Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Antonio Gonçalves Filho


‘Aos 74 anos, o jornalista carioca Zuenir Ventura, autor de dois best-sellers, 1968, o Ano Que Não Terminou e Cidade Partida, acaba de inventar um novo gênero literário, a ‘alterbiografia’, cruzamento híbrido de autobiografia com a vida alheia. É justamente o escopo de Minhas Histórias dos Outros (Editora Planeta, 272 págs., R$ 37,50), em que a história pessoal de Ventura é apresentada em capítulos pelos quais desfilam outros importantes personagens da história do Brasil, do escritor Pedro Nava ao cineasta Glauber Rocha. Sobre eles, Zuenir falou ao Estado na entrevista reproduzida a seguir.


Neste meio século de jornalismo, você enfrentou dilemas de ordem ética, como decidir pela não publicação da verdadeira história do suicídio do memorialista Pedro Nava ou divulgar a causa da morte do cineasta Leon Hirzsman, vitimado pela aids. Você acha que o Brasil é moralista ou é a imprensa?


Os dois são. A todo momento enfrento esse dilema. Ainda há interditos morais, temas que são tabus. Não se pode nem ficar muito à frente nem muito atrás da sociedade. A imprensa não é a vanguarda da sociedade. Não pode disparar na frente, sob pena de provocar um curto-circuito. Esse equilíbrio é um tanto difícil, reconheço, mas não quero posar de crítico do jornalismo.


Você nasceu numa família pobre, teve de trabalhar para estudar, foi pintor de parede, office-boy e balconista. Como superou uma educação cheia de buracos para abraçar a carreira intelectual?


Minha formação é cheia de buracos, mas tive a sorte de cursar Filosofia, que me deu régua e compasso. Uso até hoje coisas que aprendi na Faculdade de Letras, onde tive o privilégio de ser aluno de Manuel Bandeira, um dos muitos intelectuais que me ajudaram a compensar todos esses buracos.


Seu livro traz um poema erótico pouco conhecido de Bandeira. Você, que foi íntimo do poeta, não pretende escrever um livro relatando suas impressões sobre ele?


É curiosa a repercussão entre os jovens quando conto que visitei a casa de Bandeira. De fato, nunca me ocorreu escrever um livro sobre ele, mas pertenço a uma geração que conheceu bem a dor de quem, como Bandeira, sofria de tuberculose, a aids de nosso tempo. Afinal, fui criado em Friburgo, que era uma cidade de cura. Quanto ao poema, não estou bem certo, mas acho que herdei essa raridade numa visita à casa de Bandeira, quase um acaso, porque eu não era um de seus melhores alunos. De qualquer modo, teria coisas para reconstituir, como o atrito de Bandeira com Hélcio Martins, a quem devo minha introdução no jornalismo, episódio que conto rapidamente em meu livro. Hélcio era um gênio, morto aos 36 anos.


Quando Glauber Rocha começou a elogiar os militares em plena ditadura militar, provocando a ira da esquerda, você achou que ele estava enlouquecendo ou fumando maconha demais, a ponto, inclusive, de convencê-lo a participar de uma sessão de descarrego?


Cheguei a ficar em dúvida quando ele me pediu que publicasse a carta. Liguei para o Cacá Diegues e ele me garantiu que era isso mesmo que Glauber estava pensando, ao eleger Geisel como o homem que tinha tudo para fazer do Brasil um país forte, justo e livre. Glauber tinha dessas coisas. Dizia que Geisel era luterano como ele. Considerava isso mais que uma coincidência. Ele tinha essa coisa baiana de profeta. Dizia, por exemplo, que iria morrer aos 42 anos. E morreu mesmo. Glauber era um intuitivo, uma pessoa generosa. Quando o encontrei em Portugal, tempos depois, não reclamou da publicação da carta. Apenas comentou: ‘Estou sendo linchado.’ Muito diziam, na época, que ele tinha feito acordo com os militares para dizer tudo aquilo, mas posso garantir que não havia sacanagem por trás disso. Ele sabia que a abertura viria, tinha um sentido histórico que pouca gente teve.


