Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Antonio Sampaio Dória

‘Dentre as revistas de informação semanal no Brasil, Veja se destaca pela longevidade e número de exemplares em circulação. Sem aderir aprioristicamente à noção de que esse veículo é porta-voz dos valores mais conservadores da sociedade, caberia questionar visões e pontos de vista com que somos semanalmente brindados, até mesmo porque depreende-se de sua leitura uma certa ambição de representar o saudável meio termo, o ‘bom-senso’ que não se inclina ideologicamente à esquerda ou à direita.


Duas das últimas edições da revista (11/5 e 18/5) incluíram matérias sobre o racismo e as formas de combatê-lo. A primeira, ‘Índex de palavras’, faz um ataque bem humorado à já famosa cartilha de termos politicamente corretos lançada pelo governo federal. Sem dúvida, poucos adotarão a orientação de evitar termos como ‘pivete’, ‘caipira’, ‘cigano’, entre outros. A questão é que no esforço de demonstrar o ridículo da idéia, Veja a ilustra com fotografias e frases de três escritores brancos. Jorge Amado, Gilberto Freyre e Chico Buarque comparecem como os fiéis da balança lingüística. Se esta cartilha não é a solução para o racismo e o preconceito, ela traz a noção correta de que, em sociedade, não deveríamos chamar alguém por um termo rejeitado pelo interlocutor. Preto, mulato? Os escritores citados poderiam garantir não ter nenhum ranço preconceituoso ao utilizar essas palavras, embora a aferição seja dificultada pelo fato de dois deles já não estarem vivos.


O tema assumiu contornos mais precisos com a entrevista de João Ubaldo Ribeiro na semana seguinte, que voltou à carga. Ele afirma ter sangue negro, mas não se considera um representante dessa etnia: ‘Por que a metade zulu tem de prevalecer?’ E ataca a idéia de cotas nas universidades para os afro-descendentes. ‘Ela representa um esforço para dividir este país, pela primeira vez, em linhas raciais’. Segundo esse raciocínio, o racismo estaria sendo criado agora, por essa iniciativa. Até o presente momento, teríamos vivido num país igualitário. E a escravidão? João Ubaldo garante que ela nada tem a ver com a cor da pele. Os portugueses apenas se apropriaram de um sistema que já existia na África, trazendo-o para cá. Well…


O ataque de João Ubaldo à cartilha e outras propostas seria pelo menos um pouco mais eficiente se ele não fizesse uso de argumentos tão desgastados. Os mesmos, aliás, que os portugueses utilizavam há 300 anos, como se pode ler no estudo O problema da escravidão na cultura ocidental, de David Brion Davis. Embora escritor, João não se esforça para dar uma aparência de originalidade a essas idéias. A sua descrição da própria genealogia, por sua vez, ilustra muito bem a Teoria do branqueamento, que de fato existiu como proposta governamental para eliminar a cor negra através de cruzamentos sucessivos, isso sem falar da sua crença no apaziguador mito da Democracia racial, que nega a existência do racismo. Mas, provavelmente, ele tem razão em usar a expressão ‘primeira vez’ ao falar das cotas; neste caso, o atual governo não pode ser considerado exatamente igual ao anterior, como foi tantas vezes repetido.


Mais do que o conteúdo, chama a atenção nessas duas matérias a própria forma de conduzi-las: não vale aqui o parâmetro jornalístico de ‘ouvir o outro lado’. O negro, mesmo em assuntos de seu interesse (e aqui ele é o maior interessado), não é chamado a opinar. Onde estão os intelectuais negros, os representantes do Movimento Negro? Não cabem na pauta da revista Veja? Pois o branco, por mais que se esforce, não poderá falar em nome de toda a sociedade. Para eles, ‘o fato de não ser questionado sobre a cor em situações públicas ou privadas enfatiza a falta de sentido em se identificar racialmente’, segundo Edith Piza. Por isso mesmo, é difícil convencer brancos de que eles representam uma parte da sociedade, e não a totalidade.


É desnecessário fazer aqui um discurso contra o mito da democracia racial, e contra outros mitos, porque isso já foi feito de uma forma até bastante enfática. Resta apenas insistir para que essas vozes, ainda que tarde, tenham o espaço que lhes é de direito – na imprensa e fora dela.


