‘Apesar de a Constituição de 1988, em seu capítulo sobre Comunicação Social, já falar em ‘complementaridade dos sistemas privado, público e estatal’, a lei que definiu as rádios comunitárias veio apenas dez anos depois. Desde então, iniciou-se o debate sobre a legislação, formas de fiscalização e atuação da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), e da Polícia Federal, que dá apoio às ações da Anatel.
Durante todo o mês de dezembro, repórteres da Agência Brasil procuraram os mais diversos pontos de vista envolvidos na discussão. Descobriu, por exemplo, que só na Câmara Federal tramitam 36 projetos para rever a legislação do setor. Uma legislação que é objeto de debate entre os juristas. Também foram investigadas denúncias apontadas por várias pessoas e instituições ligadas a associações organizadas de rádios comunitárias a respeito da suposta violência que a Polícia Federal, em apoio à Anatel, viria desenvolvendo no cumprimento de decisões judiciais para o fechamento de rádios não licenciadas pelo Ministério das Comunicações.
Anatel e o Ministério das Comunicações receberam a reportagem para longas conversas explicando a atuação desses órgãos em relação a essas rádios. O leitor verá também entrevistas com os próprios diretores de rádios que foram fechadas, representantes das entidades mais conhecidas que agregam essas emissoras, juízes, advogados, deputados e representantes da Polícia Federal.
Além do especial sobre Rádios Comunitárias, leia também o que já foi publicado nas reportagens especiais durante a semana pela democratização da comunicação, em outubro de 2004:
Agressões durante fechamento de rádios comunitárias geram protestos
Número de rádios fechadas pela Anatel aumenta 37% no primeiro ano do governo Lula
Ministério diz que tem resolvido pendências e propõe ‘sistema de Boa Viagem’ para comunitárias
Associações de rádios e especialistas defendem mudanças na legislação para emissoras comunitárias
Governo Lula trabalha para que rádios comunitárias ‘existam em profusão’, diz coordenador do MinC
Para ativista internacional, comunicação comunitária corresponde a evolução da democracia.’
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‘Confronto em desocupação na Anatel no RS gera troca de acusações e denúncia na Câmara’, copyright Agência Brasil, 6/01/05
‘‘Quando tentei dissuadir policiais que estavam espancando um jovem militante, o agente, em tom elevado, respondeu: ‘Não te mete que vai sobrar pra ti. Aqui você não manda nada. Você pode mandar alguma coisa na Câmara. Aqui quem manda somos nós’. As declarações, do deputado federal Adão Pretto (PT-RS), fazem parte do relatório enviado para a Corregedoria da Câmara no dia 14 de dezembro, a respeito das supostas agressões da Polícia Federal durante a manifestação que ocupou a sede regional da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) no Rio Grande do Sul, no dia 26 de novembro de 2004.
‘O papel aceita tudo. Essas alegações, absolutamente, não procedem’, garante o superintendente da PF no RS, Rubem Albino Fockink. ‘Na verdade, na ocasião, os agredidos foram os policiais – a polícia não procura provocar tumultos, mas apaziguar. Tenho laudos do IML de policiais feridos, um deles com oito pontos na cabeça. Nenhum deles da marcha apresentou qualquer tipo de lesão. A versão do deputado é apenas a versão de um dos lados. Os documentos que estão sendo coletados poderão provar o contrário’, diz.
O coordenador jurídico da Associação Nacional de Radiodifusão Comunitária (Abraço), Joaquim Carlos Carvalho, também aparece no relatório como tendo sido agredido. Ele conta que ‘prenderam e surraram esse rapaz do movimento dos catadores, e antes de ele entrar no presídio, fizeram um exame de corpo-delito’. Carvalho, que alega ter sido agredido também, disse que se recusou a fazer o exame, assim como outros colegas, porque julgaram que a culpa não foi dos policiais que praticaram a agressão: ‘São trabalhadores e seriam responsabilizados pela má conduta de um delegado. Isso ia estourar no policial federal, e não no comandante da operação’.
De acordo com a versão de Carvalho e do deputado Adão Pretto, cerca de 300 manifestantes ligados ao movimento de rádios comunitárias foram à sede da Anatel cobrar explicações do diretor regional sobre supostas irregularidades na fiscalização. Pretto conta que ‘todos os funcionários tiveram garantida a possibilidade de realizar suas atividades normais como também a de desocupar o prédio’, e que, inclusive, ‘no momento se realizava concorrência pública que não foi suspensa com a ocupação’.
