Friday, 22 de November de 2024 ISSN 1519-7670 - Ano 24 - nº 1315

Cibele Maciel

‘‘Jamais imaginaria que, depois de um trabalho de cinco anos feito pela comunidade, a polícia faria o que fez aqui. Quando cheguei, o agente da PF estava atrás da porta, fortemente armado. Colocou o revólver na minha cabeça e pediu que eu deitasse no chão, de costas. O mais vexatório é que fui algemado e obrigado a percorrer praticamente toda a comunidade sem que as pessoas soubessem o que estava acontecendo’. Quem faz essa narração é o diretor da Rádio Digital, Eduardo Martins, uma das rádios fechadas pela Polícia Federal em Belo Horizonte na operação chamada ‘Capitão Gancho’.

A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), encarregada pela fiscalização das rádios sem licença de funcionamento, considera ‘grave’ o caso de Belo Horizonte, onde somente em novembro de 2004 foram julgadas 63 emissoras não-outorgadas. Um ano antes, a Anatel, a PF, a Justiça Federal e o Ministério Público Federal discutiam uma forma de fiscalização e repressão mais eficaz, ‘que culminou com a operação da Polícia Federal no dia 25 de outubro, na qual promoveu-se a execução de mandados de busca e apreensão em 14 entidades não outorgadas e 3 links [aparelhos de retransmissão]. Todas eram reincidentes’, diz o relatório da Anatel.

No mesmo dia, a Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), com representantes em 17 estados brasileiros, divulgou um documento repudiando a ação. No texto, a instituição afirma que ‘comunicadores populares foram algemados, tratados como bandidos, autuados em flagrante, sob a mira de metralhadoras’. Para o coordenador de comunicação da Abraço, José Guilherme Castro, pior do que a violência física é a ‘violência psicológica’, devido à presença da Polícia Federal.

O gerente da regional de Belo Horizonte da Anatel, José Dias Coelho Neto, explica que o papel da Polícia Federal é executar o mandado expedido pela Justiça. Quanto às denúncias de violência desnecessária, ele exige que sejam apresentadas formalmente à Anatel para averiguação. ‘Que então se abra um processo administrativo. Primeiro, a Anatel nunca fez isso (fechar rádios com violência). Segundo, a Polícia Federal pode até ter feito isso, mas quando se sentiu obrigada, por força de uma reação agressiva das partes. Normalmente, a Polícia Federal não age dessa maneira e a Anatel muito menos, até porque não é essa a nossa orientação’.

A Rádio Constelação FM, formada por portadores de necessidades especiais, cegos, em sua maioria, foi outra rádio fechada na mesma operação. O diretor, Roberto Emanuel, também acusou os policiais de agirem de forma truculenta e despreparada. ‘Três agentes da Polícia Federal chegaram armados, com outros três agentes da Anatel. Acho que, quando eles viram que eram só deficientes, se envergonharam. Não precisava apontar arma pra gente, porque a gente não enxerga’, disse. Emanuel disse que, depois, foi obrigado a ir à delegacia prestar depoimento: ‘como se eu fosse um marginal nocivo à sociedade. Quando perguntaram de onde tinha saído o dinheiro para comprar o equipamento, eu disse, bem claro, que era de esmola no trânsito. E vou continuar pedindo esmola, para que a gente possa colocar nossa rádio no ar’.

De acordo com a Anatel, somente no estado de Minas foram concluídas 6.018 ações de fiscalização de janeiro a setembro deste ano. Das 14 emissoras fechadas na Operação Capitão Gancho, de acordo com Emanuel, da Rádio Constelação, nove delas fizeram um acordo entregando os equipamentos e cestas básicas em troca do arquivamento do processo.’

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‘DF e Rio produziram ‘dossiês’ sobre violência e apreensões sem mandado em rádios’, copyright Agência Brasil, 6/01/05

‘Entidades do Distrito Federal e do Rio de Janeiro produziram dossiês apontando o que consideram arbitrariedades no fechamento de rádios comunitárias. A Federação das Associações de Radiodifusão Comunitária (Farc) apresentou 70 casos de rádios que foram fechadas no estado do Rio de Janeiro, a maioria delas sem mandado da Justiça, segundo o documento. Já o relatório assinado pela Rede Brasil de Comunicação Cidadã (RBC), TV Comunitária do Distrito Federal e Sindicato dos Jornalistas Profissionais do DF, chamado ‘Quem quer calar a voz do povo – A violência contra as rádios comunitárias no Brasil’, conta a história de 17 casos de rádios que foram fechadas por todo o Brasil. Segundo as quatro entidades, as emissoras comunitárias sofrem forte repressão.