Antonio Sampaio Dória é escritor, autor de Um Amigo Inesquecível (Ed. Atual) e da dissertação ‘A temática ‘Preconceito’ na Literatura Contemporânea para a Juventude’, apresentada na área de Estudos Comparados em Literaturas em Língua Portuguesa, na USP.’




GZM EM CRISE
Comunique-se


‘Audiências contra GZM já começaram’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 3/06/05


‘No dia 01/06, foram realizadas as primeiras audiências judiciais de funcionários e ex-funcionários da Gazeta Mercantil, que movem processos envolvendo salários atrasados e outras pendências judiciais que se acumulam desde 2001. Elas são acompanhadas pelos advogados da Associação dos Funcionários, Ex-funcionários e Credores da Gazeta Mercantil (Asfunprece). A primeira fase deve durar até o final de julho.


Três advogados dos réus compareceram, um da Gazeta Mercantil e outros dois da Editora JB.


As audiências terminam em setembro. Segundo a Asfunprecre, é imprescindível a presença do reclamante no local da audiência uma hora antes de seu início. Ele deve levar Carteira de Trabalho para orientações sobre os pedidos da ação proposta. Se o reclamante não comparecer, a ação será arquivada e ele poderá arcar com o pagamento das custas processuais.


As audiências acontecerão na 26ª Vara do Trabalho, no Fórum Trabalhista da Barra Funda, São Paulo, sempre entre 12h e 13h.


Quem precisar de mais informações deve acessar o site da Asfunprece ou enviar e-mail para associacao@cidadeinternet.com.br.’




MERCADO DE TRABALHO
Milton Coelho da Graça


‘Rotativa, passaralho. A imprensa carioca ferve’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 30/05/05


‘Até o final de agosto, uma rotativa de 16 unidades estará operando bem pertinho do grande parque gráfico do Globo, na rodovia Rio-Petrópolis. Comprada nos Estados Unidos, em segunda mão e recondicionada, seu trabalho principal será imprimir o Jornal do Brasil e a edição carioca da Gazeta Mercantil.


Não conheço outro caso no Brasil de uma gráfica destinada a imprimir jornais diários não pertencentes às próprias empresas dos jornais. Esta foi bolada por três sócios: Nilson Rezende e Eduardo Courreges, ambos ex-Globo, o primeiro da área de circulação e o segundo, da área industrial, mais Antonio Puga Sanchez.


Nelson Tanure, dono da empresa JB-Gazeta Mercantil, decidiu deixar de usar a muito mais moderna gráfica do jornal O DIA com o objetivo de reduzir os custos de impressão. É possível que essa mudança aumente os problemas de O DIA, porque o contrato com o JB, segundo informações não confirmadas por nenhuma das duas partes, significa cerca de 400 mil reais por mês.


A nova gráfica também está negociando a impressão do JORNAL DOS SPORTS. Existe também a possibilidade de lançamento de um novo jornal diário dedicado à Baixada Fluminense.


Este arranjo entre uma empresa industrial exclusivamente gráfica e editoras de jornais diários sem rotativas é bastante comum em outros países. Tomara que aqui também dê certo.


No Globo há expectativa de rebu. Luiz Eduardo Vasconcelos (filho de uma das irmãs de Roberto Marinho) deixou a direção da Mira (Mídia impressa e Rádio), criada numa das rearrumações da empresa propostas por consultorias e que, agora, parece estar sendo detonada. Há alguns meses, como se sabe, Merval Pereira também havia sido desligado de responsabilidades na Mira, voltando a ser exclusivamente colunista.


O comunicado oficial, assinado por Roberto Irineu Marinho, deixou muita gente arrepiada. Luiz Eduardo passou a ter funções que outros diretores e gerentes interpretam como meramente simbólicas. E ninguém sabe direito como vai ficar a ligação de jornais, Época e rádios com o comando das Organizações Globo.


Há rumores de que um passaralho levantou vôo como parte da reestruturação financeira do grupo.’




