Os principais jornais do país dedicam bastante espaço, nas edições de quinta-feira (17/11), às análises de dados dos questionários mais complexos do Censo 2010, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O Estado de S.Paulo e a Folha de S.Paulo colocam seu foco na tendência à redução do número de filhos e à projeção de queda no crescimento populacional, enquanto o Globo escolhe como ponto central uma questão trágica, mal resolvida e preocupante do Brasil contemporâneo: o número elevado de mortes violentas de jovens brasileiros do sexo masculino.
O retrato do Brasil que surpreende o mundo com seu desempenho econômico ainda tem aspectos característicos de países subdesenvolvidos, como os altos índices de desigualdade social, que, embora decrescentes, seguem representando grandes abismos entre os brasileiros.
Embora se possa detectar um aumento geral da qualidade de vida, constata-se que o país cresce de maneira desigual não apenas quando se comparam as grandes regiões. Mesmo em áreas mais restritas, pode-se notar que o crescimento da renda ainda se caracteriza pela desigualdade, o que se reflete em outras medidas de qualidade de vida.
Mais velhos
Mas o que parece preocupar mais a imprensa, de modo geral, são os aspectos demográficos e não os econômicos ou sociais. A postergação do casamento e da maternidade, por exemplo, com um número mais baixo de mães adolescentes, é um dos destaques das reportagens, que ressaltam o fato de que, ao evitarem a gravidez precoce, as mulheres brasileiras se mostram mais preparadas financeira e emocionalmente para assumirem suas próprias famílias.
A redução da taxa de fecundidade, aspecto mais destacado pela Folha e o Estadão, é uma característica que começou a se manifestar ainda nas décadas de 1970 e 1980 e que se consolida como tendência desde o início deste século.
Entre 2000 e 2010, o número de filhos por mulher caiu da média de 2,38 para 1,86, o que faz os demógrafos projetarem um ponto de equilíbrio entre o número de nascimentos e o de óbitos para a década de 2030. Nesse ponto, a população brasileira vai parar de crescer e as necessidades do país serão de outra natureza.
O Brasil precisa se preparar para oferecer infraestrutura adequada para o envelhecimento da população no futuro muito próximo.
Desigualdade de renda
Mas há outro aspecto, que diz respeito ao momento presente, e que foi relativizado pelos jornais, com exceção do Globo: os dados do IBGE mostram a persistência de um índice excessivo de mortes violentas entre os jovens do sexo masculino com idades de 20 a 24 anos. Nessa faixa etária, morrem quatro vezes mais homens do que mulheres de causas externas, como homicídios e acidentes de trânsito.
Por essa razão, torna-se ainda mais importante que a imprensa leve adiante os debates sobre o controle do uso de bebidas alcoólicas, a criação de estratégias eficientes para melhorar a segurança no trânsito e, principalmente, a prevenção nos eventos com potencial para gerar conflitos, como jogos de futebol.
Alguns estados, como Alagoas, se destacam nesse aspecto mórbido, com uma concentração atípica de mortes violentas de homens jovens. Um levantamento inédito do IBGE revela que em 2010 morreram naquele estado 798 homens para cada grupo de cem mulheres na faixa entre 20 e 24 anos.
Um estudo concentrado nas causas dessa mortandade pode ajudar a produzir estratégias não apenas para conter a violência em Alagoas, mas também para estabelecer algum controle no resto do país. Trata-se, porém, de um desafio que não se resolve apenas com políticas públicas: este é o ponto em que a mídia pode dar uma grande contribuição, como tem feito em outras questões sociais, ao divulgar produções audiovisuais que combatem a homofobia, o preconceito racial e outras questões.
Os novos dados do Censo 2010 apontam também indicadores muito auspiciosos, como a redução do número de jovens fora das escolas. No aspecto econômico, registra-se a melhoria do ambiente de negócios, com a redução da informalidade e maior capacidade dos brasileiros para produzir riqueza. No entanto, persistem os vícios do modelo de desenvolvimento, com uma concentração de renda inaceitável: 1% dos brasileiros mais ricos são donos de uma renda que, somada, é maior do que a soma da renda dos 40% mais pobres, ou seja, cada cidadão no topo da pirâmide financeira possui uma renda igual à de 40 brasileiros na faixa mais pobre.
Embora seja temerário fazer diagnósticos amplos com base em dados parciais, pode-se afirmar que o Brasil está no caminho do desenvolvimento, mas ainda tem que lidar com desafios cruciais.
A boa notícia é que os problemas persistentes podem ser resolvidos com políticas públicas adequadas, com investimento e, principalmente, com o engajamento da sociedade.