CQC
Depois daquele beijo, 14/11
‘Tanto zunzunzum a propósito do beija-não-beija entre dois galalaus, naquelas reiteradas novelas da Glória Perez e do Aguinaldo Silva que prometem, prometem e não cumprem – e olha só que cena mais explícita acabou sendo protagonizada, no CQC desta segunda-feira 10, durante aquilo que parecia ser apenas uma entrevista. Azar da Globo. Demorou, remanchou e mais uma vez perdeu a chance de ser vanguarda.
O tabu rolou por terra na Band, quando o publicitário Nizan Guanaes tascou mais do que um mero selinho no repórter Felipe Cortez, que o, hum, encurralou no Claro Rio Summer, para o programa pilotado pelo Marcelo Tas. Seja qual for a sua leitura do episódio, que foi lindo, foi. O repórter especialista em encabular ficou encabulado. Mas numa relação a dois tem sempre um que é mais discreto, menos efusivo, né não?
Pode ser que o clima fashion tenha a ver com a, digamos, situação, mas há que se elogiar o destemor do publicitário de encarar de frente a questão. Na minha Bahia, essas coisas são mais simples, deve ter pensando Nizan. Depois daquele beijo, a TV pode, enfim, relaxar – e, se possível, algo mais. A bitoca está liberada. Precisou que fossem dois héteros – é o que se diz – para derrotar o preconceito.
Esta coluna sabe que, desde a recente eleição, não cai bem comentar a vida sexual das pessoas – a menos, naturalmente, que elas sejam nossas adversárias na política.
Nesse quesito intimidade, o Brasil ficou, à maneira dos americanos, civilizado: Don’t ask, don’t tell (Não pergunte, não diga). O que tem a ver com a política o que os políticos fazem sob os lençóis?
O CQC é uma hilariante máquina de humilhar políticos. Eles são, de fato, alvo óbvio. A fama dos políticos é péssima e estão sempre ávidos por um microfone. Qualquer cidadão tem acesso ao Congresso Nacional, o que torna a missão do repórter-carrasco bem mais fácil. Desmoralizar as loiras da tevê também não é das tarefas mais espinhosas. Nem treinadores de futebol.
Mas essa vertente do Pânico do teleentretenimento se mantém à judiciosa distância, por exemplo, dos militares da ativa e dos magistrados do Supremo – por mais ridículos que sejam seus respectivos ritos e suas respectivas vestimentas. Por que não alfinetar, com aquela mesma perspicácia inteligente que atormenta os congresssitas, o exibicionismo togado, pastoso, doutoral, do ministro Gilmar Mendes?
O CQC se arrisca, mas ninguém ali é louco. Se é prudência ou se é covardia, aí já é questão séria demais para se tratar com humoristas.’
MICHELLE O.
Nossa idéia de elegância, 14/11
‘Antes mesmo de se mudar para a Casa Branca e assumir o fatal encargo de ser comparada a Jackie Kennedy e a Hillary Clinton, Michelle Obama já ganhou dos fashionistas um holofote só para ela. Não há paninho que ela venha doravante a usar que não vá cair no escrutínio dos críticos daqueles que acham que moda é sempre uma afirmação e um julgamento. Bastou Michelle surgir num modelo de grife no pódio da vitória, em Chicago, para que uma saraivada de especulações se encadeasse.
O vestido é Narciso Rodríguez. Narciso é cubano, criado em Miami. Foi ele quem se encarregou do figurino do casamento da desafortunada Carolyn Bessette com John John Kennedy. O vestido de Michelle Obama, adaptado em nome do decoro protocolar de uma futura first lady, estava na coleção primavera-verão 2009 do estilista. Tudo isso significa… nada.
Michelle Obama está longe de fazer o gênero skinny – magrelinha. Mas tem postura e compostura. Socióloga formada por Princeton e advogada pela fechadíssima Harvard Law School, Mrs. Obama, nascida Robinson, é o tipo da pessoa que, onde quer que esteja, transparece a certeza de que sabe o que está fazendo ali.
O encontro de Michelle mais o marido com o casal Bush, na Casa Branca, foi uma dessas formalidades que beiram o constrangimento. A futura primeira-dama, magnífica num figurino vermelho-tomate assinado pela estilista favorita de Chicago, Maria Pinto (americana de família portuguesa), tentou em vão não ofuscar a patética presença dos anfitriões. Michelle faz a diferença. Chegou a dar pena dos capiaus texanos.’
INTERNET
Estelionatários nigerianos invadem redes, 14/11
‘Os estelionatários nigerianos estão de volta, agora em versão ‘rede social’. Segundo o jornal australiano Sydney Morning Herald, os golpistas utilizam o Facebook para tentar obter dinheiro fácil de usuários incautos, geralmente com a senha de uma conta legítima.
O golpe funciona porque a grande maioria dos que usam a internet sabe que não se deve responder ou clicar em links de e-mails provenientes de endereços estranhos. Mas não tem o mesmo cuidado e receio de mensagens mostradas em um site de relacionamentos, que teoricamente foram escritas por um amigo conhecido e confiável.
