Sunday, 22 de December de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1319

Carta Capital

TELES
Sergio Lirio

A versão do BNDES, 2/5

‘Ainda falta mudar as leis, mas, em termos financeiros, a compra da Brasil Telecom pela Oi foi acertada na sexta-feira 25 de abril. Principal articulador da operação, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) emprestará 2,5 bilhões para que o nó societário entre as duas companhias seja desfeito.

As negociações permitiram ao banqueiro Daniel Dantas sair do setor de telefonia com mais de 1,5 bilhão de reais no bolso e livre de responder a ações judiciais que o acusavam de diversos crimes societários. Além disso, o banco estatal vai emprestar dinheiro a uma empresa, no caso a Oi, sócia de um filho do presidente da República. Mas, impassível diante dessas questões, Luciano Coutinho, presidente do banco, recebeu CartaCapital na quinta-feira, 1º de maio, e defendeu a fusão. Segundo ele, é a chance de se criar uma empresa brasileira com capacidade de competição no mercado internacional.

CartaCapital: Por que o BNDES vai financiar a compra da Brasil Telecom pela Oi?

Luciano Coutinho: As duas empresas, nos últimos anos, tiveram um desempenho aquém do potencial. Os mercados não atribuem a elas valores econômicos equivalentes a outras companhias do setor, pois são notórios os conflitos entre os sócios. A Brasil Telecom, principalmente, estava defasada na operação de telefonia móvel, que é hoje a principal força de expansão do setor de telecomunicações. A telefonia fixa está estagnada, temos pouco menos de 40 milhões de terminais. O que cresce mesmo é a móvel, caminhamos para 150 milhões de linhas. Como resultado do processo de privatização, o BNDES tem participação expressiva na Oi, tem interesses econômicos, portanto. As duas empresas estavam tentando resolver os problemas do nó societário há algum tempo.

CC: E por que não deixar que a solução viesse pelo mercado?

LC: Foram feitas várias tentativas, principalmente da Oi, para solucionar problemas societários via mercado de capitais. O BNDES apoiou essas tentativas, mas elas foram bloqueadas por investidores poderosos, inclusive internacionais. A Brasil Telecom também se preparava para pulverizar as ações, mas, neste momento, os grupos de controle das duas empresas chegaram à conclusão de que seria mais vantajoso buscar uma solução conjunta. Se os órgãos reguladores permitirem essa união, a empresa resultante terá um tremendo ganho de escala em nível global. É preciso entender que, no mundo, há um processo de concentração no setor de telecomunicações. Nos Estados Unidos, ele vem ocorrendo desde os anos 90. Busca-se a competição em serviços de maior valor agregado. A decisão do BNDES de apoiar a reestruturação veio da compreensão das tendências do mercado mundial. Caso não caminhemos nessa direção, o futuro dessas operadoras estaria comprometido. A tendência seria elas se tornarem alvo das duas gigantes que dominam o mercado na América do Sul, a Telefônica e a Telmex. A médio prazo, seria criado um duopólio no mercado brasileiro. O que vai ocorrer, se os órgãos reguladores autorizarem, é a possibilidade de manutenção de um terceiro competidor de capital nacional.

CC: Mas, quando a lei for mudada, acabarão as restrições a qualquer tipo de fusão. O que vai impedir que, logo depois, a nova empresa não acabe nas mãos de estrangeiros?

LC: Existem várias salvaguardas no acordo que impedem que os controladores tomem decisões sem o aval dos demais acionistas. O BNDES terá o poder de vetar cisões, incorporações ou qualquer mudança que implique diluição excessiva ou perda de controle por parte dos acionistas brasileiros. Se alguém quiser vender, o banco tem assegurado o direito de preferência. E de veto.

CC: O próximo governo pode decidir liberar a venda a estrangeiros.

