‘Dan Rather, veterano ‘âncora’ dos principais telejornais da CBS anunciou sua renúncia esta semana. É o fim de uma era. Seu contrato não expirava nos próximos dois anos. Mas o escândalo do Rathergate, uma combinação de erros primários de investigação jornalística com ingredientes fatais de arrogância selou seu destino e do modelo de telejornalismo autoritário, de mão única, ‘eu falo, vocês ouvem’. Tom Brokaw, o âncora da emissora líder, a NBC, também se aposenta esta semana. O âncora com jeitão de cowboy preferiu não arriscar a decadência inevitável dos telejornais na TV aberta.
A ABC, por outro lado, resolveu aproveitar a ocasião para defender o seu próprio âncora, Peter Jennings. Resolveu investir milhões de dólares em uma campanha publicitária que alguns comentaristas consideraram ‘oportunista’, outros, ‘questão de vida ou morte’ para o apresentador da ABC. Se Peter Jennings não conseguir manter ou melhorar a sua posição no ranking – seu telejornal está em segundo lugar há 10 anos – será muito difícil justificar o seu prestígio e, principalmente, o seu salário milionário em tempos de crise e vacas magras para os patrões da Disney.
Outro programa de prestígio com ‘âncora’ poderoso também está ameaçado. Leroy Sievers, produtor-executivo do Nightline, o telejornal noturno da ABC News apresentado pelo veteraníssimo Ted Koppel, anunciou sua saída do programa. É uma perda significativa para um programa e ‘âncora’ com problemas sérios. Segundo o Wall Street Journal, ‘o pedido de decepção de Sievers sinaliza o enfraquecimento econômico do programa de notícias da ABC.’ Tudo a ver. Os departamentos de jornalismo das redes americanas sofrem uma pressão enorme das grandes corporações para reduzir os custos, aumentar os lucros e a audiência. Uma tarefa difícil considerando o envelhecimento do público de telejornais e da competição das novas tecnologias como as TVs por assinatura ou a Internet.
Walter Cronkite, o âncora com a voz de Deus
O jornalismo de modelo com ‘mão única’ onde o todo-poderoso ‘âncora’, a voz de Deus, acumula salários milionários, determina o noticiário, emite opiniões, monopoliza os grandes eventos e determina como o público deve pensar parece estar com os dias contados.
Esse mesmo modelo de telejornalismo foi criado pelo legendário Walter Cronkite também da CBS durante os anos 50, em pleno clima de guerra fria nos Eua e no mundo. Walter Cronkite não só era o jornalista de maior prestígio, mas também era considerado a personalidade mais confiável de todo o país. Além de um jornalista ou ‘âncora’ ele representava os ideais do jornalismo e da sociedade americanos. Naqueles tempos, havia uma ‘sintonia’ entre ambos. O jornalismo e os americanos mudaram muito. O país está dividido e o jornalismo também.
Esse modelo combinado de apresentador e editor-chefe de telejornais ainda é referência não só no EUA como em vários países como o Brasil. Obviamente, fizemos algumas ‘adaptações’. Não temos nada parecido com o poder e prestígio dos âncoras americanos. O nosso próprio modelo de telejornalismo desenvolvido e aprimorado durante a ditadura não cria condições para termos ‘âncoras’ de verdade. Criamos um ‘híbrido’ entre o modelo JN – apresentador bonitão com pouco jornalismo e poder de decisão mas com muita audiência, e o modelo Boris Casoy – jornalista veterano com larga experiência profissional, prestígio, que exagera nas opiniões mas que não faz a menor diferença porque quase ninguém assiste ao telejornal. Os ‘donos’ de nossas TVs preferiram não arriscar concedendo o poder a ‘âncoras’ de verdade.