Sobre o ferimento do policial, tanto o advogado da Abraço como Pretto dizem que foi um acidente, causado pelos próprios agentes da PF. O advogado da Abraço diz que a PF chegou no local com ameaças de bombas de gás. ‘Foi então feita uma negociação entre os deputados e a PF: sairia uma comissão de dez pessoas para negociar a saída pacífica dos manifestantes, sem que a polícia entrasse. Eu fui o último desse grupo a sair e, atrás de mim, a PF descumpriu esse acordo tentando invadir o prédio. O pessoal, que usava uma taquara como bandeira, tentou usar a taquara como alavanca para impedir a porta de se abrir, e quando o policial empurrou a porta, a taquara quebrou e bateu na cabeça dele’, conta.
Em seguida, Pretto conta que viu sete policiais partirem para cima de um trabalhador do movimento dos catadores de lixo: ‘Um pisava nas costas, outro nas mãos, outro tentava algemar, outro batia com um pedaço de pau na cabeça. Pedi que parassem, mandaram que eu recuasse porque ia sobrar pra mim, que ali quem mandava eram eles e que ninguém é superior a eles’.
O assessor de imprensa do deputado estadual Dionilso Marcon (PT-RS), Kiko Machado, que também estava presente, publicou uma nota dizendo que também foi agredido na ocasião e que ‘com base nos registros fotográficos do jornalista, os agredidos moverão um processo contra a PF’.
De acordo com a versão do delegado Fockink, ‘os policiais foram solicitados pela Anatel, que foi invadida com violência, portas quebradas e pessoas mantidas em cárcere privado. O policiais chegaram e foram repelidos, com violência que provocou lesões. Bandeiras serviram de armas de agressão, na tentativa de impedir que os policiais ingressassem na garagem. Nossos policiais tiveram muita tranqüilidade e bom senso e, apesar de agredidos, não responderam no mesmo padrão’, afirma. O delegado diz ainda que ‘com certeza, qualquer pingo de sangue que fosse vertido do outro lado seria usado como uma grande bandeira’, e que ‘políticos tentam, aqui e acolá, capitalizar essas questões, o que é compreensível. O senhor Adão Pretto não foge à regra. Mas o ônus da prova cabe a quem acusa’.
Pretto disse à Agência Brasil que estava alarmado com a brutalidade da Polícia Federal na ocasião. ‘Há mais de 20 anos que estou nessa luta, sou um dos fundadores do PT, do MST, já estive muitas vezes em conflitos com a polícia militar, mas nunca vi uma polícia tão violenta como a PF durante a intervenção na Anatel de Porto Alegre, onde fui desrespeitado, agredido verbalmente e até fisicamente. Fui ameaçado, inclusive, e vi a polícia praticar banditismo contra trabalhadores desarmados. Tenho dezenas de testemunhas que comprovam isso’, declara.
Uma nota emitida pela Comunicação Social da Superintendência da PF no Rio Grande do Sul logo após o incidente afirma que ‘cerca de 50 pessoas ligadas à Associação de Rádios Piratas invadiram o prédio no início da manhã e exigiam a liberação de equipamentos de rádio pirata apreendidos pela Agência. Ao chegarem (…), os policiais federais foram recebidos pelos invasores com agressões físicas, inclusive pauladas. (…) O confronto resultou em quatro policiais federais com lesões corporais, que receberam atendimento médico, e um invasor preso’.’
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‘Leia entrevista com o superintendente de fiscalização da Anatel’, copyright Agência Brasil, 6/01/05
‘Para explicar como funcionam as ações de fiscalização da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), no que diz respeito às rádios não licenciadas, o superintendente de radiofreqüência e fiscalização da Anatel, Edílson Ribeiro dos Santos, recebeu a reportagem da Agência Brasil em seu escritório em Brasília. Leia, abaixo, os principais trechos da entrevista.
Agência Brasil – Foram realizadas, até novembro de 2004, 162.672 ações de fiscalização pela Anatel, de uma previsão de 181.751 ações (89,5%). Como é feita essa previsão do número de rádios a serem fiscalizadas?
Edílson Ribeiro dos Santos – Todo planejamento parte de um trabalho que começa juntando relatórios de outros órgãos do governo, demandas de nossas superintendências técnicas, consultando também dados estatísticos de denúncias de radiointerferência, de uso não autorizado do espectro, solicitações do Ministério Público, da Justiça e do Legislativo, para então definirmos as necessidades do ano seguinte.
