‘A vida no planeta certamente seria diferente se ricos experimentassem viver entre os miseráveis, ao menos por uma semana. Partindo dessa possibilidade, os produtores do reality show Mundos Separados (Worlds Apart) realizaram uma série original e comovente, que estréia hoje, às 21h30, no canal GNT. O primeiro dos quatro programas deste mês acompanha a família Palmer, de East Brunswick, New Jersey, que parte para o Quênia em busca de aventura. No epílogo, seus membros descobrem que, no deserto, o essencial é água, comida e, se possível, um pouco de afeto.
Na produção americana, que será apresentada às sextas, todas as famílias pertencem à classe média. O choque cultural enfrentado por elas em lugares como o deserto do Quênia é o mesmo de quem testemunha pelo vídeo esse encontro com a alteridade. Caem os discursos sociológicos, cresce o abismo entre culturas.
Ao mesmo tempo, esse abismo se transforma em ponte quando americanos médios, que moram em confortáveis casas com cinco quartos, como a família Palmer, são recebidos com generosidade insuspeita por nômades do deserto africano. O primeiro dos quatro programas tem momentos reais que repetem cenas marcantes do cinema, como o encontro do menino branco com o aborígine australiano em A Grande Caminhada (Walkabout), de Nicholas Roeg.
No filme do inglês Roeg, o garoto aprende com facilidade a língua do antípoda e volta transformado para o grande centro urbano. No programa inaugural de Mundos Separados, também é o garoto que parece aprender com maior facilidade os códigos da tribo nômade, criadora de cabras.
Em todos os programas, particularmente no terceiro, que mostra a família Thurman, de Oakton, Virgínia, numa ilha do Pacífico Sul, a 160 quilômetros da costa da Papua-Nova Guiné, a dificuldade de adaptação ao ‘outro’ é mais dos americanos. Hedonistas e acostumados ao conforto da vida moderna, jovens adolescentes morrem de tédio sem seus videogames e a agitação clubber, recusando-se a participar das atividades comunitárias que garantem a sobrevivência dos nativos.
Tal resistência traduz a dificuldade que o americano médio tem de aceitar a diversidade cultural (o que ficou bem mais claro após os atentados de 11 de setembro). Outros episódios, como o quarto, que acompanha a trajetória da família Rappy na Índia, revelam a ignorância em que esse mesmo americano médio está mergulhado. A primeira seqüência é reveladora: ao pisar num templo que tem a cruz gamada, seus integrantes, chocados, pensam estar diante da suástica nazista. É um pobre indiano que explica aos ricos americanos que Hitler se apropriou ilicitamente do signo religioso. Só então os últimos respiram aliviados.’
TV PAGA & TELEFONIA
‘Empresas de TV a cabo querem telefonia’, copyright O Estado de S. Paulo, 4/06/04
‘As empresas de TV a cabo estão de olho na telefonia e planejam lançar seus serviços ainda este ano. A idéia é aproveitar as vantagens trazidas pelo protocolo de internet (IP, na sigla em inglês) para cobrar menos que as operadoras de telecomunicações, com o objetivo de diminuir a perda de clientes e elevar a receita.
A TV Cidade planeja oferecer telefonia usando sua rede de cabos em Aracaju, Cuiabá, Salvador e no Recife. A empresa – que tem como sócios o Grupo Silvio Santos, a Rede Bandeirantes, os Diários Associados e fundos americanos – já pediu as licenças de telefonia fixa à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).
A TVA planeja um teste comercial com alguns clientes no próximo mês, em São Paulo. A companhia oferecerá o serviço com a parceria de operadoras. O lançamento deve ocorrer três meses depois. A Net também testa a tecnologia.
Atualmente, só a CTBC Telecom vende o serviço de telefonia via cabo, em Uberlândia.
‘Acreditamos que 60% dos que assinam internet rápida vão querer também um telefone’, explicou o presidente da TV Cidade, Marcos Henrique Costa. A empresa têm hoje 23 mil assinantes de internet via cabo e espera chegar, até o fim do ano, a 35 mil. Com TV paga, está presente em 18 cidades.
Os serviços de dados já respondem por 25% do faturamento da TV Cidade. A expectativa é que, somados à telefonia, a fatia do que não é televisão alcance 50% em dois anos. A empresa faturou R$ 118 milhões em 2003 e espera chegar a R$ 150 milhões este ano.
‘As telecomunicações reduzem a inadimplência’, afirmou Costa. ‘O assinante de internet, mesmo na crise, sempre fica.’ A estratégia, segundo o executivo, é oferecer pacotes de televisão, dados e telefonia. ‘Uma empresa de TV por satélite pode tentar tirar um hotel da minha carteira de clientes baixando preços, mas não conseguiria oferecer o pacote completo. O cliente pensaria duas vezes.’
A telefonia com protocolo de internet traz uma série de vantagens que devem ser exploradas pelas empresas de cabo. ‘Um escritório de importação e exportação pode ter um número de telefone de Miami no Brasil’, exemplificou o diretor de Novos Negócios da TVA, Amilton de Lucca. O cliente de telefonia IP pode levar o número para qualquer lugar que tenha conexão de internet rápida.
