‘Aqui é o mundo do crime. Não se pode sair fotografando assim.’
Foi isso que o bandido armado com um fuzil automático disse aos repórteres de três jornais cariocas que no sábado (26/7) acompanhavam o candidato a prefeito Marcelo Crivella na Vila Cruzeiro (a mesma onde há seis anos foi massacrado o repórter Tim Lopes, da TV Globo).
O bandido gabou-se de entender de tecnologia e exigiu que as fotos fossem apagadas dos cartuchos de memória das câmeras digitais. Nas redações, as fotos foram recuperadas com auxílio dos computadores e publicadas no domingo (27) pelos jornais O Dia, Jornal do Brasil e O Globo.
Vitória da imprensa, sem dúvida: os jornais não capitularam e cumpriram com o seu dever de informar. Mas convém lembrar que há poucos meses, quando repórteres do Dia foram seqüestrados e torturados pelas milícias, o sindicato carioca de jornalistas acusou as empresas de colocar em risco a vida dos profissionais. Equivale a dizer que soldados não devem sair dos quartéis nem bombeiros combater o fogo.
Os jornalistas não cobriam uma blitz, acompanhavam a campanha eleitoral de um país democrático. A sociedade não pode se intimidar, o mundo do crime não pode se impor ao mundo cidadão.
Dito isto, convém registrar que o candidato Marcelo Crivella, senador pelo PRB (base aliada do governo), estava acompanhado de um diligente assessor que tentava encerrar o incidente. ‘Isso não deveria acontecer’, alguns repórteres captaram o comentário do assessor.
Isso não deveria acontecer se o mundo da demagogia não compactuasse abertamente com o mundo do crime.
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Nota do governo do estado do Rio de Janeiro
O direito de ir e vir de quaisquer candidatos e da imprensa é sagrado. Fatos como esse, gravíssimo, tornam evidente a necessidade de combate sem tréguas à criminalidade. As ações do Estado visam justamente a acabar com áreas em que criminosos se acham donos das comunidades. O Poder do Estado tem que ser a referência para as comunidades – e não os bandidos. O combate ao crime no Rio tem que ser incessante e firme para garantir o processo democrático e a livre circulação de toda a população – o que inclui, naturalmente, candidatos e jornalistas no exercício de suas funções.
Toda vez que o livre jornalismo é impedido de atuar é sinal de um Estado de Exceção. Portanto, garantir segurança aos cidadãos é, em última análise, garantir o Estado de Direito Democrático. [26/07/2008, às 19h07]
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Tráfico ameaça jornalistas
Reproduzido da edição digital de O Dia, 27/7/2008
Traficantes da Vila Cruzeiro, na Penha, obrigaram equipes de reportagem de O Dia, O Globo e do Jornal do Brasil a apagarem das câmeras imagens feitas durante corpo-a-corpo do candidato à prefeitura do Rio Marcelo Crivella (PRB) em rua de acesso à comunidade, neste sábado. Os criminosos tinham sido fotografados quando o senador tentava cumprimentá-los durante caminhada na Estrada José Rucas. As imagens foram eliminadas pelos fotógrafos por ordem de rapaz armado de fuzil, mas, graças ao auxílio de um programa de computador, foram recuperadas.
A ameaça aos jornalistas ocorre na mesma favela onde, há seis anos, foi capturado o repórter Tim Lopes, da TV Globo, executado por criminosos. O primeiro compromisso da agenda do candidato ontem era caminhada no Calçadão da Penha, às 10h. O senador chegou com cerca de 50 minutos de atraso ao ponto de encontro, em frente ao Shopping da Penha. Mas, em vez do roteiro combinado, a comitiva seguiu pela Avenida Nossa Senhora da Penha, rumo à Vila Cruzeiro.
Ordem do tráfico
Acompanhado de grupo com bandeiras, o senador caminhava rapidamente e entrou na principal rua de acesso à comunidade. Numa praça, ele tentou apertar a mão de três homens, que recusaram o cumprimento e baixaram a cabeça. Crivella ainda tentou conquistar a simpatia do grupo, passando a mão sobre a cabeça de um deles e seguiu em frente. Os traficantes começaram a gritar para os fotógrafos não tirarem mais fotos. Uma equipe de filmagem acompanhava a comitiva.
Poucos metros depois da praça, um dos supostos bandidos falou ao ouvido do candidato, que não respondeu e seguiu em frente. Nesse momento, o mesmo jovem deu ordens para a imprensa parar. ‘Vamos voltar!’, gritou ele, tentando que os repórteres voltassem à praça. O bandido que tinha sido fotografado disse: ‘Aqui é o mundo do crime’, e que não se ‘pode sair fotografando assim’.