Aline Moura


‘Profissão Jornalismo: o difícil começo’, copyright Comunique-se (www.comuniquese.com.br), 1/06/05


‘Primeiro, preciso esclarecer a dúvida que certamente paira em seu pensamento. Não, o Eduardo Ribeiro não parou de escrever para a coluna Jornalistas&Cia – Cenários. Mas você continua se perguntando: então por que outra pessoa assina a coluna hoje? Explico: Angustiada e inquieta enviei um e-mail para o Eduardo Ribeiro sugerindo que ele abordasse em sua coluna a questão do mercado de trabalho para jornalistas que se encontram na mesma situação que a minha: recém-formados e sem perspectivas. E para minha surpresa, recebi o convite do próprio colunista para fazer esta pauta e aqui estou eu! Durante duas semanas, busquei com profissionais experientes dicas para trilhar os caminhos na profissão. Ouvi conselhos, boas histórias e até presenciei alguns momentos reais da rotina jornalística, e percebi que esses dias foram a minha maior aula de jornalismo. A faculdade me ensinou a técnica e me apresentou a profissão, mas acho que esqueceu algumas lições que aprendi agora.


Assim como eu, o estudante entra na universidade com desejos e ilusões e acaba muitas vezes frustrado com a realidade do mercado. Mas se já no período acadêmico o pontapé inicial foi dado, fazendo estágios, participando de seminários e tomando iniciativas, quando formado este iniciante terá mais chances em relação ao recém-formado que nada fez. Perguntado sobre dicas para os jovens profissionais, o jornalista Ronaldo Lapa, gerente de Comunicação Corporativa da Câmara de Comércio Americana do Rio de Janeiro e professor de jornalismo na UniverCidade, foi contundente: ‘É interessante passar, ainda como estudante, por uma situação real de mercado’. E foi o que procurou fazer a jornalista Fabiana Lobão, formada há 11 meses, hoje repórter do programa Estado em Ação, na TV Alerj (Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro), e assessora de imprensa do Instituto Vivo. Ainda na universidade, sem medo de ousar, ela correu atrás literalmente do seu espaço.


– É importante ter uma meta e acredito que tive desde o primeiro período do curso, quando fui fazer um trabalho para a faculdade na rádio Transamérica com outras meninas e deixei meu currículo com o responsável. Fui chamada uma semana depois para estagiar na emissora. No mesmo período, conheci um redator da Rede TV e falei com ele que estava interessada em estagiar lá e logo ele me indicou – lembra Fabiana.


Difícil conseguir acesso ao mercado sem nenhuma experiência? Sim. Impossível? Não. Na verdade eu própria me desesperei bastante, a ponto de escrever uma carta-desabafo ao Eduardo, e receber dele ‘um puxão de orelhas’, do tipo, ‘pare de reclamar e vá a luta. Olha aí que bela pauta você mesma criou e pode desenvolver’.


Foi uma importante lição: percebi que sempre é tempo de começar, mesmo que demore um pouco. Vai depender de cada um e do que se está fazendo para reverter a situação. Certo, o mercado é competitivo, mas vagas existem e o importante é saber procurá-las e, principalmente, ter determinação, se preparar constantemente e gostar da profissão. ‘Mesmo sem oportunidades depois de formada, a pessoa ainda poderá ser jornalista profissional. Eu sou um exemplo vivo. Só trabalhei na área dois anos depois de concluída a graduação’, surpreende o jornalista Sidney Rezende, âncora da CBN e apresentador do Bom Dia Rio, da TV Globo.


O iniciante do jornalismo precisa estar atento aos novos nichos de mercado. Aquela visão romântica da profissão, de apresentar um telejornal, ser repórter de tevê ou rádio, escrever para um grande jornal ou uma revista, precisa se adequar à realidade. Não que os jornalistas jovens como eu devam abandonar o sonho de trabalhar numa grande redação, porém precisam compreender que outras alternativas existem e podem ser um trampolim para os objetivos maiores. ‘Os jornais, as rádios e a televisão estão mais retraídos, mas houve uma abertura de espaços em jornais menores, em assessorias de imprensa, Internet e canais de televisão fechada’, comenta o editor Paulo Motta, chefe da editoria Rio do jornal O Globo. Além de se sintonizar nessas novas áreas, quem quer entrar e crescer na profissão precisa entender que o primordial é atuar, é circular pelo meio e conhecer os profissionais.