Outra possibilidade aberta pela tecnologia é a caixa universal de mensagens, que reúne num só lugar a secretária eletrônica, o correio eletrônico e o fax. ‘Dependendo de onde está, o cliente pode ouvir as mensagens de texto ou ler as mensagens de voz’, explicou Lucca, acrescentando que nem todos os recursos estariam disponíveis já no lançamento.
A TVA espera que 70% dos clientes dos 25 mil assinante do Ajato contratem uma linha telefônica.’
ENTREVISTA / MOACYR FRANCO
‘‘Quando um gênero agrada, todo mundo se dá bem’’, copyright O Estado de S. Paulo, 3/06/04
‘O programa de maior audiência do SBT em todo o território brasileiro é o seriado Meu Cunhado (segundo PNT/Ibope). Uma surpresa até para a emissora de Silvio Santos, que engavetou os 52 capítulos do humorístico – estrelado por Ronald Golias e Moacyr Franco – por quase três anos. Nesta entrevista, Moacyr, que além de interpretar o cunhado explorado por Golias também escreve a história, dirigida por seu filho Guto, fala das dificuldades de produção e diz que o sucesso da sitcom se deve à adequação ao talento do Golias.
Estado – Por que o SBT hesitou tanto em colocar ‘Meu Cunhado’ no ar?
Moacyr Franco – Era para estrear em 2001, mas começou a crise de dinheiro. E Silvio Santos foi protelando porque quis fazer o saneamento da emissora antes.
Estado – Até onde o adiamento afetou o programa?
Moacyr – Eu queria que estreasse naquele momento porque a gente mexia com a atualidade. Nos cinco ou seis primeiros episódios falamos de apagão, de No Limite, assuntos que estavam em alta naquele momento. Guto (Franco, diretor do programa) sacou que podia demorar e começamos a escrever de maneira meio atemporal, meio Chaves. Nunca tinha trabalhado desse jeito, meio Hollywood, de fazer e esperar anos para ser exibido.
Estado – A que você credita o sucesso do programa?
Moacyr – À adequação do Golias ao programa. Como um esquete, cada cena tem começo, meio e fim, porque o jeito dele de trabalhar é assim. E deixamos o Golias solto, andando em cena. Já no começo, Guto percebeu que a série devia ir para rua. Por falta de recursos, gravamos com uma câmera só, no ombro, sem iluminação, uma produção experimental, quase amadora. Foi um esforço danado. Meu Cunhado saiu mais barato do que programa de auditório. É sucesso porque o texto é muito bom e o elenco também.
Estado – O sucesso vai prolongar a vida do programa?
Moacyr – Mais do que retornar com a série, gostaria que o SBT acreditasse na idéia de que a criação e o texto são fundamentais para o sucesso de um programa. Todo mundo gosta de humor, ele sempre se contrapôs à crise. Tenho umas cinco ou seis idéias de programas bem engraçados.
Estado – Acha que o SBT encontrou a fórmula da sitcom?
Moacyr – Não, encontramos a família ideal para apoiar o talento do Golias.
Estado – Fazer mais sucesso do que ‘A Praça é Nossa’ não gera ciúmes nos bastidores?
Moacyr – Nunca pensei nisso. Mas acho que não gera ciúme porque, quando um gênero agrada, todo mundo se dá bem, um puxa o outro. É por isso que a Globo tem oito programas de humor.
Estado – Você e Golias fazem parte do elenco da ‘Praça’, que faz um humor mais pesado. Não acha que o público está querendo algo mais ingênuo?
Moacyr – Acho que o público quer tudo. Quer A Praça e Zorra Total, que é o humor meio carioca, das gírias e bordões. Tem lugar para tudo na TV. Quando escrevo, não deixo pesar e não é por moralismo. Quero surpreender, detesto piada batida. Quero ser engraçado e original.
Estado – Um dos seus filhos (Guto Franco) escreve e dirige o programa e outro atua. É um programa de família?
Moacyr – Eu queria que fosse mais, minha mulher (Daniela) fez algumas pontinhas na série. Ela ia lá me vigiar e eu acabei escrevendo umas falinhas para ela, como vizinha, balconista, essas coisas.
Estado – Sua mulher é atriz?
Moacyr – Ela fez cursinho para ser atriz, até tirou o DRT, vive fazendo teste para comerciais. Gosto de ter uma mulher trabalhadora, afinal, é mãe de três meninos.
Estado – A diferença de idade entre vocês é grande, não é?
Moacyr – Quase 40 anos. Quando conheci Daniela, eu tinha 54 e ela, 15. É um absurdo completo, é o fim da picada, não recomendo a ninguém.’
HISTÓRIA, HUMOR & TV
‘Quando a TV é uma comédia’, copyright O Globo, 6/06/04
‘A turma que freqüenta este humilde espaço – é pequena mas qualificada – sabe tudo sobre seriados brasileiros na televisão. Por isso, quando escrevi, na quarta-feira, sobre as tentativas da Rede Globo de criar uma comédia de costumes semanal nos moldes das bem-sucedidas sitcoms americanas, todo mundo teve um palpite para dar. A maioria das mensagens chamava a atenção do colunista para um ou outro esquecimento.
