DIPLOMA EM DEBATE
Diploma e monopólio
‘Faz quase dois séculos que foram fundadas escolas de direito e medicina no Brasil. É embaraçoso verificar que ainda não foram resolvidos os enguiços entre diplomas e carreiras. Falta-nos descobrir que a concorrência (sob um bom marco regulatório) promove o interesse da sociedade e que o monopólio só é bom para quem o detém. Não fora essa ignorância, como explicar a avalanche de leis que protegem monopólios espúrios para o exercício profissional?
Desde a criação dos primeiros cursos de direito, os graduados apenas ocasionalmente exercem a profissão. Em sua maioria, sempre ocuparam postos de destaque na política e no mundo dos negócios. Nos dias de hoje, nem 20% advogam.
Mas continua havendo boas razões para estudar direito, pois esse é um curso no qual se exercita lógica rigorosa, se lê e se escreve bastante. Torna os graduados mais cultos e socialmente mais produtivos do que se não houvessem feito o curso. Se aprendem pouco, paciência, a culpa é mais da fragilidade do ensino básico do que das faculdades. Diante dessa polivalência do curso de direito, os exames da OAB são uma solução brilhante. Aqueles que defenderão clientes nos tribunais devem demonstrar nessa prova um mínimo de conhecimento. Mas, como os cursos são também úteis para quem não fez o exame da Ordem ou não foi bem-sucedido na prova, abrir e fechar cursos de ‘formação geral’ é assunto do MEC, não da OAB. A interferência das corporações não passa de uma prática monopolista e ilegal em outros ramos da economia. Questionamos também se uma corporação profissional deve ter carta-branca para determinar a dificuldade das provas, pois essa é também uma forma de limitar a concorrência – mas trata-se aí de uma questão secundária.
A medicina é uma carreira estritamente profissional, não prepara para outras funções. O custo de estudá-la é quatro vezes maior do que o custo de estudar direito. E pior do que no direito são as conseqüências dramáticas dos erros. Portanto, garantir qualidade na formação de todos os médicos é do mais legítimo interesse social. É lamentável que as associações médicas demonstrem uma atitude tão tíbia diante de faculdades fracas. Pior, a lista de punições para erros médicos é embaraçosamente curta.
A melhor solução está aí para todos verem: as provas da OAB, os exames para exercer medicina nos Estados Unidos e, agora, iniciativas semelhantes em São Paulo. Ademais, os médicos, como os pilotos de avião, deveriam passar em provas periódicas, para demonstrar sua atualização. Querer proibir a abertura de cursos não passa de uma tentativa de reduzir a oferta de médicos, sem melhorar a qualidade dos que aí estão. Ao desdenharem dos exames e reivindicarem um ferrolho nas faculdades, as associações mostram à sociedade que prezam mais seus salários do que a saúde da população. O correto seria a liberdade de abrir cursos, seguida de uma prova individual rígida. Como acontece em outros países, só quem varasse esse ferrolho poderia exercer a medicina.
Resta mencionar os cursos de administração, outra formação clássica de cultura geral. Por que exigir diplomas para o exercício profissional? Nos Estados Unidos, onde nasceram tais cursos, não há nenhuma exigência de diploma. Além disso, as melhores universidades não oferecem administração no nível de bacharelado. Na Alemanha, praticamente, não há formação em administração de empresas. Não consta que esses países padeçam de incompetência crônica na gestão dos seus negócios. É mais uma profissão se locupletando dos monopólios conferidos por leis passadas sorrateiramente no Congresso. Jornalismo é um caso até mais absurdo de monopólio dos diplomas. Menos mal que uma lei semelhante para bacharéis de astrologia não foi aprovada.
É no mínimo um passo atrás que o MEC haja cedido às pressões dos médicos e advogados para exercer legalmente o seu pseudodireito de vetar a abertura de novos cursos. Erro do MEC? Não, da sociedade brasileira, que assiste passivamente a tais tentativas de cercear a concorrência. Os pobres com pouco estudo devem competir pelos empregos que o mercado oferece. Mas para quem tem curso universitário o mercado é protegido por lei.
Claudio de Moura Castro é economista’
TELEVISÃO
Freud, não. Darwin explica
‘Como observaram inúmeros estudiosos, a exemplo do primatologista holandês Frans de Waal, animais podem cultivar relações de sexo e poder de uma complexidade quase shakespeariana. De shakespeariano, o comportamento do pessoal do Big Brother Brasil não tem nada. Mas as semelhanças com o mundo animal saltam aos olhos. Freud? Nada disso. A edição atual se presta, de cabo a rabo, a uma interpretação darwinista. A pedido de VEJA, dois especialistas em comportamento animal analisaram as situações mostradas no programa. Há lances bem parecidos com os que se verificam em grupos de animais selvagens como os leões, as hienas e, sobretudo, os chimpanzés. Diego, o Alemão, é uma espécie de macho alfa – aquele que goza da primazia junto às fêmeas e mantém sob seu jugo os concorrentes. Ele era o vértice principal do triângulo amoroso que monopolizou as atenções na gincana até a semana passada, quando sua namorada Siri foi expulsa, graças a uma manobra dos dois outros homens da casa, Alberto e Airton. Esses dois, por sinal, vêm cumprindo o papel de machos beta – aqueles que ocupam um lugar inferior na hierarquia e costumam formar coalizões para desafiar o poder do alfa. Depois de insuflarem os participantes contra Alemão, eles vêm sofrendo as mesmas conseqüências reservadas aos machos derrotados num bando de macacos: receberam uma banana de suas ex-aliadas.