Caça ao âncoras na Itália
Mas não é só nos EUA que os ‘âncoras’ dos telejornais estão ameaçados. Na Itália, a situação também é considerada delicada. Segundo matéria publicada no Observatório da Imprensa, ‘Demissão à italiana – Berlusconi livre de âncora incomodo’ , as razões divulgadas podem ser diferentes, mas as ameaças se assemelham. Pelo jeito, a temporada de caça aos jornalistas considerados ‘poderosos’ e ‘perigosos’ não parece distinguir fronteiras. Enrico Mentana, após ter sido contratado pelo próprio Berlusconi há 12 anos, foi demitido esta semana. Ele trabalhava ‘com uma pequena equipe, partiu do nada, criou o TG5 (canal 5), do qual, além de diretor, era apresentador, e em pouco tempo conseguiu o 2° lugar em audiência, logo abaixo do TG1 da RAI, mas muitas vezes superando-o’… Segundo o mesmo artigo, ‘muito elegante, disse que vinha sendo fritado há algum tempo… Deu a entender que sua demissão foi uma exigência política superior’. Berlusconi também não gosta de âncoras poderosos.
Por um telejornalismo de conversa
A verdade é que simplesmente ‘substituir’ os velhos e poderosos âncoras dos telejornais por novos ancoras, não parece resolver a crise de audiência e de credibilidade dos programas de jornalismo nas TVs abertas.
O modelo autoritário de telejornalismo, ‘eu falo – vocês ouvem e… obedecem’ após a introdução da Internet e do jornalismo ‘blogging’ não tem mais a menor sustentação e justificativa. Seu fim é mesmo mera questão de tempo. O público anseia por um jornalismo menos ‘professoral’, hierárquico e autoritário. Preferem algo mais no estilo de uma ‘conversa’, um diálogo entre pares onde o público contribui e acrescenta valor às noticias. É o fim de um modelo de jornalismo de ‘pedestal’ onde o jornalista se considera detentor único das notícias e da verdade. Dan Rather não percebeu que os tempos mudaram. Hoje, o público de TV também utiliza a Internet, investiga os noticiários e derruba até mesmo os ‘âncoras’ mais influente e poderosos.
Os telejornais deveriam apostar mais na integração do poder massivo da TVs com os recursos das redes comunicacionais digitais como a Internet. Mas não se trata simplesmente de consultar a opinião do público com perguntas inúteis. As novas tecnologias oferecem inúmeras possibilidades para a melhoria dos telejornais. Muitas matérias produzidas pelos jornalistas de TV poderiam ser expandidas e disponibilizadas de forma gratuita em sites dos telejornais. Mas também é preciso experimentar e reinventar novas formas de incluir comerciais nesses produtos interativos. Insistir no modelo autoritário de telejornalismo baseado em estrelas milionárias e decadentes é muito perigoso para o futuro do meio. Ao invés de estrelas únicas e milionárias que monopolizam a identidade dos nossos telejornais, deveríamos investir em uma constelação de repórteres-apresentadores que contribuiriam para a experimentação e diversidade do meio.
Ignorar o potencial do jovens jornalistas e o poder participativo da Internet podem ser erros fatais para o jornalismo de TV não só nos EUA como em todo o mundo.
Âncora Multiuso e o Jô no JN
E no Brasil? Como seria o futuro dos nossos ‘âncoras’ e dos nossos telejornais? Quem seria o apresentador ideal do nossos telejornais. Segundo, artigo publicado pela Folha de São Paulo nesta semana, a solução nacional é ainda mais radical:
‘Âncora Multiuso – Daniel Castro – Rede TV? Inventa jornal de um homem só… A emissora está testando em Belo Horizonte um software em que o apresentador, em tese, pode colocar todo um telejornal no ar sozinho, manipulando pedais ou teclas na bancada. O telejornal ‘Notícias de Minas’, que estréia dia 24 em Belo Horizonte, será o primeiro a ter o Digital News. O apresentador, além de assumir funções de editor, fará reportagens.’
Faz sentido. Quem seria o seu apresentador favorito para o JN? Eu preferia apostar no Jô Soares. Tudo a ver. Pelo menos, seria bem mais criativo e engraçado.’
