Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Problemas evitáveis

Mesmo considerando que a realização da Confecom foi um relativo avanço teórico, já que muito pouco de prático deve resultar disto, em termos de democratização da comunicação houve problemas que poderiam ter sido facilmente evitados.

Para se ter uma idéia deste resultado, basta lembrar quantos anos se levou para implantar o SUS – Sistema Único de Saúde após sua proposta na Conferência da Saúde. Sendo a comunicação algo muito mais sutil, certamente levará ainda mais tempo para ter seus resultados concretizados. E, deve-se considerar que a qualidade do SUS é algo condenado por quase todos brasileiros! Apesar de ser universal e atender necessidades básicas da população e, algumas vezes, nem isto…

Certamente, o planejamento, disciplina e objetividade não é uma qualidade intrínseca da cultura íbero-católica-latino-americana, ao contrário do que ocorre com a anglo-saxã-protestante e nos chamados tigres asiáticos.

A tudo isto, acrescenta-se o fato de que os donos da mídia, os financiadores de campanha política, bem como o representante ou sócio da Rede Globo, detentor do cargo de Ministro das Comunicações, fizeram de tudo para que esta I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) não acontecesse.

Assim, ao reclamar de qualquer problema que ocorreu na Confecom, na maioria das vezes, ouvimos a resposta de que a culpa era dos outros que (não) fizeram isto ou aquilo.

Dificuldades de transporte

Seria desonesto de minha parte não explicitar o empenho de alguns abnegados voluntários do movimento social, visando a minimizar os problemas ocorridos, a exemplo do radialista e professor do LapCom da UnB Fernando Oliveira Paulino, o responsável pela infra-estrutura Nascimento Silva e alguns diretores da Fitert, bem como Carolina Ribeiro e outros membros do Coletivo Intervozes de Comunicação. O próprio presidente da Comissão Organizadora Nacional, Marcelo Bechara (MiniCom), empenhou-se em ir até os últimos limites permitidos pela burocracia ‘Estado autoritário e oligárquico’ (Marilena Chauí) que financiou a atividade.

Segue, então, um breve relato daqueles problemas que me chegaram ao conhecimento:

(1) A informação sobre transporte dos delegados para Brasília foi fornecida de última hora, deixando os envolvidos bastante inseguros e com pouco tempo para se prepararem para viagem, principalmente as pessoas mais simples e de poucas posses.

(2) Parte das passagens somente foi emitida após a constatação por aqueles dos interessados de que estavam faltando.

(3) Houve grande dificuldade para que os suplentes substituíssem os efetivos que não puderam ir, cujo cadastro da organização não foi atualizado até quando eles chegaram ao evento.

(4) Foi exigido que se chegasse três horas antes do horário do vôo, no aeroporto, o que Marcelo Bechara suprimiu, após minhas considerações. Mas a informação continuou mantida no sítio da Confecom, mesmo após eu enviar mensagem solicitando que fosse retirada.

(5) Alguns delegados do interior do Pará não puderam vir porque a passagem a eles destinada era para vôos de Belém, para onde teriam de se deslocar por centenas de quilômetros em estradas de péssimo estado, não dispondo de tempo e dinheiro para tanto. Na realidade, havia vôo direto para Brasília, de alguma cidade próxima da deles (por exemplo, Altamira e Marabá), mas isto não foi levado em conta pela organização, alegando que a culpa era da comissão estadual que não tinha colocado um dado que não lhe tinha sido pedido: a cidade de origem do delegado.

Problemas nas refeições

(6) Foi prometido que haveria reembolso do traslado da cidade do interior para a capital, donde sairia o vôo ou da passagem para o aeroporto, mediante a apresentação do comprovante do gasto. Apesar de todos terem entendido que isto ocorreria imediatamente (‘mediante a apresentação do comprovante’), na realidade, seria mediante um processo administrativo no MiniCom, após o retorno dos delegados para suas casas. Como pobre não tem reservas financeiras, estava sendo assinada uma moção para protestar contra mais esta leviandade. Em função de nossas ponderações, a organização designou um funcionário para emitir, no local do evento, passagens de volta para aqueles que dela necessitassem e foi disponibilizado outro para remarcação de vôos, exceto para os da TAM que somente podiam ser feitos no aeroporto.

(7) As diárias de hotel terminaram antes da Confecom, exigindo que os delegados retirassem seus pertences às 7 h da manhã, em função de um aviso nos elevadores e no bar do hotel, de que o último ônibus sairia para o Centro de Convenções às 8. Somente mais tarde, após muita pressão, fomos informados de que teríamos outra diária, isto é, quando boa parte já estava com suas malas no local do evento, e dali partiriam direto para o aeroporto sem ao menos tomar um banho. Tudo isto porque as passagens para retorno foram adquiridas para um horário em que a conferência ainda não teria terminado.

(8) Durante as refeições sempre faltava alguma coisa do cardápio para aqueles que chegavam mais tarde, com o gerente se defendendo através da alegação de que tinha sido informado de um determinado número de pessoas, quando o número sempre era muito maior, não recebendo ele pelo excedente. A informação que recebi da organização é de que isto não é verdade.

Garantia de qualidade

Quando apresentei este texto ao Bechara, visando adicionar também a visão dele sobre o assunto, como manda o bom jornalismo, ele concordou com o levantamento feito e explicou que ocorreram em função do pouco tempo existente entre o fim das conferências estaduais e a nacional. Também alegou que nomes dos delegados de muitos estados vieram errados, com dados incompletos, cuja correção não foi fácil.

Arriscou prejudicar a organização da conferência nacional, visando estender o prazo para os estados finalizarem suas etapas. Emitir passagens para 1600 pessoas, ida e volta, com apenas 10 dias foi um desafio, cuja decisão foi tomada consciente de que a relação custo/benefício seria vantajosa para a grande maioria dos envolvidos e para o evento como um todo.

Posteriormente, lembrei-me de que houve muita reclamação, mesmo por parte das pessoas da Comissão Organizadora, quanto ao trabalho da Fundação Getúlio Vargas, a qual fez um projeto para o tratamento das teses estaduais, executado por uma empresa contratada para este fim. A pergunta que as pessoas se faziam era se elas receberiam o mesmo valor que mereceriam, caso tivessem feito um bom serviço.

Vários delegados também apontaram ‘o atraso de cinco horas que nos fez desperdiçar a tarde e a noite de quarta-feira, para ler as propostas aprovadas nos GT, ao invés de adiantar a votação’ (Alexandre Nativa-MG).

Assim, concluí que falta ao governo um núcleo interministerial de eventos, que padronize, organize e registre as experiências negativas e positivas vivenciadas até aqui, em tantas conferências (por exemplo), de tal forma a utilizá-las para aprimoramento das atividades futuras. Algo do tipo de uma ISO 9000, um sistema de garantia de qualidade, como o fazem os empresários de sucesso. Coisa que, aliás, poderia muito bem ser aplicada a toda atividade do Estado brasileiro.

Sobre isto, Bechara informou que há um projeto de lei tramitando no Congresso Nacional, visando legalizar a realização das conferências em geral, no que estaria incluído algo neste sentido.

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Engenheiro civil, Belo Horizonte, MG