– O mais comum ainda é chegar ao mercado através do conhecimento de um ou outro jornalista. A concorrência é grande e o candidato deve fazer tudo o que estiver ao seu alcance para demonstrar sua capacidade e sua vontade de fazer jornalismo – destaca Aziz Filho, presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro e chefe da sucursal Rio, da revista IstoÉ.


Devemos ir atrás e agarrar as oportunidades surgidas, por menos atraentes que possam parecer. Essa, aliás, é a tese defendida, por exemplo, pelos repórteres esportivos da rádio Tupi, Paulo Júnior e Carla Matera. Para eles o recém-formado não deve desprezar uma chance, mesmo que não seja um emprego com um bom salário. ‘Claro que para você se firmar, só com muito trabalho e demonstrando que você tem competência. Agora, para chegar em algum lugar você precisa se tornar conhecida’, afirma Carla. A jornalista Roberta Guimarães, produtora na rádio Tropical Solimões, formada há quase dois anos, segue isto a risca. Ela acredita que o importante é não ficar estacionada. Mesmo não sendo bem remunerada, ela prefere trabalhar a não ter nenhuma oportunidade. Jornalistas experientes, como Nair Suzuki, editora de Negócios do jornal O Estado de S. Paulo, começaram a carreira sem receber um salário.


– Quando cursava o segundo ano da faculdade, em 1969, candidatei-me a uma vaga de estagiária na sucursal de São Paulo do Jornal do Brasil. Na época, o estágio não era remunerado. Por minha escolha, fiquei trabalhando de graça durante cinco meses no JB. Depois abriu uma vaga na Agência Folhas e fui convidada a trabalhar lá, com carteira assinada – conta Nair.


Um bom caminho para o recém-formado ingressar no mercado de trabalho são os cursos de treinamento oferecidos por alguns veículos de comunicação, conhecidos como programa de trainee. Os principais são: Folha Treinamento, oferecido pela Folha de S.Paulo, o curso intensivo de Jornalismo Aplicado, do jornal O Estado de S. Paulo, e o Curso Abril de Jornalismo, do grupo Abril. Agora estão abertas as inscrições para o programa de treinamento da Folha, pelo site do jornal. Pode se candidatar qualquer pessoa que tenha curso superior concluído ou em andamento, que seja criativa, bem formada e julgue ter talento para jornalismo. Também está em fase de inscrição o curso do Estadão, destinado a jornalistas formados até dois anos ou alunos do último ano ou semestre das escolas de jornalismo de todo o Brasil. Para se inscrever acesse o site do veículo. As inscrições iniciaram em maio e continuam durante o mês de junho.


Vale lembrar que para conseguir uma oportunidade, além da atuação no mercado, o recém-formado precisa se aperfeiçoar. Não precisa nem dizer que a leitura foi a dica unânime entre os jornalistas entrevistados, mas que é recomendada para praticá-la desde a época de estudante, já no ginásio! Ler todos os jornais, revistas semanais, livros e mais livros sobre diversos temas e não somente sobre jornalismo. ‘Eu acho indispensável a pessoa ler. Lendo vai ter mais vocabulário, mais argumentos e mais informação’, ressalta Sidney Rezende. Ter bagagem cultural, ter um bom texto, ser curioso, ser dinâmico e ter caráter, estas são qualidades que Paulo Motta aponta para um aspirante a jornalista. ‘Bagagem cultural não é só assistir a peças teatrais ou entender pintura, é conhecer história, gostar de sociologia e antropologia, é cultura geral como um todo’, explica Paulo. Nair Suzuki vai mais longe nas suas dicas. Para ela a preparação depende muito das iniciativas que o profissional terá. ‘Estudar línguas, fazer um curso fora do país, fazer uma pós-graduação, cursar outra faculdade etc. O curso de jornalismo, por si só, não prepara o aluno para o mercado’, aconselha Nair.


A dedicação deve ser contínua e a perseverança do recém-formado não pode acabar. Manter o contato com os amigos da faculdade e conhecer novas pessoas. Comunicar, essa é a palavra de ordem para o jornalista. Seguir as dicas dos colegas mais experientes, se informar e estar antenado com o mercado. ‘Ficar de olho nas vagas e aparecer na hora certa’, destaca Aziz Filho. Tudo isso deve ser levado em consideração para o jovem profissional galgar seus espaços.