LC: Se a população brasileira quiser eleger no futuro um presidente liberal que deseje desnacionalizar a economia, nenhuma empresa estará garantida. Mas isso é parte do jogo democrático, não? Seria autoritário querer vedar as margens de atuação de quem venha a ser escolhido por meio do voto. Agora, não vejo, no cenário atual, nenhum potencial candidato que defenda o enfraquecimento do sistema empresarial brasileiro. Ele já é relativamente frágil. Há economias emergentes de porte igual ou inferior ao Brasil com sistemas empresariais mais poderosos, mais arrojados, mais importantes, inclusive em áreas mais sofisticadas. O futuro dirá. O que estamos estabelecendo é uma salvaguarda para o Estado brasileiro.

CC: Quais seriam os ganhos da criação dessa empresa?

LC: A criação da nova empresa não vai gerar concentração relevante na telefonia fixa, porque elas atuam em áreas diferentes. Na longa distância, também não. A maior concentração ocorreria no mercado de internet discada, que está em processo de extinção, daqui a pouco tudo vai migrar para a banda larga. Por outro lado, a Brasil Telecom possui hoje uma operação na telefonia móvel muito modesta. A soma dessa operação com a da Oi permitirá o surgimento de uma quarta força capaz de competir nacionalmente no ramo de celulares. Juntas, elas terão 17% do mercado, ante cerca de 30% da Vivo, 25% da TIM e 24% da Claro. Portanto, aumentará a competição no mercado de maior expansão do setor. No caso da transmissão de dados, por redes de fibra óptica e cabos submarinos, será criada uma alternativa à única hoje existente. Atualmente, só há a malha herdada da antiga Embratel. Não vejo, por isso, nenhum risco ao consumidor decorrente dessa união.

CC: E quanto à capacidade de concorrência internacional?

LC: Ainda vejo oportunidades de expansão na América do Sul e na África. São mercados que vêm crescendo a taxas bastante expressivas e a nova empresa, mais robusta financeiramente, poderá aproveitar as oportunidades. Se a companhia resultante da união for bem administrada, obterá os recursos que vão permitir essa expansão.

CC: O que o País ganha com a união?

LC: Há a expectativa de geração de muitos empregos. Queria chamar a atenção sobre um aspecto pouco comentado. O Grupo Telemar (Oi) tem uma empresa chamada Contax, de call center, atualmente com cerca de 60 mil empregados. Com a aquisição da Brasil Telecom, o número de vagas pode crescer bastante. Talvez ela se torne a maior empregadora do País, essencial para o primeiro emprego do pessoal de baixa renda, aquele estrato com poucas oportunidades. Além do mais, a aposta é que, com os ganhos de escala, com a ampliação da capacidade de competição, a empresa ganhe mercado e amplie seus quadros. Apesar dessa convicção, foi inserida uma cláusula no acordo que determina a manutenção do nível geral de emprego nos três anos posteriores à união. Mas a minha expectativa é que aumente o número de postos de trabalho. Também se firmou um compromisso para se desenvolver um departamento de tecnologia e inovação. O objetivo é aproveitar o potencial tecnológico do Brasil. O CPqD da antiga Telebrás é hoje um centro subutilizado. É assim desde a privatização. Se a nova empresa tiver um programa estruturado de inovação, é natural que vire uma cliente relevante do CPqD. Então, serviços serão contratados dentro do País. Há possibilidades assim em várias áreas. No passado, o Brasil teve um parque de produção de equipamentos de telecomunicações expressivo. Isso foi em grande parte perdido, mas é sempre possível recuperar o desenvolvimento tecnológico.

CC: Há uma política definida no BNDES de estimular a criação de grandes empresas brasileiras?

LC: Não há nenhum objetivo de sobrepor critérios de desenvolvimento ou um determinado privilégio a empresas nacionais aos da racionalidade empresarial. Seria ilusão querer estabelecer uma política nacionalista baseada em conceitos do passado, como incentivos tributários ou protecionismos. O Brasil tem um conjunto de setores competitivos internacionalmente, principalmente em grandes complexos produtores de matérias-primas. Posso citar o setor de celulose e o de mineração, entre tantos outros. Portanto, existe a capacidade de a gente se firmar como grandes players globais. Se o Brasil não desenvolver empresas em determinadas áreas, estará perdendo oportunidades de trazer vantagens à sua economia. Então, sem nenhum artificialismo, faz sentido apoiar a estruturação de grandes companhias. Parece-me até uma vocação dessa etapa histórica do desenvolvimento do sistema empresarial brasileiro.’