Houve quem tivesse se lembrado de ‘O jovem doutor Ricardo’, que, sob o patrocínio do Leite Condensado Moça, era apresentado nos anos 50 pela TV Tupi carioca, ao vivo, com Cyll Farney de protagonista e Yoná Magalhães como seu interesse amoroso.
Peralá. Não quis fazer um histórico dos seriados na TV. Minha intenção era escrever sobre as tentativas da Globo a partir de 1979, quando Daniel Filho lançou os três seriados ‘Malu mulher’, ‘Plantão de polícia’ e ‘Carga pesada’. E mais: só me referi a esta trinca porque ela fez história na TV brasileira. Na verdade, pretendia falar da difícil tarefa de fazer sucesso com comédias de situação. Aquelas que gastam só meia hora para contar uma história inteira surpreendente e divertida.
E, fala sério, no tempo de ‘O jovem doutor Ricardo’ eu nem via televisão.
Teve gente que sentiu falta de ‘Armação ilimitada’ e de ‘Ciranda, cirandinha’. Não tem nada a ver. As duas séries são do tempo em que o gênero era tratado como programa especial. Iam ao ar uma vez por mês. Não enfrentavam o desafio de exibir um roteiro inédito a cada semana.
Mas quase todos os e-mails que chegaram aqui queriam mesmo era fazer justiça a ‘A grande família’. ‘Alguma coisa contra esse programa?’, ‘Você se esqueceu do melhor de todos’, ‘O melhor não foi mencionado’, ‘Você omitiu uma das melhores comédias de costumes feitas recentemente’, ‘Que absurdo!’…
Também sou fã de ‘A grande família’, o programa criado em 1974 por Daniel Filho, Max Nunes e Roberto Freire. Se a gente for rigoroso, vai ver que as raízes do programa estão numa outra sitcom – esta dos anos 60 – exibida pela TV Record e que também era escrita por Roberto Freire, ‘Gente como a gente’. Nela, a mãe era Lélia Abramo; o pai, Felipe Carone; e os filhos, Irina Grecco, João José Pompeo e Silnei Siqueira. Na Globo, Eloisa Mafalda (agora Marieta Severo) ficou com um papel parecido com o de Lélia; Jorge Dória (agora Marco Nanini), com o de Carone; e os irmãos ganharam a força de Djenane Machado (agora Guta Stresser), Luiz Armando Queiroz (agora Lucio Mauro Filho) e Osmar Prado (o personagem foi eliminado na versão atual).
A família de Roberto Freire ganhou na Globo um genro encostado – Paulo Araújo (agora Pedro Cardoso) – tornando o programa mais parecido com uma sitcom que fazia sucesso na época nos Estados Unidos, ‘All in the family’. A pitada original ficou por conta da criação do personagem do sogro, vivido por Brandão Filho (Rogério Cardoso quando o programa voltou ao ar).
Mas ‘A grande família’ é um caso à parte. Nesta altura do campeonato, já pode ser considerado um fenômeno. A empatia que a fórmula do programa mantém com o espectador é única. Geralmente, novas versões de velhos sucessos costumam suscitar comparações sempre favoráveis ao modelo original. No caso de ‘A grande família’ isso não aconteceu. Todo mundo se lembra da primeira versão, todo mundo gostava da família original, todo mundo gosta da família atual e ninguém compara um programa com o outro.
Mas dei para falar de séries de TV porque torço por uma que vai ao ar hoje, ‘Sob nova direção’. Ainda não está nos trinques. Mas tem tudo para dar certo: uma dupla de protagonistas que são comediantes impagáveis, cenário praticamente único, elenco de apoio que brilha e um roteiro enxuto. Se o programa tiver tempo para acertar a mão, pode ficar no ar por muito tempo.
O engraçado é que a Globo parece estar investindo em sitcoms justamente no momento em que, no país em que ela surgiu, acredita-se que o gênero esteja esgotado.
Para a programação da TV americana, a sitcom é tão importante quanto a telenovela para a da brasileira. Ela ocupa o horário nobre. É comum serem exibidas quatro seguidas na mesma noite. Quando dão certo, ficam no ar por anos a fio. Uma sitcom de sucesso às 20h30m acaba puxando audiência para uma sitcom nova às 21h e assim por diante. Mas todos os críticos de TV americanos acreditam que o gênero nunca esteve tão por baixo.
Nas últimas temporadas, grandes sucessos de audiência como ‘Seinfeld’, ‘Sex and the city’, ‘Friends’ e ‘Fraser’ saíram do ar. Uma das poucas séries cômicas de sucesso que restaram, ‘Everybody loves Raymond’, já teve anunciado seu episódio final. É natural. O problema é que, até agora, não apareceu série alguma que repetisse os seus índices de audiência. Já se percebeu que a próxima temporada será aquela com menos sitcoms previstas nas últimas décadas. Os espectadores americanos parecem definitivamente enamorados dos reality shows.’