O mercado, como em qualquer área, é competitivo e vai depender do crescimento econômico do País e justamente por isso a oportunidade surgirá se o jovem jornalista for ao encontro dela. Vai depender exclusivamente do recém-formado, da sua vontade de exercer a profissão, começando em uma pequena ou grande empresa, aceitando um trabalho fixo, um temporário ou um ‘bico’, remunerado ou não, qualquer coisa que o coloque na vitrine do jornalismo. Ficar reclamando, colocando obstáculos em tudo e esperar o seu emprego cair do céu, isto não resolve o problema. Por isso não pensei duas vezes na hora de aceitar o convite do Eduardo Ribeiro. Pode ser que eu ainda não consiga abrir as portas do mercado, mas termino esta coluna consciente que dei um grande passo nessa direção.


(*) Aline Moura – Especial para o Jornalistas&Cia-Cenários. Ela tem 24 anos e é formada pela Universidade Veiga de Almeida – RJ. Estagiou como assessora de imprensa do projeto Jovem Trabalhador Social, desenvolvido pela Coordenadoria Estadual da Juventude, do Governo do Estado do Rio de Janeiro e depois foi supervisora da assessoria de Comunicação da Coordenadoria Estadual da Juventude. No total, trabalhou no Governo do Estado por um ano e cinco meses.


Nota do colunista


O e-mail que recebi da Aline é, de certo modo, recorrente. Vários jovens desalentados com as perspectivas do mercado de trabalho, no Jornalismo, mostram-se desarvorados, perdidos, sem saber por onde começar. Nada mais natural, portanto, que o desabafo.


Com a Aline resolvi devolver-lhe a inquietação: se você está incomodada, se coce, menina, vá à luta. Foi o recado que mandei, só que de uma forma elegante. Propus a ela fazer uma matéria sobre as dificuldades de acesso à profissão e, se possível, até com algumas dicas, para ajudar os demais que se encontram na mesma situação. E me comprometi a publicar seu texto na coluna semanal que assino no Comunique-se, colocando-a, de certo modo, na vitrine (dando-lhe, ao mesmo tempo, a oportunidade e o pretexto de ir atrás de colegas e de conhecer redações, de ver a prática). Ela cumpriu a parte dela e eu aqui estou cumprindo a minha.


Já escrevi sobre o tema outras vezes e volto a insistir: não há mercado de trabalho no Brasil em condições de absorver 5 mil novos jornalistas por ano. Isso não existe. No segmento dos veículos o mercado se retraiu brutalmente nos últimos quatro anos e agora ensaia uma retomada, mas ainda pequena, estando as maiores oportunidades no segmento de assessoria de imprensa e atividades afins. Mas ainda assim nada que se mostre compatível à absorção de 5 mil profissionais por ano. O que nos obriga, num raciocínio bem simplista, a afirmar que a maioria dos jovens que saem das universidades não terá vez nesta atividade.


Se o nosso fosse um País sério, certamente o Ministério da Educação já teria tomado providências de fechar pelo menos metade desses cursos, os quais se locupletam com o dinheiro suado desses alunos e seus familiares, vendendo-lhes ilusões, sem a contrapartida da garantia de trabalho. Formam, ganham o seu dinheiro e literalmente despejam no mercado pencas de meninos e meninas que muitas vezes não sabem sequer onde ir buscar trabalho. Uma desonestidade. Ou, como diria Boris Casoy, ‘Uma vergonha!’. Se não há mercado, não há porque haver cursos formando gente para atuar no vento.


Como, no entanto, a realidade é essa, cabe-nos trabalhar com ela. Se não há mercado para todos, há ao menos para os melhores, para aqueles que escolheram essa atividade profissional por vocação, por desejo e por ambição. Para esses, os obstáculos serão a força de que necessitam para virar o jogo e conseguir um lugar ao sol. Fácil não é, mas impossível também não.


Costumo dizer que a iniciativa é meio caminho andado. Em palestras que às vezes profiro pelos cursos de jornalismo, sempre digo que melhor do que bater na porta de alguma redação pedindo emprego é ir lá e oferecer algum tipo de trabalho (uma pauta, por exemplo), dispondo-se a fazer ou a colaborar com ela.