Em seguida, outro jovem que estava no grupo da praça, com gorro, chegou numa moto armado de fuzil. Ele também protestou contra a imprensa, evocando ‘direito de imagem’. ‘Não é assim que se trabalha’, orientou o bandido. Dizendo que ‘entendia de tecnologia’, exigiu que os cartões de memória fossem apagados. Com o fuzil pendurado no ombro, ele viu os profissionais apagarem seus cartuchos e foi embora, junto com os comparsas.
Assessores alegam desconhecer homem que guiava a comitiva
A caminhada do senador Marcelo Crivella pela Penha neste sábado contou com o aparato comum que tem sido usado por sua campanha. Militantes à frente, com bandeiras e panfletos, e locutor com auxílio de megafone chamam a atenção da população para a presença do candidato. Em apoio à comitiva, alguns homens equipados com rádio acompanham o grupo, dando orientações de itinerário e para resguardar o candidato de qualquer incidente. Um deles ontem assumiu outro papel, ao recomendar aos jornalistas que não publicassem a interferência dos traficantes na cobertura do corpo-a-corpo.
O homem, que não foi identificado pela assessoria do candidato, falava o tempo inteiro com o senador. Quando ele tentou entrar em ruela da favela, este acompanhante o desaconselhou, indicando o caminho da rua principal. No alto do lugar, havia grupo de cerca de dez homens armados. No momento em que um traficante mandou a imprensa parar, foi ele quem buscou uma das equipes que tinha se adiantado. Ele acompanhou o bandido armado quando ele exigia a eliminação das fotos.
O homem que acompanhava Crivella desabafou: ‘Não era para isso ter acontecido’. Disse várias vezes para as equipes que não publicassem nada sobre os fatos. Depois, ele apertou o passo e acompanhou os repórteres até a comitiva do senador novamente. A assessoria de Crivella negou que haja segurança para a comitiva e que tenha havido contato com criminosos.
Crivella vai manter visitas a favelas
O senador Marcelo Crivella lamentou o incidente envolvendo os jornalistas e disse não ter notado o fato durante a caminhada. O senador criticou o cerceamento do direito de ir e vir e negou fazer acordo com o crime. Ele contou que passou por situação de risco na própria comunidade há sete ou oito meses.
‘Temos que pedir autorização para entrar na casa de uma pessoa, mas para andar na rua? Andar na calçada? O que é isso?’, declarou o senador, que também foi a Vigário Geral e Parada de Lucas.
Segundo ele, quando visitou um fiel da Igreja Universal na Vila Cruzeiro deparou-se com homem armado de fuzil numa moto e que temeu por sua vida. O bandido foi embora sem disparar. Crivella, que tem um candidato a vereador de sua coligação acusado de receber apoio do tráfico — Claudinho da Academia (PSDC), na Rocinha — disse que o caso precisa ser investigado. O senador afirmou, no entanto, que ainda não conversou com ele sobre as acusações.
O senador criticou candidatos que fazem acordo com traficantes ou milicianos para ter exclusividade de panfletagem em determinadas comunidades. ‘As autoridades políticas, os homens públicos desse País precisam entender que as paixões eleitorais não podem ficar acima dos rumos da nossa sociedade’, afirmou Crivella. O senador disse que vai continuar fazendo campanha em favelas. ‘Eu não desisto. Eu não paro. Vou subir as comunidades todas. Deus há de me guardar e vou levar minhas propostas’, prometeu o candidato.
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Tráfico ameaça jornalistas na Vila Cruzeiro
Reproduzido da edição digital de O Globo, 26/07/2008
Traficantes da Vila Cruzeiro ameaçaram os jornalistas que cobriam a caminhada do senador Marcelo Crivella (PRB), candidato a prefeito, pela principal via do local. Armados com fuzis, eles obrigaram os repórteres-fotográficos do Globo, Jornal do Brasil e O Dia a apagar as fotos. Um deles disse que, se fosse fotografado, iria ‘queimar todo mundo’. A Vila Cruzeiro, no Complexo do Alemão, é o local onde o jornalista Tim Lopes, da TV Globo, foi executado, há seis anos.
Cenário de um ano de conflitos entre polícia e traficantes, com pelo menos 15 mortes, a Vila Cruzeiro foi visitada de surpresa por Crivella, que caminhava pelo calçadão da Penha.
‘Aqui, é vida do crime. Ninguém tem nada a perder’
Logo no início, assessores fizeram o candidato desistir de entrar numa viela, ao perceber a presença de traficantes armados. Mais à frente, ao passar por uma praça, Crivella viu três jovens sentados em torno de uma mesa de concreto e foi tentar cumprimentá-los. Os rapazes baixaram a cabeça e gritaram que não queriam fotos.
