‘Ô da poltrona. Você aí, até outro dia, já tinha ouvido falar em Marcos Valério e em Fernanda Karina Somaggio?
Nem eu. Mas, acredite, até 23h45m57s de sexta, o supersite de buscas Google já registrava 65.700 citações para o empresário do mensalão e 21.200 para sua supersecretária.’
UNIVERSAL
‘Na Câmara, tropa protege império de comunicação’, copyright O Estado de S. Paulo, 17/7/05
‘O parlamentar paulista João Batista Ramos da Silva, expulso do PFL após ter sido pego pela Polícia Federal com malas de dinheiro no aeroporto de Brasília, faz parte de uma bancada de 14 deputados federais e 1 senador eleitos com o apoio da Igreja Universal do Reino de Deus – do bispo Edir Macedo. No Congresso, eles são fiéis defensores dos interesses da igreja, tanto na frente das crenças religiosas quanto na dos bens materiais. Ao mesmo tempo que numa comissão travam projetos que beneficiem homossexuais, em outras vigiam tudo que se relaciona a emissoras de rádio e TV – o que é explicável, considerando que a Universal controla três redes de TV (Record, Família e Mulher) e um império na área do rádio.
O deputado João Batista é um dos titulares da Comissão de Ciência, Tecnologia e Comunicações e em sua declaração de bens entregue à Justiça Eleitoral em 1992 aparecia como sócio de nove empresas de rádio e TV. Mas não é só ele. Quase toda a bancada costuma gravitar ao redor dessa área.
É o caso da deputada Edna Macedo (PTB-SP), irmã do bispo Edir Macedo, que atua na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Entre outras investidas, ela já pediu explicações ao ministro Luiz Furlan, do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, sobre empréstimo feito pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ao Sistema Globo de TV; e solicitou uma sessão de homenagem à Record, pelos seus 50 anos.
Edna não é a única parente de Edir Macedo no Congresso. O senador da Universal, Marcelo Crivella, é sobrinho do bispo e o suplente dele, irmão.
Quem relacionar os nomes da bancada com a lista de sócios de empresas de radiodifusão, disponível no site do Ministério das Comunicações, verá de maneira ainda mais clara como os interesses se cruzam. O deputado Carlos Rodrigues (PL-RJ) consta como sócio de quatro emissoras de rádio e duas de TV. Conhecido no passado como Bispo Rodrigues, ele foi o articulador da bancada da Universal até seu nome despontar no escândalo Waldomiro Diniz, no ano passado. Foi posto para escanteio e ficou na sombra até seu nome ressurgir nas denúncias do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), que o listou entre os mentores e articuladores do mensalão.
FRENTE EVANGÉLICA
No Congresso, os parlamentares da Universal alinham-se na Frente Parlamentar Evangélica, que reúne 54 deputados e 3 senadores. O partido com a maior preferência nessa frente é o PMDB, com 13 congressistas, seguido pelo PL, com 11, e o PTB, com 9.
Do ponto de vista ideológico, é um bloco que vai do centro para a direita, segundo observações do sociólogo Ricardo Mariano, estudioso do avanço pentecostal. Em termos de denominação religiosa, a bancada mais numerosa é a da Assembléia de Deus, com 22 nomes. Colaborou: Fabiano Rampazzo’
José Edward
‘Dinheiro a jato’, copyright Veja, 20/7/05
‘Na temporada de caça às malas suspeitas, duas ações da Polícia Federal pegaram parlamentares pertencentes ao alto escalão da Igreja Universal do Reino de Deus usando jatinhos para transportar pacotes de dinheiro. Na primeira, o próprio presidente da Universal, bispo João Batista Ramos da Silva, deputado federal pelo PFL, foi flagrado em Brasília com 10,2 milhões de reais divididos em sete malas. Na outra, o deputado estadual mineiro George Hilton dos Santos Cecílio (PFL) e o vereador de Belo Horizonte Carlos Henrique da Silva (PL), ambos pastores da igreja, acabaram liberados no Aeroporto da Pampulha depois de explicar que onze caixas de papelão contendo – segundo eles – 600 000 reais eram doações de fiéis do sul de Minas Gerais. Se bastaram dois flagrantes, quase simultâneos, para descobrir essas quantias expressivas, qual será o montante que a igreja movimenta mensalmente no país? O valor preciso só pode ser revelado pelo bispo Edir Macedo Bezerra, criador e presidente mundial da Universal, que há alguns anos foi gravado em vídeo numa reunião em que celebrava a generosidade dos fiéis atirando cédulas para o alto. Os casos da semana passada dão uma idéia, no entanto, de como é vigoroso e lucrativo o empreendimento religioso que Macedo administra há 28 anos.
