‘E já que estamos denunciando ‘baixarias’ na TV (ver artigo do C-se de hoje, Ofensiva atinge programas policiais) e lutando pelas liberdades em nosso país, também deveríamos aproveitar o momento para discutir esse tal horário eleitoral ‘gratuito’ na TV.
Pra começo de conversa, o horário eleitoral não é ‘gratuito’. Isso é ‘propaganda enganosa’ e o público deveria ser alertado. É caríssimo. As emissoras recebem ‘ressarcimento’ dos ‘prejuízos’ na forma de descontos fiscais. Ou seja, nós pagamos por esse festival de bobagens em espaço reservado para a propaganda partidária.
E não temos opção. Se você, como eu, não está satisfeito, dane-se! Pelo jeito, democracia no Brasil também não é ‘absoluta’. As alternativas são óbvias, mas em um jogo de cartas marcadas e interesses diversos ninguém se arrisca a perder a ‘boca livre’ de mais um ‘espaço reservado’ . O problema é que todos nós pagamos pelos excessos e privilégios de políticos despreparados, matreiros e ambiciosos.
Em um momento em que tantos jornalistas se insurgem contra a obrigatoriedade de pertencer a um CFJ, também deveríamos defender os direitos dos ouvintes e telespectadores. Vivemos em um espaço cada vez mais estreito entre o ‘obrigatório’ e o ‘proibido’.
No horário da propaganda eleitoral, tanto no rádio como no TV, a única opção para o público é assistir ou ‘desligar’ a TV ou o rádio. Mas nem todos podem ou conseguem enfrentar as conseqüências nefastas da ‘abstinência’ de um vício poderoso.
Horário eleitoral é igual à Voz do Brasil
A TV aberta no Brasil ainda é a principal e muitas vezes, única forma de acesso à informação – mesmo que de qualidade duvidosa, de entretenimento e companhia para milhões de brasileiros que não podem pagar os preços exorbitantes das TVs por assinatura.
Trata-se da mesma estratégia comunicacional dos tempos da ditadura de Vargas, que todos os donos do poder e tantos funcionários públicos privilegiados tanto apreciam e defendem. Em nosso país, o horário eleitoral na TV segue a mesma linha de desrespeito ao livre arbítrio de outra ‘excrescência’ radiofônica: A Voz de Brasília, quer dizer, a Voz do Brasil. Um programa caro e inútil que continua uma longa trajetória de privilégios com audiência cativa. Insiste em desafiar a vontade e a liberdade dos ouvintes.
A propaganda eleitoral no rádio é ainda pior. Hoje tive que ouvir durante um longo período a infindável repetição de uma única frase: ‘este horário está reservado para a propaganda eleitoral gratuita, este horário está…’ . Parecia um ‘mantra’ religioso ou uma ameaça. O partido político não apresentou a sua inserção publicitária por qualquer motivo e o pobre do ouvinte é refém de uma lei caduca e inadequada, sem qualquer opção ou defesa.
Quanto desrespeito ao público e a democracia. E quanto desperdício de tempo em um meio de comunicação poderoso e desperdício ainda maior de recursos públicos preciosos. Como sobra dinheiro no Brasil para propaganda eleitoral e governamental!
Baixaria eleitoral gratuita e obrigatória
Em nenhum país dito ‘civilizado’ se permitiria tamanha afronta com recursos públicos e com a ‘liberdade’ do público. Mas, hoje sabemos, que poucas coisas realmente mudam no Brasil. Liberdade não é um valor ‘absoluto’. Depende de diversas contingências e principalmente, depende de quem está no poder.
Esta semana, procurei assistir aos primeiros programas eleitorais na TV aqui mesmo no Rio de Janeiro. Que sacrifício! Baixaria por baixaria, prefiro qualquer outra coisa. Até mesmo os nossos telejornais nacionais, locais ou ‘policiais’. Aqui entre nós, não vejo tanta diferença! Baixaria não é só crime. É manipulação, distorção, descaso ou incompetência no jornalismo de TV.
Foi um desfile de agressões ao bom senso e a inteligência dos telespectadores. Ninguém merece. Chego a dizer que é um desserviço a democracia. Não é a toa que os brasileiros costumam desprezar os políticos em geral, e ainda mais os políticos municipais. Como são despreparados para fazer política e para aparecer na TV.
Para avaliar as minhas próprias opiniões, procurei assistir aos programas com um pequeno grupo de pessoas. Eles não eram marqueteiros, políticos ou seus parentes mais próximos. Gente comum que gosta e precisa assistir a TV.
Todos os pesquisados estavam dispostos ao ‘sacrifício maior’ de assistir aos programas eleitorais no Rio de Janeiro, capital cultural do país e centro de produção televisiva.