Sérgio Dávila
‘Nova fórmula da Fox muda a TV americana’, copyright Folha de S. Paulo, 5/12/04
‘No último dia 2 de novembro, a vida dos três principais executivos de jornalismo das três maiores emissoras abertas norte-americanas piorou, e não é porque o povo decidiu que George W. Bush ficaria mais quatro anos como inquilino da Casa Branca. Naquela noite, menos telespectadores buscaram a cobertura da ABC, CBS e NBC do que em 2000. Sim, as três juntas ainda atraíram quase 40 milhões de pessoas. Mas a ação mesmo estava na TV paga.
Enquanto o republicano contava os votos, a Fox News triplicava sua audiência. Mais de 8 milhões de telespectadores clicaram seus controles remotos na emissora do australiano Rupert Murdoch, que funciona como uma espécie de porta-voz eletrônico da administração Bush. Enquanto checavam os monitores de audiência, Roger Ailes, ex-assessor de Nixon, Reagan e Bush pai e atual presidente do canal noticioso, e o próprio Murdoch brindavam com Coca-Cola e cachorro-quente.
‘Eles mudaram a natureza do jogo’, afirmou Neal Shapiro, o presidente da divisão de notícias (o equivalente brasileiro a diretor de telejornalismo) da NBC, uma das ‘Três Grandes’ -as outras são ABC, cuja divisão noticiosa é comandada por David Westin, e CBS, liderada por Andrew Heyward. Nos anos 70, os principais telejornais do trio chegaram a dominar 75% da audiência. Hoje, têm 19%. Para piorar, dois de seus âncoras estão se aposentando (leia texto na página seguinte).
A Folha conversou com os três jornalistas quando o trio esteve na Universidade Stanford, em Palo Alto, na Califórnia, para uma sessão de perguntas e respostas com os estudantes, da qual a reportagem também participou. Leia os principais tópicos da entrevista e do encontro:
FENÔMENO FOX NEWS
‘A Fox News adicionou um novo ingrediente importante ao atual sistema: eles misturam notícia com opinião. Eles são uma mistura de noticiário e programa de rádio na TV. É uma fórmula poderosa.’ (Andrew Heyward, CBS)
‘Tudo bem dar opinião, mas esta precisa ser identificada claramente. O problema é quando o noticiário e a opinião são apresentados como a mesma coisa, como eles fazem. Isso é querer empurrar uma opinião como fato, o que corrói nossa missão principal. Nós temos de manter a meta central, que é contar a verdade como a vemos.’ (David Westin, ABC)
‘É importante olharmos para esta crescente cornucópia de opções, e a Fox News começou isso. Hoje é muito diferente do oligopólio confortável que prevaleceu no começo dos telejornais, quando você tinha as três principais emissoras com uma fatia de mercado enorme. Acho que essa mudança acaba beneficiando o telespectador, pois nos pressiona a buscar mais a excelência.’ (Heyward, CBS)
‘Sim, eu dou à Fox News o crédito de mudar a natureza do jogo.’ (Neal Shapiro, NBC)
AUDIÊNCIA DAS ‘TRÊS IRMÃS’
‘TV paga como a Fox News, blogs na internet, precisamos estar atentos a toda essa inovação tecnológica. Mas, por enquanto, uma boa parte do público ainda depende da TV aberta para se informar e nós temos de atender à essa demanda da melhor maneira possível.’ (Westin, ABC)
‘Dezessete milhões de pessoas assistiram à cobertura das eleições na TV paga, o.k., mas 40 milhões acompanharam nas TVs abertas. É uma boa notícia para a TV paga, mas eles ainda têm menos do que um em cada três espectadores.’ (Heyward, CBS)
