Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Alessandra Stanley

‘A única pergunta que os telespectadores devem fazer sobre a série ‘Nip/Tuck’, drama na linha ‘Miami Vice’ sobre dois inescrupulosos cirurgiões plásticos da Florida (EUA), é ‘por quê?’.

Por que a Fox é a única rede a tocar na obsessão americana pelas cirurgias plásticas? A ABC tomou o caminho mais fácil com o ‘reality show’ ‘Extreme Makeover’ (exibido no Brasil pela Sony); no entanto, a busca pela juventude eterna é ignorada ou subestimada pela televisão.

Até surgir ‘Nip/Tuck’. Suas cenas de cirurgias são tão ousadas quanto as de sexo, e muito mais repugnantes que qualquer coisa em ‘E.R.’. No primeiro episódio, um implante nas nádegas, um aumento de seios e uma reconstrução facial são retratados sem pudores. A série é atípica, mas assim como em ‘The Shield’ -sobre policiais corruptos-, temos jovens e talentosos cirurgiões que não salvam e nem melhoram vidas. ‘Nip/Tuck’ é um drama sem pretensões intelectuais, repleta de humor negro.

A maioria dos pacientes são mulheres belas, neuroticamente inseguras, que precisam de um hobby, e não de operações. Nem é preciso dizer que os dois deploráveis cirurgiões são atraentes.

O criador da série, Ryan Murphy, teve a idéia enquanto fazia reportagem sobre cirurgiões plásticos, merece crédito extra porque conseguiu romantizar a área até satirizá-la. ‘Nip/ Tuck’ pega um cenário tão inexplorado quanto os coveiros de ‘Six Feet Under’ (‘A Sete Palmos’), mas com menos formalidades.

No primeiro episódio, Sean (Dylan Walsh), o médico mais convencional, suspeita que seu cliente latino-americano, que procura um novo rosto, tem uma imagem distorcida de si mesmo. Ele deixa o cliente para seu parceiro, o amoral Christian (Julian McMahon), que logo conclui que se trata de um traficante que precisa de nova identidade.

Sexo e violência, é claro, estão na mistura. Não demora muito para um vingativo traficante achar usos mais criativos para o botox, por exemplo.

Os telespectadores não precisam se preocupar que ‘Nip/ Tuck’ possa legitimar as cirurgias plásticas -a série tem um aviso de precaução. A produção faz essas operações parecerem glamourosas, mas também miseráveis e mesquinhas. E não há dúvidas de que o trabalho dos personagens é tolo ao máximo e revoltante na maior parte do tempo.’



VIDEOLOGIAS
Bia Abramo

‘Livro esmiuça papel da televisão no Brasil’, copyright Folha de S. Paulo, 7/08/04

‘‘Se tirássemos a TV de dentro do Brasil, o Brasil desapareceria’. Parece, e é, uma hipérbole, mas isso não tira a força do quase aforismo a que o jornalista Eugênio Bucci recorre para falar da urgência de uma crítica de televisão, em um dos textos inaugurais de ‘Videologias’.

Mais adiante, a psicanalista Maria Rita Kehl, ao discutir o papel central da televisão na produção mesma da violência, vai ainda além: ‘Faz sentido pensar que o Outro está encarnado nessa produção imaginária da qual a televisão é o principal veículo. Isso porque ela é de certa forma onipresente e onisciente, como Deus.’

O lugar central que a televisão ocupa na sociedade brasileira só muito aos poucos vem merecendo reflexões menos apressadas e mais rigorosas do que a crítica jornalística. Bucci e Kehl fazem uma importante contribuição nesse sentido nessa coletânea de textos que, apesar de produzidos em tempos e para propósitos diversos, constituem um dos mais consistentes esforços de entender a televisão no Brasil.

É uma dupla que leva a televisão a sério e não é de hoje. Maria Rita Kehl, por exemplo, participou do fundamental ‘Um País no Ar’, outra coletânea de ensaios sobre a televisão publicada quase 20 anos atrás e que ainda hoje é referência para qualquer interessado no assunto. Seu ensaio naquele livro, ‘Eu Vi Um País na TV’, sobre a constituição da Rede Globo, é retomado e ampliado por Bucci em ‘Videologias’. Este, por sua vez, vem da crítica de TV em jornais e revistas -escreveu na Folha, na ‘Veja’ e no ‘Jornal do Brasil’, hoje é presidente da Radiobrás.

Ambos partem, entretanto, dos mesmos referenciais teóricos para olhar para a TV -sim, Barthes & Saussure e Freud & Marx-, mas isso não deve assustar o leitor não-acadêmico. Embora seja necessário acompanhá-los em parte de seu percurso teórico, os textos caracterizam-se pela clareza.

O mais complicado, na verdade, é abandonar aquilo a que estamos acostumados a pensar sobre a TV. Por exemplo, que a violência independe dos conteúdos, mas ‘é própria do funcionamento do imaginário em si’, ou seja, ‘na imagem enquanto imagem, uma vez que esta é elaborada e transmitida de maneira a não só substituir o real, mas sobretudo para oferecer um suposto gozo imediato do telespectador e com isso impedir os processo psíquicos e sociais de simbolização’ como diz Marilena Chauí no prefácio.

Claro, a naturalização de cenas chocantes preocupa na medida que alimenta a violência real, no dizer de um dos melhores ensaios de Bucci, mas o buraco fica muito mais embaixo quando é a própria forma de circulação das imagens que é violenta.