A secretária executiva da Farc, Graça Rocha, afirma que a Polícia Federal age com ‘bastante brutalidade’ e o uso da violência psicológica é explícita. Um dos casos apresentados no dossiê é o da Rádio Liberdade, de Jacarezinho, onde ‘os cartazes foram arrancados das paredes e rasgados, os CDs foram quebrados, e até hoje a comunidade não reviu seus pertences’. Outro caso descrito é o da Rádio FM Ilha, que recebeu três visitas da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e Polícia Federal. Segundo o relatório, ‘o mandado de busca e apreensão só chegou após duas horas, por fax, depois que seus dirigentes estavam presos na delegacia regional na PF do Rio’.

O dossiê do DF conta outra história ainda, da Rádio Valente FM, da Bahia, que foi fechada em 2000. ‘(…) Eles [Policiais Federais] saltaram o muro, quebraram a porta que dá acesso à rádio e começaram a espancar o colaborador da rádio. Como se não bastasse, algemaram o rapaz e começaram a fazer o interrogatório ali mesmo no local’, descreve o texto. O documento diz que a rádio foi lacrada em 2003, quando já era autorizada, porque a Anatel alegou que os equipamentos utilizados não estavam licenciados.

A Rádio Santa Cruz do Sul, do Rio Grande do Sul, hoje autorizada pelo Ministério das Comunicações, também consta no relatório do DF como vítima de ‘uma ação truculenta, violenta, que causou, inclusive, lesões em mulheres, homens e crianças, que ficaram indignados com a apreensão ilegítima do material’. Para os autores, ‘esses relatos demonstram o comportamento arbitrário e preconceituoso das autoridades contra os comunicadores comunitários’.

De acordo com o relatório da Farc, desde 2000 a entidade vem denunciando abusos nas ações de fiscalização feitas com base na lei nº 4117 de 1962, modificada pelo decreto 236/67. A entidade representa 396 rádios parceiras e afiliadas no estado e, de acordo com a secretária executiva da Farc, Graça Rocha, sua instituição já processou a Polícia Federal e a Anatel por abuso de autoridade. De acordo com Graça, depois da publicação dos dossiês, equipamentos foram devolvidos e processos contra os diretores das rádios foram arquivados. ‘Nós tivemos uma resposta positiva’, comemora.’



André Deak e Fabrício Ofugi

‘Violência contra rádios comunitárias é sistemática, dizem associações’, copyright Agência Brasil, 6/01/05

‘O Estado brasileiro promove perseguições e violência sistemática contra as rádios comunitárias, afirmam instituições que trabalham com esses grupos. ‘Não apenas o número de rádios comunitárias que são fechadas está aumentando, mas a violência com que são fechadas aumenta também’, afirma o uruguaio Gustavo Gómez, diretor do programa de legislação e direito à comunicação da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (Amarc).

A presidente do conselho de administração do Sindicato das Entidades Mantenedoras do Sistema de Radiodifusão Comunitária de São Paulo (Sinerc), Luci Martins, diz que ‘diante desse cenário de violência, a rádio comunitária vem tendo o mesmo tratamento que os criminosos de alta periculosidade. Por mais que deputado, [ativista de] direitos humanos, se manifeste, a Polícia Federal acha que está acima de qualquer poder’.

Na mesma direção vão as críticas do coordenador geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) e também secretário da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Celso Augusto Schroder. ‘Nós temos percebido (a violência contra as rádios) e várias vezes fizemos contato com a Anatel e com a PF pedindo outro tipo de atuação. Não estamos tratando de criminosos, contrabandistas, traficantes, nada disso. Ao contrário, estamos tratando de comunidades que precisam e necessitam produzir informação para se enxergarem no mundo, para construírem sua identidade e, com isso, interferir na identidade nacional.’

