Saturday, 02 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1312

Carta Capital

TI
André Siqueira

Na rota da distribuição de serviços

‘As empresas brasileiras de Tecnologia da Informação (TI) ainda sonham entrar na rota da terceirização internacional de serviços, ou offshoring, e formar parcerias com as grandes multinacionais do setor. Mas a crise financeira internacional, somada a escândalos corporativos, como as fraudes na indiana Satyam, uma das maiores do mundo no segmento, deve esfriar um pouco essa tendência. Enquanto isso, uma empresa paulista, a Ação Informática, descobriu outra maneira de chamar a atenção dos gigantes da TI, justamente em uma das áreas mais tradicionais do ramo: a distribuição.

A estratégia da empresa vai muito além da simples venda. Inclui participar de projetos e da implantação de sistemas e equipamentos de todas as marcas, em grupos de médio a grande porte, em qualquer região do País. O resultado foi um salto de faturamento: de 132,5 milhões de reais, em 2005, para 312 milhões de reais em 2008 – um crescimento médio anual superior a 30%.

Para oferecer toda essa gama de serviços e garantir os exigentes contratos de nível de serviço, os chamados SLAs (que impõem metas ao fornecedor a cada etapa dos projetos), a Ação utiliza um conjunto de 1,5 mil pequenas empresas de tecnologia. Com isso, pode atender aos requisitos técnicos das principais marcas de software e hardware. Ao mesmo tempo, os fornecedores veem na empresa um distribuidor capaz de identificar as melhores oportunidades de venda.

‘Depois de vencer o desafio de dobrar de tamanho em quatro anos, decidimos que o novo objetivo seria atingir 1 bilhão de reais de faturamento num prazo de cinco anos e contratamos consultorias para nos mostrar o caminho’, conta o presidente da Ação, Enio Issa. As respostas passavam por aquisições e pela expansão internacional.

Grandes fornecedores facilitaram a entrada da brasileira em novos mercados. Em meados de 2008, a partir de uma indicação de executivos da IBM, a empresa comprou a Aktio S.A., com presença na Argentina e no Uruguai. A parceira americana também sugeriu o início das atividades na Colômbia. ‘A IBM sentia falta de um distribuidor de produtos de alto valor agregado naquele país’, diz o empresário. De acordo com Issa, o próximo mercado de atuação da empresa deverá ser o peruano, onde já há negócios em andamento.

O objetivo é firmar posição nos principais países da América do Sul, o que inclui Paraguai, Bolívia, Equador e Venezuela, antes de chegar ao México – que, depois do Brasil, é o maior e mais problemático mercado latino, segundo o presidente da Ação. E quanto à crise financeira internacional? ‘Não há crise quando se está um passo à frente dos concorrentes’, garante Issa.

De acordo com o empresário, desde o agravamento da turbulência global, em outubro, a tendência observada é a de manutenção nos gastos do governo com tecnologia, a exemplo das médias e grandes empresas. ‘A retração ficou por conta das multinacionais, que se ressentiram das perdas nas matrizes’, conta.

Embora também deva desacelerar em razão da freada na economia mundial, a área de TI continuará aquecida, de acordo com dados da consultoria IDC. As projeções para o setor em 2009 foram revistas no terceiro trimestre, de 14,4% para 9,1%, no Brasil, e de 13,7% para 7,8% no restante da América Latina. ‘Ainda aposto que ficaremos na casa dos dois dígitos’, arrisca Issa.’

 

DITADURA
Carta Capital

Herzog e Crioulo, arquivados

‘O pedido de investigação criminal das mortes do jornalista Vladimir Herzog e do militante Luiz José da Cunha, o Comandante Crioulo, da Ação Libertadora Nacional (ALN), assassinados por agentes do DOI-Codi durante a ditadura, acaba de ser arquivado. A decisão foi tomada pela juíza substituta Paula Mantovani Avelino, da 1ª Vara do Júri Federal de São Paulo, na sexta-feira 9, a pedido da Procuradoria Criminal do Ministério Público Federal. Agora, esgotaram-se as possibilidades de punição na Justiça brasileira.

Herzog morreu numa cela do DOI-Codi paulista há 33 anos, no meio de uma sessão de tortura. Diretor de jornalismo da TV Cultura e militante do Partido Comunista Brasileiro, Vlado, como era conhecido, apresentou-se para prestar depoimentos no dia 25 de outubro de 1975. Horas depois, apareceu enforcado no cárcere. Segundo os militares, o jornalista de 38 anos cometera ‘suicídio’. Àquela época, 8 mil cidadãos participaram de um ato ecumênico na Catedral da Sé para protestar contra a infâmia. Já o Comandante Crioulo, um dos líderes da ALN, foi torturado até a morte nas dependências do DOI-Codi, em 1973. O corpo foi ocultado numa vala comum do cemitério de Perus, até ser descoberto há dois anos.

A juíza Paula Avelino considera esses homicídios prescritos e refutou a tese de que se trata de crimes contra a humanidade, portanto imprescritíveis. Isso porque o Congresso brasileiro não ratificou a Convenção Internacional de 1968, que assim os considera. ‘Na verdade, essa convenção só sistematiza o que já estava previsto desde 1945, quando a Organização das Nações Unidas foi criada’, contesta a procuradora Eugênia Fávero, que, ao lado de Marlon Weichert, instaurou ações civis contra Carlos Alberto Brilhante Ustra e Audir Santos Maciel, ex-comandantes do DOI-Codi.