‘Antes as pessoas organizavam sua vida de maneira a parar às 18h30 [horário em que os principais telejornais vão ao ar na TV norte-americana] para sentar em suas poltronas confortáveis e assistir a sua meia hora de notícias. O desafio agora é que nós temos de ir a esse telespectador, e não mais ele a nós. É conquistar o indivíduo numa sociedade saturada por emissoras noticiosas 24 horas por dia no ar, como a Fox News e a CNN, e sites noticiosos.’ (Westin, ABC)
GUERRA DO IRAQUE
‘Algumas das coisas que cobrimos durante a guerra não tiveram repercussão. A NBC entrevistou várias vezes um militar de alta patente que dizia diariamente que não haveria tropas suficientes no Iraque no pós-invasão. Esse fato, por alguma razão, não causou o menor efeito no público.’ (Shapiro, NBC)
‘Nós cansamos de noticiar que não havia a menor evidência de cumplicidade de Saddam Hussein no ataque terrorista de 11 de Setembro, assim como que não havia nenhuma evidência da existência de armas de destruição em massa. Mesmo assim, as pesquisas mostram que um alarmante número de pessoas ainda acredita que havia esse tipo de armas no Iraque… Sendo curto e grosso, nós decepcionamos o povo norte-americano na questão das armas de destruição em massa. Havia muitas questões e nós não fomos céticos o suficiente. Eu me arrependo sinceramente disso.’ (Westin, ABC)
COBERTURA DAS ELEIÇÕES 2004
‘Cobrir uma eleição presidencial é um serviço público que as emissoras são obrigadas a oferecer a seus espectadores. Se a meta fosse audiência e lucro, nenhuma emissora faria esse tipo de cobertura.’ (Westin, ABC)
‘Gostei muito da nossa cobertura nestas eleições. Foi um exemplo para as futuras. Fiquei feliz com a cautela dos repórteres em noticiar os resultados. Eles se contiveram e não cantaram vitória no meio do jogo. Que foi exatamente o que as emissoras fizeram em 2000.’ (Heyward, CBS)
‘Não nos arrependemos de ter usado todo o tempo que foi necessário para obter o resultado correto desta vez.’ (Shapiro, NBC)
PESQUISAS DE BOCA-DE-URNA
‘As pesquisas de boca-de-urna foram tendenciosas em relação ao candidato democrata [John Kerry]. É verdade.’ (Heyward, CBS)
‘Discordo. A boca-de-urna é um instrumento importante, mas só se for interpretada corretamente. Não acho justo dizer que houve erro. Um levantamento desse tipo não é tão acurado quanto o resultado da eleição, é só uma mostra.’ (Westin, ABC)
‘Não, nenhum de nós está contente com o fato de as pesquisas terem errado o resultado inicialmente. Todos nós estamos revisando a metodologia. Acho que houve, sim, erros, alguns dos quais conseguiremos sanar, outros não.’ (Shapiro, NBC)
FRAUDE NAS ELEIÇÕES
‘Recebemos dezenas de denúncias de que houve fraude em algum lugar nestas eleições, a maioria vinda de blogs. Nenhuma era verdadeira. Acredite, eu adoraria reportar uma história cabeluda sobre a eleição. [Risos] Na Flórida, então, seria ótimo, mas simplesmente não aconteceu.’ (Shapiro, NBC)
COBERTURA DAS CONVENÇÕES
‘Acho que as convenções dos partidos [democrata e republicano, que ratificam os candidatos à Presidência a cada quatro anos] estão tendo cada vez menos interesse noticioso. Nós todos cobrimos os discursos dos candidatos e dos políticos mais importantes, mas eu não me surpreenderia de ver cada vez menos cobertura desse tipo no futuro.’ (Heyward, CBS)
‘A cobertura das emissoras da TV paga foi mais exaustiva porque incluiu detalhes que só importam ou interessam aos insiders ou aos que chamamos de ‘political junkies’ [viciados em política].’ (Shapiro, NBC)
