Saturday, 23 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Carta Capital

DASLU
Mino Carta

Os donos do poder e sua mídia

‘Os indivíduos têm direito de revisar suas crenças e opiniões. A mídia também. Por exemplo. A revista Exame, da Editora Abril, escrevia quando a Operação Narciso da Polícia Federal, dia 13 de julho de 2005, invadiu a Daslu e prendeu dona Eliana Tranchesi pela primeira vez: ‘A Daslu virou vidraça, o templo paulistano do luxo se tornou o grande alvo da histeria anticapitalista no Brasil’. Era a véspera do aniversário da Queda da Bastilha.

Apanho a edição desta semana de Veja, nau capitânia da mesma Abril. Depois de admirar na capa o fantasma de dona Eliana a exalar ectoplasmaticamente da maquete da célebre loja, leio que a nova prisão da senhora em questão ‘pode marcar o fim de uma era de permissividade’. Na qual chafurdaram, como diriam cronistas de antanho, os barões midiáticos, entre outros senhores do poder. Não esqueçamos que à inauguração da ‘loja dos ricos’, como sublinha Veja, esteve presente para cortar a fita o próprio governador de São Paulo, então Geraldo Alckmin. Se fosse hoje, estaria José Serra? Aposto que sim.

Vale não esquecer outros fatos. As reportagens que celebraram o evento histórico da presença na capital bandeirante de um empreendimento comercial sem similares no mundo, a demonstrar que o espírito dos desbravadores continuava lépido. As denúncias da truculência da Operação Narciso, sem contar as lágrimas de Antonio Carlos Magalhães ao saber do vexame sofrido por sua protegida Eliana. De fato, ACM apreciava um terno Armani, levemente desestruturado.

Cabe a pergunta: por que a mídia, com exceção de O Estado de S. Paulo, privilegiou, dia 27 de março passado, a prisão de dona Eliana em lugar da notícia da Operação Castelo de Areia, que indicia o pessoal da Camargo Corrêa e pretende desvendar pretensa trama para favorecer partidos da oposição? Sinceramente, não tenho resposta. Permito-me caminhar por tentativas de explicação, sem descurar das principais características da chamada elite nativa.

De saída, acentue-se que, antes do futebol, esta porção nobre da sociedade nacional pratica com afinco e perícia o chute do cadáver. A queda da Daslu já foi, faz quase quatro anos. Hoje assistimos à consequência, e os tais 94 anos de prisão, cominados pela juíza Maria Isabel do Prado, tidos como absurdos antes que surpreendentes, nada significam além do vezo da Justiça brasileira de somar penas previstas para cada crime cometido. No passado, até recente, houve condenações a mais de 200 anos. E hoje a mesma Abril que enalteceu a Daslu colhe os sintomas de uma mudança histórica com a condenação de dona Eliana.

O comportamento dos diários parece confirmar a tese. Fiquemos por aqui? Não enxergo serviço prestado à razão. Haverá quem diga, do alto da experiência jornalística: ofereceu-se ao distinto público aquilo que de fato o excita. Sim, sim, mas a que público aludimos? Obviamente, ao público dos frequentadores da Daslu (40 mil cadastrados em 2005) e dos aspirantes a fregueses. O creme do creme, a cúspide da pirâmide. Meditemos a respeito: não há espanto se a mídia nativa cuida de comunicar-se, apenas e tão somente, com os privilegiados e com os empenhados em chegar lá. Os esperançosos do bom êxito do seu alpinismo.

Recomendável outra consideração: que tal desviar a atenção do escândalo levantado pela Operação Castelo de Areia? Se as acusações forem provadas, o caso incrimina mais uma vez o sistema, desde o uso de caixa 2 até a evasão fiscal. A rigor, ninguém dos graúdos fica em perfeita segurança nestes domínios. Está na moda, como sabemos, proclamar a corrupção política. E onde se esconderiam os corruptores? Estamos diante da denúncia de um caso destes, e de grande porte. Não seria a hora de ir ao fundo do problema?

A mídia, como sempre, a não ser que o envolvido seja o governo Lula, receia avançar demais, quando, com expressão impávida, não trapaceia, omite ou mente. Que esperar, porém, da mídia verde-amarela? Tropeço, tardiamente, no Jornal da ABI destinado a celebrar o aniversário da Associação Brasileira de Imprensa. A qual teve boas passagens, mas, ao comemorar um século de existência por meio de seu Jornal, canta em prosa e verso em vez de momentos de puro, independente jornalismo os feitos dos patrões: Marinho, Civita, Frias, Mesquita, Bloch, Chateaubriand, Saad. Com o pronto aval de ilustres intelectuais, partícipes da comissão de honra, e de jornalistas não menos ilustres.

Repito, mansamente: este é o único país que conheço onde os profissionais chamam os patrões de colegas. Quanto à Daslu, no momento da Operação Narciso não faltou quem avisasse: não se iludam, não é a Bastilha.’

 

INTERNET
Felipe Marra Mendonça

Nasceu em Londres o G-20 do B

‘Na polícia de Londres teve pouco trabalho para conter os manifestantes anticapitalistas que tentaram tomar as ruas do centro financeiro na quarta-feira 1º. Uma batalha semelhante foi travada na internet, onde os organizadores das marchas usaram sites para congregar as multidões. O principal e mais citado pela mídia internacional foi o G20 Meltdown (www.g-20meltdown.org).

