Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Um serviço que não tem preço

Nem a melhor das assessorias de imprensa nem os mais hábeis marqueteiros seriam capazes de prever o efeito que uma cirurgia plástica pode fazer por seu candidato quando se trata de ganhar espaço na mídia. O serviço que a imprensa prestou à ministra Dilma Rousseff não tem preço: transformou-a, do dia para a noite, em mais uma celebridade brasileira. Daquelas que são notícia porque usam roupa de determinado costureiro, porque têm um namorado mais jovem ou porque mudaram seu visual com uma dieta rigorosa, uma aplicação de botox ou uma plástica rejuvenescedora. Isso, é claro, quando a celebridade é mulher. Aquelas celebridades que povoam as revistas de fofoca, injustamente classificadas como revistas femininas, que se amontoam nos consultórios médicos e salões de beleza.

A ministra começou a ganhar destaque na mídia quando foi nomeada ‘mãe do PAC’. Até então, com seu passado de guerrilheira e sua fama de rigorosa, só aparecia no noticiário político. O que, convenhamos, é pouco para quem quer seguir os passos do presidente Lula e se tornar uma líder popular, capaz de ganhar votos suficientes para se eleger presidente da República.

Quando o presidente chamou Dilma de ‘mãe do PAC’, a imprensa até denunciou a tentativa de torná-la um produto mais palatável ao eleitorado. Até então, com pouco efeito. Parece que o milagre pretendido pelo governo acabou acontecendo. Com a reforma visual, Dilma passou a fazer parte do imaginário popular, todo mundo querendo conhecer mais de perto o resultado da plástica que mereceu capa de todos os jornais e destaque nas revistas semanais.

Apenas ‘umas pinceladas’

Se a intenção da ministra era ganhar espaço na imprensa, até que o preço foi pequeno. Descontada a invasão de privacidade – coisa que não parece incomodar os políticos –, teve um resultado extraordinário, pois faz mais de um mês que os fotógrafos procuram o melhor ângulo e as revistas, quando não têm o que dizer dela – como a revista Veja –, publicam a foto explicando que, ‘livre do inchaço’, a ministra começa sua campanha à Presidência da República.

O efeito foi tão forte que até na hora de comprar uma foto-montagem (da ministra com o presidente e o pagante no meio) os candidatos perguntavam: a foto dela é de antes ou depois da plástica?

Resta saber se, agora que o visual da ministra e sua candidatura foram assimilados, a imprensa vai continuar tratando a candidata como celebridade, chegando ao absurdo de contar ao público o tipo de cuidados que ela tem ao freqüentar salão de beleza: ‘Ao fazer as unhas, não gosta que suas cutículas sejam retiradas em excesso. Pede apenas umas pinceladas. Ela tem verdadeiro horror que seus pés, sempre em sapatos fechados, sejam lixados’ (O Estado de S. Paulo, 8/2/2009).

Preferências e salões de beleza

Resta saber também se esse tratamento é exclusivo para mulheres ou para candidatos apoiados pelo governo. E os outros candidatos? Se as cutículas de Dilma são notícia, o que terão a oferecer os governadores de São Paulo e Minas, os nomes mais falados do PSDB para a disputa presidencial? O que podem fazer os candidatos homens para ganhar espaço na mídia: plástica, tratamento de beleza, implante de cabelo, uma namorada nova e célebre? Ou será que vai chegar o dia em que a imprensa vai se concentrar no que interessa: o que esses candidatos – e a candidata do governo – têm a oferecer como propostas de governo?

Certamente todos eles – inclusive a ministra Dilma – merecem mais da imprensa do que notícias sobre suas preferências pessoais e a imagem que é feita artificialmente por cirurgiões plásticos ou salões de beleza.

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Jornalista