O bispo Edir Macedo construiu em 28 anos, com a Universal e coligadas, um dos grupos econômicos mais vigorosos do país
A começar por uma frota de pelo menos sete aeronaves que não se sabe precisamente quanto é utilizada para transportar dinheiro, a Igreja Universal tem um patrimônio e um faturamento de causar inveja aos mais bem-sucedidos empresários do mundo. O maior desses negócios é a Rede Record de Televisão, comprada por 45 milhões de dólares há quinze anos e hoje avaliada em quarenta vezes mais. O grupo possui também editoras, jornais, emissoras de rádio e uma financeira, entre outros negócios, além de 5 000 templos próprios, em oitenta países (veja quadros). Mais de 15 000 pastores e 100 000 auxiliares, chamados obreiros, cuidam da administração desse parque produtivo e, principalmente, da arrecadação de contribuições financeiras de 2,5 milhões de fiéis. A receita anual do grupo Macedo é estimada em 3 bilhões de reais, dinheiro suficiente para colocar o conglomerado entre as oitenta maiores empresas do Brasil e seu proprietário nas revistas que listam as maiores fortunas do mundo.
Macedo tem uma biografia comparável à de grandes magnatas que ergueram impérios começando do zero. No seu caso, mais precisamente, a história começa nas dependências de uma modesta funerária, num subúrbio carioca, onde instalou o primeiro salão de sua igreja. Hoje, os templos da Universal – catedrais da fé, como são chamados – são construídos como palácios de mármore e granito. O de Belo Horizonte, inaugurado há um ano e orçado em 50 milhões de reais, tem 28 000 metros quadrados, lugares para 5 000 fiéis, 255 vagas no estacionamento para carros e ônibus, heliponto, hotel para bispos e pastores, berçário e lojas. Modelos parecidos funcionam ou estão sendo erguidos em todas as grandes cidades do país e em algumas do exterior. Como shoppings, são guardados por seguranças que evitam a entrada de mendigos ou gente muito malvestida.
A vida de Macedo naturalmente mudou muito com o crescimento dos negócios. De uma temporada de onze dias na cadeia, em 1992, acusado de charlatanismo, estelionato, evasão de divisas, contrabando e curandeirismo, o ex-funcionário da Loteria do Estado do Rio de Janeiro evoluiu para uma rotina que mistura as atividades de um alto executivo globalizado às atribulações de astro mundial. Sua base fica na cidade americana de Atlanta, terra da CNN, da Coca-Cola e de um canal de TV dirigido à comunidade hispânica, recém-adquirido pela Universal. No púlpito da igreja local, o bispo ensaia as pregações que repete mundo afora em eventos que chegam a reunir mais de 10 000 fiéis. Seus deslocamentos ocorrem a bordo de um jato Global Express para oito passageiros e com autonomia de vôo de 12 000 quilômetros (São Paulo a Moscou sem escalas, por exemplo), avaliado em 50 milhões de dólares. No Brasil, usa também um Cessna Citation X, o mesmo que carregava as malas do bispo João Batista na semana passada.
Não há nenhuma coincidência no fato de os dois flagrantes aéreos do dinheiro da Universal envolverem parlamentares. A representação política é um dos aspectos de que o bispo cuida com mais carinho. A bancada ligada à sua igreja, que se move de um partido para outro conforme as conveniências dos empreendimentos de Macedo, conta com dezessete integrantes no Congresso Nacional e age geralmente de comum acordo com outros 46 parlamentares evangélicos. A Universal tem ainda algumas dezenas de deputados estaduais e centenas de vereadores espalhados pelo país. O grande expoente é o bispo senador do PL Marcelo Crivella, sobrinho de Macedo, virtual candidato ao governo do Rio de Janeiro e figurante num processo que investiga seu possível envolvimento com duas empresas instaladas em paraísos fiscais. O PFL decidiu expulsar seus dois integrantes envolvidos nos casos das malas. Antes que alguém ligasse esses pacotes de dinheiro aos que transitam pelo caixa do PT, Crivella foi à tribuna defender o patrimônio da Universal. ‘Esse dinheiro é fruto de doações de fiéis. Tem origem e destino, coisa que muitos na política não têm’, discursou o senador, para tranqüilizar operários, empregadas domésticas, desempregados e aposentados que sacrificam um pedaço de suas economias para ajudar a construir a obra do bispo Macedo. Para justificar o destino da dinheirama, Crivella afirmou que a Igreja Universal paga mensalmente 12 milhões de reais em aluguéis e 6 milhões de reais em salários. Ou seja: 216 milhões de reais por ano.’