O Estado de S. Paulo e a Folha de S. Paulo, os dois principais jornais paulistas, trazem em suas edições de sexta-feira (15/2) relatos do incidente que deixou pelo menos dez pessoas feridas na passarela que liga as plataformas das estações do metrô e da linha de trens metropolitanos no bairro de Pinheiros, zona oeste de São Paulo. Os jornais não chamam atenção para o episódio na primeira página, cujo espaço foi ocupado pelos transtornos provocados pela chuva forte; apenas relatam que o problema foi causado por excesso de passageiros.
O evento tem relação com os alagamentos em vários pontos da cidade, que provocaram a interrupção do tráfego na linha 8-Diamante da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos. Além de compor o sistema interligado às cidades da região oeste da Grande São Paulo, como Itapevi e Osasco, essa linha também se conecta com o metrô e com um dos principais terminais rodoviários da capital, o que produz alterações constantes no fluxo de passageiros em alguns dias e horários específicos.
Foi numa dessas ocasiões, no fim da tarde, que a conjugação do grande movimento de passageiros com a necessidade de direcionar para a estação Pinheiros a multidão que vinha de Itapevi e Osasco, que o incidente veio a ocorrer.
Com o alagamento, ficou interrompido o tráfego entre as estações Lapa, na zona oeste, e Barra Funda, no centro-oeste, onde fica o terminal rodoviário. Ao mesmo tempo em que os funcionários da linha metropolitana de trens desviavam milhares de pessoas para a estação Pinheiros, agentes da empresa postados no outro lado da linha interrompida orientavam os passageiros a se dirigirem para a estação Pinheiros do metrô.
Os dois movimentos convergiram para a passarela, que ficou sobrecarregada.
A passarela, coberta e cercada de vidros, fica suspensa sobre o rio Pinheiros e passa sobre a rede elétrica que alimenta o sistema de trens. Por volta das 19h30 da quinta-feira (14/2), sob um intenso temporal, os transeuntes não podiam seguir adiante nem voltar para trás. Alguns passageiros pularam a barreira de vidro, outros escaparam do aperto subindo para o teto da passarela e pelo menos um deles acabou caindo sobre a plataforma, segundo os jornais.
Latas de sardinha
Esse é um relato sucinto, refeito a partir das reportagens dos dois principais jornais de São Paulo e informações de boletins de emissoras de rádio. No entanto, não é possível descrever o que realmente ocorreu com pessoas mais vulneráveis, como mulheres grávidas, idosos, pessoas com crianças ou com dificuldade de locomoção.
O número reduzido de feridos que precisaram ser levados para hospitais não reflete a gravidade do acontecimento, que só não produziu um número maior de vítimas porque os passageiros mantiveram uma ordem possível na circunstância, o que evitou um tumulto que poderia ser trágico. No entanto, os jornais não deveriam parar no relato do incidente, dando a entender que tudo foi consequência das chuvas fortes.
A região metropolitana de São Paulo não tem estrutura para evitar os alagamentos, e isso ocorre também em outras grandes cidades pelo mundo afora. Mas a imprensa precisa se antecipar a futuros incidentes, como tem feito com relação às casas de espetáculos depois do incêndio na boate em Santa Maria (RS), mostrando como certos equipamentos urbanos se transformam em verdadeiras ratoeiras nas ocasiões em que eventos climáticos afetam o planejamento baseado em estatísticas da rotina.
Além da passarela sobre o rio Pinheiros, há outro ponto da rede de transporte sobre trilhos armada para produzir uma tragédia a qualquer momento em São Paulo: trata-se da passagem subterrânea entre as estações Consolação e Paulista, que conecta as linhas Amarela e Verde do metrô. Naquele ponto ocorrem diariamente dois picos de movimento que chegam a se prolongar por mais de uma hora, prendendo os transeuntes como em verdadeiras latas de sardinha.
Os jornais já registraram várias ocorrências de tumultos e correrias, com eventuais feridos, mas ainda não propuseram às autoridades uma revisão do sistema. Os agentes de segurança do metrô muitas vezes são obrigados a atuar como guardas de trânsito de pedestres para organizar as passagens entre as plataformas da estação Paulista, mas claramente a passarela não comporta o volume de pessoas que precisam passar por ali de manhã e no fim da tarde.
A tragédia está esperando para acontecer.