Trinta metros adiante, os jornalistas foram abordados por um dos rapazes. O senador, a essa altura, já se afastara. O homem disse que já havia ‘passado um rádio lá para cima’ comunicando a proibição de que os jornalistas seguissem.
– Aqui, é vida do crime. Ninguém tem nada a perder.
Um dos integrantes da comitiva de Crivella ficou com os jornalistas. Pouco depois, outro traficante, de gorro e armado com um fuzil, chegou na garupa de uma moto. Exigiu que os fotógrafos apagassem as fotos:
– Mandei não tirar foto. Entendo de tecnologia. Não adianta enganar. Pode apagar tudo.
O homem armado só foi embora após o comparsa conferir se as fotos estavam apagadas. O Globo apagou as fotos, mas conseguiu recuperá-las e publica as imagens na edição deste domingo. O nome do fotógrafo e do repórter não está sendo divulgado por questão de segurança.
Embora acompanhado por candidatos a vereador da região, Crivella disse não ter negociado o acesso na Vila Cruzeiro e que não recuará da intenção de entrar nas favelas:
– Honestamente, se o cara quiser me dar um tiro, dê, porque não aceito. É o fim do mundo. Na cidade em que a gente mora e onde nasci, a gente pedir autorização. Vou entrando.
O senador Crivella encerrou a caminhada ao saber das cenas de constrangimento, mas disse que continuará indo às comunidades.
– Truculência. Um absurdo. Não tenho palavras para expressar a minha revolta. Como pode, numa cidade onde pagamos impostos, pedir autorização para andar na rua?
Governador vê estado de exceção
O governador Sérgio Cabral (PMDB) divulgou nota afirmando que toda vez que o livre jornalismo é impedido de atuar é sinal de um estado de exceção e que, portanto, garantir segurança aos cidadãos é garantir o estado de direito democrático.
‘O direito de ir e vir de candidatos e da imprensa é sagrado. Fatos como esse, gravíssimo, tornam evidente a necessidade de combate sem tréguas à criminalidade’, diz a nota. Segundo Cabral, as ações do estado visam a acabar com áreas em que criminosos ‘se acham donos das comunidades’.
‘O poder do Estado tem que ser a referência para as comunidades, e não os bandidos. O combate ao crime no Rio tem que ser incessante e firme para garantir o processo democrático e a livre circulação de toda a população, o que inclui, naturalmente, candidatos e jornalistas’, afirma ainda o texto.
Também em nota, a Secretaria de Segurança considerou afronta ao estado de direito e à sociedade organizada as ameaças que bandidos feitas na Vila Cruzeiro:
‘Um dos princípios da política de segurança adotada desde o início de 2007 é o de recuperar áreas carentes sob domínio de traficantes de drogas. É público e notório que a Vila Cruzeiro é uma das áreas a serem reconquistadas’.
Jandira e Gabeira também já estiveram na Vila Cruzeiro
Jandira Feghali, candidata do PCdoB, também esteve na Vila Cruzeiro. Apesar de não ter havido nenhum incidente, uma moto e dois carros com bandidos armados passaram pelo grupo que a acompanhava.
– Se eu não for às comunidades com a minha campanha, estou deixando as pessoas fora do processo eleitoral.
Ao ser informado sobre as ameaças aos jornalistas, o candidato a prefeito Fernando Gabeira, do PV, fez mais uma de suas propostas inusitadas:
– Se for assim, é para liberar geral. Vou propor que todos os candidatos subam a favela juntos – disse Gabeira, afirmando que quando esteve na Vila Cruzeiro apenas lhe pediram para retirar os óculos escuros.
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Jornalistas são ameaçados por traficantes em favela
Reproduzido da Folha de S.Paulo, 27/7/2008
Repórteres e fotógrafos que acompanhavam ontem pela manhã a campanha do candidato a prefeito do Rio de Janeiro Marcelo Crivella (PRB) receberam ameaças de traficantes armados na Vila Cruzeiro, na Penha, zona norte. A abordagem ocorreu depois que um grupo, formado por repórteres e fotógrafos dos jornais O Globo, Jornal do Brasil e O Dia, distanciou-se do senador.
Os profissionais fotografavam o candidato cumprimentando moradores em uma praça da favela quando três homens cobriram os rostos e começaram a dizer que não era para fotografar. O senador os ignorou e seguiu a caminhada.
Um dos homens aproximou-se dos jornalistas e mandou que eles apagassem as imagens feitas no local. Um assessor do candidato que estava com o grupo tentou argumentar que o objetivo não era denunciar ninguém, mas logo chegou uma moto com outros dois homens, um deles armado com um fuzil.
