MERCADO
Naus supersônicas
‘Consta que Pedro Álvares Cabral levou 43 dias entre a partida de Lisboa e a primeira visão do Monte Pascoal, na Bahia, em 22 de abril de 1500. Passados cinco séculos, foram necessários poucos dias a mais para um grupo português pôr o pé em solo brasileiro e colocar em pleno funcionamento uma redação em São Paulo – o Brasil Econômico, lançado em outubro de 2009. Seis meses depois, a mesma holding adquiriu uma empresa de mídia no Rio, o grupo O Dia, que edita três jornais de perfil popular. Mais um diário será lançado nos próximos meses, desta vez em Brasília. Tampouco será surpresa se a investida chegar à tevê.
Não há limites à expansão territorial pretendida pela Ongoing, companhia criada há apenas três anos pelos remanescentes de um tradicional clã industrial lusitano, com a intenção de atuar no relativamente novo mercado TMT (tecnologia, mídia e telecomunicações). Mas apesar da rapidez, a chegada ao Brasil foi planejada. A começar pela escolha a dedo do CEO do grupo no País. O calabrês Carmelo Furci comandou as operações da Telecom Italia e conhece bem o mercado local de telecomunicações.
As naus da Ongoing seguem, céleres, rumo à conquista do mundo lusófono, com prioridade para Brasil, Angola e Moçambique. Navegar era preciso. Antes, porém, o grupo preparou em solo português as bases para o crescimento. É dono do título Diário Económico, maior jornal de economia do país e matriz do jornal lançado recentemente em São Paulo. Tem uma empresa de tecnologia, a Mobbit, focada na distribuição de conteúdo, além de uma agência de criação de marcas, a Mybrand. A mais jovem aposta do grupo é a CTN Transnational Contents, uma consultoria na área televisiva. Outras controladas são a filial portuguesa da empresa de recrutamento de executivos Heidrick & Strugles e a consultoria de gestão Accelerator.’
CAMPANHA
O que será?
‘Proponho um teste: quem pronunciou a seguinte sentença? ‘Não se deve pensar no Estado da inércia, da improdutividade. O Estado deve ser forte, não obeso. Forte em seu papel de cumprir as funções básicas e ativar o desenvolvimento, a justiça social e o bem-estar da população.’ Respostas: a) Karl Marx; b) Antonio Gramsci; c) José Serra; d) Lenin; e) Dilma Rousseff.
Não obrigo os leitores a procurar na última página desta edição a resposta correta, colocada de cabeça para baixo. Digo logo: resposta C. A apreciação do pré-candidato tucano à Presidência da República consta da entrevista que ele deu à Folha de S.Paulo, publicada no domingo 11. Excluído do teste, obviamente, o público do jornal.
Talvez haja quem se surpreenda com uma declaração que coincide, ao menos na essência, com algumas anteriores feitas pela pré-candidata Dilma Rousseff. Os meus afáveis botões murmuram em surdina que a mim não cabe surpresa. Com sua definição a favor do Estado ativo (o adjetivo é dele), Serra foi certamente sincero. Outra situação que não justifica espantos é o entusiasmo da mídia nativa com o lançamento da candidatura do ex-governador, sábado 10. De volta aos botões, eles sentenciam: é a beatificação em vida.
Foi de fato uma apoteose, com o condimento das lágrimas de Fernando Henrique e da súbita empolgação de Aécio Neves. Sobram aspectos da cobertura midiática de compreensão intrincada, se não francamente impossível. Se Dilma fala em Estado forte, o pânico coa das páginas e do vídeo. Em compensação, a Serra tudo se permite. Será que editorialistas, colunistas, articulistas, repórteres não levam Serra a sério quando usa argumentos banidos do catecismo dos herdeiros do udenismo velho de guerra? E apostam então na ação concentrada do tucanato para conter os arroubos de um ex-cepalino ainda sob contágio?
Talvez. Coisa certa: a mídia nativa está contra Lula, desde sempre, e contra sua candidata. Portanto, a favor de Serra. Favor? Algo mais do que isto, como se no firmamento as estrelas tremelicassem em desespero. A campanha que esboça é, porém, antiga, anacrônica, mofada igual às roupas da bisavó nos baús do sótão. O propósito continua a ser a semeadura do medo. Funcionou contra Getúlio em 1950, contra JK, contra Lott, contra Jango. No golpe de 64. E contra as Diretas Já e contra Lula em 1989, aquele momento em que o presidente da Fiesp, Mario Amato, vaticinou o êxodo da burguesia caso vencesse o fundador do PT.
Com a candidatura de Fernando Henrique, tudo ficou fácil, os graúdos e sua mídia enamoraram-se dele. A vitória do ex-metalúrgico muda o quadro em 2002 e 2006. Fica provado que o jornalismo pátrio com suas aulas de pavor não chega lá. Chegaria agora? Lula não cativou apenas seu povo, que de resto é maioria. Cativou também largos setores do empresariado nacional que a mídia insiste em pretender assustar quando denuncia o ódio, pretensamente estimulado pelos governistas em um confronto entre ricos e pobres e entre Sul e Norte.
Os editoriais dos jornalões clamam contra a ideia do plebiscito, como se toda eleição não implicasse o confronto entre as realidades do passado e as promessas do futuro, e como se os índices de rejeição de FHC não alcançassem a abóbada celeste. Sim, Dilma é a candidata de Lula. Serra, entretanto, é a figura política que cresceu à sombra de Fernando Henrique, o amigo inseparável sob a batuta de Sergio Motta, o parceiro cativo.
Como escapar a esta circunstância? Houve tentativas de tirar o ex-presidente da ribalta. Em vão. Ali está ele, a reivindicar seu lugar na história e o próprio Serra não consegue fugir à injunção de recomendá-lo aos pósteros e de lhe provocar a comoção. A mídia malha Lula sem perceber que, desta maneira, endossa o conceito do pleito plebiscitário. Mostra, antes de mais nada, é seu medo, em face de uma candidata que absorve o prestígio de quem a ungiu.
Um ponto permanece obscuro: resta saber se a mídia nativa, desta vez e finalmente, dirá quem apoia, em lugar de alegar uma imparcialidade fajuta. A bem da verdade factual.’
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