O comportamento das mulheres também se presta a uma análise do tipo ‘Discovery Channel’. Tome-se o caso de Siri, a defenestrada. Ela era a predileta do macho alfa, que a tratava carinhosamente como ‘a porta’, por seus parcos atributos intelectuais. Siri fazia questão de ostentar sua condição de favorita – coisa que, entre animais como as hienas, é um atalho para a expulsão do grupo. ‘Essa não é uma boa estratégia de sobrevivência para fêmeas em bandos’, diz o geneticista Renato Zamora Flores, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Siri também causava irritação pelo hábito de cantar em altos (e desafinados) brados, abrir o berreiro a toda hora e posar de pobre. ‘Fêmeas espalhafatosas não são bem-vistas em nenhuma espécie de mamífero’, informa Flores. Em tempo: ao contrário do que acontece na natureza, em que as fêmeas cobiçam os genes dos machos mais fortes, para ter uma prole sadia, no Big Brother o prêmio vem na forma de fama e dinheiro. Por isso, Siri pode dar-se ao luxo de nunca ceder às investidas sexuais do Alemão. Na hora do vamos-ver, Diego se enroscava mesmo no edredom com Fani, ex-miss Nova Iguaçu e terceiro vértice no triângulo amoroso.
No papel de fêmea secundária, Fani – que se prestou a lavar louça para o macho cafajeste, enquanto a outra enxaguava suas cuecas – ensaiou uma aproximação com os inimigos de Alemão. Mas, depois que a força de Diego foi reconfirmada, no paredão da semana passada, ela e as outras mulheres procuram se realinhar com ele. A carioca Carol, que antes conspirava contra o loiro, agora se mostra simpática. A catarinense Bruna terminou seu namorico com Alberto e seguiu o mesmo caminho. Entre os chimpanzés, as fêmeas mudam de posição de olho em seus interesses. ‘Elas tendem a se aproximar dos machos dominantes em busca de proteção’, diz o especialista em comportamento animal César Ades, da Universidade de São Paulo.
A batalha entre os machões representou uma bênção para a Globo. Depois de um início morno, o programa decolou no ibope – com 47 pontos de média, o paredão da semana passada foi o de maior repercussão nessa edição. Outra vez se demonstrou que o sucesso do reality show é tanto maior quanto mais ele se revela capaz de gerar um fiapo de trama que seja. Para não repetir o marasmo da edição anterior, considerada politicamente correta em excesso pela Globo, optou-se por gente mais desinibida e de pavio curto. ‘Tiramos os pobrinhos e os certinhos. Queríamos um pessoal que incendiasse a casa’, diz o diretor Boninho. Nisso, ele está bem servido – como se pode verificar na versão ‘para maiores’ exibida nas madrugadas de quarta para quinta-feira, essa edição é pródiga em mentes ocas e condutas abjetas. O macho alfa de plantão se destaca nesses quesitos. Há duas semanas, Diego protagonizou a pior baixaria até o momento. Depois que os inimigos arrancaram sua cueca, ele envolveu-se num bate-boca chulo e só não saiu no soco com Airton porque foi contido pelas fêmeas, ops, garotas da casa. O administrador de 26 anos, aliás, já comentou no ar que certa vez se meteu numa rusga que acabou na delegacia. Como qualquer macho alfa, ele fica bravo quando invadem o seu território.’
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Punida pela boa ação
‘Encerrada na semana passada, a novela Páginas da Vida ganhou um lugar na história da teledramaturgia brasileira como a primeira a abordar o preconceito contra os portadores da síndrome de Down. Apesar de essa intenção ter sido óbvia e ululante, o Ministério Público Federal achou pouco. Às vésperas do fim da novela, o procurador regional paulista Sérgio Gardenghi Suiama e a procuradora da República Eugênia Augusta Gonzaga Fávero encaminharam à Globo uma carta em que recomendavam que o autor, Manoel Carlos, incluísse na novela cenas para mostrar que é crime uma escola recusar uma criança portadora de deficiência, como ocorreu com a personagem Clara (Joana Mocarzel), ou então veiculasse nos créditos finais uma mensagem a tal respeito. O não-cumprimento poderia acarretar uma ação contra a emissora por dano moral coletivo. A recomendação é estapafúrdia, por ter vindo com seis meses de atraso: já fazia tempo que a escola de Clarinha não era assunto na trama. Ela é tola, pois a novela deixou claro que a ação da escola era errada: exigir que além dessa mensagem uma novela ainda divulgue minúcias da lei extrapola o razoável. Finalmente, ela é perigosa: não é função de promotores reescrever roteiros; aberto o precedente, que idéias as autoridades vão querer impingir ao folhetim de amanhã? Noveleiros com freqüência criam cenas grosseiras e apelativas. O próprio Manoel Carlos cometeu deslizes em Páginas da Vida. Mas, ao falar da síndrome de Down, ele fez um trabalho corajoso. Os procuradores querem puni-lo pela boa ação.’
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