Você poderia ter morrido no lugar de Vladimir Herzog em 1975, caso tivesse ocupado seu cargo no Departamento de Jornalismo da TV Cultura. Como enfrentou o medo de ser preso e torturado, uma vez que seu nome era citado pelo Serviço Nacional de Informações (SNI) como o coordenador das campanhas do PCB na imprensa?


Eu só soube disso muito tempo depois por meio do Elio Gaspari. Na época, não acreditava que eu fosse um elemento perigoso. O Gaspari disse que, realmente, eu poderia ter morrido e estou certo que sim. Na época, trabalhava na Visão (Zuenir era chefe da sucursal do Rio e Herzog havia sido editor de Cultura da revista um ano antes de sua morte).


No verão da abertura política, isto é, em 1980, Fernando Gabeira apareceu de tanga de tricô lilás em Ipanema, para escândalo dos comunistas tradicionais. Sete anos depois, Leon Hirzsman agonizava com um vírus conhecido, na época, como ‘praga gay’, sendo igualmente rejeitado. Qual foi a sua reação na época?


Eu era metido a ‘prafrentex’, mas, no fundo, moralista como toda a esquerda. De qualquer modo, sempre gostei do Gabeira. Quanto ao Leon, eu e ele éramos muitos amigos desde a adolescência. Fui seu confidente e ele foi quase um irmão para mim. Quando escrevi seu obituário, divulgando a causa mortis, Norma, a primeira mulher do Leon, não meu perdoou. Eu, contudo, não me arrependo, porque fiz meu papel. Até como homenagem a ele, não teria coragem de omitir tal fato. Ele foi um mártir que morreu com esse estigma.


Nelson Rodrigues livrou-o da prisão, apesar de estar do outro lado da fronteira ideológica. Isso serviu para que você reavaliasse sua posição em relação a ele, considerado um reacionário pela esquerda?


Esse contato íntimo com o Nelson foi fundamental. Ensinou-me a não hierarquizar ideologicamente a pessoa. Aos poucos, ele foi entrando em minha cela e desmontou uma série de preconceitos que eu alimentava. Essa foi a minha grande lição.


Seu livro dedica um capítulo ao caso Pedro Nava, afirmando que ele se matou por ser vítima de chantagem de um garoto de programa. Contrariando a opinião de repórteres sob seu comando, que defendiam a publicação da notícia, você optou por não divulgar tal história. Foi a falta de provas ou o medo de macular a reputação do escritor o motivo de tal omissão?


Eu tinha razões objetivas. Acho que pesou muito o lado social, o pedido dos amigos para não divulgar a notícia. Você pode perguntar por que não pesou no caso do Leon Hirzsman, mas a situação era diferente. Leon era amigo íntimo e, no caso dele, pesou muito o preconceito social e individual.


Você não acreditava que seu primeiro livro, 1968, o Ano que Não Terminou, chegasse à segunda edição – e ele já passou da 40.ª. Como analisa o interesse do público por essa história e o fenômeno dos filmes que tratam do período, como Cabra Cega ou Quase Dois Irmãos?


Não tenho uma tese, mas uma hipótese. Foi um período que a ditadura tentou soterrar. Assistimos agora ao retorno do recalcado, para usar um termo psicanalítico que define aquela coisa misteriosa mantida em segredo pelas famílias. Acho que o jovem tem nostalgia do não vivido, o que explica o súbito interesse por 1968.


Outro livro seu, Cidade Partida, registra o que aconteceu com o Brasil ao receber a herança de 20 anos de ditadura militar. Há saída para a crescente onda de violência nas cidades brasileiras?


Não sei, mas a saída não é pela guerra, pelo confronto. Esta é uma guerra pós-moderna, em que você tem o elemento econômico, o mercado. As pessoas brigam por um produto que é muito consumido, a droga. Não é dando tiro no morro que se vai resolver a situação. Política de segurança não é matar bandidos, mas pensar em inclusão social, mais emprego e educação.


