Por unanimidade, a 5ª Câmara Cível Isolada do Tribunal de Justiça do Estado confirmou a sentença de 1º grau, da 4ª Vara Cível de Belém, negando a apelação interposta contra essa decisão por Ronaldo Maiorana. O executivo do grupo Liberal queria a condenação do Diário do Pará e minha, em ação que propôs em 2005.
Alegava que o jornal e eu o ofendemos no vasto noticiário sobre a agressão física que sofri, praticada pelo diretor do jornal O Liberal, em 21 de janeiro daquele ano, no restaurante do Parque da Residência, que é local público, onde está a sede da Secretaria de Cultura do Estado.
Além de cobrar indenização pelos danos morais que teria sofrido, Ronaldo Maiorana queria que a justiça impusesse – ao Diário e a mim – nos abstermos ‘de praticar atos que impliquem em calúnia, injúria e difamação’ contra si. Mesmo não tendo exercido o direito de resposta quando da publicação das reportagens, o diretor corporativo de O Liberal reivindicava ainda que o poder judiciário determinasse a publicação de carta sua no jornal da família Barbalho.
Todos os pedidos foram rejeitados à unanimidade pelos desembargadores da câmara cível. Para eles, não houve qualquer abuso no exercício do direito de informação. Maiorana foi condenado ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, arbitrados em 10% do valor da causa.
O voto da relatora na câmara, desembargadora Luzia Nadja Guimarães do Nascimento, acompanhada pela desembargadora Helena de Azevedo Dorneles e pela juíza convocada Elena Farag, é o seguinte, na íntegra, apenas com a exclusão de detalhes da técnica jurídica:
Ronaldo Maiorana e outros apresentam recurso de apelação cível nos autos de ação de indenização por danos materiais e morais cumulada com tutela inibitória e antecipatória inconformados com a sentença de primeiro grau que reconheceu a ilegitimidade passiva de Lúcio Flávio de Faria Pinto, extinguindo o processo sem julgamento de mérito quanto a ele e que julgou totalmente improcedente os pedidos formulados contra o segundo demandado, Diário do Pará Ltda. Ademais, condenou os autores, ora apelantes, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, deixando de aplicar sanção por litigância de má-fé por entender descaracterizada.
Os apelantes pedem a anulação da sentença recorrida por entenderem ter havido cerceamento de defesa, uma vez que a magistrada de piso não acolheu pedido de produção de provas testemunhais e julgou antecipadamente a lide.
Alternativamente, requerem a reforma da sentença quanto ao primeiro recorrido considerando caber-lhe responsabilidade pela publicação de suas palavras no jornal editado pela segunda recorrida. Sendo, por conseguinte, parte legítima da demanda, deve pagar a indenização pleiteada pelos apelantes por distorcerem os fatos ocorridos e opinar, abusando do direito de criticar, e ainda ofender causando dano moral.
É a mesma razão, informam os apelantes, que a sentença merece reforma para condenar, também, o segundo apelado ao pagamento de indenização por danos morais.
Requerem, por derradeiro, a condenação por danos materiais pelo disposto no artigo 953, parágrafo único do Código Civil, bem como reforçam o direito dos apelantes à resposta requerida na inicial, não obstante a ausência de pedido extrajudicial.
Lúcio Flávio de Faria Pinto apresenta contra-razões, sustentando o acerto da decisão recorrida quanto à sua ilegitimidade passiva e a inexistência de danos materiais e/ou morais. Por tudo, requer a rejeição e a confirmação integral da sentença recorrida.
Diário do Pará Ltda., por seu turno, apresenta contra-razões, arguindo que não houve cerceamento de defesa e, na eventualidade dele ser considerado, a inexistência de danos morais e/ou materiais.
Voto
Sobre a questão fática exposta na lide, tem-se que o apelante Ronaldo Maiorana agrediu fisicamente o primeiro apelado [Lúcio Flávio Pinto] em 21 de janeiro de 2005, no restaurante Parque da Residência em Belém. Deste fato notório, deu-se publicidade por diversos meios de comunicação, sendo que nos dias 22 a 29 de janeiro e 02 e 03 de fevereiro daquele ano, o jornal sob responsabilidade da segunda apelada [Diário do Pará] publicou reportagens que no entender dos apelantes extrapolaram a narrativa dos fatos ocorridos e causaram abalos morais e materiais devidos de reparação.
Requereram, ainda, tutelas específicas consistentes em direito de resposta em periódico do segundo apelante no mesmo número de edições em que houve a alegada violação da honra e em determinar tutela inibitória para que os réus se abstenham de praticar atos que impliquem em calúnia, injúria e difamação dos autores, ora apelantes.
A sentença guerreada expôs, inicialmente, os contornos constitucionais da liberdade de manifestação do pensamento, de expressão e de informação, bem como o direito à honra e à imagem.
Depois entendeu não ter sido o primeiro apelado responsável por qualquer das publicações acusadas de violadoras da honra e da imagem dos apelantes, pelo que julgou que o primeiro recorrido não tinha legitimidade passiva para figurar na lide e determinou sua exclusão da mesma com extinção do processo sem resolução de mérito quanto a ele.
Acerca da segunda apelada, entendeu que o jornal publicou a narrativa dos fatos que importavam em interesse de seus leitores por tratar-se de evento com vias de fato envolvendo o apelante Ronaldo Maiorana e o primeiro apelado, Lúcio Flávio de Faria Pinto, ambos conhecidos repórteres e personalidades de renome no meio social regional.