Confrontamos isso com nossos recursos, e fazemos um ajuste, levando em consideração se o serviço é público e de interesse coletivo, se é privado de interesse coletivo e, por último, que é a menor demanda, se são limitados de interesse restrito. A prioridade são os serviços de interesse coletivo, mas, associado a isso, temos os objetivos estratégicos da agência. Feito isso, emitimos as diretrizes para elaboração do plano operacional, em que você tem aquelas ações que chamamos de sistêmicas – já previstas inicialmente – e outras, em que alocamos horas para atender demandas provenientes das denúncias.
ABr – Até setembro de 2004, de acordo com um relatório da Anatel, foram instaurados 1.388 processos de fiscalização para ‘não-outorgadas’, a maior quantidade entre os outros grupos. O que é isso?
Edílson Ribeiro – A não-outorgada é a clandestina. A penalmente denominada de clandestina – aquela que não tem nenhuma autorização para explorar nem o serviço, seja de telecomunicação, seja de radiodifusão, porque temos um conjunto de clandestinas também na área de telecomunicações. Você pode ter radioamador clandestino, rádio-táxi clandestino, telefone clandestino… Você pode ter até uso de satélite clandestino – agora mesmo recebemos denúncia dos EUA de que temos brasileiros utilizando um satélite americano. Não é só radiodifusão.
ABr – Do total, qual seria a percentagem de rádios?
Edílson Ribeiro – Cerca de 60% é a utilização não autorizada na faixa de radiodifusão. E 40% seriam outros serviços de telecomunicações. Desses 60%, 25% apenas é que estariam contidas no limite de 25 watts de potência, que foi estabelecido por lei para Rádios Comunitárias. Todo o restante tem potência acima de 25 watts. De qualquer forma, todas são clandestinas. Para ser Radcom, a primeira obrigação é estar constituída nos termos da lei 9.612 e adicionalmente o Código Brasileiro de Telecomunicações.
ABr – Quais são as penas previstas?
Edílson Ribeiro – Aquelas que não tem licença têm duas penas: uma é a sanção administrativa – que, a depender do serviço (que ela esteja operando clandestinamente) pode ir até R$ 50 milhões. E existe mais uma ação penal, que pode ser de dois a quatro anos de detenção. Na esfera administrativa, ela será penalizada com uma multa.
ABr – Sempre acontecem essas duas penalidades?
Edílson Ribeiro – Com certeza absoluta. Só não recebe pena administrativa quando não se consegue localizar o responsável. Chega a fiscalização, os equipamentos estão lá, mas não tem registro, não tem nada.
ABr – A sanção penal vai para as pessoas que estão presentes?
Edílson Ribeiro – A penal vai para as pessoas responsáveis que estão ali. Normalmente você identifica um radialista que está lá, mas, como ele não representa aquilo ali – está sendo utilizado -, termina se safando. Na penal, só é possível penalizar quando a Justiça ou a PF identifica o responsável pela exploração da estação. Nesse caso, é a PF que investiga.
ABr – Como é o apoio da PF?
Edílson Ribeiro – Vamos dizer que a PF esteja investigando um crime de tráfico de drogas. Instaura o inquérito policial, pega todas as provas, ouve as pessoas e faz um dossiê. Pega esse conjunto todo e manda para o MP, para que o MP ofereça a denúncia ao juiz. O juiz analisa e, se entender que está tudo certo, dá andamento ao processo e instaura o processo pra aplicação dessa sansão penal. Só o juiz pode determinar uma sanção penal, nem o MP pode. No caso de rádio clandestina, é a mesma coisa. Normalmente a Anatel recebe uma denúncia de que tem uma rádio operando clandestinamente.
A primeira providência que a Anatel toma é fazer uma notificação pra essa entidade dizendo: eu tenho uma denúncia de que você está operando uma rádio clandestinamente, você tem 5 dias para se defender administrativamente e, se você estiver operando, você pode querer não sair do ar, sob pena de, não o fazendo, nós irmos lá interromper, porque ninguém pode utilizar o espectro sem a devida autorização do Estado.
Se ela não sair do ar, ou se a defesa dela não apresentar a licença correspondente, a fiscalização vai lá e interrompe a transmissão. Se ela não for interrompida ou se resistir à ação da fiscalização, o que a fiscalização faz? Instaura um processo administrativo contra ela e informa a PF para que a PF solicite o mandado de busca e apreensão à justiça e, com isso, proceda a ação e faça apreensão dos equipamentos correspondentes e instaure o devido inquérito policial para que a pessoa seja processada e julgada pela Justiça.