FENÔMENO JON STEWART ‘Pessoas como o Jon Stewart só conseguem fazer o que fazem porque as emissoras sérias fizeram suas coberturas sérias antes. É saudável existir paródia e sátira, mas se isso é o futuro do noticiário como andam dizendo [uma das principais fontes de informação de adolescentes nestas eleições foram os chamados programas noticiosos cômicos], então não há motivo nenhum para dar risada.’ (Heyward, CBS)
FUTURO DAS ‘TRÊS IRMÃS’
‘Há uma explosão no número de provedores noticiosos e seminoticiosos, há a banda larga, o ‘video-on-demand’, os celulares… E nós, das grandes emissoras, temos de reconhecer isso. A tecnologia permite ao público querer que nós cheguemos a ele, em vez de fazê-lo vir a nós, como acontecia antes.’ (Westin, ABC)
‘Sim, as pessoas podem acessar as notícias de diversas maneiras, mas acredito que sempre haverá um mercado para o telejornal noturno.’ (Heyward, CBS)
‘Quanto mais o jornalismo migrar para o ambiente da internet, mais os telejornais serão relevantes. Porque aquela combinação mágica de palavras e imagens pode levar o espectador a algum lugar e fazê-lo ter uma experiência diferente. E isso só os telejornais fazem.’ (Shapiro, NBC)’
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‘TVs aposentam os âncoras da era dourada’, copyright Folha de S. Paulo, 5/12/04
‘Com a voz embargada, Tom Brokaw encarou a câmera central no telejornal ‘NBC Nightly News’ da última quarta e disse: ‘Obrigado por tudo o que aprendi com vocês’. Assim, aos 64 anos, encerrou uma carreira de 23 anos e marcou o início do fim da era dourada dos âncoras, os apresentadores de TV que são também jornalistas experientes e (raramente) dão opinião no ar.
Em março, será a vez de Dan Rather, 73, deixar o ‘CBS Evening News’, que ancora desde 1981. Sobra Peter Jennings, 66, à frente do ‘ABC World News Tonight’ desde 1983 e sem planos de sair.
As emissoras aproveitam o momento para chacoalhar seus telejornais em busca de uma audiência mais jovem -que fugiu para a internet ou para os chamados programas noticiosos cômicos, como o ‘Daily Show’ de Jon Stewart, do canal de TV paga Comedy Central- e mais à direita, como o público de Bill O’Reilly na Fox News, que alcança 3 milhões de telespectadores em média, um número notável para uma emissora noticiosa de TV paga. Seria a ‘foxização’ das emissoras abertas, como disse à Folha um jornalista da ABC, que não quis ser identificado.
Brian Williams, 45, o substituto de Brokaw, um repórter sem grandes coberturas em seu currículo, mas considerado ‘bom de vídeo’, tem a missão de ganhar novos telespectadores sem alienar os antigos e assim manter a liderança de audiência do telejornal. Modéstia não será seu principal obstáculo. ‘Nessa noite, começa uma nova era nessa emissora’, disse ele, gravata roxa, jeito de galã, ao fim de sua estréia.
Já o caso de Dan Rather é mais complicado. Ele deixa seu posto antes do planejado (a data original era 2006, quando completaria 25 anos), em meio a suspeitas de ter praticado mau jornalismo. Em setembro último, o jornalista texano declaradamente democrata apresentou reportagem que trazia supostas provas do tratamento especial que o republicano George W. Bush teria recebido quando no serviço militar, nos anos 70; os documentos se revelaram no mínimo dúbios. Uma comissão independente investiga se houve má-fé ou falha na apuração.
Para seu lugar, há uma bolsa de apostas que inclui John Roberts, 48, correspondente-chefe na Casa Branca, que seria a opção mais ‘jornalística’. Mas estão no páreo também estrelas da casa como o ex-assessor de Bill Clinton George Stephanopoulos, do semanal ‘This Week’, e Matt Lauer, do matinal ‘Today’, mais conhecidos por seus atributos estéticos.