A matéria da Aline mostra alguns personagens do primeiro time do jornalismo brasileiro que começaram trabalhando de graça, esperando pacientemente uma oportunidade. Isso, 20 ou 30 anos atrás. O mesmo se aplica nos dias de hoje: quem quer vai à luta, enfrenta os desafios, dá a cara pra bater, ‘invade’ as redações, pede uma oportunidade (com uma solução debaixo do braço – isso sempre ajuda), acompanha e analisa o mercado, começa por baixo, enfim, se supera. Isso faz a diferença, como comprovam milhares de exemplos, Brasil afora.’




FONTES DESCONFIADAS
Mair Pena


‘Imprensa fora da ordem’, copyright Direto da Redação (www.diretodaredacao.com), 2/06/05


‘Um executivo de uma grande empresa foi procurado por um jornalista para declarações em off sobre determinado assunto de interesse público e decidiu consultar seus amigos em uma rede de Internet da qual faz parte. Todos jornalistas ou publicitários, com bem mais de 40 anos e larga experiência em redações e agências. Alguns ainda em veículos da grande mídia, outros em assessorias de imprensa e alguns na vida acadêmica. De todas as sugestões apresentadas, o saldo foi uma grande desconfiança da imprensa, o que soa muito preocupante para um setor que vive, ou deveria viver, da credibilidade e da confiabilidade.


Muitas questões foram levantadas na discussão que tomou conta da rede da qual o executivo participa. Se o jornalista era sério, o que implica numa divisão da categoria em sérios e não sérios, para não dizer irresponsáveis. O caráter do veículo, que teve sua postura no tratamento dos assuntos seriamente questionada, e, o mais importante, o papel do jornalista e os interesses envolvidos na sua atividade.


Debateu-se que o jornalista empregado em veículo de comunicação deve pautar o seu trabalho pelo interesse público. Na busca da informação este pressuposto tem que estar em primeiro plano. No entanto, não se pode ignorar, como salientou um integrante da dita lista, o quanto é difícil exercer um ofício, que na essência é um serviço público, em empresas privadas, agentes importantes do jogo político e econômico na vida social.


A discussão teórica foi levada à prática com a vivência de cada um nos meios de comunicação e na relação com eles. Indagou-se, sobretudo, quantos jornalistas enxergam com clareza a sua função social e a exercem, efetivamente. O que se vê, segundo alguns relatos, são jornalistas cujo foco principal é o furo, a exclusividade da notícia, sair na frente da concorrência ou, pelo menos, não ficar para trás. Estes jornalistas teriam a lógica do patrão, do capital do acionista. Muitos deles, particularmente nas colunas de vários tipos, caem regularmente na tentação de serem irresponsáveis na divulgação de informações mal apuradas, não checadas ou contaminadas por opiniões pré-concebidas. Todos fingem que são comunicadores sociais e que estão a serviço do público, mas na prática não é isso que se dá.


Não se culpou o jornalista, mas as condições de trabalho, a má formação e a ausência de crítica. Uma integrante da lista, hoje exercendo sua profissão fora dos grandes meios de comunicação, observou que nada como sair da redação para olhá-la mais criticamente. Considerada cuidadosa em suas apurações nas várias redações por que passou, ressaltou que foi ao sair e ao passar para o outro lado do balcão, como se diz, que começou a enxergar onde havia estado, o que faziam e como pensam os nossos colegas, desarvorados pelas cobranças e cegos pela prepotência. Foi muito enriquecedor e sofrido também, relatou, pois uma vez adquirida a lucidez nunca mais a perdemos.


A discussão inquietou a todos e despertou uma tremenda reflexão sobre a profissão. Concluiu-se que falta formação profissional, com ênfase em ética e função social, e sobra pressão do mercado de trabalho, cada vez pior para os coleguinhas. É preciso que este debate se alastre por toda a categoria. Quando um caráter manipulador e muitas vezes mal intencionado da imprensa sobrepuja o interesse público que ela deveria representar, alguma coisa está fora da ordem. (Trabalhou no Globo, JB e Agência Estado. Foi correspondente da F-1 em Londres, durante três anos. Foi editor de política do JB e repórter especial e economia.)’