Monday, 23 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Um ‘furo’, sete anos depois

Domingo, 4 de março de 2001: o jornal mineiro O Tempo destaca, na capa do caderno de cultura ‘Magazine’ e com chamada na primeira página, reportagem que revelava em absoluta primeira mão na imprensa a existência de um caderno inédito de anotações feitas pelo escritor João Guimarães Rosa quando exercia o cargo de vice-cônsul do Brasil em Hamburgo (Alemanha), durante a Segunda Guerra Mundial. Trechos dessas anotações, livremente chamados ‘Diário de Guerra’, foram publicados na mesma edição.

Fevereiro de 2008: a revista Bravo! publica, como matéria de capa de sua edição desse mês, texto de conteúdo análogo reivindicando a primazia da divulgação das anotações rosianas que, de fato, ainda continuam inéditas em livro, mas cuja existência já havia sido revelada desde 2001 por O Tempo. Autor da matéria original, tomei a iniciativa de escrever para a seção ‘Cartas’ da revista, solicitando fosse desfeito o equívoco e dado a quem de direito o crédito pelo ineditismo da revelação. Fiz também acompanhar minha carta de imagem em PDF da capa de ‘Magazine’ daquela data.

Questão ética

Não por coincidência, a seção ‘Cartas’ da edição de março de Bravo! foi inteiramente dedicada ao ‘Diário de Guerra de Guimarães Rosa e suas repercussões’ (sic), seguida do seguinte bigode: ‘Leitores comentam a publicação, com exclusividade, das anotações feitas pelo escritor mineiro durante a Segunda Guerra’. Surpreendentemente, minha correspondência sequer é mencionada entre tantas ali publicadas.

Bravo! não tinha a obrigação de ter conhecimento da reportagem anterior de O Tempo, mas uma vez informada do fato, teria a obrigação de registrá-lo. Lamento que o elegante senhor da foto que ilustra a seção ‘Carta do Editor’ da revista, postulando ‘a arte de defender idéias de forma clara, atraente e elegante’, não tenha tido a elegância de reconhecer um furo de sete anos, que a revista insiste em ignorar, reiterando o ‘ineditismo’ da revelação por Bravo! dos ‘Diários de Guerra’. Acho que esse desabafo se justifica por tangenciar uma questão ética crucial no jornalismo, que é o reconhecimento do mérito de quem dá a notícia em primeira mão.

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Jornalista, Belo Horizonte, MG