Schroder concorda que ‘a lei tem que ser cumprida’, mas diz que a Anatel deveria incluir um ‘componente social’ em sua ação, que tivesse relação com as rádios comunitárias. ‘É óbvio que a PF e a Anatel têm a obrigação de cumprir a lei, mas achamos que é preciso licenciar as rádios imediatamente, para não dar a elas as mesmas características dadas aos criminosos comuns’, diz.

De acordo com o coordenador jurídico da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), Joaquim Carvalho: ‘é um ato de violência sistemática, sim’. Carvalho explica essa ‘perseguição’ por meio de dois aspectos: em primeiro lugar, a questão financeira, ‘não porque a rádio comunitária compete pelos anunciantes com a rádio comercial; a questão é de audiência: os patrocinadores já não querem os valores propostos anteriormente, por causa da redução da audiência – que migra para as comunitárias’. Em segundo lugar, ainda de acordo com o coordenador da Abraço, viria a questão política: ‘As rádios comerciais, na história do Brasil, têm servido como moeda de troca do governo para votações dentro do Congresso. No RS, quando se fala em rádio comercial, pergunta-se logo qual é o deputado que está vinculado, qual é sócio’.

Chefe da Delegacia Regional de Combate ao Crime Organizado (DRCOR), o policial federal Francisco Moura Velho diz que muitas pessoas não têm noção do que seja um mandado de busca, e por isso se assustam. ‘Caso a pessoa não permita a entrada, a Justiça dá amplos poderes, autoriza até você derrubar a porta, e às vezes as pessoas não entendem. Acham que o policial não precisava estar armado, o camburão parado lá embaixo – o que o vizinho vai pensar? Na verdade, essa é a forma correta. E a pessoa pode até ser algemada em flagrante delito’, diz.

Em relação às acusações de que a polícia utiliza a mesma força contra criminosos perigosos e proprietários de rádios, Moura diz que ‘não se pode nem comparar’. ‘Não dá para dizer que quem tem uma rádio vai ser tratado da mesma forma que um traficante, onde se leva armas mais pesadas e um número de policiais bem maior’, diz. Até mesmo porque, segundo ele, ‘não existe qualquer resistência, mesmo porque boa parte (no DF) está vinculada a programas religiosos, e são pessoas que não tem qualquer folha de antecedentes criminais’.

‘São pessoas que querem fundar uma associação e infelizmente colocam a rádio no ar sem autorização. Quando se deparam com a polícia, no geral cooperam. Mas sabem que estão infringindo a lei, então dificultam a fiscalização da Anatel, mudando a rádio de lugar. Quando se emite um mandado, muitas vezes a rádio já não está mais lá’, conta.’



Iara Falcão

‘Leis permitem prisão de até quatro anos para responsáveis por rádios sem licença’, copyright Agência Brasil, 6/01/05

‘De acordo com a legislação em vigor, ter uma rádio comunitária clandestina funcionando pode dar cadeia. Um dos principais dispositivos usados nessas situações é o artigo 70 da lei 4.117/62, antigo Código de Telecomunicações, que foi modificado pelo decreto 236 em 1967, durante o regime militar. O artigo considera crime a instalação ou a utilização de telecomunicações fora do que especifica a lei, o que incluiria as rádios comunitárias sem licença. Pela infração, os responsáveis pelas rádios podem ser presos por um ou dois anos.

Representantes dos movimentos sociais consideram que a lei trata representantes comunitários como criminosos. ‘Um crime é você matar uma pessoa, é você roubar, assaltar. Agora, cometer uma irregularidade porque não tem uma autorização e por isso ir para a cadeia, ou ser acusado de formação de quadrilha é, no mínimo, um exagero’, afirma Dioclécio Luz, escritor e membro do Sindicato dos Jornalistas do Distrito Federal.

Em 1997, criou-se uma nova Lei Geral de Telecomunicações (9.472/97), que aumenta a punição dada pelo artigo 70 da lei 4.117/62: o artigo 183 da LGT pune com dois a quatro anos de prisão quem ‘desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação’. Segundo o superintendente de fiscalização e radiofreqüência da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Edílson Ribeiro dos Santos, ainda que a LGT não esteja entre as normas citadas pela legislação específica da radiodifusão comunitária, é utilizada por normatizar o uso do espectro de radiofreqüência, pelo qual a Anatel é responsável.