E os novos ares já se fazem sentir também para os lados do veterano de plantão. Desde que as aposentadorias dos concorrentes foram anunciadas, a ABC colocou no ar uma série de anúncios em que Peter Jennings se mostra mais ‘humano’ -uma das principais críticas feitas ao canadense é sua suposta ‘frieza’ ao relatar os fatos. Definitivamente, a temperatura é outra no atual jornalismo televisivo norte-americano.’
Luciana Coelho
‘Credibilidade é o ponto fraco da TV de Murdoch’, copyright Folha de S. Paulo, 5/12/04
‘Líder entre os canais a cabo de notícias e cada vez mais avançando no terreno de ABC, CBS e NBC- a Fox News certamente tem o que comemorar. Sua reputação em termos de credibilidade, no entanto, não tem o mesmo sucesso.
‘Quase nenhuma pessoa racional que acompanha o noticiário discorda que eles freqüentemente manipulem suas entrevistas e, às vezes, algumas reportagens, para a direita’, disse à Folha Robert Kubey, diretor do Centro para Estudos da Mídia da Universidade Rutgers (Nova Jersey).
A afirmação de Kubey reflete um problema enfrentado pela rede de Rupert Murdoch. Uma pesquisa de junho deste ano do Pew Research Center mostra que apenas 25% dos espectadores com acesso à Fox News acreditam em tudo que o canal mostra. Em contrapartida, 10% não acreditam em nada e 27%, em pouca coisa. A Fox fica consideravelmente atrás de sua maior concorrente, a CNN -32% crêem totalmente no canal, 9% não crêem em nada, e 19%, em pouco.
Um reflexo dessa diferença está no departamento de marketing: enquanto a receita da Fox News foi de US$ 340 milhões em 2003, a da CNN foi de US$ 876 milhões.
‘Os responsáveis por comprar espaços para anúncios afirmam que normalmente pagam à Fox News 75% ou 80% do que pagam à CNN -mesmo sabendo que a CNN tem metade da audiência’, escreveu Julia Angwin no ‘Wall Street Journal’. ‘Os programas com melhor índice são os de comentários, e mesmo o resto da programação sendo composta de noticiários, esses programas dão a impressão de que a Fox News é muito tendenciosa para ser considerada jornalismo puro.’
Sua audiência, no entanto, é fiel. Segundo analistas, é essa base sólida, conquistada graças à sua posição de antagonista dentro do chavão de que a imprensa americana é liberal (de esquerda), que explica o sucesso do canal. O tom veemente usado por seus apresentadores e a pauta carregada de temas de segurança, crimes e questões jurídicas também parecem garantir apelo popular.
‘Eles têm uma audiência leal e centrada em certos temas, além de terem uma mensagem constante’, afirma Al Tompkins, do Instituto Poynter de jornalismo.
Em uma célebre entrevista em outubro passado à revista ‘Salon’, Charlie Reina, que trabalhou na Fox News de 1997 a abril de 2003, falou que há ordens -às vezes expressas, mas normalmente implícitas- para distorcer as reportagens a favor do Partido Republicano. Ele chegou a citar um memorando interno contendo essas ordens. ‘Na Fox News, quando o assunto envolvia política, havia sempre indicações sutis, direções a seguir aqui e acolá.’
A assessoria de imprensa da Fox News rejeitou os pedidos da Folha para entrevistar seus executivos.’
Franthiesco Ballerini
‘Aos 25, CNN cria novas táticas’, copyright O Estado de S. Paulo, 5/12/04
‘Quem trabalha no meio televisivo sabe que um minuto é uma eternidade e que dá um trabalho enorme produzir conteúdo para este tempo. Imagine, então, produzir notícias e imagens inéditas para 24 horas, ou 1.440 minutos, todos os dias.
Em 2005, a CNN (Cable News Network) – uma das maiores redes de notícia do mundo – completa 25 anos produzindo conteúdo jornalístico 24 horas por dia. E, para atender a um público de mais de 1 bilhão de pessoas – um sexto da população do planeta – que tem acesso aos serviços da rede, a estrutura do conglomerado norte-americano é de deixar no chinelo todo o deslumbramento que a Globo consegue provocar nos visitantes de seu complexo em Jacarepaguá, o Projac.
