uma CPI, a dos Bingos, que as lideranças governistas impediram no Senado. O tribunal acatou meus argumentos, fundados na Constituição, e por nove votos contra um, determinou a instalação da comissão.

Contudo, a percepção popular é de que as CPIs sempre acabam em ‘pizza’. Discordo, porque uma CPI não tem o poder de julgar e prender um parlamentar ou funcionário ou quem quer que seja envolvido em corrupção; pode apenas recomendar à Procuradoria-Geral da República que abra processo e denuncie o investigado à Justiça ou, no caso de um parlamentar ou ministro, ao Supremo Tribunal Federal (STF). Uma CPI ainda tem a faculdade de indiciar e solicitar a cassação do parlamentar. No caso dos denunciados que acabam absolvidos pelo voto da maioria do plenário, a população tem agora, nestas eleições, a condição de afastar esses políticos da vida pública.

Problemas graves

Apresentei projeto de lei para garantir que parlamentares que respondem a processo de cassação por corrupção não consigam fugir da punição com a renúncia ao mandato. Caso o Congresso aprove minha proposta, mesmo que o parlamentar renuncie, o processo segue adiante para cassar os direitos políticos do deputado ou senador que não honrou o mandato popular. Tenho outras propostas com o mesmo objetivo moralizador da vida pública. Entre elas, o fim do sigilo bancário para autoridades, desde o presidente da República até diretores de autarquias e dirigentes partidários; e o que estabelece preferência para processos que envolvem malversação do dinheiro público.

Os problemas são graves e cabe aos poderes da República a busca de soluções capazes de recuperar a segurança e a tranqüilidade dos cidadãos e impor a moralização e a ética na vida pública brasileira.

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Senador da República (PMDB-RS)