Você fala de Darcy Ribeiro como uma espécie de ‘consciência crítica’ do País. Quem você acha que representa esse papel, hoje, no Brasil? Quais são os traços remanescentes do ‘darcisismo’?


Há tipos e figuras extraordinários no Brasil, mas o Darcy Ribeiro é insubstituível. Ele, assim como Glauber, era um apaixonado pelo Brasil. Não vejo ninguém com essa capacidade de entrega.


Você talvez seja a única pessoa capaz de escrever uma biografia de Rubem Fonseca. Como começaria essa história? Falando de um policial com vocação marginal ou um subversivo com vocação para detetive?


Rubem sabe que sou um jornalista. Depois de escrever sobre ele em meu livro, mandei o capítulo para sua aprovação. Estava com medo de levar uma bronca, mas, para minha surpresa, ele não causou problemas. De qualquer maneira, jamais escreverei uma biografia dele.


Você adotou um filho aos 58 anos, um menino de 7 anos que viria a lhe dar muita dor de cabeça, Genésio Fereira da Silva, antes adotado pelo fazendeiro Darly, dono da fazenda onde foi arquitetada a morte de Chico Mendes, testemunhada por Genésio. Ao que atribui essa decisão? Ao destino ou à Providência?


Houve um momento em que apareceram as condições para a adoção. Fiz isso porque não poderia ser de outra maneira. Não iria dormir tranqüilo se ele fosse assassinado. De onde ele vinha, os caras não ameaçavam. Matavam, como no caso de Chico Mendes. Não tive alternativa. Não me arrependo. Só lamento não ter tido sucesso.’



Daniela Name


‘Com Zu por testemunha’, copyright O Globo, 29/04/05


‘Ué, o livro não é uma autobiografia de Zuenir Ventura? Então por que a página está cheia de fotos dessa gente toda? Porque em ‘Minhas histórias dos outros’ (Planeta), que chega às livrarias hoje, o jornalista passa a carreira a limpo saindo do centro do palco para dar voz àquele que é o motor da profissão: o outro. Autor de ‘Cidade partida’, ‘1968: o ano que não terminou’ e ‘O mal secreto’, ele passou pelas maiores redações de jornais e revistas do país e define o livro como ‘uma alter biografia’.


– Não queria escrever uma autobiografia tradicional, e sim contar histórias, que é o que sei fazer – diz Zuenir, apenas Zu para muitos dos jornalistas, artistas e anônimos de quem se tornou amigo nesses anos de trabalho. – No jornalismo, estamos sempre contando a história do outro e para o outro. O jornalista é o catalisador entre o entrevistado e o leitor. Não tem que ser juiz, promotor. Somos testemunhas. Nossa humilde tarefa é olhar e contar.


Mas, antes de contar, o repórter muitas vezes tem que tomar decisões que escapam ao conhecimento do leitor. Também passa por situações em que é meio premiado pela sorte, como aquela em que Zuenir relata logo no início do livro.


O flagra na calcinha branca de Jackie Kennedy


Em 1961, ele estava em Viena para cobrir para a ‘Tribuna da Imprensa’ o histórico encontro entre o então presidente dos Estados Unidos, John Kennedy, e o líder russo Nikita Kruschev. Saiu de perto do grupão de repórteres por um motivo que nem lembra direito. Foi quando viu parar uma limusine. E dela tentava sair ninguém menos que Jackeline Kennedy, primeira-dama americana transformada em mito naquela época. Atrapalhada para deixar o carro e com a roupa apertada, Jackie não teve tempo de impedir que o vestido subisse, revelando sua calcinha branca.


Zuenir teve tempo: disparou sua Rolleyflex e fotografou aquele que seria o maior furo de sua cobertura, não tivesse a foto se perdido misteriosamente na ‘Tribuna’.