Os procuradores pediram para que os acusados fossem obrigados a ressarcir à União as indenizações pagas aos familiares e vítimas, além de seus afastamentos das funções públicas que, eventualmente, exerçam hoje. ‘Chile e Peru também não assinaram a convenção de 1968 e isso não impediu que esses países fossem condenados por crimes da ditadura pela Corte Interamericana de Direitos Humanos’, afirma Eugênia.

Diante da inércia da Justiça brasileira, familiares das vítimas ou entidades civis podem levar o caso às cortes internacionais, para exigir a responsabilização criminal dos algozes de Herzog e Crioulo.’

 

TELEVISÃO
Nirlando Beirão

A realidade como ficção

‘A uma semana da inauguration de Barack Obama, lá, a gente tem o privilégio aqui de mais umareinauguração de Pedro Bial. O Big Brother apontou na tela e, com ele, emerge o biógrafo-poeta de seu habitual ano sabático. É uma pena que Bial só nos brinde com sua presença, fora eventos extraordinários, no confronto com aquela fauna disposta a se submeter, aos olhos da multidão, ao pior dos ridículos. Ali, naquele hábitat, Bial estará sempre a salvo de qualquer comparação mais funesta. Deve ser a mesma sensação, a de ser celebrity no bar Jobi do Leblon.

O Boninho, diretor do BBB, vangloria-se de ter circunscrito desta vez, no seu Guantánamo da grosseria, dois, digamos, candidatos que já frequentam o território da melhor idade. É o jeito que ele, vá lá, idealizou para dar um upgrade no programa: elevar a faixa etária. Este veterano colunista fica lisonjeado com a iniciativa do Boninho. Mas é possível que a boa intenção não resista. Existe uma quantidade extraordinária de velhos estúpidos. Aliás, uma das maldições da velhice é você radicalizar sua própria estupidez. Logo, dá para prever, bíceps esculpidos e cabeças vazias vão prevalecer, na lógica implacável do BBB.

Pena que Bial e Boninho não tenham respeitado o timing que é todo de A Favorita. A última semana reiterou aquela pirotecnia que fez com que a plateia da novela de João Emanuel Carneiro se sentisse tão exausta quanto os atores. Na busca das emoções do folhetim – redundâncias, caricaturas, pastiches –, A Favorita rompeu qualquer compromisso com a verossimilhança e só faltou dizer, ao apagar das luzes, que a narrativa era um mero sonho da Flora afinal tão boazinha.

Assim como o BBB, a telenovela é relíquia velhíssima, mas resta à tevê vetusta o consolo de que a pós-modernidade de tal forma embaralha imagens e conceitos que a gente fica sem distinguir as fronteiras da ficção e sem saber qual é o genuíno reality show. Se é o BBB ou se é, por exemplo, aquele Fashion Show carioca, no qual atrizes e atores simulam, na passarela, ser modelos e as modelos e os modelos sonham em ser atrizes e atores. Num caso e no outro, o triunfo é da vulgaridade.’

 

A CRISE E O CINEMA
Nirlando Beirão

Capra visita a chanchada

‘Steven Spielberg recebeu no domingo 11, da Associação dos Correspondentes Estrangeiros de Hollywood, o Globo de Ouro pelo conjunto da obra. Na cerimônia em que os vestidos de grife conseguiram sobressair sobre o kitsch do décor e a indigência dos discursos, Spielberg produziu um dos mais cristalinos momentos Spielberg.

Com aquela integridade circunspecta que preside até os seus filmes mais engraçados, ele mencionou a crise econômica e receitou contra o sufoco: cinema, mais cinema, mais diversão, mais entretenimento, mais alegria, mais otimismo.

Hollywood já conhece – perdão – este filme. Acudiu, por mais de uma década, a uma América açoitada pela recessão de 1929 e, para que as coincidências não parem aí, o grande artífice desse escapismo virtuoso e edificante foi o, digamos assim, Steven Spielberg da época: Frank Capra.

O Spielberg que empapa lenços em E.T. (de 1982) e A Lista de Schindler (1993) é da mesma estirpe daquele Capra de It’s a Wonderful Life (que um descerebrado nativo traduziu como A Felicidade Não Se Compra), de Meet John Doe (O Galante Mr. Deeds), de You Can’t Take It With You (Do Mundo Nada Se Leva) e de Mr. Smith Goes to Washington (ops, A Mulher Faz o Homem).

Siciliano de berço, Capra embebe sua obra com uma ética militante e populista que é como a América gosta de se ver ao espelho: meio piegas, talvez, muito caipira – como o cheesecake e as pinturas de Norman Rockwell –, mas carregada de bons sentimentos, dignidade, fé, dor, altivez e, quase sempre, recompensa.

Se a receita gringa para o estorvo das finanças requer, bem ao modo de Capra, ou no melhor estilo Spielberg, lágrimas antes do sorriso, é o caso de se perguntar que tipo de cinema haveria de confortar as eventuais agruras da nossa tropicana conjuntura.

No Brasil, a vida é um pandeiro e o cinema de massa sempre esteve mais para Cantinflas do que para Orson Welles. Está na hora de desempoeirar as fitas de Oscarito, Mazzaropi, Ankito, Grande Otelo – aquele escracho da chanchada capaz de, já à época de Vargas e JK, fazer da carestia (como se chamava a inflação com penúria) uma permanente piada.

Chefe de escola do Cinema Novo, Glauber Rocha disse que a chanchada era ‘vulgar’ e ‘alienante’. Depois admitiu que o deboche podia também ser ‘democrático nacionalista anárquico e libertatório’. Boa hora para isso.’

 

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