 

TV E RÁDIO
Fabio Kadow

Direitos iguais?, 2/5

‘A idéia é ousada e polêmica. O Atlético Paranaense entrou na mira das emissoras de rádio de todo o Brasil. Motivo: o clube anunciou que iria cobrar 15 mil reais pelas transmissões radiofônicas integrais de cada um dos seus jogos no próximo Campeonato Brasileiro, como mandante ou não, ou 456 mil reais pelo pacote das 38 partidas. A notícia caiu como uma bomba no meio. Nunca a idéia, uma tendência na Europa, havia sido cogitada aqui.

‘Debatemos o assunto internamente durante meses. Não estamos tirando a liberdade de imprensa. Só queremos fortalecer a nossa marca, que traz audiência e faturamento para as rádios, assim como já ocorre com as televisões’, diz Luciana Pombo, diretora de comunicação do clube. Ela também garante que os torcedores não ficarão sem as transmissões, já que o Atlético tem a sua rádio na internet e outra poderia ser criada.

A maioria das rádios protestou com veemência, algumas questionaram o valor e apenas duas demonstraram interesse. A juíza Nilce Regina Lima, da 5º Vara Cível de Curitiba, enterrou as esperanças do clube paranaense ao liberar a transmissão gratuita para qualquer emissora. No veredicto, ela menciona as leis 10.671/03, do Estatuto de Defesa do Torcedor, e 9.615/98 (Lei Pelé). A juíza alegou que os textos não fazem referência à regulamentação de transmissão radiofônica de partidas de futebol.

O irônico é que ela também relata que ‘sendo impedida de transmitir os jogos, (a rádio) estaria sofrendo graves prejuízos de ordem financeira e também perda de audiência – fonte que propicia a angariação de anunciantes e o auferimento de lucros’. Ou seja, justamente o que o clube pleiteia: a divisão dos lucros.

Não é difícil imaginar a força que essa idéia pode ganhar se todos os clubes tomarem uma decisão conjunta, provocando uma reação ainda mais feroz das emissoras. Um assunto para muito mais que 90 minutos. Na sua opinião, a cobrança é legítima? Deixe abaixo seu comentário.’

 

CASO ISABELLA
Emiliano José

Uma montanha de abutres, 29/4

‘O que pretende a mídia com essa cobertura do caso da menina morta? Para quem não é refém desse tipo de espetáculo provoca náuseas. É o eterno retorno. É sempre assim: trata-se de pegar um caso, aquele que cai como uma luva para as pretensões midiáticas, e envolver, capturar o pacato cidadão, a pacata cidadã. E o País, como no final das novelas, pára: só discute aquele assunto. A vítima, em duplo significado, é a menina morta – Isabella Nardoni. Durante esses dias todos ela foi esquartejada pela imprensa – apareceu sob todos os ângulos, como sob todos os ângulos apareceu o casal assassino. Sim, porque a mídia já decidiu, para além de investigações, que o casal a matou.

E o casal pode até ter matado. Mas, que direito tem a mídia de pré-julgar, como o faz rotineiramente? Não teria. Mas se julga no direito de fazê-lo e nada acontece. Ela pode, pode tudo. Ou ao menos pensa e age dessa maneira. Poderíamos, quem sabe, recorrer a Theodor Adorno com sua densa análise sobre a indústria cultural – tudo transformado em mercadoria, inclusive as emoções, os sentimentos, que são construídos e reconstruídos permanentemente pela mídia. Nem o inconsciente, tão presente num tipo de cobertura como essa, pode ser pensado individualmente. Ele é suscitado constantemente, chamado a cada minuto pela mídia, e se manifesta das mais variadas maneiras – o chamado inconsciente coletivo. O que é raiva da multidão? É uma raiva natural? Ou, de alguma forma, essa raiva é chamada à cena?

