Esclareço que, na edição anterior, formalizara minha despedida até 2008. Todavia, em razão de o programa Roda Viva, gerado pela TV Cultura e retransmitido pela atual TV Brasil, entregar seu precioso horário no qual a TV brasileira considera que o telespectador não é um indigente à exposição do educador-antropólogo mineiro Tião Rocha – programa exibido em 10/12 –, uma entrevista da qual se espera consistência, senti o ímpeto incontrolável de, antes do término de 2007, uma vez mais, ocupar o espaço do OI.
A condição de educador, com atuação diária, ao longo de 37 anos, conquistada da graduação ao doutorado na Faculdade de Letras da UFRJ, me permite o direito de sentir-me, no mínimo aviltado, por tudo que, como telespectador, me agrediu. Para começar, lamento que, no corpo de entrevistadores do programa, não houvesse nenhum nome à altura de representar a ‘esfera acadêmica’. A partir daí, sou obrigado a ouvir depoimentos que, em nome da crítica ao modelo acadêmico-educacional brasileiro – cujas fragilidades são conhecidas por todos (e não são poucas) – enaltecem as experiências desenvolvidas em Moçambique.
Tenho o direito de ao menos indagar que contribuições as experiências educacionais promovidas em Moçambique trouxeram, até a presente data, para a evolução da humanidade no campo da ciência, da filosofia, da tecnologia? Sinto muito: Tião Rocha não dá para ser o Paulo Freire II.
Na contramão do que preconiza o antropólogo-folclorista-educador Tião Rocha, o Brasil precisa, urgentemente, instituir um modelo educacional sério, disciplinado e rigoroso. Esse é o caminho para o potencial de inteligência nacional ser canalizado para resultados emancipatórios. Não se trata de ignorar o peso do folclore. O que não se pode é elevar o folclore ao estamento da sapiência libertadora.
Educação pela pedra
Não tenho a obrigação de ouvir frases do tipo ‘é preciso convocarmos a sociedade brasileira para que cuidamos da…’. Rigorosamente, estou cheio de ouvir ‘soluções mirabolantes’ (quando não exóticas) a respeito da transformação da educação no Brasil. Também não tenho mais paciência para aturar relatos estatísticos, sejam eles da gestão Paulo Renato (governo FHC), sejam outros da condução gestora de Fernando Haddad (governo Lula), dando conta da ampliação disto ou daquilo. De todos, o que fica é um quadro deplorável no qual o que, efetivamente, se constata é a crescente degradação da qualidade intelectual do cidadão brasileiro.
Se alguém, radicalmente interessado na redefinição do sistema educacional brasileiro, deseja contribuir para a qualificação do sentido da vida no Brasil, não tem o direito de legitimar posições assumidas, por exemplo, pela prefeitura do Rio de Janeiro (DEM), ao instituir aprovação indiscriminada para os alunos do município; e, menos ainda, referendar estratégias educacionais adotadas em Moçambique.
As culturas que, no mundo de hoje, dominam não são aquelas que elegeram o folclore como foco de ‘políticas transformadoras’. Por favor, Tião Rocha, não me venha com ‘educação pela roda’. Se é por esse caminho, fico com ‘educação pela pedra’, lição ensinada pela poética de João Cabral de Melo Neto. Vamos parar de ‘folclorizar’ o Brasil. Não pretendo irritar ninguém, mas não tentem tirar-me do sério.