Wednesday, 13 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1313

Antonio Brasil

‘O cinema sempre foi uma grande paixão. Pode ser considerado perigoso e causar muitas polêmicas. Mas o que seria da vida sem o cinema? Para alguns jovens cinéfilos durante os conturbados anos 60, os filmes representavam mais do que uma mera paixão. O cinema era a própria vida. Em tempos de muitas lutas e cobranças políticas, alguns desses jovens se refugiavam da dura realidade no escurinho das cinematecas. Eles descobriam os mistérios da vida, da política e do sexo em longas e apaixonadas discussões após a projeção dos últimos filmes de Godard, Fellini ou Antonioni. A realidade lá fora era por demais ameaçadora e exigia decisões ou posicionamentos políticos. O cinema, por outro lado, oferecia um refúgio seguro para essa realidade. Não era um lugar de ‘escapismo’ irresponsável, mas era bem mais seguro do que um que não fazia o menor sentido. Entre o fazer e o assistir, existia sempre a possibilidade de discutir, analisar e, principalmente, postergar. O cinema só cobrava uma discussão. A vida, no entanto, exigia luta.

Mas nem todos os jovens cinéfilos daquela época se contentaram em assistir aos filmes e adiar as decisões. Alguns desses jovens abandonaram o conforto e segurança das cinematecas e foram à luta. Uns se tornaram diretores de cinema, enquanto outros tomaram o caminho da guerrilha. Fizeram opções diferenciadas para enfrentar a vida. Mas todos certamente continuaram ‘apaixonados’ pelo cinema.

Os sonhadores

Esta semana, dois filmes excelentes foram lançados em Nova Iorque. The Dreamers (Os sonhadores) é a ultima produção de um veterano cineasta italiano muito conhecido dos velhos cinéfilos brasileiros: Bernardo Bertolucci. O outro filme tem o sugestivo nome de Osama, e foi dirigido por um diretor estreante, Siddiq Barmak, 41 que também já foi um cinéfilo apaixonado e se tornou ‘guerrilheiro’ no Afeganistão. Aprendeu a filmar em Moscou com os velhos inimigos, os temíveis soviéticos contra quem depois viria a lutar nas montanhas geladas do Hindu Kush. A vida de Siddiq Barmak é um verdadeiro roteiro de filme de aventuras. Mas, em seu filme de estréia, ele criou uma verdadeira obra prima. Ao invés da opção fácil pelas imagens de guerra e violência, ele optou pelas belas imagens da luta igualmente interminável das mulheres do Afeganistão e de todo o mundo por respeito e igualdade.

Em The Dreamers, Bertolucci retrata uma outra forma luta. Ele mostra com a sua arte a paixão dos jovens franceses pelo cinema em meio aos conflitos de uma Paris em chamas em 1968. Em seu novo e polêmico filme, Bertolucci resolveu enfrentar os talibans americanos que hoje dirigem os grandes estúdios e a censura americana. Ele não aceitou os cortes ‘recomendados’ por Hollywood e seu filme recebeu a rigorosa classificação NC-17. Ou seja, nenhum jovem americano de 17 anos mesmo acompanhado dos pais pode assistir ao filme do cineasta italiano. Os censores consideraram o filme como ‘quase’ pornográfico. Ele retrata uma época onde as paixões pelo cinema, o sexo e a política se confundiam e jovens americanos de hoje precisam ser ‘preservados’, principalmente do sexo e da política.

A luta de Osama

O ex-guerrilheiro e cineasta Siddiq Barmak, por outro lado resolveu lutar de forma totalmente diferente. Evitou a polêmica das imagens explícitas e se concentrou na poesia das insinuações cinematográficas. Ele segue uma linha mais próxima do novo cinema iraniano. Seus atores não conhecem muito bem o cinema, são todos amadores, mas conhecem bem a realidade de um Afeganistão ainda ameaçado pelo poder dos fundamentalistas. Siddiq Barmak escolheu tratar da discriminação das mulheres em seu país de uma forma discreta e delicada. A repressão ‘insana’ dos jovens estudantes militantes afegãos, mais conhecido pela mídia internacional como os temíveis ‘talibans’ ainda sobrevivem no interior do pais e ninguém pode garantir o futuro.

Em seus melhores momento, o filme mostra as agruras de uma menina afegã que precisa se transformar em um homem para assegurar o sustento da família. Ela adota um nome revolucionário que não pode causar dúvidas políticas ou religiosas: Osama. Mas ela precisa abrir mão da sua própria identidade feminina para garantir a sobrevivência de uma família de mulheres sábias. Sua mãe, enfermeira em hospital local e a avó, estão condenadas ao desemprego e à fome. A nova ordem política e religiosa dos fundamentalistas talibans não lhes permite alternativas. O pai, como tantos outros afegãos, morreu em uma das infindáveis guerras de um pais em luta contra tudo. As mulheres que sempre sobrevivem não podem trabalhar ou sequer sair pelas ruas descobertas ou desacompanhadas. O impasse é religioso, político e sexual.