Foi o que aconteceu com a australiana Karina Wells. Ela conta que recebeu uma mensagem no Facebook de um de seus amigos, Adrian. Ele dizia estar preso em Lagos, na Nigéria, e que precisava de 500 dólares australianos para comprar uma passagem para casa. ‘No começo fiquei preocupada, porque parecia algo legítimo’, disse Karina ao Sydney Morning Herald. ‘Depois entendi o que acontecia e fingi ajudar, conseguindo os detalhes do golpista e passando tudo para as autoridades competentes’, completou.
É interessante relembrar como a Nigéria se tornou fonte de golpistas especializados de relativo sucesso. No começo dos anos 80, a indústria petrolífera do país entrou em colapso. Alguns desempregados recém-saídos de companhias do setor usaram seu conhecimento para convencer investidores europeus a colocar dinheiro em companhias fictícias. A tecnologia da época era rudimentar e as vítimas recebiam mensagens por carta, fax e até telex.
O advento do e-mail barateou o custo do golpe. Tornou-se mais fácil atingir um número maior de possíveis vítimas e o investimento era mínimo. Insa Nolte, especialista da Universidade de Birmingham, disse em entrevista à revista Wired que a tecnologia ‘tinha ajudado a transformar uma forma local de fraude em uma das mais importantes indústrias exportadoras da Nigéria’. O crime ficou conhecido como ‘golpe nigeriano 419’, porque esse é o número do artigo da Constituição do país que lida com fraudes.
Os casos atuais vistos no Facebook abusam da confiança do usuário, mas outras táticas também são empregadas com sucesso. Uma envergonha a vítima e acaba por infectar o computador com um vírus que rouba senhas pessoais. A mensagem inicial dá a entender que existe um vídeo comprometedor em circulação e vem com um link. Ao tentar assistir à gravação, o usuário é levado a instalar uma ‘nova versão’ do software de vídeo, que não passa de um vírus. Assim que tenta acessar novamente sua conta, o vírus trata de copiar os dados utilizados e se autopropaga, enviando a mesma mensagem para todos os amigos do usuário incauto.
Basta que um dos que recebem essa nova mensagem acredite nela para que o vírus se propague em progressão geométrica. É de esperar que em algum ponto uma vítima acabe por acreditar que um amigo realmente está preso na Nigéria e precisa de dinheiro para comprar uma passagem aérea, por mais que o país seja um destino pouco associado ao turismo.’
SARAMAGO
Diante do paquiderme, 14/11
‘O paquiderme asiático de pintas pretas que caminha de Lisboa a Viena como presente português ao arquiduque austríaco, em 1551, não incomodará muita gente no Brasil. Pelo contrário, será fácil que o admirem por aqui, onde A Viagem do Elefante (Conto) ganha a primeira edição mundial, com tiragem de 50 mil exemplares, ante os 3 mil destinados a qualquer obra de alta literatura no País. Se é José Saramago quem escreve um livro, o interesse do leitor parece ser natural por estas terras. O Brasil lê Saramago, mas Saramago também o lê.
A Viagem do Elefante (Companhia das Letras, 264 págs., R$ 42) encerra a tentativa do Nobel de Literatura de 1998 de atingir a irreverência bem-humorada que parece às vezes caracterizar o brasileiro, demolidor nos cartuns, cordial na vida. Saramago, que fincou pá na sobriedade literária quando escreveu O Ano da Morte de Ricardo Reis (1988) e atingiu o reconhecimento de sua escrita fabular em Ensaio sobre a Cegueira (1995), livro de duas edições, 40 reimpressões e 796 mil espectadores na transposição respeitosa ao cinema, repete em Viagem os livros anteriores, ou tenta repeti-los, com o toque inaugural do riso.
Em entrevista por e-mail à CartaCapital caracterizada por esse azedume que lhe é próprio, mas pode, por efeito involuntário, divertir, Saramago diz: ‘O humor, eu preferiria dizer a ironia, é, sobretudo, um modo de ver. É difícil, senão impossível, um acto humano em que não se encontre uma parte de ridículo, de caricato’, ele crê, indiferente às normas ortográficas a serem unificadas no ano que vem, mas apoiador de sua emergência para a comunidade de língua portuguesa. ‘A Viagem do Elefante é a primeira ficção minha em que o humor tem uma participação tão directa, tão constante. Sendo menos irónico, o livro é, de certa maneira, mais ‘inocente’. Ao distrair-se com o prazer de narrar, a sua ironia limita a sua intencionalidade em geral agressiva como facilmente se notará nos meus livros anteriores.’
O alvo da história, ele diz, não é apenas Portugal, ‘mas a sociedade humana em geral’. Saramago não mudou. Habitante de Lanzerote, nas Ilhas Canárias, marido agradecido da espanhola Pilar, a quem dedica o livro, ele continua sendo um apontador dentro da cena literária, até mesmo um juiz. O escritor de 86 anos narra um acontecimento tido por ocorrido durante a vigência imperial de dom João III, o Piedoso, avô do mítico Sebastião, morto na batalha de Alcácer-Quibir em 1578.
