Amelia Hill é jornalista e trabalha como repórter especial para o jornal britânico The Guardian. Há alguns meses, junto com o colega Nick Davies, ela ajudou a expor o escândalo dos grampos telefônicos ilegais que levou ao fechamento do tabloide News of the World. Foi a partir da apuração de Davies e Amelia que se descobriu que a adolescente Milly Dowler, assassinada nove anos atrás, havia tido seu telefone invadido pelo jornal quando estava desaparecida. Foi a partir de suas matérias que Rupert Murdoch e seu filho, James, donos da News Corporation, foram chamados a depor no Parlamento britânico; o News of the World, depois de 168 anos, teve suas atividades encerradas; mais de uma dezena de funcionários e ex-funcionários foram detidos; e uma grande investigação da Polícia Metropolitana de Londres foi reaberta, chegando ao impressionante número de quase seis mil vítimas de grampos.
Um mês depois da exposição do escândalo, Amelia escreveu uma matéria sobre a prisão de James Desborough, ex-repórter do News of the World, e a polícia chegou à conclusão de que detalhes da investigação haviam sido vazados para o Guardian. Um detetive da chamada Operação Weeting foi preso e Amelia foi levada a interrogatório.
Polícia e tabloides
Originalmente, a jornalista foi interrogada com base na acusação de que teria induzido um policial a compartilhar informações ilegalmente. Em setembro, no entanto, surgiram rumores de que ela pudesse ser acusada sob o Ato de Segredos Oficiais. Houve grande repercussão e crítica na mídia britânica e polícia acabou desistindo desta acusação – mas ela continuava sob risco de ser processada pela acusação original.
E foi assim que, de repórter investigativa, Amelia Hill tornou-se alvo da polícia e dos tabloides – com direito a fotógrafos acampados na porta de sua casa e a seguindo quando saía para o supermercado.
“Eu fiquei impressionada [com a situação], já que estava apenas fazendo o bom e velho jornalismo”, disse ela em entrevista ao jornalista David Carr, do New York Times [28/11/11]. “Não fiz nada além de falar com uma fonte, sem confirmar ou negar quem é esta fonte, e é chocante que isso seja criminalizado. É algo que ultrapassa o território de ‘Alice no País das Maravilhas’”.
“Amelia não pagou ninguém, não hackeou ninguém e apenas fez seu trabalho como jornalista”, resume Davies. A repórter disse ter ficado surpresa que seu trabalho – que ajudou a revelar ações ilegais dentro de uma organização jornalística – a tenha transformado em alvo. A polícia já encerrou a investigação sobre ela e agora é esperar para descobrir se o processo irá adiante.
Inquérito
Depois do escândalo no News of the World, foi aberto, a pedido do premiê David Cameron, um inquérito para analisar o funcionamento da imprensa britânica e propor soluções para os problemas encontrados nela. Na semana passada, tiveram início no chamado Inquérito Leveson os depoimentos de vítimas de grampos telefônicos e invasão de privacidade. Celebridades – como os atores Hugh Grant e Sienna Miller – e pessoas que se tornaram famosas por circunstâncias trágicas – como o casal McCann, pais da menina Madeleine McCann, desaparecida há 4 anos – se revezaram para repetir histórias parecidas de como suas vidas pessoais foram invadidas sem pudor por tabloides sensacionalistas.
Amelia acredita que o inquérito tem seu valor. Ela lembra que, quando Davies começou a reportar sobre grampos no News of the World, dois anos atrás, o resto da imprensa ficou quieto. “As pessoas morriam de medo de Murdoch e tinham todo o direito de ficar aterrorizadas. Com os políticos de quem era amigo, os jornais e os canais de TV, ele podia punir seus inimigos”.