Deveria ser um programa ‘atípico’ considerando a importância da cidade e da qualidade de produção comunicacional. Mas o resultado foi assustador!
Os comentários dos telespectadores eram sempre os mesmo. ‘Esses candidatos mais parecem humoristas do que políticos.’ Não é a toa que o horário eleitoral na TV é a alegria e fonte de inspiração de diversos programas de TV como o Casseta & Planeta ou o Plantão de Notícias. Nossos candidatos parecem tudo, menos políticos.
Vote no ‘Seu Creysson’
Outro comentário dos nossos pesquisados se referiam a questão do ‘despreparo’ dos candidatos. Qualquer um pode ser candidato a vereador no Brasil e aparecer na TV durante o ‘espaço reservado a propaganda eleitoral’ na TV. Uma fogueira de vaidades com recursos públicos preciosos.
Em relação ao despreparo de nossos políticos, assim como tantos jornalistas defendem uma formação específica para os futuros jornalistas, deveríamos exigir algum tipo de formação específica – não precisa ser universitária, para candidatos a cargos públicos.
É claro que muita gente vai reclamar, mas então também não reclamem que jornalista não tenha diploma. Não vejo tanta diferença entre os objetivos e obrigações de um político e de um jornalista. Mas a verdade é que temos muitos políticos que são analfabetos ou semi-analfabetos. Pude assistir a vários exemplos de ‘Seu Creysson’ não horário eleitoral na TV.
Nomes dos políticos parecem apelidos de bandidos
O calvário eleitoral na TV desse ano é muito especial, mas não é atípico. Os candidatos a vereadores de muitos partidos se apresentam perante o publico em um tempo digno de recorde ‘olímpico: preciosos 5 segundos para descrever a sua trajetória política e seus objetivos publico. Pode? É claro que é impossível, o máximo que conseguem é dizer o próprio nome e uma frase de efeito!’.
Já que não pude saber nada sobre a trajetória ou objetivos dos políticos, procurei selecionar alguns nomes que considerei exemplares. O que mais me chamou atenção, é que a grande maioria desses candidatos a vereador possuem ‘nomes de guerra’ ou apelidos. Deve ser mais uma grande idéia de marqueteiro político. O problema é que os candidatos na TV ficam muito parecidos com outras celebridades igualmente notórias: bandidos e traficantes famosos.
Um desfile de ‘bonecos’ com nomes esdrúxulos como:
– Tião do Carnaval, Bebeto do Ouro, Ricardo Pastel, Rogério das Kombis, Bené do Cesarão, Cidinho, Jorge Babu, Guaraná, Zezé, Leonardo Dinamite, Jerominho e tantos outros.
Tenho certeza de que os nossos leitores em outras cidades tem exemplos ainda melhores.
Ditadura no Rádio e na TV
Em relação à linguagem televisiva nada poderia ser mais deprimente. O horário pode ser gratuito – para os políticos – mas a produção de bons programas de TV ainda é muito caro e complexo. Mas o horário eleitoral também é a alegria de muitas produtoras de vídeo brasileiras. Nem todas entendem de TV, mas sabem como superfaturar com a ingenuidade e ignorância de nossos políticos. Os preços desses ‘spots’ para a TV, apesar de muito mal produzidos, são sempre caríssimos. O problema é receber o dinheiro de candidato que perde as eleições. Tive uma das primeiras produtoras de vídeo do Rio de Janeiro e fiz questão de afixar um cartaz enorme na recepção: programas para candidatos somente com dinheiro adiantado. Produzir os programas era fácil. O difícil era receber o dinheiro devido. Muitos colegas tiveram que ir a Justiça para receber o que lhes eram devido. No entanto, o horário eleitoral na TV rende fortunas para as produtoras envolvidas com o poder e com os marqueteiros de sucesso. Quem paga a conta somos todos nós.
Não sou contra o Horário eleitoral ‘dito gratuito’ no rádio e na TV (Por que não fazer o mesmo nos jornais e na Internet?) Mas sou contra o seu formato e, principalmente, sou contra essa obrigatoriedade. Tenho o direito inalienável de assistir a outras baixarias tanto no rádio como na TV. Já sou obrigado a pagar tantos impostos, receber tão pouco em serviços públicos essenciais e, ainda mais importante, não deveria colocar em dúvida a própria ‘democracia’. Televisão e rádio são veículos de comunicação de massa poderosos e perigosos. Exigem competência, qualidade e liberdade de opção!
Se não lutarmos agora, algum dia desses, outras ‘baixarias televisivas’ também serão consideradas ‘espaço reservado’ para uma propaganda eleitoral ou governamental.