Poderíamos, também, falar na sociedade do espetáculo, e aí recorreríamos a Guy Debord. Que é tudo isso senão um impressionante espetáculo, que busca no terreno do sórdido, dos sentimentos mais obscuros da alma humana, a sua matéria-prima, usada à saciedade? E a partir do acontecimento, parece que tudo agora coloca-se à disposição da cena, da montagem do espetáculo, da lógica da mídia, sempre pronta, preparada para o espetacular. Todos os atores são colocados em cena, para além de suas vontades, sem que consigam perceber que se preparam constantemente para a cena. A vítima, porque nada pode fazer para impedir a utilização. Os réus – é, a mídia já os decidiu nesse lugar – são atores privilegiados e ocupam espaço no fantástico show global da vida, sem que talvez sequer percebam estarem sendo utilizados para esse espetáculo.

A polícia e o Ministério Público entram no jogo. É visível como tudo muda quanto os microfones são colocados à frente da fonte, das autoridades. Todos se submetem, se orientam de acordo com lógica do espetáculo. Tudo está situado de acordo com as câmeras, com as luzes que ofuscam e condicionam. E a população também. Uma parte dela envolve-se diretamente: vai à porta da delegacia, apedreja, quer sangue, condena os que a mídia decretou como assassinos. Quer linchar. A mídia sabe que estimula esse procedimento. Não é inocente. Outra parte da população opina – para as câmeras, para os repórteres que aparecem daqui e dali, de todo lugar que se tem pra partir. Claro que essa opinião foi construída previamente, foi pacientemente tecida pelos conceitos embutidos na notícia, se é que se pode qualificar de notícia uma cobertura com essa característica. Ou a chamada notícia é isso mesmo? Há lágrimas na multidão, há rostos encolerizados, há desejo de violência. A mídia não pergunta sobre as conseqüências de sua atividade, reitere-se. Ela vende o que lhe interessa.

Foi, na história bíblica, Jesus quem clamou ‘Pai, eles não sabem o que fazem’, não foi? Creio que foi. Esse clamor não pode partir da mídia. Ela sabe o que faz. Sabe que está mexendo com sentimentos profundos, ancestrais. Está lidando com a vida e a morte. Com a violência que vem do íntimo de uma sociedade envolvida pela banalidade do mal – e agora visitamos Hannah Arendt. Com a violência contra as crianças. Que importa? O que interessa é aquela criança morta – branca, de classe média. ‘Que pauta!’ – gritará logo o chefe de reportagem. ‘Vamos colocar todo o reportariado em cima da menina morta’. ‘Vamos fungar no cangote deles!’ ‘E seguiremos até quando sobrar fôlego, e quanto mais demorar para chegar a conclusões mais definitivas, tanto melhor’.

Não, a mídia não tem perguntas sobre o entorno social. Parece, dada a natureza hiperbólica da cobertura sobre a menina morta, que não há outras meninas mortas, e há aos montes, infelizmente. Todo dia. Sem exceção. Meninas e meninos são maltratados, não são cuidados como deveriam pela sociedade, não são cuidados devidamente por suas famílias. Até porque as famílias assim descuidadas estão doentes – aqui no sentido mais amplo, social, psicológico.

É o pai que maltrata a filha, que bate. É o pai que estupra continuamente a filha ou o filho. É o pai que mata. É a mãe que abandona ou que bate ou que mata. Não há nenhum exagero no que digo, infelizmente. O que há é uma subestimação estatística de tudo isso. Uma tentativa da sociedade de considerar esse quadro de violência como algo confinado a quatro paredes, onde a lei não entra. A banalidade do mal. Ainda bem que temos o Estatuto da Criança e do Adolescente, que se constitui numa das legislações mais avançadas relativas à proteção integral à criança e ao adolescente. Lamentavelmente, no entanto, apesar dos avanços, ainda falta muito para que seja cumprido com o devido rigor.