A começar por sua sede, em Atlanta, a CNN tem até um hotel cinco estrelas com duas torres dentro da TV para acomodar empresários, jornalistas e entrevistados. Seus apresentadores são tão estrelas quanto atores de Hollywood a ponto de, todos os dias, centenas de turistas fazerem fila e pagarem US$ 10 para um passeio pelos corredores da rede.
Fundada pelo empresário Ted Turner, a CNN nasceu tímida, com 225 funcionários. Mas virou estrela do telejornalismo na Guerra do Golfo (1991), principalmente por ser uma das poucas a exibir imagens ao vivo da guerra. O resultado é que a empresa tem, hoje, 4 mil funcionários – a maioria jornalistas – e nada menos que 900 afiliadas.
Mas os próprios executivos da CNN admitem que este diferencial – a cobertura ao vivo de uma guerra – já não existe mais. ‘Agora, buscamos estar no máximo de lugares imagináveis em todos os cantos do mundo, sem estourar o orçamento da empresa’, diz Paul Ferguson, editor supervisor da CNN Internacional.
Para que isso seja possível, a rede começou a treinar, recentemente, jornalistas e produtores para usar uma nova tecnologia de transmissão de notícias. Com um minitransmissor, uma câmera pequena e um laptop, apenas duas pessoas são capazes, por exemplo, de transmitir um conflito no Iraque ao vivo. ‘Em cinco anos, queremos transmitir quase tudo por celular, já que o satélite custa US$ 700 cada 10 minutos. Com a transmissão por celular mais eficiente, não haverá país sob censura que segure informações’, complementa Ferguson.
Hoje, todo o conteúdo do programa Inside Africa, da CNN Internacional, é enviado à sede via e-mail. ‘Seria impossível ter este programa se não fosse a transferência de dados pela internet’, diz Paul.
Mas, se de um lado a tecnologia barateia custos, a CNN está gastando milhões de dólares na contratação de seguranças e treinamento de jornalistas para cobrir a guerra. ‘Somos acompanhados por um agente que nos indica, por exemplo, o melhor lugar para estacionar o carro e captar boas imagens no meio de um conflito’, diz Michael Holmes, jornalista que perdeu dois colegas recentemente em uma cobertura no Iraque. ‘Dormíamos três horas por dia somente’, complementa ele, que diz que, ao lado de roupas, capacete, água e uma faquinha, leva um ipod (aparelho que toca MP3 com alta capacidade de armazenamento) em todas as coberturas de guerra.
Transmitir um programa inteiro por e-mail não é o único fato curioso da CNN. Comentaristas como Arnaldo Jabor e Franklin Martins e cartunistas como Chico Caruso não teriam emprego na rede americana. Isso porque a política interna da empresa não permite expressar opiniões em nenhuma atração. ‘O programa Choque de Opiniones é um dos poucos a expressar comentários, mas de convidados’, explica Donna Mastrangelo, vice-presidente da CNN en Espa‡ol.
Ela diz que ser âncora de um telejornal – como William Bonner e Fátima Bernardes no Jornal Nacional – não é o topo da carreira na CNN, mas, sim, um dos cargos mais disputados do mundo. ‘Não tenho a menor idéia de quantas fitas de candidatos recebemos por semana, mas já fiquei oito horas vendo mais de 50 fitas em um só dia’, diz Donna.
Censura interna
Decidir o que deve ir ao ar em um canal visto por um público tão diverso não é a tarefa mais fácil para os editores da CNN.
O vice-presidente da CNN Internacional, Eric B. Ludgood, explica que imagens controversas – como as recebidas o terrorista Osama Bin Laden – são analisadas pela alta cúpula da emissora durante várias reuniões.