Ou quando, nas discussões iniciais sobre o método, Bucci afirma: ‘A televisão não mostra lugares, não traz lugares de longe para muito perto, a televisão é um lugar em si’, que ‘nada mais é que o novo espaço público’. Sujeito às regras do espetáculo, o espaço público constituído pela televisão esgarça os limites entre fato e ficção com conseqüências complicadas para qualquer discussão sobre ética no jornalismo de TV.

Em outra rasteira no senso comum, Kehl propõe uma leitura em que a obscenidade do ‘Big Brother’ está na manipulação dos afetos e não dos corpos. Coerentes com a afirmação de que a ‘crítica de televisão é, hoje, uma crítica do poder’, os autores encerram o volume com um apêndice sobre os direitos do telespectador.

Videologias Autores: Eugênio Bucci e Maria Rita Kehl Editora: Boitempo Quanto: R$ 32 (252 págs.)’



TV SEM BAIXARIA
Laura Mattos

‘Governo fecha o cerco contra ‘mundo cão’’, copyright Folha de S. Paulo, 6/08/04

‘O governo federal propôs nesta semana às principais emissoras de TV a assinatura de um ‘termo de compromisso’ com regras de controle à programação.

Um das normas é exibir somente após as 20h ‘programas jornalísticos policiais e ou que abordem de forma mais contundente atos de violência e acidentes do dia-a-dia’. Atualmente, são vespertinos os principais exemplares do chamado ‘mundo cão’: ‘Brasil Urgente’ (Band), ‘Repórter Cidadão’ (Rede TV!) e ‘Cidade Alerta’ (que a Record pretende tirar do ar no próximo mês).

A reunião foi coordenada pela Secretaria Nacional de Justiça, responsável pela classificação de programas de TV. O documento, ao qual a Folha teve acesso, afirma que o termo de compromisso leva em consideração reclamações de ‘ofensa a princípios constitucionais’ cometida pela TV.

Há restrições às ‘pegadinhas’. Diz que as redes devem ‘abster-se de levar ao ar pegadinhas que atentem contra a honra, a imagem e a integridade física e psíquica dos participantes’. Também não devem utilizar menores, idosos e portadores de deficiência.

As TVs analisam o documento e deverão apresentar contraproposta. Executivos consideram que grande parte é subjetiva, como o item que diz para a TV dar ‘preferência à finalidade educativa, artística, cultural e informativa’. O governo vê o termo como tentativa de ‘auto-regulamentação’.

OUTRO CANAL

Confusão

A Endemol (criadora do ‘Big Brother’) entrou na Justiça contra o SBT. Diz que ‘Eu Compro o seu Televisor’, apresentado por Silvio Santos, é plágio de ‘Deal or no Deal’, um de seus formatos. A Globo Endemol, representante brasileira, já havia acusado ‘Casa dos Artistas’ de ser cópia de ‘BB’. A assessoria do SBT não foi localizada pela Folha até o fechamento desta edição.

Titanic

Com ibope baixo, ‘Metamorphoses’ (Record) vai acabar no próximo dia 27, com uns 20 capítulos a menos do que o previsto.

União 1

O esforço é grande para que as principais TVs, atualmente rompidas politicamente, voltem a se unir. Elas querem ter força para brigar, por exemplo, contra novas regras que deverão ser propostas hoje pelo governo (como comerciais obrigatórios para o cinema).

União 2

A reconciliação foi debatida anteontem entre João Roberto Marinho (Globo), Johnny Saad (Band), Guilherme Stoliar (SBT), Amílcare Dalevo (Rede TV!) e Dennis Munhoz (Record). A idéia é que todas voltem à Abert (associação das TVs), hoje só com a Globo.

União 3

As quatro dizem que a Abert está nas mãos da Globo e exigem mudança de estatuto, a fim de garantir participação de todas na direção. A eleição da nova diretoria, marcada para o dia 31, pode ser adiada. Se não houver alteração estatutária, o ‘G4’ ameaça fundar a Acert (Associação Central de Emissoras de Rádio e TV).’



PUBLICIDADE NA TV
Folha de S. Paulo

‘Executivos viram garotos-propaganda’, copyright Folha de S. Paulo, 6/08/04

‘Presidentes de empresas não gostam de ir à TV. Mas alguns passaram a ser o garoto-propaganda de suas companhias por duas razões: ou para inverter um cenário de vendas em queda ou por questão de oportunidade. Abílio Diniz entra no segundo time: desde a noite de ontem, ele aparece em uma campanha do seu grupo Pão de Açúcar na qual informa que a empresa irá reduzir o preço de alguns produtos.

O que a rede de supermercados tenta fazer é atrelar a sua imagem a um movimento de redução de preços -que acontece por conta de recente redução de contribuições federais.

Na campanha que protagoniza, Abílio diz: ‘Entendemos que, neste momento de retomada de crescimento do nosso país, e em resposta ao esforço do governo federal, todos devem fazer a sua parte’. O filme foi criado pela agência de Duda Mendonça, coordenador da campanha à reeleição da prefeita de São Paulo, Marta Suplicy (PT). A Duda Mendonça Propaganda é uma das três agências responsáveis pela campanha de mídia do governo federal.

Ford, TAM, Kasinski (motos) e Africa (agência de publicidade) também já colocaram os seus presidentes com a cara na mídia. Os executivos dos grupos foram à TV trazer credibilidade às campanhas. Nos Estados Unidos, essas ações são ainda mais comuns.

No final de 2001, Antonio Maciel Neto, presidente da Ford, apareceu na televisão para oferecer R$ 100 àqueles que, após participarem de um test-drive de carros da marca, não gostassem do produto. Meses após o lançamento do filme, em setembro de 2001, ele ofereceu R$ 200. A campanha acabou em junho de 2002.’