Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Uma nova configuração entre sociedade e informação

A criação do blog Fatos e Dados pela assessoria de imprensa da Petrobras intensifica a discussão sobre a crise da grande imprensa, principalmente a escrita, no Brasil. O weblog tem como objetivo, segundo a assessoria de imprensa da empresa, publicar as respostas dadas às perguntas feitas por jornalistas. A ideia é apresentar a informação em ‘estado bruto’, ante de passar pelos crivos da edição de jornais e revistas. A prática, que já é comum em países como os Estados Unidos, causou grande preocupação e indignação na mídia brasileira.

O jornal O Globo publicou, no domingo (07/06), uma matéria intitulada Petrobras usa blog para vazar informações obtidas por jornalistas. O conteúdo do texto acusa a empresa de quebrar o pacto com os jornalistas, divulgando as respostas e também as perguntas enviadas pelos profissionais da imprensa. A pergunta que fica é: por que esse weblog irritou tanto a mídia tradicional?

A resposta para a questão levantada passa pela análise do cenário midiático contemporâneo. O caso do blog Fatos e Dados escancara um fato que já vem sendo estudado nas universidades e centros de pesquisa: a abertura do espectro midiático causado pela rede mundial de computadores, na qual qualquer cidadão passa à condição de produtor de informações e coloca em xeque a posição da imprensa tradicional. O weblog da Petrobras permite aos leitores/internautas comparar e contestar as respostas publicadas pelos jornais com a íntegra fornecida pela empresa.

A utilização de webmídias

Tais questões apontam para o fato de que, atualmente, a imprensa tradicional perdeu o monopólio da informação. A fragmentação, causada pela internet, no espectro midiático colocou a imprensa como um entre vários agentes informacionais e, não mais, o único. A diferença, agora, é que diversos atores, movimentos sociais e instituições estão se comunicando de maneira direta com seus públicos.

Tradicionalmente, as empresas e instituições, orientadas por suas assessorias de imprensa, necessitavam da imprensa tradicional para se comunicar com o público. Jornais, rádio e TV exerciam a função de mediar o discurso da fonte para o leitor/ouvinte/telespectador. No entanto, esse paradigma vem sendo desmontado. O jornalista e pesquisador Francisco Sant´anna (Ver SANT´ANNA, Francisco. Mídia das Fontes: o difusor do jornalismo coorporativo. Brasília: Casa das Musas, 2008), em sua tese de doutorado, argumenta que atores sociais antes vistos apenas como fontes de informação passaram a produzir seus próprios aparatos midiáticos e a passar informações à sociedade sem a mediação da imprensa tradicional.

A intenção de se comunicar diretamente com o público está clara no blog Fatos e Dados. A empresa anuncia que:

‘Neste blog, apresentaremos fatos e dados recentes da Petrobras e o posicionamento da empresa sobre as questões relativas à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).’

A utilização da internet como espaço para divulgar fatos, opiniões e posicionamentos sem passar pelos tradicionais crivos da imprensa não é exclusividade da Petrobras. Outras instituições e movimentos sociais estão utilizando as webmídias para se comunicar de maneira direta com a sociedade. Em minha monografia de conclusão de curso em Comunicação Social no Centro Universitário de Brasília (UniCEUB), trabalho com a utilização pelos políticos dos blogs como ferramenta de Comunicação Política. Denominei esse tipo específico de weblog como blogs de políticos.

A imprensa é neutra e imparcial?

Atualmente, alguns políticos profissionais importantes no cenário nacional já utilizam os weblogs. Entre os blogs de políticos mais conhecidos estão os espaços dos ex-deputados Zé Dirceu e Roberto Jefferson e do ex-prefeito da cidade do Rio de Janeiro, César Maia. Entre os parlamentares em atividade, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) e a deputada federal Manuela D´Ávila (PCdoB-RS) também utilizam a ferramenta.

Os blogs de políticos, assim como o weblog Fatos e Dados – que é acompanhado de uma versão no serviço de microblogging Twitter –, além de sites de movimentos sociais, apontam para o fato de que, no século 21, a oferta de informações não será mais monopólio apenas dos jornalistas e dos meios de comunicação de massa tradicionais. A quebra do monopólio da informação da imprensa, por conta da fragmentação do espectro midiático gerado pela internet, aumenta a quantidade de atores e posições presentes na esfera de visibilidade promovida pelos meios de comunicação.

A imprensa tradicional já acusou o golpe, como prova a nota divulgada, na segunda-feira (08/06), pela Associação Nacional dos Jornais (ANJ):

‘Numa canhestra tentativa de intimidar jornais e jornalistas, a empresa criou um blog no qual divulga as perguntas enviadas à sua assessoria de imprensa pelos jornalistas antes mesmo de publicadas as matérias às quais se referem, numa inaceitável quebra da confidencialidade que deve orientar a relação entre jornalistas e suas fontes.’

Esse movimento, registrado nos blogs de políticos e no weblog da Petrobras, longe de ser prejudicial à democracia, é, ao contrário, benéfico a ela. Quanto maior o número de informações disponíveis na arena pública, maior será o grau de informação da sociedade. Tal situação coloca em xeque, também, a própria posição da imprensa: será ela a única instituição legitimada para informar a população? Não existem interesses por trás dessa tarefa? É a imprensa neutra e imparcial? Não pode ela mesma, assim como a Petrobras, ser considerada um ator político e econômico? Deve ela ser assim?

Não se apresentam respostas para essas questões, deixa-se para a reflexão dos leitores. Mas se aponta, à guisa de conclusão, que a nova realidade midiática impõe uma reconfiguração das relações tradicionais entre sociedade e informação.

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Estudante de Comunicação Social e Sociologia, Brasília, DF