Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Presidente é premiado e a imprensa esconde

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebeu na terça-feira (7/7) à noite, em Paris, o prêmio Félix Houphouët-Boigny concedido pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura).


Presidido por Henry Kissinger, ex-secretário de Estado dos Estados Unidos, o júri premiou Lula ‘por sua atuação na promoção da paz e da igualdade de direitos’. 


Não é um premiozinho qualquer. Entre as 23 personalidades mundiais que receberam o prêmio até hoje – anteriormente nenhum deles brasileiro –, estão Nelson Mandela, ex-presidente da África do Sul, Yitzhak Rabin, ex-premiê israelense, Yasser Arafat, ex-presidente da Autoridade Nacional Palestina, e Jimmy Carter, ex-presidente dos Estados Unidos.


Secretário-executivo do prêmio, Alioune Traoré lembrou durante a cerimonia na sede da Unesco que um terço dos vencedores anteriores ganhou depois o Prêmio Nobel da Paz.


Pode-se imaginar no Brasil o trauma que isto causaria a certos setores políticos e da mídia caso o mesmo aconteça com Lula.


Thaoré disse a Lula que, ao receber este prêmio, ‘o senhor assume novas responsabilidades na história’.


Condenação do golpe


Mas nada disso foi capaz de comover os editores dos dois jornalões paulistas, Folha e Estadão, que simplesmente ignoraram o fato em suas primeiras páginas. Dos três grandes jornais nacionais, apenas O Globo destacou a entrega do prêmio no alto da capa.


Para o Estadão, mais importante do que o prêmio recebido por Lula foi a manifestação de dois ativistas do Greenpeace que exibiram faixas conclamando Lula a salvar a Amazônia e o clima. ‘Ambientalistas protestam durante premiação de Lula’, foi o título da página A7 do Estadão.


O protesto do Greenpeace foi também o tema das únicas fotografias publicadas pela Folha e pelo Estadão. No final do texto, o Estadão registrou que Lula pediu desculpas aos jovens ativistas, retirados com truculência pela segurança, e ‘reverteu o constragimento a seu favor, sendo ovacionado pelo público que lotava o auditório’.


‘O alerta destes jovens vale para todos nós, porque a Amazônia tem que ser realmente preservada’, afirmou Lula em seu discurso, ao longo do qual foi aplaudido três vezes quando pediu o fim do embargo a Cuba e a criação do Estado palestino, e condenou o golpe em Honduras.


‘Sinto-me honrado de partilhar desta distinção. Recebo esse prêmio em nome das conquistas recentes do povo brasileiro’, afirmou Lula para os convidados das Nações Unidas.


Gosto estranho


A honraria inédita concedida a um presidente brasileiro, motivo de orgulho para o país, também não mereceu constar da escalada de manchetes do Jornal Nacional. A notícia da entrega do prêmio no principal telejornal noturno saiu ensanduichada entre declarações de Lula sobre a crise no Senado e o protesto do Greenpeace.


É verdade que a terça-feira (7) foi o dia do grande show promovido nos funerais de Michael Jackson, mas também ganhou destaque na escalada e no noticiário a comemoração pelos quinze anos do Plano Real promovida no plenário do Senado, em que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso aproveitou para atacar Lula.


Diante da manifesta má vontade demonstrada pela imprensa neste episódio da cobertura da entrega do Prêmio da Unesco, dá para entender porque o governo Lula procura formas alternativas para se comunicar com a população fora da grande mídia.


Muitas vezes, quando trabalhava no governo, e mesmo depois que saí, discordei dele nas críticas que fazia à atuação da imprensa, a ponto de dizer recentemente que não lia mais jornais porque lhe davam azia.


Exageros à parte, mesmo que esta atitude beligerante lhe cause mais prejuízos do que dividendos, na minha modesta opinião, o fato é que Lula não deixa de ter razão quando se queixa de uma tendência da nossa mídia de inverter a máxima de Rubens Ricupero, aquele que deu uma banana para os escrúpulos.


‘O que é bom a gente esconde, o que é ruim a gente divulga’ parece ser mesmo a postura de boa parte dos editores da nossa imprensa com um estranho gosto pelo noticiário negativo, priorizando as desgraças e minimizando as coisas boas que também acontecem no país.


Valeu, Lula. Parabéns! 

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Jornalista