As propostas do grupo eram ecléticas. Iam desde a organização de protestos e marchas em frente à sede do Banco da Inglaterra, algo que ocorreu, até o ambicioso plano de derrubar o capitalismo, que a organização parece não ter conseguido.

Fora o site ‘oficial’ dos protestos, muitos manifestantes planejaram as atividades do dia, ao participar de grupos em redes sociais, como o Facebook. Existiam mais de 170, a maioria com pouco mais de dez ou vinte participantes, embora o maior tivesse mais de 3 mil. É certo também que os participantes da turma que discutia a rede francesa de supermercados G20 ficou surpresa com a repentina popularidade das lojas.

O Twitter também foi bem utilizado pelos manifestantes para tentar antecipar a movimentação da polícia londrina. Os dois rapazes que conseguiram subir até o teto do Banco da Inglaterra disseram ter usado os avisos do site e mensagens de texto para combinar táticas de evasão.

O lado governamental da reunião dos mais importantes líderes mundiais também usou a internet para divulgar a sua mensagem, como o site feito pelo governo britânico (www.londonsummit.gov.uk).

O site não continha objetivos tão ambiciosos quanto o dos manifestantes, mas estava na lista a vontade de ‘tomar quaisquer ações necessárias para estabilizar os mercados financeiros e ajudar as famílias e empresas a sobreviver à recessão’.

Entre os dois lados da batalha estavam os sites que pretendiam promover discussões mais profundas, ao utilizar a reunião de líderes como tema. Entre eles estava o G20 Voice (www.whitebandaction.org/g20voice), criado por um grupo de 50 blogueiros autorizados pelo governo britânico a acompanhar o encontro. O gaúcho Rodrigo Alvares, do excelente A Nova Corja (www.novacorja.org), fez parte do grupo e teve o título do seu blog traduzido como ‘a nova escumalha’.

Outro site com sugestões construtivas foi o Yoosk London Summit (www.yoosklondonsummit.com), em que usuários podiam fazer perguntas aos líderes das reuniões, como o primeiro-ministro Gordon Brown.

Um usuário identificado como Wolfgang quis saber por que ele simplesmente não aceitava que a cura para a depressão era a própria depressão. Como ficou demonstrado, segundo ele, na República de Weimar, instaurada na Alemanha logo após a Primeira Guerra Mundial.

Mesmo que a reunião não tenha trazido soluções messiânicas aos problemas mundiais, o volume de sites criados em torno do encontro foi suficiente para deixar os usuários ocupados por um bom tempo. Quanto mais diálogo, melhor. Mais saudável ainda quando feito de forma pacífica e civilizada.’

 

OPRAH E OBAMA
Nirlando Beirão

Casa do Saber

‘Já tem gente se perguntando, nos Estados Unidos – e quem presunçosamente mais pergunta são aqueles marajás dos talk shows de domingo –, onde é que foi pararo incomparável poder de comunicação do presidente Obama. O homem seduziu a América com seu charme direto e seu discurso inovador, mas não tem conseguido passar uma mensagem nítida sobre a crise econômica, o tamanho dela e o que o governo de fato pode e deve fazer. O multimídia Obama se desdobra, na tevê, na imprensa, na internet, e até videochat ele já inaugurou.

Não será surpresa se aparecer em alguma mesa-redonda da ESPN falando de basquete.

O marqueteiro James Carville – que venceu a eleição de 1992 para Bill Clinton – sai em defesa de Obama.

‘Não é que ele não esteja se comunicando bem; é que o que ele está comunicando é complexo demais para se exprimir em palavras’, analisa.

O bruxo calcula que o estoque de atenção do telespectador nunca vai além de 40 palavras. Mas como explicar o que é derivativo em 40 palavras?

As eventuais dificuldades de Barack Obama podem ser compensadas por Oprah Winfrey. Aliás, já estão sendo. O avassalador carisma da apresentadora das multidões, continua a serviço da causa Obama – uma América digna de elegância e autoestima. Oprah Winfrey, que militou ostensivamente na campanha democrata, é hoje a escultora de imagem que de melhor Obama poderia aspirar.

Ela não opera no discurso ou no panfleto. Oprah é inteligente demais e profissional demais para fazer de seu auditório um palanque.. Mas se você acompanhar seus recentes programas (veiculados no Brasil pela GNT) há de perceber que o que Oprah promove, ainda que no formato habitual de um auditório popular, uma Casa do Saber para a América insegura e tosca que, de repente, votou na esperança e na mudança. Exibe documentários instrutivos. Leciona a nova etiqueta da Era Obama.

Nos bastidores do Palácio de Windsor, a câmera percorre salões, candelabros, mesas postas, decanters, a sobremesa, o champanhe, casacas, luvas brancas, a prataria – e, claro, Sua Majestade, a rainha. Oprah apresenta assim: ‘Você que mora num apartamento de 90 metros quadrados prepare-se para visitar um castelo de 45 mil metros quadrados e 900 quartos’. No mesmo programa, ainda haverá uma conversa ao vivo com o estilista Valentino. Uma lição de entrevista.

A crise não é brincadeira e Barack Obama merece uma mãozinha de quem sabe. O cineasta Frank Capra (1897-1991) fez isso por Franklyn Delano Roosevelt, instaurando o otimismo e celebrando a boa-fé, nos anos de Depressão.

A documentarista Leni Riefenstahl (1902-2003) fez isso por Adolfo Hitler, na musculosa exibição de suas paradas militares. Oprah faz isso por uma nobre causa.’

 

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