Wednesday, 18 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1318

Proposto limite para o capital estrangeiro

A Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert), a Associação Nacional de Jornais (ANJ) e a Associação Brasileira dos Provedores de Acesso à Internet (Abranet) defenderam na quinta-feira (11/11) na Câmara dos Deputados a limitação do capital estrangeiro em 30% para empresas que produzem conteúdo jornalístico na internet.


Segundo as três entidades, a restrição ao capital externo, que está no artigo 222 da Constituição, aplica-se a qualquer negócio que explore conteúdos, independentemente do meio utilizado, seja TV, rádio, jornais ou a internet.


O assunto foi discutido em audiência pública promovida pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática.


Conforme essa interpretação, o objetivo da norma seria preservar a cultura e a nacionalidade brasileiras, e por isso a limitação. Além de o capital ser 70% nacional, o controle da empresa e da produção de conteúdo deve ser exercido por brasileiro nato ou naturalizado há 10 anos, defendem.


‘Ninguém quer controlar o livre fluxo de informações e idéias, mas queremos proteger a soberania e a cultura nacional, foi essa a intenção da lei, que inclusive existe em outros países’, disse Luís Roberto Barroso, constitucionalista e representante da Abert no debate.


Limitações geográficas


O diretor-presidente do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), Demi Getschko, disse que talvez não seja possível elaborar e fazer cumprir leis desse gênero para a internet.


A preocupação de Getschko, que também é membro do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), é que se queira aplicar a lei por meio de restrições físicas e de acesso à rede.


Segundo ele, além de ferir os princípios que norteiam o desenvolvimento da web, as características técnicas da rede impedem que leis restritivas sejam aplicadas, uma vez que não é possível localizar um portal geograficamente.


Um portal com conteúdo pode ser gerido da mesma forma por jornalistas, por uma padaria, um açougue, uma loja qualquer, por pessoas físicas ou jurídicas, e pode ser coletivo sem sequer exigir cadastro. ‘No mundo real, é claro o que é uma empresa de jornalismo, mas é difícil definir o que é um portal jornalístico na internet. A analogia não é possível porque a rede segue outras lógicas’, explicou.


O consultor jurídico do Ministério das Comunicações, Marcelo Bechara, frisou que não estava sendo discutida a ‘regulamentação da internet’, tema que assusta os usuários. ‘O jogo é proibido no Brasil, mas todos os dias milhares de pessoas jogam em cassinos virtuais, e seria a mesma coisa tentar proibir ‘, exemplificou.


Mesmas regras


A posição das associações também é a de que a internet seja livre de restrições. Segundo elas, no entanto, a defesa é para que as empresas que exploram a notícia como negócio na web no Brasil sigam as mesmas regras das demais companhias de comunicação.


‘Qualquer um pode colocar notícias na internet, mas não é disso que estamos falando. Estamos falando da empresa do lado real e não virtual, de um negócio que se organiza para produzir notícias e explorar isso empresarialmente’, disse o professor da Faculdade de Direito da USP, Tércio Ferraz, que representou a ANJ no debate.


Não é difícil imaginar que uma companhia se organize em outro país e fuja a essa regra, produzindo conteúdo em português para veiculação no Brasil. Mas Roberto Barroso afirma que não é porque uma regra é de difícil aplicação que ela deva ser ignorada. ‘Além disso, acho difícil que a produção de jornalismo sobre o Brasil se dê sem uma base de operação e profissionais no Brasil, o que obriga a empresa a ter uma sede aqui’, disse.


Realidade nova


Para o deputado Júlio Semmeghini (PSDB-SP), é natural que as empresas estejam preocupadas. No âmbito do Projeto de Lei 29/07, que trata de convergência digital e regulamenta a participação de empresas de internet e telefônicas no mercado de TV por assinatura, existe uma preocupação de que essas empresas, que têm maior participação de capital estrangeiro, passem a produzir conteúdo. ‘Mas nas negociações até o momento o entendimento é de que elas não podem produzir, e se for necessário mudaremos a legislação para tornar isso claro’, disse.