Em uma das cenas mais bonitas e significativas do filme, um militante taliban cria o maior tumulto porque uma das mulheres ousa mostrar os pés descobertos. A ameaça de morte é constante e a explicação é simples: Você não tem vergonha? Não sabe que isso pode provocar os homens?

Em Paris, Kabul ou mesmo em Nova Iorque, o cinema, a política e o sexo ainda podem provocar os homens. O cinema continua lutando contra os fundamentalistas que tentam dominar o mundo. Para os americanos, as imagens de sexo explicito do cinema de Bertolucci são inaceitáveis assim como o pe da mulher afegã é imoral para os talibans. Mas, sexo a parte, são as discussões políticas levantadas em ambos os filmes que podem ser muito perigosas para os jovens de hoje. Longe das paixões. Eles são ‘preservados’ da dura realidade pelos donos do poder. E pelo jeito, a luta continua.’



Ana Maria Bahiana

‘Batalha de confete’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 17/02/04


‘Carnaval no Brasil, Oscar em Hollywood – este ano, especialmente, as duas celebrações, estranhamente, se encontram.Das tentativas de dar alguma perspectiva à histórica presença de Cidade de Deus entre os indicados, gostei especialmente da matéria de capa da Revista de Domingo do JB, dia 8 de fevereiro, assinada por Israel Tabak (Na Paz de Deus) – um panorama da vida na comunidade pós-filme, pós-sucesso, pós-indicações. Merecia muito, muito mais espaço, mais páginas para respirar e adquirir contornos mais profundos – mas este é outro dos muitos males que nos acometem, não é mesmo? Matérias como esta de Israel recordam sempre o mais exato objetivo do bom jornalismo de artes e entretenimento – dar contexto, ver além do superficial. Artes e entretenimento são superficiais, descartáveis? Só se a gente decidir que é – e se comportar assim.


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Depois do Carnaval, para os católicos, vem a quaresma – e, para todos, vem Mel Gibson. A batata quente de filme que é seu A Paixão do Cristo (estreando, num perfeito gesto de marketing, na Quarta Feira de Cinzas) pode ser vista de tantos ângulos diferentes que, em uma mídia saudável, seria a pauta perfeita. Além do viés aparente – anti-semitismo? Reflexos da religiosidade extremamente conservadora de Gibson e de seu pai? – valeria cavar em torno da bizarra relação entre Mel, o astro de milhões de dólares que, por sua simples presença, garante a existência de projetos de ainda mais milhões de dólares, e Mel, o devoto, que enterra 25 milhões de dólares de seu próprio bolso para realizar, basicamente, um ato público de sua fé. Como isso é tolerado, visto, digerido por uma indústria que, presume-se, é civil e secular?


Sem contar essa batata tão quente que já está frita – essa desconfortabilíssima relação entre crença e cultura de massa, crença e entretenimento, crença e marketing, proselitismo e bilheteria…


Vou parando por aqui. Para não tornar isso tudo muito indigesto, fico com a excelente análise de Elvis Mitchell no New York Times (Mel Gibson’s Longstanding Movie Martyr Complex, 8 de fevereiro de 2004), apontando para ainda outro aspecto deste auto-da-fé de celulóide: o ‘complexo de mártir’ de Mel Gibson , um astro com especial atração por papéis em que tem que sofrer muito, mas muito mesmo. De preferência por alguma causa perdida – algo que aparece com maior transparência nos filmes que ele mesmo dirige.


‘Quando ouvi que Mel Gibson estava dirigindo um filme sobre a paixão de Jesus minha reação imediata foi – por que será que demorou tanto?’, Mitchell escreve. ‘Imagino que ele só deve lamentar o fato de estar meio velho para o papel principal.’


Tenho que concordar com a acidez de Mitchell – repetidas vezes, nas poucas entrevistas que tem concedido sobre seu filme, Gibson tem definido a controvérsia em torno de seu trabalho como ‘terríveis e dolorosos ataques’ e ‘perseguição’, afirmando estar ‘resignado a sofrer em silêncio’ como é seu ‘dever cristão’.


Close na coroa de espinhos, por favor.


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Interessante a reflexão de Marcelo Russio sobre a gradual e aparentemente inexorável substituição dos correspondentes esportivos por agências. O mesmo processo, exatamente , está se passando com o jornalismo cultural. E não vejo como detê-lo nas demais áreas da mídia.’




OSCAR CENSURADO
O Globo

‘Oscar terá 5 segundos de atraso na televisão’, copyright O Globo, 11/02/04

‘A cerimônia de entrega do Oscar, que acontecerá no próximo dia 29, será transmitida ‘ao vivo’ pela televisão para todo o mundo, com um atraso de cinco segundos. Desta maneira, a rede de televisão ABC imita o procedimento da CBS, que usou cinco minutos de atraso na transmissão do Grammy, domingo passado. A medida procura evitar a exibição de cenas inesperadas que possam ofender os espectadores como aconteceu, há dois domingos, durante o show de intervalo da partida final do Super Bowl, o campeonato de futebol americano.