Se os conceitos de indústria cultural ou de sociedade do espetáculo ou de banalidade do mal não nos bastam para entender a cobertura da menina morta, vamos ao cinema. Assistir, então, ao A Montanha dos Sete Abutres, fantástico filme de Billy Wilder. Ali se compreenderá o que é a mídia – não importa a morte de milhares de pessoas, importa o drama, a morte de uma. Charles Tatum, jornalista – o protagonista, vivido por Kirk Douglas, num impecável desempenho – leva essa compreensão às últimas conseqüências, praticamente deixando morrer, com suas táticas de postergação do salvamento, o sujeito preso no buraco de uma caverna. Quem assistir a esse filme, feito há quase 60 anos – exatamente em 1951 –, verá o quanto a imprensa continua a mesma.

Com algumas mudanças, que a roda gira. Afinal, nada será como antes. A mídia hoje está muito mais sofisticada, não só pelos meios, mas por suas mudanças conceituais. Não há mais lugar para crises de arrependimento, como aquela que acomete Tatum depois da morte do homem preso na caverna. Havia espaço para a reflexão ético-moral, nem que a posteriori. Havia, na culpa de Tatum, a idéia de um sentido de missão na mídia.

Hoje tudo se justifica em nome da absoluta mercantilização da notícia. A ética vale para referir-se a políticos, aos outros. O inferno são os outros, para a mídia. Ela é, sempre, o implacável justiceiro, não submetido a regras democráticas e, portanto, incapaz de aceitar que cometa erros. Hoje ela não deixa sequer que os mortos descansem em paz.’

 

VIRADA CULTURAL
Carta Capital

Rap, só com revista policial, 2/5

‘Na quarta edição da Virada Cultural, que ofereceu 24 horas de apresentações gratuitas a partir do sábado 26, em São Paulo, o tratamento dispensado a artistas e fãs de hip-hop destoou do clima de confraternização pregado pela organização. A prefeitura paulistana, traumatizada com o confronto entre o Batalhão de Choque da polícia e a platéia que assistia ao show dos Racionais no ano passado, tratou de isolar o rap. O palco foi montado no Parque Dom Pedro II, gradeado e afastado do burburinho que tomava o Centro da cidade. Para alcançá-lo, era preciso caminhar mais de 30 minutos por vias escuras e não sinalizadas.

Quem não desistia no meio do trajeto era recepcionado por viaturas, cavalaria e mais de cem soldados da PM. Ao contrário dos outros eventos da Virada, a revista era obrigatória e rigorosa. A lata de cerveja, liberada na cidade toda, estava proibida. O vendedor de cachorro-quente foi proibido de manter estoque e, na noite do sábado, não havia o que comer.

A estratégia da opressão preventiva também atingiu os artistas. Mano Brown, dos Racionais, era esperado como convidado da Banda Black Rio. Foi proibido de aparecer sob a ameaça, velada, de que som e luzes seriam desligados. O show, marcada para 0h00 do domingo, começou com atraso de 2 horas, sem Brown.

‘Estamos sitiados’, reclamou Rappin Hood, que se apresentou no fim da manhã. ‘A localização do palco é uma forma de demonstrar o preconceito’, disse o rapper Thaíde à Folha de S.Paulo. No final da tarde do domingo, o show do DJ e produtor Afrika Bambaataa, criador do hip-hop, reuniu cerca de 6 mil pessoas. Apesar de tudo.’

 

ESCÂNDALO
Carta Capital

A noitada cara de Ronaldo, 2/5

‘Enquanto Kaká pavimenta o caminho para o céu com gordas contribuições à Renascer, Ronaldo Fenômeno desce mais um degrau no purgatório em que se meteu. O jogador teve de dar um sumiço depois de terminar na delegacia na manhã da segunda-feira 28, por conta de uma situação nebulosa, ainda não esclarecida, envolvendo três travestis e muita confusão.

O caso virou comédia e jornais populares recorrem às piadas irreproduzíveis. De acordo com o que relatou ao delegado Carlos Augusto Nogueira, do 16º DP, o atleta do Milan foi a uma boate na Barra da Tijuca comemorar a vitória do Flamengo sobre o Botafogo. Ao sair, ainda segundo o jogador, procurou uma prostituta e a levou para um motel. Pediu outras duas, mas desistiu do programa ao notar se tratar de travestis. Os ‘viados’, como escreve a imprensa italiana, teriam oferecido cocaína ao craque, e um deles exigiu 50 mil reais para não levar a história à imprensa.