O superintendente da Anatel adverte que o próprio Código do Processo Penal pode ser usado também para incriminar os responsáveis pelas rádios não autorizadas, e nesse caso nem é preciso aviso prévio. ‘Literalmente, não precisa fazer a notificação. Como é um ato delituoso, e sendo em flagrante, qualquer do povo pode até dar voz de prisão’, declara. O juiz Francisco de Assis Betti, da 9a Vara Federal de Belo Horizonte, atesta: ‘Prisão em flagrante independe de mandado’.

As rádios comunitárias autorizadas também não estão livres de penalidades. Podem receber advertências, multas, interrupção do serviço e até revogação da autorização. Várias leis podem servir de base para a Polícia Federal e a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) em suas ações contra essas rádios comunitárias. Infrações contra a lei 9.612 e o decreto 2.615, ambos de 1998, que especificam o funcionamento das rádios comunitárias, estipulam várias regras como alcance restrito a um quilômetro, potência máxima de transmissão de 25 watts, proibição de publicidade e formação de rede, entre outros pontos.’

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‘Municípios assumem responsabilidade por radiodifusão comunitária’, copyright Agência Brasil, 6/01/05

‘Desde a criação da lei da radiodifusão comunitária, em 1998, foram apresentados 40 Projetos de Lei (PL) na Câmara Federal para modificar a norma. Quatro deles já foram arquivados, e outros 36 continuam tramitando na casa legislativa, mas a maioria está na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática aguardando seu destino. Ainda tramitam na Câmara uma Proposta de Emenda Constitucional e um Projeto de Decreto Legislativo.

Grande parte dos projetos trata do direito de veicular publicidade e alguns propõem a anistia dos que infringiram a lei 4.117/62 e dos que foram incriminados com base no artigo 183 da Lei Geral das Telecomunicações. O PL 796/03, dos deputados Adão Pretto (PT-RS) e Edson Duarte (PV-BA), por exemplo, vai mais além e pede a revogação do artigo 70 do antigo código de telecomunicações.

Em contrapartida, outros projetos agravam ainda mais as penalidades, como o PL 3.225/00, do deputado Wigberto Tartuce (PPB-DF), que torna inafiançável o crime de instalação ou utilização de telecomunicações em desacordo com o previsto na Lei nº 4.117/62.

Em nível municipal, uma idéia do juiz federal aposentado Paulo Fernando Silveira virou projeto de lei na Câmara Municipal de São Paulo. A proposta municipaliza a competência sobre rádios comunitárias, o que hoje é tarefa da União. Apresentado pelos vereadores Carlos Neder (PT) e Ricardo Montoro (PSDB), o PL 145/01 ainda não foi votado.

Segundo o juiz Paulo Silveira, outros municípios já adotaram o sistema: São Gonçalo, no Rio de Janeiro, Campinas e Santo André, em São Paulo, e Montes Claros, em Minas Gerais. Para Silveira, tirar da União a competência sobre rádios comunitárias ajudará na transparência das concessões. ‘No município, o nosso olho vê quem está ganhando a rádio e porquê. É o controle da população. A fiscalização da população é muito mais importante do que a fiscalização do tipo Anatel-Polícia Federal’, enfatiza.’

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‘Juristas divergem sobre legislação relativa a rádios comunitárias’, copyright Agência Brasil, 6/01/05

‘O juiz federal aposentado Paulo Fernando Silveira faz várias críticas à legislação que regula as rádios comunitárias. Para ele, não é ilegal ter uma rádio comunitária sem autorização. ‘É lícito e constitucional, porque no artigo 5º da Constituição Federal diz taxativamente que a comunicação é um direito fundamental que pode ser exercido independente de lei’, afirma. Segundo o inciso IX do artigo 5o da Constituição brasileira, ‘é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença’.