Medida foi provocada pelo incidente com Janet Jackson

Naquela ocasião, quase 90 milhões de espectadores viram um seio da cantora Janet Jackson no fim de sua apresentação no show do intervalo. O incidente provocou uma onda de moralismo nos Estados Unidos e as redes de televisão passaram a se preocupar com o conteúdo imprevisível de suas transmissões ao vivo, adotando o atraso que vem sendo chamado de ‘cinco segundos de decoro’. A ABC informou que, com o atraso, pretende tirar do ar ‘expressões fora do roteiro e obscenas’. A rede garante que não haverá censura sobre o possível conteúdo político dos discursos dos premiados.

A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, que produz o programa do Oscar, enviou uma carta a todos os seus associados dizendo que não tem ‘capacidade contratual para rejeitar a decisão da cadeia de TV de ceder à pressão do governo’.

O ator e diretor Tim Robbins, candidato este ano ao prêmio de melhor ator coadjuvante por sua interpretação no filme ‘Sobre meninos e lobos’, já mostrou-se contrário à decisão:

– Se vivemos numa sociedade livre, temos que estar preparados para lidar com qualquer coisa. Estão com medo do quê?

Seu colega Alec Baldwin, candidato ao Oscar na mesma categoria pela atuação em ‘The cooler’, é mais condescendente:

– É uma situação rara, mas cinco segundos não atrapalham tanto e o que aconteceu no Super Bowl tinha que ter sido censurado.

Carta mostra que Academia é contra a censura

A carta da Academia indica que ela é totalmente contrária aos ‘cinco segundos de decoro’. ‘Uma vez que se aceite a idéia do atraso, até onde isso vai chegar? Quanto tempo será preciso para que não apenas as palavras, mas também as idéias sejam censuradas?’, diz um trecho.

O discurso do cineasta Michael Moore no ano passado, quando ele recebeu o prêmio de melhor documentário de longa-metragem por seu filme ‘Tiros em Columbine’ e expressou sua opinião contrária às ações do presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, é o exemplo citado por todos que temem a censura da festa do próximo domingo.’



CELEBRIDADE
Daniel Castro

‘Novela bate recorde de merchandising’, copyright Folha de S. Paulo, 16/02/04

‘A atual novela das oito da Globo, ‘Celebridade’, já é o maior sucesso de merchandising da emissora. Até a semana passada, a Globo havia vendido 60 ações do gênero, em que aparecem produtos ou falas enaltecendo qualidades de mercadorias ou serviços. O número não inclui merchandisings da própria Globo, como os do filme ‘Amor, Sexo e Traição’, por exemplo. Cada merchandising custa até R 500 mil, mais 10% de cachê para atores e técnicos que participam da cena. Se manter esse ritmo, o que é muito provável, ‘Celebridade’ chegará ao fim com pelo menos 22 merchandisings a mais do que ‘Mulheres Apaixonadas’, que, com 98 ações do tipo, bateu o recorde anterior da emissora. A trama de Gilberto Braga está atualmente na metade de sua duração. ‘Mulheres Apaixonadas’ só registrou 60 ações de merchandising quando faltava dois meses para o seu término. A Globo diz que ainda não há filas para se fazer merchandising em ‘Celebridade’. Mas afirma que a procura aumentou. Cada ação demora no mínimo 15 dias para entrar no ar após a assinatura de contrato. De trama atual, a novela tem forte apelo ao merchandising. Não bastasse, chegou a criar um fictício ‘game show’ só para atender seu principal anunciante, a operadora Intelig. Natura, Gatorade e Azaléia são as outras marcas mais presentes na novela.

OUTRO CANAL

Na selva A próxima edição do ‘reality show’ ‘Amor a Bordo’, do ‘Caldeirão do Huck’, será gravada no Amazonas, com apoio do governo do Estado, que tem interesse em divulgar suas paisagens. O programa será baseado em um barco, mas terá gravações em hotel.

Prestígio O canal de TV na internet AllTV (www.alltv.com.br) foi o escolhido pela Buena Vista International para promover, com exclusividade em TV, o lançamento do filme ‘O Custo da Coragem’, com Cate Blanchett, que relata a história da jornalista irlandesa Veronica Guerin, assassinada em 1996 após denunciar esquema de corrupção e tráfico de drogas.

Boa notícia O ‘Canal Aberto’, de João Kléber, não irá mais ao ar a partir de hoje. Em tese, pode voltar em abril, reformulado. Seu horário na Rede TV! será ocupado pelo ‘Repórter Cidadão’, que passa a se exibido das 17h20 às 19h40.

Má notícia Já o ‘Eu Vi na TV’, do mesmo João Kléber, volta a exibir hoje o ‘Teste de Fidelidade’, além de um quadro de humor com certa apelação ao erotismo. A baixa audiência está por trás de tudo.

Bola A Rede 21 (ex-Canal 21) terá a partir de março uma faixa de esportes aos domingos. É a primeira vez que o canal, do grupo Band, aposta em esportes. O programa terá duas horas.’