Ludgood conta que há casos de imagens que o público americano não vê, mas o resto do mundo acompanha. Ele explica que imagens de reféns no Iraque nunca foram exibidas na CNN Domestic (interna dos Estados Unidos), mas foram exibidas na Internacional. ‘Outro problema é como lidar com as imagens dos restos de um soldado morto. Decidimos não mostrar para o público interno porque eles são muito sensíveis a isso. Mas não privamos esta notícia na CNN Internacional’, diz.
O mesmo aconteceu no atentado de 11 de setembro de 2001 às torres do World Trade Center de Nova York. A CNN americana não exibiu os corpos caindo dos prédios, ao contrário da CNN Internacional.
Na CNN en Espa‡ol, a polêmica é menor. As principais notícias abordadas pela emissora – direcionada ao público latino-americano – são imigração e indústria de aerolinhas. ‘Percebemos que estes temas são os mais sensíveis para nosso público’, diz Dario Tonelli, produtor sênior da CNN en Espa‡ol.
CNN no Brasil
Uma média de oito horas diárias do conteúdo da CNN Internacional é produzida em Londres, seis horas e meia em Hong Kong e o restante em Atlanta. Os três lugares concentram a cobertura das 900 afiliadas.
Mas há um buraco no mapa-mundi da CNN e ele se chama Brasil. ‘Reconhecemos que a falta de uma emissora ou programa direcionado ao Brasil é um buraco nas nossas ofertas para o mundo’, diz Alex Gonzalez, vice-presidente de Desenvolvimento de Negócios para a América Latina. ‘No Brasil, há um jogador dominante, a Globo, o que torna o desafio bem maior’, complementa.
A CNN – que tem como maiores concorrentes mundiais a Fox News e a BBC World – sabe que não pode desembarcar no Brasil ignorando a Globo. É por isso que o projeto da CNN em português não sai da gaveta há mais de sete anos.
Gonzalez revela que as negociações voltaram a ‘esquentar’ nos últimos seis meses, mas os planos ainda estão longe de se concretizar porque falta um parceiro brasileiro para a empreitada.
Enquanto os planos de vir ao Brasil ainda são incertos, os executivos da CNN trabalham com as comemorações dos 25 anos da rede. A partir de janeiro, a CNN vai apresentar programas comemorativos, elegendo os maiores políticos, artistas e empresários dos últimos 25 anos. ‘Vamos mostrar onde estão hoje as pessoas que foram notícia na CNN ao longo deste período. Mas não vamos olhar só para o passado, vamos analisar o que nos espera nos próximos 25 anos’, fala Rena Golden, vice-presidente -senior da CNN Internacional. (Viagem feita a convite da Turner International do Brasil)’
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‘Fox News quebra reinado’, copyright O Estado de S. Paulo, 5/12/04
‘CNN e Fox News – liberal e conservadora, respectivamente, no conceito daquele país – têm travado entre si uma guerra de números de audiência.
A Fox News – que já ganha na audiência geral da CNN há algum tempo – garante que venceu a CNN nas eleições presidenciais americanas, mas não divulga dados concretos da vitória. Segundo dados publicados pelo jornal USA Today, a Fox News teria saído da cobertura com um saldo de 20% da audiência da TV paga, ante 8% da CNN.
A CNN se defende da derrota, alegando que captou 38 milhões de telespectadores, 18% mais que a Fox, no dia da eleição.
No bolo mundial, a CNN ainda tem a maior fatia: são mais de 200 países e territórios, com 161 milhões de assinantes. A Fox News alcança cerca de 40 países e regiões aglutinadas, contabilizando 85 milhões de assinantes.
Mas o jogo nos EUA, assim como cá, ainda favorece os telejornais abertos. Segundo o site de notícias Blue Bus, os três telejornais abertos da ABC, CBS e NBC atingem cerca de 30 milhões de espectadores – platéia que aqui o Jornal Nacional abocanha sozinho -, enquanto CNN, Fox News e MSNBC não chegam, juntas, a 4 milhões de pessoas.’