A profissão também é feita de olhos atentos para as beiradas da notícia. Foi assim que a equipe chefiada por Zuenir na revista ‘Veja’ registrou as mudanças de comportamento depois da Anistia, com a sunga de Gabeira e a amizade colorida fazendo ferver o Posto Nove. Foi assim também que ele teve a coragem de propor a reconciliação do dramaturgo Nelson Rodrigues com o acadêmico Alceu de Amoroso Lima/Tristão de Athayde, que brigaram nos jornais por anos a fio.


O jornalismo, relata Zuenir no livro, também é feito de escolhas, muitas vezes bastante delicadas. Como a que ele teve que fazer depois que seus repórteres na revista ‘Isto É’, Artur Xexéo e José Castello, apuraram que o escritor Pedro Nava talvez tivesse se suicidado, na noite de 13 de maio de 1984, porque estava sendo chantageado por seu amante, um michê. Zuenir resolveu não publicar a história, alegando que não havia provas consistentes. Xexéo se rebelou: bateu o pé, alegando que o leitor tinha o direito de saber da hipótese apurada. Havia indícios claros de que era verdadeira. Prevaleceu a vontade de Zuenir, que hoje acredita que foi movido por um tabu moral:


– Tive um certo preconceito social, porque o personagem era um intelectual. E o homossexualismo, na época, ainda era visto como uma coisa muito forte. Até hoje há interdições morais na imprensa, que talvez impeçam que algumas histórias sejam publicadas. Sai tudo sobre política, mas no campo subjetivo há questões em aberto.


Zuenir levou para casa fonte ameaçada de morte


Outra decisão difícil foi a de publicar na edição da revista ‘Visão’ que lembrava, em 1974, os dez anos de golpe militar, uma carta do cineasta Glauber Rocha em que ele acenava com simpatia para a ditadura: ‘Os militares são os legítimos representantes do povo’. Glauber passou a ser perseguido pela esquerda. E Zuenir só se libertou do remorso quando encontrou com o diretor de ‘Terra em transe’ durante a Revolução dos Cravos, em Portugal, e ele disse que falaria tudo de novo.


Mas a escolha mais delicada foi a que o levou a abrigar na própria casa Genésio Ferreira da Silva, testemunha do assassinato do seringueiro Chico Mendes. Com 13 anos na época, o menino estava correndo risco de vida depois que de uma série de reportagens em que Zuenir revelara tudo o que ele tinha visto. Genésio foi trazido para Ipanema e não só sofreu para se adaptar a coisas que não conhecia, como vaso sanitário e elevador, como fez com que o clã dos Ventura – a mulher do jornalista, Mary, e seus dois filhos – precisasse se acostumar àquele novo ‘parente’.


– Continuo acreditando que o jornalista não deve interferir nos acontecimentos, esta é a regra – diz Zuenir. – Mas aquela era uma situação-limite. Entre evitar uma morte e fotografá-la, escolhi a primeira opção.’



JORNALISMO LITERÁRIO


Carlos Heitor Cony


‘Jornalismo e literatura ‘, copyright Folha de S. Paulo, 29/04/05


‘É necessário apelar para Aristóteles: a definição se faz pelo gênero próximo e pela diferença última. Exemplo: o homem é um animal racional. O gênero próximo é o animal; a diferença última é o racional. Aplicando a mesma definição ao jornalismo e à literatura, teríamos de encontrar a diferença última entre as duas expressões da comunicação humana.


O gênero próximo é o mesmo: o universo das letras. A diferença última é o tempo. Daí que a palavra crônica é segmento comum da literatura e do jornalismo. O jornalismo condiciona o espaço da letra ao tempo do tempo. O jornalismo distingue-se da literatura por ser uma expressão datada.


Não se trata de considerar o jornalismo como expressão inferior à literatura. São expressões diferentes, unidas pelo mesmo gênero. Utilizam o mesmo veículo, pretendem atingir o mesmo objetivo, mas em tempo próprio para cada um. Dois exemplos da diversidade de tempo que marca tanto o jornalismo como a literatura: o primeiro seria o de Castro Alves, essencialmente um poeta, e José do Patrocínio, essencialmente um jornalista. Ambos integram a cultura brasileira, ligados sobretudo à causa da abolição da escravatura. Patrocínio era o tigre, enchia a rua do Ouvidor, foi levado em triunfo, no ombro do povo, logo após a princesa Isabel ter assinado a Lei Áurea. O herói foi ele, não a princesa.