Diante da repercussão dos acontecimentos publicou-se opinião de diversas pessoas que ou estiveram presentes aos acontecimentos, por ter se dado em local público, ou reverberavam os acontecimentos.
Acrescenta que o assunto ainda ganhou outras dimensões porque foi objeto de persecução criminal que resultou em transação penal com a aplicação imediata de pena restritiva de direito, na modalidade de pena pecuniária, no valor de R$ 6.500,00 (seis mil e quinhentos reais), convertida em doação de cestas básicas a instituições carentes. Tudo para concluir que as matérias vinculadas com apuração dos fatos, divulgação de opiniões, juízos de valor de pessoas físicas e jurídicas e a elaboração de crítica jornalística sobre o assunto não se configuram em abuso do direito de informação. Tendo, por conseguinte, o segundo apelado agido no exercício regular do direito de expressão e informação, não se reconhecendo ato ilícito danoso à honra e à imagem dos autores [ora apelantes] a ensejar a imputação da responsabilidade civil e a conseqüente indenização, seja por danos materiais, morais ou à imagem.
Estando nestes termos rememorados os acontecimentos. Os recorrentes apresentam como primeira tese recursal a anulação da sentença por ter-lhe restringido o direito de defesa, uma vez que dispensou a produção de prova testemunhal e julgou antecipadamente a lide.
Sobre o assunto já tive oportunidade de me manifestar em outros julgamentos que as partes têm o direito de requerer a produção de provas que entender úteis para demonstrar seu direito, mas que a pretensão é dirigida sempre ao magistrado, pois de toda forma é a ele que se dirigem os elementos de convicção.
Isto posto, não resulta necessariamente em cerceamento de defesa o indeferimento do pleito, mormente quando, como no caso dos autos, estão plenamente esclarecidos os fatos e acontecimentos havidos quanto ao pedido indenizatório dos apelantes. Sobre o assunto manifestou-se expressamente a magistrada:
‘Nas lides que versam sobre a responsabilidade por supostos danos causados por publicações veiculadas por órgãos de imprensa, compreende-se que não há necessidade de dilação probatória, porquanto o elemento de prova essencial se identifica com o conteúdo do material jornalístico, que definirá com exclusividade a ocorrência da ofensa aos direitos reclamados, o que é suficiente e necessário para a resolução deste caso concreto, já que se encontra instruído com os exemplares do periódico correspondente’.
Nestes termos, sendo vigente em nosso direito processual o sistema do livre convencimento motivado do juiz, não há razão para acolher a pretensão anulatória do apelante, pois não houve qualquer prejuízo na fundamentação da sentença recorrida quanto à convicção que formou.
Isto posto, rejeito o primeiro argumento recursal por não encontrar razão para anulação da sentença recorrida por cerceamento de defesa.
Em pedido recursal secundário, os recorrentes apontam errores in judicando ao entender haver responsabilidade do primeiro apelado pelas informações passadas ao jornal vinculador que narrou fatos distorcidos e abusar do direito de criticar, ofendendo os recorrentes e causando-lhes danos moral.
Sobre o que se pôde apurar dos autos, não acredito ter havido erro de julgamento da sentença recorrida quanto à exclusão do primeiro apelado da lide processual por ilegitimidade passiva, pois, rememorando os termos em que a mesma foi lançada:
‘Todas as reportagens acoimadas de ofensivas foram veiculadas pelo jornal Diário do Pará, não tendo o segundo demandado assinado a autoria de nenhuma delas. Seu ato foi apenas de, mediante entrevista, expor sua versão dos fatos acontecidos no dia 21 de janeiro de 2005 no restaurante Parque da Residência, nesta cidade de Belém-PA, onde Houve contenda com vias de fato envolvendo ele e o autor Ronaldo Maiorana’.
Não ficou demonstrada a ligação necessária entre as reportagens apontadas como violadoras da honra e imagem dos recorrentes com a autoria das mesmas pelo primeiro apelado, não havendo como imputar-lhe qualquer responsabilidade nos termos da bem lançada sentença monocrática.
À segunda tese recursal melhor sorte não acomete. Vejamos.
Requerem os recorrentes a reforma da sentença para responsabilizar os recorridos pelas publicações que entende ofensivas e violadoras de seu direito à honra e à imagem. Tudo a determinar a reforma da sentença e condenação dos apelados ao pagamento de indenização.
Estando confirmada a sentença quanto à ilegitimidade passiva do primeiro apelado, resta neste ponto prejudicado o requerimento recursal. Não obstante manter-se válido quando ao segundo apelado, entendo não caber razão aos recorrentes, pois as matérias veiculadas não chegam a ofender-lhe a honra, pois circunscrevem-se no constitucional direito de liberdade de expressão e informação jornalística, que ganha dimensão própria na espécie pelo subjetivismo das partes envolvidas no evento acontecido em 21 de janeiro de 2005.
Não visualizo nas publicações intenção do segundo apelado em ferir direito do particular, mas narrar os fatos com a dimensão e notoriedade que os mesmos ganharam na sociedade local, que ponderadamente encontram sustentação fática e constitucional.
Por todo o exposto, conheço do recurso e nego provimento, mantendo-se todos os termos da decisão recorrida.
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Jornalista, editor do Jornal Pessoal (Belém, PA)