A ditadura na TV e no rádio tem espaço reservado no horário eleitoral nada ‘gratuito’, mas certamente ‘obrigatório’.’
O Estado de S. Paulo
‘Começou a baixaria’, Editorial, copyright O Estado de S. Paulo, 20/08/08
‘Em 25 de abril, o Estado publicou entrevista com Marta Suplicy intitulada Estou preparada para uma campanha sórdida. A prefeita, então, profetizou: ‘Vão ser usados todos os meios, possivelmente até os mais sórdidos.’ Haveria, disse ela, na oposição ‘um cunho de perversidade por eu ser mulher’.
Desde que foi iniciada para valer a campanha eleitoral para a Prefeitura paulistana, com a veiculação das mensagens dos candidat/os na propaganda política gratuita nas emissoras de televisão e nas estações de rádio, o eleitor só encontrou motivos para concordar com o vaticínio da sra. Suplicy.
De fato, marqueteiros e políticos se têm esmerado em baixar o nível das mensagens publicitárias por eles produzidas, a ponto de surpreender o público – o que não é fácil, pois se sabe que esse material nunca primou pela excelência da qualidade nem pelo respeito à ética republicana e à inteligência da platéia.
Só que a carapuça que ela tentou pôr na oposição cabe em sua cabeça: não foi dos oponentes, mas dela mesma, a iniciativa de partir para a ignorância e expor a própria vida íntima, numa tática ‘preventiva’ para enfrentar a ‘sordidez’ à qual não apelaram seus adversários. Se os paulistanos já estão bem habituados com a falta de sutileza do candidato do PP, Paulo Maluf, não se pode dizer que este tenha batido abaixo da linha da cintura ao apresentar o próprio núcleo familiar em fotos, lembrando estar casado com a mesma mulher há 49 anos.
O outro candidato com quem a prefeita empata tecnicamente, segundo as pesquisas, José Serra, do PSDB, tem baixos índices de rejeição, mas dispõe de poucos atrativos físicos para seduzir o eleitorado. Ele tem feito um esforço muito grande para se comunicar com a gente comum, exibindo um semblante menos carrancudo, iluminado por um sorriso que não parece natural.
E não teve tempo para se imiscuir em assuntos pessoais de ninguém. Aliás, nem seria justificável num candidato que se apresenta como ‘do bem’. No time de 11 candidatos com menos chances se destaca ainda Luiza Erundina, do PSB, que usa seu tempo, mais escasso que o dos favoritos, para explicar ao eleitor por que quer voltar a administrar São Paulo.
A única estratégia a submeter a vida pessoal da prefeita à exposição dos holofotes e ao estardalhaço dos microfones foi a da própria candidata à reeleição. Duda Mendonça, o marqueteiro da moda no PT e no País, não teve pejo de se repetir, transformando o ‘Maluf que fez’ do passado em ‘Marta que fez’ do presente. E fez também ouvidos de mercador aos pruridos éticos de quem acha que, se não a vida privada, pelo menos as escolhas afetivas de gestores públicos (e, sobretudo, os segredos de alcova) devem ser excluídas do debate político.
Para surpresa geral e reprovação dos puristas, que ainda acreditam que o eleitor precisa ser informado dos planos administrativos, e não da vida sentimental dos pretendentes a cargos públicos, a prefeita deu, logo no primeiro programa do horário, explicações sobre sua separação do senador Eduardo Matarazzo Suplicy (PT-SP). O discurso deste, com voz embargada, apoiando a ex-mulher na convenção, foi divulgado, ao lado de atestados de ‘boa mãe’, dados pelos filhos André e Supla e pela canção especialmente composta pelo caçula João, entoando loas a sua vocação para avó. Para que não restasse dúvida nenhuma em relação à competência desta no papel de rainha do lar, seu neto Teodoro foi convocado a dizer duas palavras no programa: ‘Vovó Marta’. De seus familiares próximos só foi poupado o atual marido, Luís Favre, que, mesmo sendo um dos mais poderosos executivos da campanha petista à permanência na Prefeitura paulistana, não deu depoimento algum a respeito da candidata, pelo menos nos programas que foram ao ar até o fechamento deste editorial.
A exibição pública das intimidades dos políticos não é uma exclusividade brasileira, mas um expediente heterodoxo de conquista do eleitorado nas democracias vigentes na contemporânea sociedade da comunicação de massas.
Nessa tentativa de reeleger a atual prefeita, é usada como um jeitinho de reduzir os índices de rejeição da candidata, que atualmente só são superados pelos de Maluf. O problema é que, tendo escancarado a alcova da forma como o fez, será difícil para ela evitar que os adversários façam o mesmo, mas com objetivos opostos.’