Se você faz parte dos 87% que apoiavam o governo Lula, fique alerta – no mais escondido covil de serpentes e escorpiões trama-se um golpe institucional contra o governo de Dilma, mesmo se esse governo começou com 62% de aprovação popular. Desta vez, ao contrário do golpe de 1964, não se trama nos quartéis com o apoio declarado dos Estados Unidos. A trama é bem mais sutil – não se acena com a paranoia do perigo vermelho, mas com base em pretensos arrazoados jurídicos se quer desmoralizar e desautorizar o ex-presidente Lula e colocar no ridículo a presidenta Dilma, que será destituída do poder de decisão.
O golpe não parece financiado só por dólares americanos, como no passado, mas por euros vindos da Itália. Aparentemente trata-se da extradição ou não extradição de um antigo militante italiano, Cesare Battisti, condenado num processo italiano fajuto à prisão perpétua, mas a verdade submersa do iceberg é bem outra.
Quem leu as revelações do WikiLeaks quanto às opiniões dos EUA sobre Lula, considerado suspeito, e Celso Amorim, considerado antiamericano, e acompanhou a campanha contra a eleição de Dilma, sabe muito bem haver interesses de grupos internacionais em provocar uma crise institucional no Brasil. Será também a maneira de grupos econômicos estrangeiros impedirem a atual emergência do país como potência mundial. A Itália neofascista de Berlusconi, com seu desejo de recuperar um antigo militante esquerdista, é apenas um providencial pretexto para os grupos políticos e econômicos internacionais incomodados com o Brasil líder do G-20 e vitorioso contra os EUA na OMC.
‘Abalo à soberania’
O que se quer agora, com o caso Battisti, é subverter as instituições brasileiras, mergulhar o país numa confusão entre o poder do Executivo e o poder do Judiciário, anular uma decisão do ex-presidente Lula, para se abrir o caminho a que governança do Brasil seja sujeita à aprovação do STF. Para isso conta-se, como em 1964, com os vendilhões da nossa soberania e com os golpistas da grande imprensa.
Simples e prático, para se evitar que a presidenta Dilma governe, vai se tentar lhe por um cabresto e toda decisão sua que desagrade grupos internacionais deverá ser anulada pelo STF. Por exemplo, a questão da exploração petrolífera do pré-sal poderá ser uma das próximas ações confiadas ao STF. Se Dilma quiser renacionalizar as comunicações, já que a telefonia é questão estratégica, o STF poderá dizer ‘Não’ e também optar pela privatização da Petrobras. Delírio? Não, os neoliberais inimigos de Lula e da política nacionalista, derrotados nas eleições, poderão subrepticiamente retirar, pouco a pouco, os poderes da presidenta e do Legislativo, para que fique apenas com o STF o governo ou o desgoverno do Brasil.
O próprio advogado de Cesare Battisti, acostumado com leis e recursos, nunca viu uma decisão presidencial ser posta em dúvida por um ministro do STF, e por isso falou em ‘golpe’ tal como havíamos alertado. Por sua vez, o atual governador do Rio Grande do Sul, que aceitou o pedido de refúgio de Battisti quando ministro da Justiça, não aguentou a decisão do ministro Cezar Peluso, do STF, de colocar em questão a validade da decisão do presidente Lula e declarou como ‘ilegal’ e ‘ditatorial’ o ato do ministro Peluso, do qual decorre um ‘prejuízo institucional grave’ para o país e um ‘abalo à soberania nacional’.
Hora de reagir
Faz dois anos, Tarso Genro concedeu refúgio a Battisti, que deveria estar em liberdade desde essa época. Mas o ato liberatório foi sustado pelo ministro Gilmar Mendes, que submeteu a questão ao STF, o que já constituía um ato arbitrário. Embora os ministros tenham decidido por 5 a 4 pela extradição, competia ao presidente a decisão final, o que foi reconhecido, depois de uma tentativa de reabertura do julgamento.
O presidente Lula, justificando seu ato, dentro do permitido pelo Tratado mútuo de Extradição entre Brasil e Itália, com base num documento da Advocacia Geral da União, negou a extradição e a própria Itália entendeu o ato como definitivo. Ora, a decisão do ministro Cezar Peluso de pôr em dúvida a decisão do presidente Lula e reabrir a questão vai além de sua competência e fere uma decisão soberana. É tentativa ou já é golpe. No entender do advogado Luiz Roberto Barroso, é ilegal e ditatorial; assim como para o ex-ministro da Justiça Tarso Genro, opiniões que vão no mesmo sentido de Dalmo Dallari e de outros juristas.
O que iremos viver, quando o ministro Gilmar Mendes se dignar a colocar na agenda do STF o ‘julgamento da decisão do presidente Lula’, se a maioria, por um voto que seja, decidir anular a decisão de Lula ? Será que a presidenta Dilma aceitará essa intromissão do STF no poder do Executivo ? Em todo caso, será o caos.
É hora de reagir, antes que seja tarde demais.
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Jornalista e escritor