Para o deputado Paulo Henrique Lustosa (PMDB-CE), que é o relator do PL 29 na comissão, pode-se até discutir um dia a possibilidade de se abrir totalmente o capital das empresas de comunicação, mas enquanto houver restrição, ela deve valer para todas as empresas. ‘Certamente não queremos censurar, nem deter os fluxos de informação, mas preservar a cultura brasileira’, disse.


E como há duas interpretações possíveis para a limitação de capital, a de que ela se aplica à internet, e a de que a rede precisa de uma norma mais atual, o presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia, deputado Eduardo Gomes (PSDB-TO), adiantou que a audiência realizada hoje pode iniciar projetos sobre o tema. ‘Nós estamos diante de uma realidade nova, e precisamos ver se as leis já estão adequadas’, disse. Não haja projetos sobre o tema em tramitação na Câmara até o momento.


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Conteúdo jornalístico de portais da web pode ser restrito a empresa nacional


Lúcia Berbert # reproduzido do Tele Síntese, 11/11/2009


Os portais da internet poderão ser obrigados a contratar uma empresa jornalística para prover os conteúdos de notícias. A medida, defendida pelos radiodifusores, tem a simpatia dos deputados da Comissão de Ciência e Tecnologia, que discutiram hoje a possibilidade de aplicação do artigo 222 da Constituição federal – que limita a propriedade de empresas jornalística e de radiodifusão para até 30% de capital estrangeiro – a esses portais.


Segundo o deputado Júlio Semeghini (PSDB-SP), será necessário regulamentar essa questão dos provedores de serviços de internet, preservando a produção de conteúdo jornalístico para as empresas nacionais. Porém prevê dificuldades na tarefa. ‘Ao restringir os grandes provedores, muitos deles de propriedade das teles, de produzir conteúdos poderemos inibir a ação dos pequenos, coisa que não é do interesse de ninguém’, disse.


Na audiência pública, requerida pelo presidente da CCT, deputado Eduardo Gomes (PSDB-TO), ficou claro que não há interesse em regular a rede mundial, mas de adequar os serviços prestados por ela às leis vigentes. ‘É uma balela dizer que a internet é terra de ninguém, as leis existentes podem e são aplicadas a condutas veiculadas por ela’, ressaltou o consultor jurídico do Ministério das Comunicações, Marcelo Bechara. Ele defende, entretanto, que as menções sobre conteúdo na Constituição sejam explicitadas.


Para o representante da Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão), é preciso preservar dois princípios básicos: impedir a desnacionalização da produção de conteúdo jornalístico e assegurar tratamento isonômico para quem presta os mesmos serviços. ‘Se optássemos pela desnacionalização da radiodifusão e das empresas jornalísticas, ao invés de futebol aos domingos, passaríamos a ver touradas’, comparou.


O presidente do NIC.br (Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR), Demi Getschko, acha difícil extrapolar as regras do mundo real para o mundo virtual. Além do mais, considera que os portais de internet são sítios que oferecem diversos serviços, inclusive de jornalismo. O representante da ANJ (Associação Nacional dos Jornais), Tércio Ferraz Júnior, defende que a comunicação é a commoditie do século 21 e é preciso impedir o monopólio na produção dela. ‘A informação é livre, mas quem a produz deve se submeter às restrições empresariais previstas na Constituição de 88’, disse.


A representante da Abranet (Associação brasileira dos provedores de acesso, serviços e informações da rede internet), Taís Gasparian, disse que o entendimento dos provedores é de que o conteúdo jornalístico da internet deve ser produzido por empresa brasileira. O deputado Eduardo Gomes disse que o tema precisa ser debatido a fundo. ‘Asquestões ligadas à internet precisam deixar de ser tabu nesta casa’, concluiu.


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Empresas de comunicação querem limite acionário também na Internet


Mariana Mazza # reproduzido do Tela Viva News, 11/11/ 2009


O avanço inegável da Internet como uma plataforma de divulgação de conteúdos audiovisuais e jornalísticos continua estimulando debates no Legislativo sobre a necessidade ou não de se fazer um controle da exploração desse meio pelas empresas. Além das iniciativas polêmicas de regulação da Internet e do PL 29/2007, que propõe regras unificadas para a TV por assinatura e chegou a incluir o tema em seu escopo, a Câmara dos Deputados realizou na quarta-feira (11/11) um debate sobre a possibilidade de se aplicar as restrições constitucionais ao capital estrangeiro também a portais de notícia na web.