ABr – Mas, pessoas com quem conversamos disseram que não ocorre notificação, e sim uma ação imediata da PF.
Edílson Ribeiro – Normalmente, isso acontece porque já são ações reincidentes. Se não foi recebido, houve uma ação antes. Além disso, esse procedimento de notificação foi implementado a partir de 2004. Na verdade, nem é preciso fazer a notificação. Como é um ato delituoso, e sendo em flagrante, qualquer pessoa do povo pode até dar voz de prisão. Ninguém faz isso porque ninguém quer levar um tiro à toa. Mas o código do processo penal permite que, em flagrante delito, se você estiver ali na rua e encontrar uma pessoa querendo agredir outro, se você quiser e se tiver condições disso, pode dar voz de prisão. Pode levar a uma autoridade policial e dizer: peguei esse aí, estava querendo matar o outro…
O oficial vai aceitar isso e vai prender, fazer o auto de flagrante. Mas a autoridade deve, se a PF tiver conhecimento de que uma estação está operando, ela deve (é dever – não é pode, deve) agir. Nós, administrativamente, fazemos o aviso, mas só que 90% das estações que estão funcionando por aí já sofreram uma ação da fiscalização e voltaram a operar normalmente. Muda de local, de nome, mas os proprietários continuam sendo os mesmos. Hoje, estamos notificando 10%, porque os outros, não tem sentido. Já fiscalizou, já disse que estava cometendo crime de desobediência…
ABr – Quantas dessas rádios clandestinas são, na verdade, comunitárias?
Edílson Ribeiro – Muito poucas. Na ordem de 25% dessas que são interrompidas estão no limite de 25 watts. E dessas, na grande maioria o sistema irradiante não obedece o que a lei diz, que são 30 metros, a irradiação de 1 quilômetro de raio, não fazer propaganda, nada disso é obedecido. Então, na verdade, na essência, pouquíssimas delas são efetivamente comunitárias. Se fossem, resolver no Ministério das Comunicações não seria difícil. Se você é efetivamente comunitário e tem toda documentação, resolver no Ministério não é problema. A grande maioria das pendências do ministério, pelo que nós sabemos, é diligência porque as próprias interessadas não dão entrada na documentação exigida.
ABr – Alega-se que a burocracia é muito grande.
Edílson Ribeiro – Sabia que hoje temos mais comunitárias legalizadas do que FMs comerciais? Vou te dar um exemplo rápido, para mostrar que isso não é tão verdadeiro assim. Só a partir dos anos 1970 é que começou a se criar rádio FM aqui no Brasil, e de 1970 até o segundo semestre de 2004, 34 anos depois, existem 2.175 estações. A lei de rádio comunitária é de 1998 – e já temos mais rádios comunitárias do que FMs, são 2.190. Em 6 anos, ultrapassamos aquilo que foi feito em 34 anos. Então, não é tão lento assim.
ABr – Existe espaço pra todo mundo?
Edílson Ribeiro – Para todo mundo, eu não diria. Em alguns locais é possível, mas em outros é impossível. Por exemplo, São Paulo: os grandes centros são mais complicados, porque é uma faixa de freqüência limitada. É como um copo, não posso colocar mais água do que cabe. Caso contrário, o que acontece? Transborda, vou entrar pelo lado, e aqui do lado tenho radiocomunicação aeronáutica. E é por isso que dá interferência. Porque radiocomunicação de aeronaves está aqui, bem do ladinho. Então, o que você tem que tentar fazer é o uso do máximo espaço possível, mas não se pode agradar a gregos e troianos.
ABr – Por que as faixas destinadas às comunitárias, entre 87,4 e 87,8 MHz, não estão no dial (que começa em 88,0 MHz)?
Edílson Ribeiro – Já estão. Os novos equipamentos já têm essa facilidade. E hoje é muito fácil e barato comprar um rádio, é mais fácil que antigamente.
ABr – Como é possível que uma transmissão de rádio clandestina interfira em comunicação aeronáutica?
Edílson Ribeiro – Com certeza absoluta, e não é difícil. No aeroporto de Brasília, temos recebido várias denúncias. Quando a interferência pode causar risco de vida ou interfere em comunicação de ambulância, de polícia ou na navegação aeronáutica, a solução é imediata. Tem que desativar. Se não desativar, vamos lá e desativamos no pau.
ABr – Os ficais da Anatel têm poder de polícia? Podem cumprir mandados sem a PF?
