Thursday, 21 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Um jornalista avesso ao outro lado

Em artigo publicado neste Observatório da Imprensa (‘A tentativa de censura ao Gagged‘), o jornalista Daniel Florêncio afirma que houve tentativa de censura ao seu filme Gagged in Brazil por parte do PSDB de Minas Gerais.

Em julho do ano passado, enviei carta à direção da Current TV, solicitando à emissora americana que veiculasse um vídeo de nossa iniciativa que questionava diversos aspectos do trabalho feito por Florêncio. Era o ‘outro lado’ a respeito de um trabalho em relação ao qual tínhamos profundas divergências. A essa carta (veja a íntegra em seguida), anexei uma cópia DVD do nosso vídeo, então já veiculado no YouTube (aqui, o link em português).

Em resposta à grave e infundada acusação que nos está sendo feita por Florêncio, estou tomando a iniciativa de divulgar o texto que remeti, na época, à Current TV e que se constitui no único contato que fizemos com a emissora. Ali está, preto no branco, ao alcance do entendimento de qualquer cidadão de boa fé: meu pedido era para que a Current TV veiculasse também o nosso vídeo.

Retomo o que escrevi, citando um trecho daquela carta: ‘É por acreditar que a Current TV compartilha do compromisso com a democracia, a liberdade de imprensa e a coexistência de pluralidade de pontos de vista que estamos sugerindo a essa emissora que também veicule um vídeo produzido recentemente em resposta ao Gagged in Brazil.’ Dizia mais: ‘Tudo o que estamos sugerindo aqui é isonomia de tratamento.’

‘Falta de liberdade’

De onde, portanto, Daniel Florêncio concluiu que pedimos à Current TV que tirasse o vídeo dele do ar?

A acusação feita contra nós por Florêncio é falsa. E isso é grave. É muito grave quando um jornalista movido não se sabe por quais motivações ou objetivos contraria o preceito básico da profissão de respeito à realidade e passa a agir e reagir em função de ‘informações’ inventadas.

Acusações de prática de censura são sempre muito graves, principalmente quando não têm amparo na realidade.

Apenas para situar o contexto para quem não acompanhou a controvérsia, o Gagged in Brazil de Daniel Florêncio dizia ter a pretensão de tratar ‘da falta de liberdade de imprensa e das relações entre a mídia no Brasil e, especialmente, em Minas Gerais com o governo Aécio Neves’, para usar as palavras do autor.

Estigmatizar os que divergem

Na época, vimos o filme, discordamos e optamos por fazer exatamente a mesma coisa que Florêncio: divulgar o nosso ponto de vista na internet. O filme que fizemos procura demonstrar por que, na nossa opinião, o trabalho de Florêncio não refletia a realidade. Enviamos este filme para os mesmos dois espaços utilizados por ele – a Current TV e o YouTube – na expectativa de que as pessoas interessadas no tema pudessem ter acesso a pontos de vista diferentes sobre o mesmo assunto.

Fizemos isso, tendo em vista a importância do tema tratado e pelo fato de considerarmos que o trabalho dele não contemplava os diversos lados da questão. Por exemplo, dos 8 minutos e 36 segundos do filme de Florêncio apenas 18 segundos foram destinados ao que se convencionou chamar no jornalismo de ‘o outro lado’. E nesses 18 segundos, as aspas se abriram para acolher – em 11 palavras em inglês e nove palavras na tradução em português – a posição do governo de Minas e a da TV Globo sobre o assunto. Quanta generosidade para se ouvir ‘o outro lado’…

Não deixa também de ser curioso que a nossa simples tentativa de divulgar um ponto de vista diferente do dele, seja interpretada como uma tentativa de censura, justamente pelo autor de um trabalho que se apresenta como sendo em ‘defesa da liberdade de expressão’. Afinal, a liberdade de expressão não pressupõe exatamente isso: espaço para manifestação das diferenças? Por que Florêncio pode manifestar a sua opinião e outros não podem? Por que ele está tentando estigmatizar como censores os que dele divergem?

Original da carta remetida à Current TV

Escrevo respeitosamente sobre a veiculação do vídeo Gagged in Brazil, que vem sendo veiculado nas últimas semanas pela prestigiosa emissora Current TV e conta com amplo acesso também por meio do You Tube e outros sites da internet.

A censura durante a ditadura no Brasil é um fato de triste memória para muitas gerações de brasileiros. Em particular nos anos 70, o regime militar mantinha policiais explicitamente dentro de redações de jornais diários com objetivo de aprovar ou vetar os textos escritos pelos jornalistas. Ao mesmo tempo, veículos semanais eram obrigados a enviar toda sua produção para aprovação prévia em Brasília, a capital federal. As emissoras de TV tinham um index prohibitorum, atualizado com freqüência por telefonemas procedentes dos órgãos de repressão. Procedimentos semelhantes a esses se encarregavam também de tentar silenciar o teatro, a literatura e a música popular, entre outras manifestações culturais. Felizmente, há muito tempo, a luta pela democracia empreendida por toda a sociedade civil brasileira deu um basta nessa truculência contra a liberdade de expressão e de imprensa no Brasil.

Faço essa breve visita ao nosso passado sombrio para registrar a perplexidade que muitos brasileiros vêm experimentando ao assistir o vídeo Gagged in Brazil. Afinal, estaria mesmo a censura de volta ao nosso País, mais propriamente no Estado de Minas Gerais, conforme assegura o vídeo da Current TV? Essa perplexidade se justifica inicialmente pelo fato de que não estamos falando de uma região que vive em isolamento nos longínquos destinos desse imenso Brasil. Trata-se de Minas Gerais, localizado no coração do País, distante apenas 464 km do Rio de Janeiro, 586 km de São Paulo e 740 km de Brasília. Um Estado que tem mais de 19 milhões de habitantes e é a segunda economia mais dinâmica do Brasil. Num País que restabeleceu a democracia plenamente e é governado por um presidente operário e de esquerda, é possível mesmo que haja a prática da censura? Com essa indagação em mente é que devemos avaliar o conteúdo de Gagged in Brazil.

É por acreditar que a Current TV compartilha do compromisso com a democracia, a liberdade de imprensa e a coexistência de pluralidade de pontos de vista que estamos sugerindo a essa emissora que também veicule um vídeo produzido recentemente em resposta ao Gagged in Brazil.

É um sacrossanto princípio da imprensa entrevistar os acusados e dar direito a que eles se manifestem. No caso do Gagged in Brazil, o lado dos acusados teve direito a exatamente 9 palavras, conforme se pode contar. Além disso, impressiona o uso incorreto de gráficos e moedas, bem como a veiculação de trechos de testemunhos de profissionais já publicamente desmentidos antes por eles próprios. O novo vídeo ao qual estou me referindo chama-se Censura em Minas: Novo. Por seu intermédio, o público da Current TV poderá ter uma visão mais abrangente da realidade em Minas Gerais e no Brasil, a fim de formar seu conceito sobre a existência ou não de censura. Tudo o que estamos sugerindo aqui é isonomia de tratamento, para que o público da Current TV não se deixe levar por um vídeo acusatório que faz eco às disputas políticas em curso no Brasil atualmente.

Reinaldo Oliveira Batista, presidente da Juventude do PSDB-MG

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Professor, Belo Horizonte, MG