As regras de composição do capital das empresas de comunicação estão no artigo 222 da Constituição Federal. Neste item, o Estado define que empresas jornalísticas e de radiodifusão só podem ser de propriedade de brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez anos e 70% do capital votante deve, obrigatoriamente, pertencer a brasileiros direta ou indiretamente. A gestão do conteúdo também só pode ser exercida por brasileiros. Na visão da Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abert), estes princípios garantem a soberania e a preservação da cultura nacional, além de identificar com clareza as responsabilidades de quem presta este serviço público à nação.


A partir dessa interpretação, o consultor jurídico da Abert, Luiz Roberto Barroso, defendeu a validade dessas regras também para a divulgação de notícias e veiculação de conteúdos por empresas privadas em portais na Internet. ‘O argumento central que se tem aqui é que, se as empresas jornalísticas, se as empresas de radiodifusão estão sob um regime jurídico, porque os portais de Internet estão sujeitos a outra regra se o objetivo maior é a soberania nacional?’, questionou o consultor. ‘Deveria haver a mesma regra, no mínimo, por isonomia.’


A Associação Nacional de Jornais (ANJ) segue o mesmo raciocínio e alerta para a possibilidade de se configurar uma ‘competição desleal’ entre os veículos de comunicação ‘do mundo real e do mundo virtual’. ‘A preocupação maior do constituinte não era com o meio, não era com o veículo, mas sim com o conteúdo e com quem o domina’, afirmou Tércio Ferraz, especialista em direito e representante da ANJ no debate. ‘Me parece claro que a leitura da Constituição deve ser a mesma nesses dois níveis.’


A advogada Thaís Gasparian, representante da Associação Brasileira dos Provedores de Acesso, Serviços e Informações da Rede Internet (Abranet), concordou com a análise das outras duas entidades. ‘A Abranet entende que, também por meio eletrônico, a distribuição de conteúdo deve ser feita por empresas nacionais’, declarou. Mas o pronunciamento consensual das associações retrata apenas um lado da discussão.


Questão complicada


Para o especialista em Internet e diretor-presidente do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br), Demi Getschko, a implementação desses princípios nas empresas que atuam no universo virtual pode não ser tão simples. ‘Acho que não há como extrapolar isso para o mundo virtual até porque há uma dificuldade de classificar as empresas nesse meio.’ Getschko acredita que uma discussão sobre como classificar essas companhias pode até ser válida, mas é importante encarar que, muitas vezes, não é possível saber sequer quem é o propagador das informações na Internet.


A análise do consultor jurídico do Ministério das Comunicações, Marcelo Bechara, considera esses dois lados da questão. Para Bechara, é importante não encarar a Internet como um meio em si, já que ela é apenas mais uma plataforma para veiculação de conteúdos. Nesse contexto, não seria necessário a análise específica do ambiente da Internet e as leis valeriam tanto para o ambiente real quanto para o virtual, sem que isso leve a um debate sobre a regulação da web. ‘A aplicação das normas é sobre as empresas e não sobre a Internet’, argumentou.


Nenhum dos deputados presentes no debate propôs uma normatização específica da Internet para resolver essa diferença de tratamento. Ainda assim o autor do requerimento, deputado Eduardo Gomes (PSDB-TO), que também preside a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI), onde foi realizada a audiência, chamou atenção para a importância do debate e que o tema não será encarado como um ‘tabu’.


Um dos alvos potenciais de uma eventual aplicação do artigo 222 sobre os portais de Internet é o Terra, empresa do grupo da Telefônica e que tem feito fortes investimentos na produção de conteúdo jornalístico e audiovisual. As empresas foram citadas pelo deputado Emanuel Fernandes (PSDB-SP) em seus comentários na audiência e, embora os participantes não tenham comentado nominalmente sobre os efeitos da ação sobre as empresas da espanhola Telefônica, o representante da Abert fez uma brincadeira que resumiu a preocupação das radiodifusoras com uma provável expansão do capital estrangeiro na divulgação de conteúdos pela Internet. ‘Se ao invés de ver jogo de futebol no domingo a gente passar a ver touradas, não vai ser legal’, brincou Barroso.