Edílson Ribeiro – Podem. Eles têm poder de polícia administrativa. Mas a PF participa por dois motivos: primeiro, quando é uma ação administrativa da Anatel, a PF pode acompanhar o agente para lhe dar segurança física, porque nossos agentes não usam armas. Nós pedimos o apoio da PF pra nos dar cobertura e salvaguarda ao nosso agente.
Está expressamente estabelecido que, caso haja impedimento, os agentes poderão solicitar apoio tanto da PF como da PM para garantir o seu dever de fiscalizar. Na outra, a ação da PF é para cumprir mandado de busca e apreensão determinado pela Justiça. E aí é nosso agente que vai como apoio à PF, para prestar apoio técnico na interrupção, onde vai desligar, como vai tirar sem causar dano aos aparelhos – porque somos especialistas nessa área. São duas coisas distintas.
ABr – A PM já atuou?
Edílson Ribeiro – O apoio é mais da PF mesmo. Mas. no interior, nem sempre o agente tem a PF à disposição para poder lidar com a fiscalização. Nesse caso, ele solicita a PM, mas nós adotamos como regra o apoio da PF. Mas nem sempre isso é possível.
ABr – O que acontece com equipamentos confiscados?
Edílson Ribeiro – Quando existe mandado – e uma ação da polícia que faz busca e apreensão -, esses equipamentos devem ficar à disposição da Justiça, porque são prova de um delito. Transitou e julgou o processo, normalmente a Justiça determina a transferência desses bens para a Anatel, nos termos da Lei Geral de Telecomunicações, particularmente do artigo 194.
Se o equipamento é um equipamento não-homologado pela Agência, a solução é passar um trator por cima e destruí-lo, porque não há como fazer essa homologação. Se é um equipamento homologado, aí a Anatel pode dar qualquer destino, inclusive, por exemplo, doar a uma rádio autorizada de uma universidade. Mas nunca tivemos um caso desse tipo… O normal é a gente destruir.
ABr – E as fiscalizações em rádios comerciais?
Edílson Ribeiro – A quantidade de infrações é mais ou menos a mesma. Mas o serviço de radiodifusão outorgado vai passar para o Ministério (das Comunicações) a partir de 1º de janeiro. Vamos fiscalizar, emitir laudo e mandar pro ministério. A Anatel ficará apenas com não-outorgada.
ABr – A fiscalização de radiodifusão tem aumentado?
Edílson Ribeiro – Nosso foco maior de fiscalização é telefonia fixa, móvel e universalização: esses vão ser os grandes focos para 2005. Vão consumir 70% do nosso esforço.’
Fabrício Ofugi
‘Entenda o que são as rádios comunitárias no Brasil’, copyright Agência Brasil, 6/01/05
‘As emissoras consideradas legalmente como ‘rádios comunitárias’ no Brasil foram definidas em 1998 pela lei 9.612, regulamentada pelo decreto 2.615, do mesmo ano. De acordo com o texto, a Radiodifusão Comunitária, também chamada de RadCom, é ‘um serviço de radiodifusão sonora, com baixa potência e com cobertura restrita, outorgado a associações comunitárias e sem fins lucrativos’. Ou seja, são estações de rádio que transmitem informações, serviços e promovem a integração nas comunidades.
O secretário-geral da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e coordenador do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Celso Augusto Schroder, entretanto, considera que, apesar de a lei de RadCom ter surgido a partir do FNDC, um movimento criado em 1991 por entidades da sociedade para discutir a comunicação no Brasil, ela atende basicamente ‘aos interesses das grandes rádios e dos grandes proprietários de mídia no Brasil’.
Ele lembra que a idéia de regulamentação das rádios comunitárias tinha o objetivo de protegê-las. No entanto, ‘a lei vem restritiva’ e, por exemplo, o ‘alcance das rádios comunitárias foi muito limitado e muito diminuído na sua potencialidade’. Assim, segundo Schroder, a função de ‘proporcionar voz às comunidades’ e incentivar a produção cultural não é correspondida pelo modelo de RadCom instalado por lei.
O coordenador jurídico da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), Joaquim Carvalho, também diz que essa legislação não representa a realidade das rádios no Brasil. Entre as críticas, a Abraço (que faz parte do FNDC) não concorda com a delimitação de um único ou mesmo poucos canais de freqüência na FM para as rádios. ‘As rádios comunitárias têm que ser livres e colocadas em todo o dial, independente de um número único de canal, conforme a necessidade de cada comunidade’, diz Carvalho. Ele acrescenta que, além de ampliar o espaço para que mais rádios funcionassem, o aumento de canais evitaria a interferência entre rádios em municípios próximos ou, até mesmo, numa mesma cidade.