Autor de um livro sobre a radiodifusão comunitária, Silveira diz que o governo só pode restringir os direitos fundamentais se houver um interesse real e concreto da sociedade para defender. E acrescenta que a Constituição deve prevalecer sobre as leis comuns. ‘Lei é a vontade dos legisladores com a anuência do Executivo, dos órgãos eleitos. Mas a Constituição é a vontade do povo. A lei tem que se adequar à Constituição, e não o contrário’, defende.

Por outro lado, a Lei Geral de Telecomunicações (9.472/97) define o espectro de radiofreqüência como um recurso limitado, ‘constituindo-se em bem público’, e a própria Constituição Federal, no artigo 223, diz que é competência do ‘Poder Executivo a outorga e renovação de concessão, permissão e autorização de serviço de radiodifusão sonora’.

O advogado Paulo Castello Branco explica: ‘Na radiodifusão, o sistema não comporta todo mundo ter uma rádio’. O juiz rebate. Baseado no artigo 30, inciso I, da Constituição, defende que o interesse local não é competência da União e sim do município, o que invalidaria a lei que institui as rádios comunitárias. ‘A lei 9.612/98 é inconstitucional no todo’, afirma. Assim, apenas as rádios que têm alcance nacional dependem da outorga do Poder Executivo federal para funcionarem. As comunitárias, por terem baixa potência e alcance restrito, estariam sujeitas ao Poder Executivo municipal. ‘Cada ente político tem sua esfera privativa de competência. Então, se a competência é municipal, a União não pode entrar naquele assunto. Aí, a lei federal é inconstitucional’.

Para Silveira, as leis utilizadas para punir com detenção os responsáveis por rádios comunitárias clandestinas também não deveriam ser aplicadas, já que a Constituição separou telecomunicações de radiodifusão (artigo 21, incisos 11 e 12 respectivamente). Segundo o juiz, o artigo 183 da Lei Geral de Telecomunicações não pode ser aplicado à radiodifusão, porque a lei é específica para telecomunicações. Já o artigo 70 da lei 4.117/62, que foi mantida no que se refere à radiodifusão, também não poderia ser aplicado. O artigo ser refere a telecomunicações e não à radiodifusão. ‘Os termos em Direito Penal têm que ser específicos e fechados. Não podem ser interpretados amplamente. Teria que falar radiodifusão. Como não fala, não pode ter crime’, conclui.

Outras interpretações consideram que o Estado, quando não consegue prestar o serviço e demora demais para decidir – caso das autorizações do Ministério das Comunicações -, desrespeita o devido processo legal. Com base nessa argumentação, em 2003, por exemplo, o Superior Tribunal de Justiça indeferiu o pedido da Anatel de suspensão da decisão do Tribunal Regional Federal da 4a. Região, que abrange o Rio Grande do Sul.

O TRF havia permitido que a rádio de uma associação comunitária de Porto Alegre (RS) continuasse funcionando até que fosse apreciada a habilitação da mesma pelo Poder Executivo. ‘Toda autoridade pública tem obrigação de responder aos requerimentos que forem feitos dizendo ‘concedo’ ou ‘não concedo’ com as justificativas’, atesta Silveira.

Assim como Silveira, outros juízes já negaram pedidos de busca e apreensão da Polícia Federal contra rádios, por interpretarem as leis de maneira a beneficiar os proprietários das rádios comunitárias. O desembargador federal José Luiz Germano da Silva, que se aposentou no final de 2004, também negou a emissão de mandados de busca e apreensão, afirmando na rejeição da denúncia que mesmo ‘o fato de a rádio inserir publicidade em sua programação não denota, por si só, fins lucrativos. Sendo a rádio vinculada a uma associação civil, certo é que, para funcionar, tem seus custos, e, nada impede que tenha renda, até mesmo para custear suas despesas operacionais, não se confundindo isto com auferição de lucro pela diretoria ou associados’. Sobre a conduta do administrador da rádio, que a faz operar sem a devida autorização, Silva decretou que ‘constitui-se em ilícito administrativo, mas é penalmente irrelevante, ensejando a rejeição da denúncia’.

Da mesma forma também julga o juiz Marcus Vinícius Reis Bastos, da 12ª Vara e Juizado Especial Criminal Adjunto do Distrito Federal.’