Castro Alves nunca teve triunfo igual, mas continua presente em nosso presente e estará presente em nosso futuro. ‘O Navio Negreiro’ atravessa gerações, é declamado nas escolas, nos teatros, na TV, emplacou na história. Patrocínio jornalista não foi menor, foi até maior do que Castro Alves no factual, no tempo, na data. Mas no tempo? Na permanência? O gênero próximo que unia os dois eram as palavras que despertavam emoções e apelos à razão, mas a diferença última foi o tempo -um escreveu para o dia; o outro, para sempre.


O outro exemplo vem de fora, foi provocado pelo caso Dreyfus. Na França, havia a consciência de que um inocente apodrecia numa caverna da ilha do Diabo. O verdadeiro culpado já confessara o crime de espionagem, mas estava a salvo na Inglaterra. O poder da época não permitia a revisão do processo, o Exército francês ficaria desmoralizado e era necessário prestigiá-lo, pois havia sempre o perigo de uma guerra contra a Alemanha.


Foi nesse quadro de infâmia que um escritor se levantou em defesa da dignidade, a própria e a da nação. Emile Zola era desprezado por sua obra naturalista, acusado de imoral. Sangue italiano, arrebatado, Zola escreveu um artigo, teve dificuldade em publicá-lo. Após tentativas frustradas, procurou o ‘L’Aurore’, dirigido então por George Clemenceau, que mais tarde seria primeiro-ministro da França. Clemenceau aceitou o artigo de Zola, mas chamou-o à Redação e comunicou-lhe que mudaria o título de seu texto. Zola quis saber o que havia de errado naquela ‘Carta a M.Felix Faure, Presidente da República’.


Clemenceau explicou:


– Ninguém lerá um texto comprido como o seu e com esse título. Você mesmo faz uma série de acusações; no trecho final, todos os seus parágrafos começam com um ‘Eu acuso’. O título está aí. Eu acuso! ‘J’accuse!’.


Entraram os três para a história, Zola, Clemenceau e o artigo.


Analisemos o episódio. O escritor já era famoso, bem mais do que Clemenceau, que, na época, era apenas um jornalista voltado para a política. As obras de Zola corriam o mundo, ele fizera discípulos em todas as literaturas (Eça de Queiroz foi um deles), tornara-se o papa de uma nova corrente literária, mas não sabia provocar impacto. Foi, como disse Victor Hugo no seu funeral, ‘um momento da consciência humana’, mas lhe faltava o ‘timing’ que se adquire nas redações comprometidas com o que está acontecendo.


Zola não escrevia para o dia seguinte, escrevia para sempre. Tanto que seus romances continuam editados, traduzidos, adaptados para o teatro, para o cinema, para a TV.


Costumo fazer uma comparação entre jornalismo e literatura. O jornalista é um peixe de aquário, exibe seu desenho, suas cores, a fosforescência que atrai o leitor. Impossível não admirar um peixe na gaiola iluminada, com água renovada diariamente. É um clown. Precisa de brilho, expressa-se num palco.


O escritor é diferente. Ele terá apenas cem leitores, como Stendhal calculava para si mesmo. Ou, como Shakespeare, passará 200 anos no limbo. O jornalista não pode passar duas edições sem ser lido.


E, se o jornalista é o peixinho de aquário, o escritor é o peixe da água profunda, vive na treva, em águas aonde nem chega a luz do sol. É monstruoso, escuro, quasímodo que habita um território impenetrável. Não conhece os limites do palco. Tem o oceano para arrastar seu corpo medonho, sua fome que não escolhe o que comer. (PS: este é o resumo de uma palestra em seminário sobre jornalismo e literatura.)’