O limite de alcance das rádios (um quilômetro de raio) e a restrição da potência em 25 watts – art. 6 e 5 do decreto 2.615/98, respectivamente – são outras restrições criticadas pela Abraço. Joaquim Carvalho entende que esse raio de alcance deve ser ampliado, assim como o limite de potência. ‘Não há condições nos municípios maiores de conseguir manter potência de 25 watts pra atender qualquer comunidade’, afirma. Ele explica que na cidade de São Paulo, por exemplo, essa potência não atende a uma quadra sequer.’
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‘Maior entrave a liberação de comunitárias é preenchimento de formulário, diz Ministério’, copyright Agência Brasil, 6/01/05
‘O principal entrave para a concessão da licença de funcionamento a uma rádio comunitária está no preenchimento dos formulários de petição, afirma o secretário de Serviços de Comunicação Eletrônica do Ministério das Comunicações, Sérgio Luiz de Moraes Diniz. ‘As pessoas não conseguem fazer a correção que a legislação exige’, diz. ‘Mesmo o pessoal de capitais, com nível mais elevado’, possui dificuldades no preenchimento ou dificuldades jurídicas.
Atualmente, o Ministério das Comunicações, órgão que emite as licenças, exige 16 documentos para iniciar o processo de outorga de uma rádio comunitária, como CNPJ, ata de constituição da entidade, estatuo social registrado, comprovante de naturalidade brasileira e de endereço dos diretores e manifestação de apoio à iniciativa, entre outros.
Sobre os critérios de seleção em relação à associação ou fundação que terá direito a uma rádio comunitária, o secretário considera as manifestações de apoio como fator determinante. ‘Quem apresenta o maior número de manifestações de apoio será contemplado’, afirma. Tanto pessoas físicas como jurídicas podem apoiar essas entidades, e Diniz afirma que são essas manifestações as responsáveis pelo ‘embate entre as entidades’.
Sérgio Diniz afirma que o preenchimento incorreto dos formulários gera ainda um custo à União, porque é preciso informar às entidades que o documento está errado. Assim, o ministério envia correspondências registradas, o que resulta em gastos. Para Diniz, toda essa burocracia contribui para o desestímulo em criar uma rádio comunitária.
Para acabar com o problema do preenchimento dos formulários, Sérgio Diniz afirma que há um grupo de trabalho que discute o assunto e que uma conferência nacional será produzida em 2005. Além de cartilhas e manuais para auxiliar esse preenchimento, o secretário diz que a facilidade no processo de abertura das rádios comunitárias também será discutida na conferência, onde ainda serão discutidas mudanças na própria legislação.
Desde 1998, quando foram criadas as normas que regulam as rádios comunitárias, até o último relatório divulgado, de 30 de agosto de 2004, o Ministério das Comunicações autorizou o funcionamento de 2.197 rádios comunitárias. Até 17 de dezembro de 2004, havia ainda 8.388 processos em andamento no Ministério.’
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‘Abert faz cerca de 50 denúncias por mês contra rádios sem licença’, copyright Agência Brasil, 6/01/05
‘Cerca de 100 denúncias contra rádios não-outorgadas são enviadas à Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) por mês. Segundo o assessor jurídico da associação, Rodolfo Moura, ‘dessas, algumas não têm condições de serem levadas adiante – por falta de dados – e nós fazemos aproximadamente umas 50 (denúncias), por mês, aos órgãos competentes do governo’. Moura explica que a Abert acompanha esses processos junto a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), órgão fiscalizador do tema.
Sobre as rádios denunciadas, Rodolfo Moura considera que ‘se dizem comunitárias, mas não o são’. Ele explica que essas rádios são ilegais porque não possuem nenhum tipo de autorização ou outorga, além de não possuírem um estudo de viabilidade técnica para funcionarem. ‘Uma pessoa compra um transmissor e coloca no ar (a programação de rádio), sem fazer recolhimento de qualquer imposto, sem fazer estudo de viabilidade técnica, esses nós denunciamos’, diz.
Em relação à afiliação de rádios comunitárias licenciadas, Moura afirma que o estatuto da Abert não as permite. ‘[As rádios comunitárias] são completamente diferentes de emissoras [comerciais], são serviços que objetivam atender à população de forma diferenciada’, e por isso, segundo ele, a associação não as aceita.’