‘Quando adolescente, eu era uma prolífica redatora de cartas. Uma das que escrevi tinha 56 páginas e estava cheia de detalhes terrivelmente corriqueiros da vida diária. Poderia interessar só a mim e, talvez, com um pouco de boa vontade, ao destinatário. Mas talvez historicamente poderia se tornar fascinante, precisamente por causa das minúcias que contava.
Um dia desses, estava conversando com um escritor que está prestes a embarcar na biografia de uma famosa concubina histórica. ‘Algumas das cartas escritas por ela’, contou-me o biógrafo, ‘não tem nenhuma pontuação. Elas têm um clima de total falta de fôlego e sua leitura é extremamente fascinante’.
Enquanto registros oficiais da história – livros, retratos e fotografias – podem enfeitar a verdade porque foram sempre destinados a uma platéia, as cartas, em contraposição, tendem a ser cruas e com freqüência gloriosamente despudoradas. Como resultado, mexeriqueiras.
Afinal de contas, eram destinadas a apenas um par de olhos. Triste, porém, não é apenas o fato de que nós não mais escrevemos cartas apropriadas, mas o fato de que hoje em dia pouquíssima gente mantém sua correspondência.
Estamos obcecados por um modo de vida minimalista, que descarta as coisas.
Quem entre nós deixará documentos úteis para os historiadores e biógrafos que vão trabalhar daqui a 100 anos? Enquanto estava fazendo pesquisa para um livro, se não tivesse tido acesso a cartas, nunca teria descoberto que, no final do século 19, coletes vistosos provocavam tanta consternação que um camarada numa pensão escreveu a um amigo para dizer que, se alguma vez ele encontrasse um homem usando tal peça de vestuário, alvejaria o exibido. Ou que a rainha Vitória, numa carta de 1858 para seu filho, escreveu que ela enxergava a moda como uma ‘coisa frívola, mas algo que emite também o sinal externo a partir do qual as pessoas em geral podem julgar e freqüentemente julgam o estado interno da mente’.
Dificilmente, um pensamento de abalar o mundo, mas a revista Heat (publicação de variedades, com ênfase em celebridades) atrai vários milhares de leitores com muito menos.
Este mês o jornal italiano Corriere della Sera vem apresentado em uma série de reportagens sobre a correspondência trocada na década de 50 entre o romancista Italo Calvino e sua amante, a atriz Elsa De Giorgi. Elas oferecem uma visão maravilhosa da outra face de um escrito conhecido pelo seu estilo literário econômico: ‘Desejo-a tanto que a primeira vez que a tomei nos braços pensei que a faria em pedaços, rasgaria suas roupas e rolaria sobre seu corpo.’ Parece que um casamento infeliz pode, também, alimentar a redação de cartas – George Bernard Shaw escreveu mais de 250 mil cartas, mantendo uma correspondência que durou a vida inteira com duas mulheres em particular, mas nenhuma delas a sua esposa.
É uma pena que detalhes se percam pela falta de um pouco de escrita à mão e arquivamento. Acho que nós todos devemos ter por objetivo escrever ao menos uma carta por mês e devemos guardar as correspondências recebidas. E-mails particularmente bons deveriam ser impressos e mantidos. Os e-mails podem não deixar um exemplo da nossa caligrafia nem das lágrimas que borraram as frases, mas nos permitem catalogar nossas vidas.’
PRIMÓRIDOS DO E-MAIL
‘Há 35 anos era trocada a 1.ª mensagem via computador’, copyright O Estado de S. Paulo, 3/09/04
‘A internet, tal como a conhecemos hoje, só surgiu na década de 90. Mas a primeira comunicação entre um computador e outro aconteceu no dia 2 de Setembro de 1969, na Universidade da Califórnia. Sob a supervisão do cientista Leonard Kleinrock, foi enviada uma mensagem de um computador da Universidade da Califórnia, chamado Interphase Message Processor, que tinha o tamanho de um frigorífico, para outro, no vizinho Instituto de Investigação de Stanford.
Passados 35 anos, milhões de máquinas estão interligadas, trocando informações e permitindo a compra de mercadorias e serviços. A internet como tal, porém, surgiu a partir da criação da Agência de Projetos de Investigação Avançada (Arpa), uma resposta dos Estados Unidos ao avanço tecnológico da então União Soviética.
No final dos anos 60, a Arpa construiu uma rede experimental, de nome Arpanet, que utilizava a tecnologia de ‘packet switching’ (comutação de pacotes) para o transporte de dados e que é a base da atual internet.
O e-mail foi o primeiro grande serviço da internet. Ele foi criado em 1972, embora demorasse algum tempo até que a sua utilidade fosse totalmente compreendida.
Em 1992, no Laboratório Europeu de Física de Partículas (Cern), na Suíça, o cientista inglês Tim Berners-Lee inventou uma forma de disponibilizar documentos de texto com links, que, quando clicados, levavam a outras documentos. Era o embrião da World Wide Web, ou simplesmente Web.’
RÁDIOS NA WEB
‘Rádios on-line oferecem som multicanal’, copyright Folha de S. Paulo, 1/09/04
‘Boa parte dos internautas usa o computador para ouvir música. Os arquivos MP3 são campeões de popularidade, mas a próxima geração do áudio digital já está na rede. É o som surround, que emprega vários canais para criar uma sensação mais envolvente do que as tradicionais gravações estereofônicas.
Vários sites já oferecem músicas surround. Para tocá-las, o micro precisa ter, além de uma conexão de banda larga e pelo menos cinco caixas de som, uma placa de som multicanal. A Intel começou a incluir essa peça como equipamento de série nas placas-mãe de alguns PCs novos, mas ela pode ser acrescentada a qualquer micro.