O travesti André Luiz Ribeiro Albertino, ou Andréia Albertine, declarou à agência espanhola de notícias EFE que Ronaldo sabia que ela ‘não era nenhuma Cicarelli’. A Associação de Travestis, Transexuais e Transgêneros do Rio de Janeiro diz que ele quebrou o código de ética da profissão. Sigilo sobre a identidade dos clientes é fundamental.

André acusa Ronaldo de não ter pago o programa e de ter consumido cocaína. O jogador nega e se diz vítima de tentativa de extorsão. Na hora de prestar depoimento, o travesti abandonou a delegacia correndo. A atitude, segundo o delegado, reforça a tese de que o jogador tenha sido vítima de um golpe.

Além do vexame na imprensa nacional e internacional, o escândalo resultou no fim do noivado com Bia Antony, que rompeu às lágrimas, e no risco de Ronaldo perder o patrocínio vitalício com a Nike, estimado em 100 milhões de dólares. Abatido, o jogador buscou o colo da mãe, cancelou participações na televisão e não falou com a imprensa.

Patrocinadores detestam vexames. Em julho de 2007, a Nike suspendeu o patrocínio do jogador de futebol americano Michael Vick, acusado de envolvimento em rinhas de cães nos EUA. Além da fabricante de material esportivo, Ronaldo tem contratos com o Banco Santander, a operadora de celulares TIM e o Guaraná Antarctica.’

 

GAME
Felipe Marra Mendonça

Tempos modernos, 2/5

‘‘Algumas das performances nesse jogo seriam dignas de um Oscar e isso não é um exagero. Sabemos que os personagens não são pessoas reais, mas ainda assim são atores melhores do que muitos que vemos na safra anual de filmes de Hollywood.’ Este é um trecho das várias resenhas que o Grand Theft Auto IV (GTA IV), jogo para os consoles Xbox360 e Playstation 3, tem recebido desde que especialistas receberam cópias para teste antes do lançamento, ocorrido em 29 de abril.

Se o nome soa estranho, uma descrição rápida de algumas atividades do jogo deve refrescar a memória. O jogador pode, por exemplo, roubar carros, ganhar dinheiro com o crime, fugir da polícia, dirigir bêbado, assassinar pacatos cidadãos e freqüentar casas de strip-tease. Versões anteriores da série foram banidas em diversos mercados. A atual sofreu cortes na Austrália, para que o lançamento fosse liberado. Segundo o órgão nacional de classificação do país, o jogo mostra cenas de suicídio e pelo menos um exemplo de inserção de arma de fogo em área muito particular da anatomia.

Aqueles que apontam uma discrepância entre as resenhas elogiosas e a temática da série, como a maioria da chamada grande imprensa, nunca chegaram perto de um console de videogame e certamente não tiveram a oportunidade de passar algumas horas imersos em Liberty City, versão ficcional de Nova York, onde se passa o enredo. Para que fique claro: o jogo não pode ser vendido para menores de 18 anos na maioria dos mercados em que foi lançado. Na Austrália, com os cortes, a classificação é para maiores de 15 anos.

Dizer que a atuação dos personagens seja digna de Oscar é exagero. Impossível, porém, não se impressionar com o grau de sofisticação atingido pelos criadores de GTA IV. Liberty City atrai o jogador para que perca horas na exploração do que é possível no jogo. Todas as atividades descritas são os apelos principais. Mas é possível comer um cachorro- quente numa esquina da Quinta Avenida, dirigir de Nova Jersey até o Queens, passando por Manhattan, ou simplesmente ver o sol nascer sentado no Central Park. A principal atração de GTA IV é esta: poder agir como quiser dentro de uma cidade recriada com minúcias.