Ameaçados, os jornalistas apagaram as imagens. Após serem liberados, voltaram a se unir a Crivella, que, sem perceber a abordagem, continuara a caminhada. Ao ser informado do ocorrido, o candidato encerrou a caminhada. A pedido dos jornalistas, ele aguardou a chegada dos carros da imprensa antes de deixar a favela.
‘Eu fui caminhando e conversando com as pessoas, quando o repórter veio me dizer que teve de esvaziar a máquina [fotográfica]. Eu não percebi, mas achei revoltante. Ofende a nossa dignidade’, disse. Segundo Crivella, é necessário ‘pedir autorização’ para ‘entrar em determinados locais’ da cidade.
O senador relatou ainda o susto que passou há cerca de oito meses, quando, numa visita à mesma Vila Cruzeiro, um homem na garupa de uma moto veio em sua direção com um fuzil na mão. ‘Ele vinha de longe e sempre na minha direção. Graças a Deus, uns 20 metros antes, tomou outro rumo e desapareceu’, afirmou.
A Vila Cruzeiro faz parte do Complexo da Penha -endereço de 130 mil pessoas de dez comunidades-, que faz divisa com o Complexo do Alemão. Neste ano, já houve mais de 70 mortes em confrontos com a polícia na região.
Como mostrou reportagem de ontem [26/7] da Folha, candidatos a prefeito do Rio têm de ignorar traficantes armados para fazer campanha. Crivella, anteontem, já havia passado, nas favelas do Amarelinho e de Acari, por homens com fuzis e pistolas. Homens armados acompanharam à distância o percurso do senador.
A ex-deputada Jandira Feghali (PC do B) também passou entre homens armados com fuzis quando esteve em campanha, há uma semana, no morro da Mangueira, zona norte.
Em nota, a Secretaria de Segurança disse considerar ‘uma afronta ao Estado de direito e à sociedade as ameaças que bandidos fizeram a jornalistas na Vila Cruzeiro.’ Também por meio de nota, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, disse que ‘o direito de ir e vir de quaisquer candidatos e da imprensa é sagrado’ e que ‘fatos como esse -gravíssimo- tornam evidente a necessidade de combate sem tréguas à criminalidade.’ Para Cabral, sempre que ‘o livre jornalismo é impedido de atuar, é sinal de um Estado de exceção’.
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Traficantes ameaçam jornalistas que acompanhavam candidato no Rio
Reproduzido do Último Segundo, 26/7/2008
Traficantes armados ameaçaram jornalistas que acompanhavam a campanha do senador Marcelo Crivella, do PRB, candidato à prefeitura do Rio de Janeiro, na comunidade de Vila Cruzeiro.
O senador fazia caminhada com eleitores na comunidade quando profissionais de três jornais foram abordados por traficantes, um dos quais estaria armado com um fuzil, segundo o jornal. Eles obrigaram os repórteres-fotográficos de O Globo, Jornal do Brasil e O Dia a apagar as fotos da cobertura.
Marcelo Crivella, que resolveu fazer uma visita surpresa à Vila Cruzeiro, não viu o incidente, segundo sua assessoria de imprensa. Ele teria tentado cumprimentar três jovens que estavam sentados em uma mesa de concreto em uma viela, quando ouviu que eles não queriam fotos. Em seguida, um dos rapazes abordou os repórteres e informou que eles não tinham a autorização do tráfico para tirar fotos da localidade.
Logo depois, um traficante chegou na garupa de uma moto, armado com um fuzil, e checou o equipamento dos jornalistas. Em entrevista ao jornal O Globo, o senador Marcelo Crivella disse que continuará indo as comunidades do Rio. ‘Truculência. Um absurdo. Não tenho palavras para expressar a minha revolta. Como pode, numa cidade onde pagamos impostos, pedir autorização para andar na rua?’, questionou.
Governo divulga nota
Em nota, o governo do Rio disse que o episódio era gravíssimo. De acordo com o comunicado assinado pelo governador Sergio Cabral, ‘o direito de ir e vir de candidatos e da imprensa é sagrado. Fatos como esse, gravíssimo, tornam evidente a necessidade de combate sem tréguas à criminalidade.’
‘As ações do Estado visam justamente a acabar com áreas em que criminosos se acham donos das comunidades. O Poder do Estado tem que ser a referência para as comunidades – e não os bandidos. O combate ao crime no Rio tem que ser incessante e firme para garantir o processo democrático e a livre circulação de toda a população – o que inclui, naturalmente, candidatos e jornalistas no exercício de suas funções’, diz a nota.
O jornalista Tim Lopes, da TV Globo, foi assassinado, há seis anos, na Vila Cruzeiro, comunidade situada no conjunto de favelas do Complexo do Alemão.