Som surround
O formato Windows Media Audio Professional, da Microsoft, aceita gravações surround. Elas ainda não se popularizaram, mas há alguns arquivos no site www.microsoft.com/windows/windowsmedia/9Series/
GettingStarted//DemoCenter/AudioQuality.asp (eles estão na seção Surround Sound).
Para ouvir as demonstrações, é preciso que o micro tenha o sistema Windows XP e o tocador Windows Media Player 9. O RealPlayer 10 (www.real.com) também toca em surround e dá acesso a muitas gravações -para encontrá-las, basta digitar a sigla 5.1 no campo de busca do programa.
O site Tuner2 (www.tuner2.com) se destaca pela simplicidade e pelo avanço tecnológico. Seu repertório é limitado -até a conclusão desta edição, havia apenas uma emissora surround, com a abertura de uma segunda prometida para ontem-, mas as transmissões são fáceis de sintonizar.
Basta ter a última versão do programa Winamp (disponível gratuitamente em www.winamp.com). O diferencial técnico é que o Tuner2 não oferece os arquivos para cópia. Eles são enviados via streaming, ou seja, dispensam download prévio -basta clicar nos links para ouvir as transmissões no formato MPEG-4.
Esse formato é uma evolução do MPEG-2 Layer III, ou MP3. Os criadores do MP3 já desenvolvem sua tecnologia surround, a Iosono (www.iosono-sound.com), que tem como suposta vantagem a uniformidade acústica: o ouvinte não precisaria ficar bem no meio das caixas acústicas para sentir o efeito envolvente do som. O Iosono exige um computador especial, mas seus inventores dizem que o sistema também funcionará com PCs comuns. A primeira demonstração ao vivo da tecnologia será num concerto no próximo dia 17, na Alemanha.
Em variedade e qualidade, o site www.sr.se/multikanal/english/Ihe_index.stm, da rádio pública da Suécia, é o melhor. Ele oferece uma extensa coleção de arquivos multicanal (clique no link Sound Archive) e adota o formato DTS-ES. Esse formato proporciona melhor fidelidade de som, pois as gravações são digitalizadas com uma taxa de bits (bitrate) maior. A desvantagem é que os arquivos ficam muito grandes -a gravação de um concerto de 68 minutos, que é o destaque do site, tem 712 Mbytes.
Ginástica técnica
Ouvir o repertório multicanal dessa rádio exige uma certa ginástica, mas vale a pena. Se você simplesmente abrir os arquivos, ouvirá apenas chiado. É preciso gravá-los num CD, usando a opção CD Audio do programa de gravação (se você não tem um software do tipo, instale o CDBurnerXP, que é gratuito e está em www.cdburnerxp.se/downloadsetup2.php).
Os discos multicanal podem ser tocados em drives de CD-ROM, mas há um detalhe curioso. Se a reprodução não funcionar, você terá de desligar o cabo de áudio analógico que conecta, dentro do PC, o drive à placa de som. Uma dica: para obter máxima fidelidade, desative todos os efeitos especiais da placa de som.’
RÁDIO / CRÍTICA
‘Uma rádio dos sonhos’, copyright Folha de S. Paulo, 6/09/04
‘Trocando uma idéia com ‘Escuta Aqui’, uma lendária figura do rock do Brasil fala de dezenas de assuntos, o principal deles a lastimável situação da música nas rádios brasileiras.
Não quero apresentar soluções prontas (se as tivesse, compraria uma rádio e ganharia rios de dinheiro), mas vale a pena citar pontos da conversa. Afinal, como seria uma rádio superbacana?
Como todo mundo sabe, 99,99% do que toca no seu rádio, hoje, é jabá. Ou seja: as gravadoras pagam para que as estações bombem as faixas ‘de trabalho’ o dia inteiro. Durante séculos, fingia-se que o jabá não existia. Todo mundo ganhava, ninguém assumia. Hoje, fala-se mais abertamente, embora não haja lei sobre o assunto.
Pois então: na rádio superbacana, pode ou não rolar jabá? Será que, para provar que está longe dos trambiques, essa emissora deveria chutar o balde, tocando só o que desse na telha dos programadores?
‘Escuta Aqui’ e o roqueiro nacional estão de acordo: não dá para transformar a programação em algo aleatório, que não repete músicas só para provar independência.
é preciso ter alguma sistematização, algo a que o ouvinte se acostume. Exemplo dessa linha ‘independente, porém com rumo’ é a sempre elogiada Indie 103, de Los Angeles (www.indie1031fm.com). A linha-mestra é a seguinte: tocar só as melhores faixas de cada disco. E que discos são esses? Basicamente, os dos nomes ‘indie’ que estão bem no momento, mais clássicos alternativos dos anos 80 e 90.
A Indie 103 não torra a paciência apresentando uma mesmo música 80 vezes. Mas também não embarca na piração total de vasculhar o arquivo e tocar, no horário nobre, a faixa 15 de um grupo de rock progressivo siciliano dos anos 70.
Mas, e o jabá? O que fazer com ele no Brasil? Buscar a pureza total, ficando longe disso, ou aceitar a bagunça completa de hoje?
De novo, será que não seria possível um meio termo? Alguma regulamentação clara que explicitasse números e porcentagens, que não deixasse dúvidas sobre quanto e para quem é preciso pagar para que uma música toque? Ou será melhor manter a hipocrisia atual, situação de fato que não encontra respaldo no papel?’