As vendas do jogo são aguardadas com expectativa por analistas de mercado. O lançamento pode se tornar o mais lucrativo da história da indústria do entretenimento, incluídos os segmentos de música e filmes. Michael Pachter, analista de videogames da consultoria Wedbush Morgan, avalia que as vendas possam chegar a 9 milhões de cópias somente na primeira semana e até atrapalhar o lançamento de filmes, como o Iron Man.

O jogo pode também estimular as vendas de música digital. É possível ligar para um número de telefone a partir do celular virtual, quando se ouve uma música interessante em qualquer das 16 estações de rádio presentes em Liberty City. A ação marca a faixa escolhida, que depois fica disponível para que o usuário a compre e baixe no serviço de música digital da Amazon por 99 centavos de dólar cada.’

 

MÍDIA E POLÍTICA
Mino Carta

Nossa mídia é de parte, 2/5

‘Jornalistas na contramão e politólogos desabridos acreditam que a mídia brasileira atue como partido político. Permito-me discordar, a despeito do meu apreço por quem não hesita em expor o facciosismo, a hipocrisia e a má qualidade do jornalismo nativo.

Onde estaria o modelo? Qual seria o partido que no Brasil não passou e não passa de clube recreativo? Em anos ainda verdes, imaginei que um partido de esquerda, autêntico e genuíno como agremiação política voltada para o interesse da maioria, representaria um avanço para o País, fator de progresso.

Creio que este partido poderia ter surgido caso o golpe de 1964 não interrompesse brutalmente um processo então apenas esboçado. Da industrialização em andamento, com resultados notáveis em São Paulo e outros pontos do mapa, surgiria um proletariado (perdoem os vocábulos vetustos) habilitado a votar à esquerda com a consciência da urgência da escolha e a força determinante de pretender as benesses burguesas.

Os donos do poder perceberam a ameaça, por mais distante, e convocaram seus arautos midiáticos a invocar o golpe-já. Com a inestimável colaboração de Tio Sam, os gendarmes de farda verde-oliva executaram o serviço sujo. Em nome de certa marcha da subversão que alguns iludidos esperam até hoje e, quem sabe, nunca verão passar.

Nascido à sombra da ditadura e do propósito de Golbery do Couto e Silva de estilhaçar com sua ‘reforma partidária’ a oposição concentrada no MDB, o Partido dos Trabalhadores por mais de duas décadas teve a aparência de partido na acepção correta. Apesar dos esforços de alguns dos seus líderes, no governo portou-se como os demais.

Graúdos representantes da chamada ‘grande imprensa’, grande não se sabe por que, debateram a respeito de temas que lhes são caros na Câmara dos Deputados, na moldura da III Conferência Legislativa sobre Liberdade de Imprensa. Terça-feira, 29. Nada escapou às obviedades de sempre.

A maioria dos debatedores de sobrenomes imponentes – Mesquita, Frias, Marinho, Civita e Sirotsky – repudiou qualquer lei destinada a regulamentar a profissão jornalística e concordou quanto ao fato de que crimes de imprensa têm é de ser enquadrados nas leis Penal e Civil.

A tese é correta, na opinião de CartaCapital. Falta, porém, de nossa parte, confiança em uma Justiça que abriga magistrados dispostos a absolver caluniadores, porque a calúnia seria do seu estilo. Em compensação, o Congresso que hospedou os senhores da mídia sempre cuidou tempo adentro de agir em proveito deles.

Caberia ao Parlamento, isto sim, aprovar uma lei capaz de limitar o alcance desses barões, que abarca todas as manifestações da comunicação, como não se dá em países democráticos e civilizados. Mas que fazer no Brasil elevado pela Standard & Poor’s à glória dos altares do deus Mercado, singular país onde os parlamentares são donos de jornais, rádios e tevês?

Vimos, de todo modo, que os patrões da mídia, um dos rostos mais nítidos do poder, esquecem antipatias e até rancores recíprocos na hora de sustentar o privilégio.

Donde, a conclusão: a nossa é mídia de parte em lugar de partido, transcende a ideologia, cuida apenas de defender seus valores medievais. Primitivos, primários, aqueles da lei do mais forte. Ou, por outra, o puro, exclusivo interesse da minoria.’

 

 

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