*Confira a íntegra desta reportagem na edição impressa’
WOODY ALLEN
O diretor como Sherazade, 14/11
‘Nascido no Brooklyn e cultivado em Manhattan, Woody Allen caminhou socialmente enquanto fez seu cinema particular. O diretor americano começou engraçado, escrevendo piadas sem razão narrativa como as que há em O Dorminhoco e, quando se esperava que avançasse nesse percurso quase televisivo, quis dar mais ao seu público, como Ingmar Bergman deu ao seu. Mas o público de Allen, do ponto de vista do diretor, revelou-se estranho, por desejar o mesmo, e sempre mais.
Assim se vê o cineasta em Conversas com Woody Allen, de Eric Lax (Cosacnaify, 512 págs., R$ 65). O diretor diz não ser engraçado, apenas encenar as piadas que lhe chegam mentalmente, sem convite. Em meio à risonha batalha pela vida, o artista constatou que o assassinato se escondia atrás dos negócios. Crimes e Pecados, uma tentativa de Allen de atingir o Monsieur Verdoux de Charles Chaplin, foi aceito pela crítica, embora o público o tenha acolhido com a relutância conhecida.
Allen está preso. Precisa ser mais engraçado de novo. Olhar no espelho e aconselhar-se, como fez diante do Humphrey Bogart de araque em Sonhos de um Sedutor. E cada novo filme seu é sempre uma promessa que ele não cumpre por completo, como fez a jovem com o soberano cruel das Mil e Uma Noites.
Lax tem estado com Allen nos últimos 36 anos. Sua primeira grande matéria sobre ele não foi publicada, tamanho o tempo que o jornalista levou para apresentá-la aos editores. O cineasta, contudo, leu o que Lax escreveu e o pôs a seu lado, como biógrafo enviesado. O livro é feito a partir de dentro, leve, mas determinado. Vale para destruir as ilusões sobre o artista e pôr outras em seu lugar, enquanto uma nova história de Allen anuncia a próxima.’
MODA
Caçador de borboletas, 14/11
‘John Casablancas, o top das tops, estava mesmo devendo uma biografia na qual explicasse por que corre o risco de passar para a posteridade como o chefe que demitiu Gisele Bündchen; responder às intrigas espalhadas naquele venenoso livro Model, de Michael Gross (edição brasileira da Objetiva); e demonstrar que é hoje mais do que meramente o pai de Julian Casablancas, o borbulhante band leader dos Strokes. Eis que ele, chegando aos 66 anos, encara o desafio, ponto por ponto (Vida Modelo, Agir, 400 págs., R$ 50).
A surpresa faz parte da vida de John Casablancas, nascido em Nova York, de pais catalães e educado na Suíça num daqueles colégios particulares em que você tem toda a chance de virar amigo de infância de um futuro magnata árabe do petróleo. De fato, John construiu um fotogênico portfólio de amizades convenientes e, com seu physique du rôle de ator de Hollywood, acabou ingressando no grand monde da beleza – da beleza alheia, bem entendido.
Sentiu no ar o aroma de mulheres bonitas misturado ao perfume do dinheiro. Foi para Paris e em 1969 abriu um pequeno escritório em endereço de luxo – Élysées 3 – e, por acaso, estava semeando aquela que seria a única agência de modelos capaz de competir com a matriarca do mercado: Eileen Ford (leia-se: Ford Models). A Elite Models de John Casablancas foi, no pior e no melhor sentido, um escândalo. Beldades e problemas são coisas que tendem a se atrair. Mas a Elite se deu bem, chegou a faturar 70 milhões de dólares a cada saison, em suas duas décadas Casablancas.
Figurinha do jet set, agitador das passarelas internacionais, por muito tempo o homem com o maior metro quadrado de mulher bonita em volta dele no mundo inteiro, John descortina mais esta surpresa: abre seu ansiado baú de memórias numa edição brasileira.
Tudo bem que ele more no Rio há mais de dez anos, tenha há 17 uma mulher brasileira – a ex-modelo Aline Wermelinger –, dois filhos com passaporte verde-amarelo e que esteja ensaiando aqui seu comeback, com a agência Joy. Mas não deixa de ser um privilégio ter essa primazia de vê-lo desfiar, em português, na intimidade da primeira pessoa, o estrelado name droping – Cindy, Linda, Christy, Naomi, Helena, Cheryl, Claudia, Heidi, Stephanie… – nessa ‘compilação de lembranças’ de ‘um business movido a egos’ (palavras dele).
Movido a egos, mas também a rasteiras, caviar, champanhe, jatinhos, salários de 2,5 mil dólares por dia, lolitas, farejadores de oportunidades, tramas mafiosas, cigarros, drogas, doideiras e, eventualmente, sexo. John não foge dos fatos, nem das versões, nem dos mexericos, nem dos bafafás. E nem de Gisele – de quem definitivamente não guarda lembrança agradável. Mas sobre isso é melhor ler no livro.’
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